Acórdão nº 598/12.0TBVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Outubro de 2013
Magistrado Responsável | HELENA MELO |
Data da Resolução | 10 de Outubro de 2013 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães I - Relatório A… instaurou acção declarativa sob a forma de processo sumário, contra B… – Companhia de Seguros, S.A., pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a indemnização global de € 17.563,62, correspondendo € 13.563,62 aos danos patrimoniais e € 4.410,00 aos danos morais, acrescida dos juros, à taxa legal, desde a citação até integral e efectivo pagamento, bem como “a indemnização que vier a liquidar-se em execução de sentença a proferir nestes autos”.
Alega, em síntese, que no dia 26 de Setembro de 2011, cerca das 18h30, deslocou-se ao Porto no seu veículo de marca Audi, modelo A4, matrícula …-CO-…, tendo-o deixado estacionado, cerca das 20h30, na Rua General Norton de Matos, naquela cidade, e que cerca das 02h30m da madrugada recebeu um telefonema do pai a informá-lo que havia sido contactado pela GNR de Vila do Conde a comunicar que o dito veículo fora encontrado por volta das 00h30, na Rua S. Paio, Labruje, incendiado. Na manhã seguinte, deslocou-se ao posto da GNR de Vila do Conde onde apresentou queixa por furto de veículo, tendo o inquérito sido arquivado por inexistirem elementos tendentes à identificação e localização dos autores do crime.
O autor tinha transferido para a Ré a responsabilidade civil do dito veículo, do qual fazia parte a cobertura de furto ou roubo, garantindo a indemnização até ao valor seguro à data do sinistro, dos prejuízos devidos ao desaparecimento, destruição ou deterioração do veículo por motivo de furto, roubo ou furto de uso, que na referida data era de € 12.770,27. A R. recusa-se a proceder à liquidação dos danos emergentes do evento, por entender que a perda total do veículo fora resultado de “actos maliciosos”, situação não abrangida no contrato de seguro.
Como consequência directa e necessária do sinistro, resultou a perda total do veículo, bem como danos pela privação do mesmo, designadamente para se deslocar diariamente para o seu local de estágio, obrigando-o a utilizar a transportes públicos, nos quais gastou € 583,35 e boleia de amigos.
A ré contestou, invocando, em síntese, que o autor apenas contratou consigo a cobertura de furto e roubo, não contratou a cobertura de incêndio, nem a cobertura pela privação do uso do veículo, nem a cobertura de veículo de substituição, alegando ainda desconhecer se o veículo foi ou não objecto de furto, pois apenas sabe que o mesmo foi encontrado incendiado.
Foi dispensada a audiência preliminar e foi proferido despacho saneador, tendo também sido dispensada a fixação da base instrutória.
Foi realizado o julgamento e a final foi proferida sentença que julgou a acção procedente e condenou a ré a pagar ao autor a quantia de € 12.987,55, a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento, bem como no pagamento de uma indemnização pela privação do uso, no montante diário de € 15,00, até efectivo pagamento, sem no entanto poder exceder o pedido formulado (€ 17.793,62 - 12.987,55).
A R. não se conformou e interpôs o presente recurso, tendo apresentado as seguintes conclusões: «1ª O contrato de seguro celebrado entre o Autor e a Ré, titulado pela apólice nº 5043051, era, ao tempo em que foi realizado, um contrato formal, sendo a apólice não apenas um requisito ad probationem mas antes uma exigência da sua existência.
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Deste modo, o contrato vale nos precisos termos em que foi celebrado e no caso, de acordo com as coberturas facultativas que expressamente foram contratadas e que constam mencionadas na respectiva apólice.
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Das coberturas facultativas que o Autor podia contratar, apenas contratou as coberturas das Condições Especiais expressamente descritas nas Condições Particulares constantes da Apólice junta com a contestação, ressaltando-se para o caso em questão a cobertura para o risco de furto ou roubo do veículo de matrícula …-CO-….
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E não foram contratadas diversas outras coberturas facultativas possíveis e que a Ré disponibilizava, nomeadamente, as coberturas do risco de colisão incêndio, actos maliciosos, de veículo de substituição ou de privação de uso.
