Acórdão nº 838/16.7T8GMR-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA PURIFICA
Data da Resolução14 de Setembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

I.

RELATÓRIO Aberto o incidente de qualificação da insolvência nos autos supra identificados veio o Ministério Público apresentar parecer propondo que a insolvência fosse qualificada como culposa e que afecte os insolventes.

A senhora A.I apresentou parecer qualificando a insolvência como fortuita e em julgamento alterou o seu parecer para culposa acompanhando o Ministério Público.

Em cumprimento do disposto no n.º 5 do art.º 188.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa foi ordenada a notificação dos insolventes e a citação daqueles que deveriam ser afectados com a qualificação da insolvência a fim de ela se oporem.

Os insolventes apresentaram oposição.

Os autos prosseguiram e foi proferida sentença na qual se decidiu: A). Qualificar como culposa a insolvência de A. F. e M. F.; B). Declarar A. F. e M. F. inibidos para o exercício do comércio durante 3 anos, bem como para a ocupação de qualquer cargo titular de órgão de sociedade civil ou comercial, associação, fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa; C). Determinar a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou massa insolvente detidos por A. F. e M. F., bem como determinar que sejam restituídos à massa quaisquer bens ou direitos recebidos em pagamento desses créditos; D). Condenar A. F. e M. F. a indemnizar os credores da insolvente no montante dos créditos não satisfeitos, até às forças do respectivo património.

* Custas a cargo da massa insolvente – art.º 304.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa.

* Registe e notifique.

Inconformados com esta decisão os insolventes apresentam recurso que terminam com as seguintes conclusões:

  1. Os recorrentes requerem que seja corrigido o lapso manifesto constante do ponto 17 dos factos provados, porquanto resulta dos documentos de fls_ e até da própria fundamentação da sentença que a sociedade referida nesse ponto não é a "Empresa A, SA", mas sim a "Empresa X, SA".

    I - Da alínea a) do nº 2 do artigo 186.º do CIRE e do seu não preenchimento B) Tal norma prevê que se considera sempre culposa a insolvência quando o devedor tenha destruído, danificado, inutilizado, ocultado, ou feito desaparecer, no todo ou em parte considerável, o seu património, sendo evidente que não existe qualquer facto provado que se subsuma a tal previsão normativa C) O Tribunal o quo acredita ter-se verificado o seu preenchimento em virtude do insolvente A. F. ser administrador único da sociedade "Empresa X Comercio, Importação e Exportação, SA e da sociedade "Empresa A - Investimentos e Propriedades, SA", tendo esta última sociedade celebrado com os insolventes um contrato de arrendamento urbano para fins habitacionais com prazo certo e ainda em virtude da existência dos contratos de compra e venda de acções que, no seu entendimento, por retirarem bens da esfera jurídica dos devedores, implica um "descaminho" (!) que impede ou dificulta o acesso ou accionamento por parte dos credores D) Porém, não existe qualquer descaminho de bens ou ocultação de património pelo simples facto de terem adquirido acções com um custo efectivamente suportado de (2.500,00 (vide - ponto 23 dos factos provados) e vendido as mesmas pelo mesmo preço ou pelo facto do mesmo ser Administrador único daquelas sociedades.

    E) Nem se chega a perceber a razão pela qual o Tribunal a quo também enfatiza a questão do Imóvel que é pertença da sociedade "Empresa A, SA" ter sido dado de arrendamento aos insolventes e do mesmo prédio ter pertencido anteriormente aos pais/sogros dos insolventes, uma vez que tal imóvel não é, nem era dos insolventes, sendo, pois impossível ter havido ocultação de bens dos insolventes nessa transmissão do bem! II - Da alínea b) do nº 2 do artigo 186.º do CIRE e do seu não preenchimento F) Em bom rigor, pese embora o objecto do litígio e os temas da prova incidissem sobre o preenchimento de tal alínea, o Tribunal é completamente omisso quanto a tal questão, tendo até decidido (com decisão surpresa) que ocorreu o preenchimento da alínea d) do nº 2 do artigo 186.º do CIRE que não era sequer objecto do litígio, não tendo sido seleccionado qualquer tema da prova nesse particular.

    G) De qualquer forma, perante todos os factos provados, não poderá certamente qualificar-se como culposa a insolvência pelo preenchimento da alínea b) do nº 2 do artigo 186.º do CIRE, pois nenhum facto provado induz no sentido de que os insolventes tenham procedido à criação ou agravamento artificial de passivos ou prejuízo, reduzido lucros, celebrado negócios ruinosos ou tirado proveito próprio ou quaisquer pessoas com eles especialmente relacionadas com a celebração dos mesmos negócios ruinosos.

    III- Da alínea d) do nº 2 do artigo 186º do CIRE e do seu não preenchimento H) O Tribunal de primeira instância, apesar de referir expressamente que considera preenchida a alínea em análise (que aliás não constituía o objecto do litígio, nem tinha sido carreada para os temas da prova com a inerente impossibilidade de produção de prova por parte dos recorrentes), acaba por não explicar que disposição de bens foi essa.

