Acórdão nº 5699/15.0T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA AM
Data da Resolução18 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Na sequência da declaração da insolvência da sociedade “DD, Lda”, o Sr. Administrador da Insolvência emitiu parecer no sentido de a insolvência ser qualificada de culposa e de ser afectado por tal qualificação o sócio-gerente José.

Para justificar a qualificação de insolvência como culposa, o Sr. AI aponta os seguintes fundamentos: incumprimento da obrigação de manter uma contabilidade organizada; incumprimento do dever de colaboração com o Sr. AI; ocultação, danificação ou desaparecimento de bens integrantes do património da insolvente (als. a) h) e i) do n.º 2 do art.º 186.º do CIRE).

* O Ministério Público emitiu também parecer, no sentido de qualificação da insolvência como culposa, por estarem verificadas as situações previstas nas als. a), h) e i) do n.º 2 e al. a) do n.º 3 do art.º 186.º do CIRE e de ser afectado por tal qualificação o gerente da insolvente.

* Notificada a devedora e citado pessoalmente aquele que, segundo o Sr. AI e o MP, deve ser afectado pela qualificação da insolvência (o gerente da insolvente acima identificado), foi por este deduzida oposição, na qual impugnou todos factos alegados – quer pelo AI, quer pelo MºPº - para fundamentar a qualificação da insolvência como culposa.

Diz que sempre se mostrou disponível para fornecer todas as informações solicitadas pelo AI quanto à situação contabilística da devedora, conforme documentos que junta; que informou o sr. AI do paradeiro das viaturas, assim como do seu estado; e que quanto ao seu dever de se apresentar à insolvência, ainda que tenha omitido esse dever, esse facto não criou nem agravou a sua situação de insolvência, para a sua qualificação como culposa.

Acrescenta que tem vindo a diminuir o passivo da devedora, assumindo pessoalmente as dívidas daquela; que tem assumido as responsabilidades dos trabalhadores nos processos movidos contra a empresa; e que reverteu parte das dívidas da sociedade insolvente, quer perante a Autoridade Tributária, quer perante a Segurança Social, encontrando-se ainda a pagar essas dívidas, concluindo, a final, que a insolvência devia ser considerada fortuita.

*O AI respondeu à oposição, mantendo o anteriormente alegado quanto à qualificação da insolvência.

*Tramitados regularmente os autos, foi proferida a seguinte decisão: “Nos termos e fundamentos expostos, decide-se: a)- qualificar a insolvência da sociedade DD, Lda. como culposa; b)- declarar que é afectado pela qualificação da insolvência, José, sócio e gerente da insolvente; c)- decretar a inibição de José pelo período de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses; d)- declarar José inibido para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa durante o período de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses; e)- condenar José a indemnizar os credores da insolvente no montante dos créditos não satisfeitos, até às forças do respectivo património, a apurar em liquidação de sentença.

Custas pela massa insolvente (art.º 304.º do CIRE)…”.

*Não se conformando com a decisão proferida, dela veio José interpor o presente recurso de Apelação, apresentando Alegações e formulando as seguintes Conclusões: “1. Vem o presente recurso da douta sentença proferida que, qualificando a insolvência como culposa, e para além do mais, condenou o ora recorrente a indemnizar os credores da insolvente no montante dos créditos satisfeitos, até à força do respectivo património, a apurar em liquidação de sentença.

  1. Desde logo, andou mal a sentença recorrida ao concluir que "Por outro lado, não obstante ter recepcionado as notificações que foram enviadas em 04 de Janeiro de 2016 pelo AI, endereçadas ao próprio e à sociedade insolvente, solicitando o fornecimento dos elementos a que alude o artigo 24º do CIRE, José não o fez”- Ponto 8. Dos factos provados.

  2. Na verdade, o que resulta dos elementos probatórios juntos aos autos é que o recorrente, através do seu mandatário, no dia 26 de Janeiro de 2016, indicou ao AI que todos os elementos contabilísticos se encontravam no escritório do Dr. Manuel, 4. Sendo certo que um mês depois, o recorrente dirigiu nova informação ao AI dizendo que por impossibilidade de comunicação com o Dr. Manuel não conseguia, naquele momento, reunir toda a documentação solicitada (Cfr. docs. nºs 2 e 3 juntos como articulado de oposição de insolvência).

  3. Ora, o Tribunal a quo fez tábua rasa das comunicações juntas pelo recorrente, como se as mesmas nunca tivessem existido, num claro erro de julgamento, susceptível de influir na culpa e grau de ilicitude para efeitos de qualificação da insolvência como culposa.

  4. Pelo que é entender do recorrente que o ponto 8. Dos factos provados deve ser alterado, considerando que: "Tendo recepcionado as notificações que foram enviadas em 04 de Janeiro de 2016 pelo AI, endereçadas ao próprio e à sociedade insolvente, solicitando o fornecimento dos elementos a que alude o artigo 24º CIRE, José respondeu nos termos das missivas constantes dos documentos nºs 1 e 2 junto aos autos." 7. Também julgou mal ao afirmar que o recorrente não indicou ao AI qual o paradeiro dos veículos automóveis marca Opel, matrícula CC, marca Peugeot, matrícula EE, marca Toyota, matrícula MM; - vide ponto 9 do elenco dos factos provados.