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A responsabilidade do segurador ao abrigo das coberturas facultativas é a que decorre do disposto nas respectivas Condições Especiais, e nos riscos abrangidos pela cobertura de danos próprios a responsabilidade do segurador corresponde ao valor seguro à data do sinistro conforme importância fixada nas Condições Particulares (Clª. 32 da Apólice (pág. 12).
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A única cobertura facultativa que o Autor contratou para o veículo de matrícula …-CO-… e que é chamada para a resolução do caso sub judice é a do risco de furto ou roubo, constante da Condição Especial 005 da Apólice (pág. 27).
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Esta cobertura não abrange, porque não foi contratada, a Condição Especial correspondente às despesas ou indemnização resultantes da privação de uso do veículo seguro nem o fornecimento de um veículo de substituição.
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As despesas que o Autor suportou e continua, eventualmente, a suportar resultantes da privação do uso do seu veículo, não estão abrangidas pelo contrato de seguro facultativo de danos próprios.
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A indemnização de tal dano emergente só seria devida se contratada tal cobertura, caso em que seriam clausulados nesse sentido não só o capital seguro mas também o período de indemnização.
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Face ao teor do contrato de seguro celebrado entre o Autor e a Ré, o ressarcimento dos danos resultantes do furto do veículo está limitado ao valor do veículo seguro, à data do sinistro.
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A ser entendido de outro modo, era forçar a entrada pela janela o que não foi sequer contratado entrar pela porta.
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A indemnização devida ao Autor, em função do contrato de seguro realizado com a Ré, é apenas a importância correspondente ao valor do veículo seguro à data do sinistro, ou seja e 12.770,27.
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Quando muito, caso seja entendido que a Ré não tinha razão justificada para recusar o pagamento daquele valor, 60 dias após a participação do furto efectuada pelo Autor à GNR, àquela importância de € 12.770,27 acresceriam os juros legais, embora a Ré entenda que recusou legitimamente assumir a responsabilidade por tal pagamento, uma vez que a única certeza a que teve acesso foi a de que o veículo seguro foi incendiado, e não estava contratada a cobertura do risco de incêndio.
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Ao decidir como decidiu, a douta sentença recorrida não teve na devida conta o contrato de seguro celebrado entre o Autor e a Ré e o direito aplicável, tendo violado, nomeadamente, o disposto nos artºs. 762º e 806º do Cód. Civil e nos artºs. 432º, nº 4 e 435º do Cód. Comercial.
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Deve, assim, ser revogada a decisão recorrida e limitar-se o montante da indemnização devida pela Ré à quantia de € 12.770,27.» A ré contra-legou, pugnando pela confirmação da sentença recorrida.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
Objecto do recurso Considerando que: o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado a este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso; . os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu acto, em princípio delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, a questão a decidir é a seguinte: se é ou não devida indemnização ao autor pela privação do uso do veículo, sabendo-se que essa indemnização não está prevista no contrato de seguro.
II– Fundamentação Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos:
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O Autor é legítimo dono e proprietário do veículo de marca Audi, modelo A4, matrícula …-CO-….
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No dia 26 de Setembro de 2011, cerca das 18h30, o Autor deslocou-se ao Porto, na referida viatura, para se encontrar e jantar com a sua namorada, que ali estuda.
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Cerca das 20h30, encontrou-se com ela na Rua General Norton de Matos e aí estacionou o veículo, matrícula …-CO-….
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O Autor residiu naquela Rua, que funciona como uma espécie de ponto de encontro dos dois para situações idênticas.
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Seguiram depois ambos no automóvel propriedade da sua namorada e foram jantar ao restaurante “Piolho”, local muito frequentado por estudantes universitários, onde se encontrariam depois com alguns amigos para conviverem.
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Cerca das 20h30m da madrugada, o Autor foi surpreendido por um telefonema do pai a informá-lo que havia sido contactado por um agente da GNR de Vila do Conde, a comunicar que o veículo …-CO-… fora encontrado por volta das 00h30, incendiado, na Rua de S. Paio, Labruje.
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No dia seguinte, o Autor deslocou-se à GNR de Vila...
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