    I) Uma vez que, para além da compra e venda de acções (pelo mesmo preço de aquisição), não está reflectida na matéria de facto provada qualquer outra disposição de outros bens, só poderá o Tribunal recorrido ter considerado o preenchimento de tal alínea em virtude desses negócios, os quais não são idóneos ao preenchimento da refenda alínea, ficando sem resposta para quem, como e de que forma é que existiu proveito pessoal ou de terceiros IV.

    Da alínea i) do nº 2 do artigo 186º do CIRE e do seu não preenchimento J) Tal norma prevê que se considera sempre culposa a insolvência quando o devedor tiver incumprido, de forma reiterada, os seus deveres de apresentação e de colaboração até à data da elaboração do parecer referido no n.º 2 do artigo 188º, tendo o Tribunal sindicado considerado que existiu violação do dever de colaboração.

    K) No entanto, os apelantes não se conformam com qualquer preenchimento desta alínea, na medida em que também não existiu qualquer incumprimento desse dever de colaboração e muito menos a exigida reiteração de tal incumprimento para a qualificação da insolvência como culposa.

    L) Os insolventes foram totalmente colaborantes com a Ex ma Senhora Administradora da Insolvência, sendo que em lado algum do relatório ou do parecer pela mesma elaborado se vislumbra qualquer referência a um pedido não satisfeito pelos insolventes.

    M) Para o Tribunal recorrido o alegado incumprimento ocorreu apenas e só porque os insolventes (apesar de não terem sido questionados para o efeito) nunca referiram que o apelante marido seria administrador não remunerado da sociedade "Empresa A, SA" N) Ora, é patente que tal omissão (de resto, não intencional) não consubstancia o incumprimento reiterado do dever de colaboração que é sancionado com a qualificação da insolvência como culposa.

    O) Acresce que não corresponde à verdade que "O insolvente omitiu factos relativos à sua qualidade de anterior accionista e fundador da empresa que agora é a sua entidade patronal e da sua esposa”, pois resulta do acervo documental junto aos autos principais a compra e venda de acções disponibilizada pelos insolventes, ressalvandose ainda que já no parecer de qualificação da insolvência como FORTUITA era referido” (…): - O insolvente trabalha na Sociedade "Empresa X - Comércio, Importação e Exportação, SA", onde exerce a função de director de serviços, pela qual aufere um vencimento mensal ilíquido de € 680,00.

    - A insolvente também trabalha na Sociedade "Empresa X - Comércio, Importação e Exportação,SA", onde exerce a função de secretária, pela qual aufere um vencimento mensal ilíquido de € 530,00.

    - A Sociedade "Empresa X - Comércio, Importação e Exportação, SA" foi constituída em 05-06-2013, na qual foi designado administrador o ora insolvente, A. F..

    - O seu capital social encontra-se subscrito em numerário pelo valor de € 50.000,00 dividido em 1.000 acções de valor nominal de € 50,00 e realizado pelo valor de € 2 450,00.

    - Por contrato de compra e venda de acções, celebrado em 30-12-2013, o insolvente cedeu a totalidade das acções, pelo preço recebido de € 2.500,00, a J. J., residente na Praça do …, Moçambique - De acordo com a declaração de rendimentos, IRC, Modelo 22, a sociedade Empresa X - Comércio, Importação e Exportação, SA, no exercicio de 2013 apresentou um resultado líquido do período positivo no valor de € 659,36; no exercício de 2014 apresentou um resultado líquido do período positivo no valor de € 5.092,05 e no exercício de 2015 apresentou um resultado líquido negativo no valor de €25,502,37.

    - Não resultou da análise efectuada aos elementos disponíveis que, por qualquer forma, a situação actual tenha sido criada ou agravada em consequência da actuação, dolosa ou com culpa grave, dos Devedores, nos três anos anteriores ao início do processo de insolvência." P) Desta forma, é incompreensível e não corresponde à realidade que "O insolvente omitiu factos relativos à sua qualidade de anterior acionista e fundador da empresa que agora é a sua entidade patronal e da sua esposa e a Ex.ma Senhora Administradora da Insolvência, com acesso a todas as informações registrais dos insolventes, também nunca questionou os insolventes acerca da relação com a "Empresa A, SA", sendo que a simples omissão dos mesmos no relato resultou apenas do facto de não ter sido considerado pelos insolventes importante para o processo, na medida em que a mesma não implicava. como não implicou nem implicará qualquer prejuízo real ou hipotético para os credores Q) Mais estranho é ainda o facto do Tribunal a quo, na fundamentação acerca da matéria de facto ter referido que a Administradora da Insolvência esteve nas redondezas da casa onde residem os insolventes, mas não ter conseguido encontrar a entrada, o que significa que houve ocultação de factos (!) porque é evidente que bastaria agendar com os insolventes um ponto de encontro nas...

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