  5. Com efeito, os elementos de prova constantes dos autos, e, nomeadamente, o doc. nº 3 junto com a oposição à insolvência deveria permitir ao Tribunal entender que para além de o devedor sempre ter justificado o paradeiro de tais veículos, estes também não foram pura e simplesmente "dissipados" ou "ocultados".

  6. Aliás, da leitura de tal documento, conjugado com a informação constante do registo automóvel, também junta aos autos, constata-se, quer pelo ano dos veículos, quer pela marca e modelo dos mesmos, que o seu valor patrimonial é altamente reduzido, sendo certo que se entende que nos poderes do Tribunal cabe o de averiguar oficiosamente informação acerca dos mesmos.

  7. Atendendo à informação indiciária acerca dos veículos que acima se referiu - revelada pela análise conjugada dos documentos em causa - o Tribunal não poderia pura e simplesmente considerar verificada a presunção constante da alínea a) nº 2 do artigo 186º tendo em conta que o normativo em causa exige não só uma dissipação (que não se verificou) mas também que esta seja considerável.

  8. Nestes termos, e como se disse, para além de o recorrente ter informado o Tribunal acerca do paradeiro dos veículos - em território francês e com ordem de abate - o valor comercial dos mesmos não é de molde a poder considerar-se preenchida a alínea a) do artigo 186º do CIRE.

  9. Pelas mesmas razões expostas e em face dos documentos juntos pelo recorrente (doc. nº 3 oposição à insolvência) o Tribunal deveria ter julgado como não provados os factos constantes dos pontos 9 e 10.

  10. Também é completamente desacertada a conclusão extraída pelo Tribunal de que "ao longo dos anos referidos e anos posteriores, foram-se vencendo créditos, cuja existência foi reconhecida, no valor global de €451.309,20, designadamente os seguintes (...)". - vide ponto 13 do elenco dos factos provados.

  11. Ora, é flagrante a contradição da sentença recorrida na parte em que, por um lado, afirma que o recorrente deveria ter-se apresentado à insolvência em 2014 e, por outro, refere que ao longo dos anos foram-se vencendo créditos no montante global de €451.309,20.

  12. É que, não pode deixar de atentar-se que o incidente de qualificação da insolvência está relacionado com acções/omissões do devedor que criem ou agravem a situação de insolvência, o que significa que nem todos os factos praticados pelo devedor enquanto gerente da sociedade poderão servir para formular um juízo de culpa quanto à qualificação da insolvência.

  13. Vale por dizer que, não pode presumir-se que a totalidade dos créditos não satisfeitos nos presentes autos decorrem de acções culposas do devedor.

  14. Na verdade, a grande percentagem de créditos não satisfeitos nos presentes autos dizem respeito a contribuições para a Segurança Social - €403.265,63 (vide apenso de reclamação de créditos) - relativas a um período temporal não abrangido pela insolvência culposa uma vez que no tempo em que se venceram não havia ainda qualquer obrigação do devedor se apresentar à insolvência, ou seja, são créditos que se venceram por força da actividade comercial da sociedade e não por qualquer omissão culposa do recorrente de se apresentar à insolvência (não se olvide que o tribunal considerou que a obrigação de apresentação à insolvência apenas se gerou na esfera do recorrente em 2014).

  15. Face ao exposto, entende-se que o ponto 13 dos factos julgados provados deve ser modificado devendo apenas considerar-se os créditos vencidos após o ano de 2014 (relativos a liquidações da Autoridade Tributária) no montante de €36.797,50, sendo este aliás o montante discriminado nos factos provados que omitem a referência a créditos da Segurança Social.

  16. Mas, o Tribunal errou também na aplicação do Direito.

  17. Dispõe o artigo 189º nº 2 alínea e) CIRE que na sentença que qualifique a insolvência como culposa o juiz deve condenar as pessoas afectadas a indemnizarem os credores do devedor declarado insolvente no montante dos créditos não satisfeitos, até à força dos respectivos patrimónios.

  18. No que respeita ao quantum indemnizatório rege o disposto no nº 4 segundo o qual “Ao aplicar o disposto na al. e) do nº 2, deve o juiz fixar o valor das indemnizações devidas ou, caso tal não se mostrar possível, em virtude de não dispor dos elementos necessários para calcular o montante dos prejuízos sofrido, os critérios a utilizar para a sua quantificação, a efectuar em liquidação de sentença".

    Não nos diz a lei quais os critérios de fixação, mas o montante a indemnizar terá necessariamente como limite a observar, por um lado, o valor dos créditos não satisfeitos e, por outro, o do património pessoal dos responsáveis.

  19. Todavia, e...

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