Acórdão nº 515/09.5GCVRM.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelPAULO FERNANDES SILVA
Data da Resolução21 de Janeiro de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: --- I.

RELATÓRIO.

--- Nestes autos de processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, o Tribunal Judicial da Comarca de Vieira do Minho, por sentença de 13.07.2012, depositada no mesmo dia, decidiu, além do mais, --- «1) Condenar o arguido Manuel de Carvalho Vieira, pela prática, como autor material, de um crime de homicídio negligente, p. e p. pelo artigo 137º, nº 1, do Código Penal, na pena de 7 (sete) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano.

2) Condenar o arguido Manuel V..., pela prática, como autor material, de um crime de homicídio negligente, p. e p. pelo artigo 137º, n° 1, do Código Penal, na pena de 7 (sete) meses de prisão, suspensa na sua execução, pelo período de 1 (um) ano.

3) Em cúmulo jurídico na pena única de 12 (doze) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano.

4) Condenar o arguido Manuel V..., pela prática, como autor material, da contra-ordenação, p. e p. pelo artigo 145°, nº 1, al. e), do Código da Estrada, na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 5 (cinco) meses» Cf. volume IV, fls. 1080 a 1123. ---. --- Do recurso para a Relação.

--- Inconformado com a referida decisão, o Arguido dela interpôs recurso para este Tribunal, em 28.09.2012, concluindo as suas motivações nos seguintes termos: (transcrição) --- «1ª-) Mesmo que se entendesse que a conduta do arguido foi negligente, o que o mesmo não aceita, a morte da Fernanda F... e do Emanuel F... não resultou directa e causalmente da sua conduta; 2ª-) Tendo ficado provado que duas vítimas mortais estavam sentadas lado a lado na traseira do autocarro e que não faziam uso do cinto de segurança na altura do acidente e que no interior do autocarro existiam diversos pictogramas a informar sobre a obrigatoriedade de uso de cinto de segurança pelos passageiros que estavam colocados nos vidros laterais, na parte traseira e junto à televisão, as mesmas contribuíram de forma directa e necessária para a produção das lesões que lhes provocaram a morte; 3ª-) Mesmo que estes pictogramas não estivessem colados e bem visíveis no interior do autocarro, ainda assim as duas vítimas mortais sabiam que é obrigatório o uso do cinto de segurança, tanto mais que os cintos de segurança estão bem visíveis nos próprios assentos de tal forma que qualquer condutor menos avisado ou distraído não poderia deixar de os ver quando se senta no seu lugar e de ficar alertado para a obrigatoriedade do seu uso; 4ª-) Resultando do relatório da autópsia que as duas vítimas mortais faleceram na sequência de lesões sofridas quando as mesmas foram projectadas para fora do autocarro na altura do despiste, as mesmas não teriam ocorrido caso os dois passageiros em causa viajassem com os cintos de segurança devidamente colocados o que não se verificou por clara omissão dos mesmos e não do arguido; 5ª-) Existe um nexo causal (naturalístico) entre a provada ausência do cinto de segurança e a morte destas duas pessoas, pois que a ausência do cinto de segurança foi um facto omissivo por parte das duas vítimas mortais que foi apto a causar a sua projecção para o exterior do veículo, ficando debaixo deste; 6ª-) As duas vítimas não deixaram de actuar com negligência e imprevidência uma vez que não agiram com a prudência de um homem médio colocado na mesma situação e com o mesmo grau de conhecimentos - cfr. artigo 487º, n° 2, do Código Civil; 7ª-) A culpa das vítimas foi assim causal quanto à produção dos danos causados que conduziram à sua morte, e não resultado da conduta do arguido, porquanto se viajassem com o cinto de segurança colocados, como era seu dever e como para tal estavam avisadas, não teriam sido projectadas como foram dos seus assentos para debaixo do autocarro e não teriam morrido naquelas circunstâncias; 8ª-) Não se pode sequer imputar ao arguido qualquer responsabilidade pelo não uso do cinto de segurança por parte das malogradas vítimas, pois resultou provado no ponto 39) a existência de pictogramas avisadores para o uso obrigatório do cinto de segurança, além de que não resultou provado que a Fernanda F... e o Emanuel F... não tivessem sido avisados pelo arguido para colocarem os cintos de segurança; 9ª-) Ocorreu erro notório na apreciação da prova por parte do Tribunal "a quo" quanto aos factos dados como provados sob os pontos 13), 14) e 16); 10ª-) Deve ser dado como não provado em cada um destes concretos pontos que foi "em consequência deste despiste e capotamento" que a Fernanda F... e o Emanuel F... foram projectados para o exterior do veículo, ficando por debaixo deste (ponto 13) e que foi "em consequência directa e necessária deste despiste e capotamento" que a Fernanda F... e o Emanuel F... sofreram múltiplas lesões (pontos 14) e 16); 11ª-) Deve ser dado como não provado o ponto 28) dos factos provados no sentido de que não resultou provado que a conduta do arguido foi causa directa e necessária para o despiste e para a morte da Fernanda F... e do Emanuel F...; 12ª-) Deve ser dado como provado o facto referido na alínea n) dos factos não provados de que "as duas mortes não teriam ocorrido caso os passageiros em causa viajassem com os cintos de segurança devidamente colocados"; 13ª-) Deve ser dado como não provado o ponto 7) dos factos provados; 14ª-) Da audição do depoimento das testemunhas indicadas no corpo das motivações resulta que não nevava em Vieira do Minho quando se iniciou a viagem, que o piso, embora húmido, se apresentava normal, que não eram visíveis sinais de gelo acumulado na estrada até ao local do acidente, que a viagem, estava a ser tranquila, sem pressas e sem qualquer apreensão quanto às condições meteorológicas. De resto, no local onde ocorreu o acidente não é habitual existir acumulação de gelo, por ser uma zona aberta e exposta ao sol; 15ª-) Era por isso impossível que o arguido tivesse previsto que naquele local havia grande acumulação de gelo na via que provocasse o despiste do autocarro; 16ª-) O Tribunal “a quo” errou no julgamento que fez deste concreto facto, bem como na fundamentação do mesmo, pois no momento em que se iniciou a viagem o piso da via não se encontrava escorregadio devido à presença de gelo e neve, condições que só se verificavam no local do acidente e que surpreenderam o arguido; 17ª-) O ponto 8) dos factos provados está em nítida e insanável contradição com o que no início da audiência de leitura de sentença foi dito e consta do despacho que procedeu à alteração não substancial dos factos vertido no despacho de pronúncia; 18ª-) O ponto 8) dos factos provados deverá passar a ter apenas a seguinte redacção: A Autoridade Nacional de Protecção civil, às 15h00 do dia 15 de Dezembro de 2009, emitiu um comunicado técnico operacional, alertando para as difíceis condições atmosféricas (Nível Amarelo), designadamente no Distrito de Braga; 19ª-) O Tribunal recorrido ao dar como não provado nas alíneas a) e d) dos factos não provados que as condições atmosféricas foram amplamente divulgadas na televisão e nas rádios locais e que o arguido tivesse conhecimento de tais alertas, prova que o arguido não agiu de forma negligente e que foi absolutamente surpreendido, mas apenas no local do acidente, com as condições do piso adversas, as quais não podia prever; 20ª-) A prova produzida em sede de julgamento não permite dar como provados os pontos 10) e 26) dos factos provados; 21ª-) Tendo o Tribunal "a quo" alicerçado a sua convicção quanto a estes concretos factos no relatório de peritagem efectuada ao tacógrafo digital do veículo, da autoria de Pascal F..., e no relatório de perícia de acidente rodoviário pericial, da autoria de Jorge M... e José C..., e não tendo estes peritos sido ouvidos em sede de julgamento, os mesmos não poderiam ter sido valorados como foram na sentença; 22ª-) A sentença violou o princípio do contraditório e da imediação da prova subjacentes ao artigo 355º do C.P.P. que prescreve que não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência; 23ª-) Não tendo esta concreta prova (relatórios periciais de fls. 57 a 364 e de fls. 365 a 378), sido produzida e/ou examinada em sede de julgamento, vedado estava ao Tribunal recorrido dela ter-se servido para fundamentar a sentença; 24ª-) Deve este Venerando Tribunal modificar a sentença recorrida dando como não provados os factos 10) e 26) em causa; 25ª-) Os pontos 27), 28) e 29) dos factos provados devem ser dados como não provados por este Venerando Tribunal, pelas mesmas razões apontadas para os pontos 10) e 26); 26ª-) A morte das duas vítimas não se deu por causa do comportamento do arguido, mas sim pelo facto de as mesmas não fazerem uso do cinto de segurança, pois caso viajassem com os cintos devidamente colocados e apertados, não seriam projectadas ou cuspidas para debaixo do autocarro; 27ª-) A prova que fundamentou estes factos provados é nula por violação da proibição de valoração de prova ínsita no artigo 355º do C.P.P.; 28ª-) Quando se iniciou a viagem o piso não denotava sinais de neve, nem de gelo, com que o arguido e os passageiros foram subitamente surpreendidos na fatídica curva; 29ª-) Todas as testemunhas que viajavam no autocarro e que foram a propósito insistentemente inquiridas pela Digna Procuradora-Adjunta sobre as condições atmosféricas, sobre o estado da via, sobre a condução do arguido, sobre a velocidade imprimida, sobre especiais preocupações ou apreensões com a viagem, todas foram unânimes (com excepção da testemunha Vanessa G..., cujo depoimento foi, e muito bem, totalmente desvalorizado pela Meritíssima Juíza - cfr. página 11 da sentença, a meio do texto) em dizer que não iam apreensivas com o tempo, que iam completamente tranquilas, despreocupadas, que não iam atrasadas, que iam com calma, que o arguido conduzia de forma atenta e tranquila, que o arguido não estava a manusear o...

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