Acórdão nº 753/09.0JABRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Março de 2013
Magistrado Responsável | ANT |
Data da Resolução | 18 de Março de 2013 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães * I- Relatório José V... foi condenado pela prática de um crime de difamação agravada, p. e p. pelos arts. 180.º, 182.º e 183.º n.º 1 al. a) e 2 do Código Penal na pena 320 dias de multa, à taxa diária de € 7,00, perfazendo o montante de € 2.240,00.
Mais foi condenado a pagar € 6.500,00 à lesada Cláudia C... em sede de pedido de indemnização civil.
Inconformado recorre o arguido suscitando, em síntese, as seguintes questões: - impugnação da matéria de facto (credibilidade do depoimento de Carlos R..., depoimento indirecto e direito ao silêncio do arguido); - violação do princípio in dubio pro reo; - medida da pena e do montante da indemnização civil.
* O Ministério Público junto do tribunal recorrido e a lesada responderam ao recurso, pugnando pela manutenção do julgado.
Admitido o mesmo, o Exº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no mesmo sentido.
Colhidos os vistos cumpre decidir.
* II- Fundamentação Conforme é sabido, as conclusões do recurso delimitam o âmbito do seu conhecimento e destinam-se a habilitar o tribunal superior a conhecer as razões pessoais de discordância do recorrente em relação à decisão recorrida (arts. 402º., 403º. e 412º., nº.1, todos do Código de Processo Penal e Ac. do STJ de 19-6-1996, BMJ nº.458, pág. 98), devendo conter, por isso, um resumo claro e preciso das questões desenvolvidas no corpo da motivação que o recorrente pretende ver submetidas à apreciação do tribunal superior.
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Factos provados 1- Em data indeterminada do mês de Outubro de 2009, o arguido criou uma página de rede social na internet denominada “HI5”, à qual associou uma fotografia da assistente.
2- Em Outubro de 2009, na referida página, o arguido identificou o seu utilizador com a dita fotografia da assistente a que deu o nome de “vaca”, com o comentário “num concurso de cus eu ganhava de caras”.
3- E manteve a página identificada como “Vaca que ri”.
4- Entre 18 de Outubro de 2009 e 10 de Novembro de 2009, além de outros conteúdos, o arguido manteve escrito na página o seguinte perfil: a. Sobre mim: Sou uma grande vaca. Tenho a mania que sei tudo, que sou a maior. Mas sou rasca que chegue.
b. Interesses: Muito poucos para além de estar de boca aberta; isso já me ocupa o tempo todo.
c. Música Favorita: O hino nacional.
d. Filmes favoritos: A 5.ª pata do cavalo.
e. Shows de TV favoritos: O big brother.
f. Livros favoritos: Nunca consegui ler nenhum. Já agora o que é um livro? g. Frase favorita: Abre a boca nem que seja para dizer asneiras.
5- O arguido manteve a página aberta, pelo menos entre 18 de Outubro de 2009 e 10 de Novembro de 2009.
6- Tendo, durante esse lapso temporal, enviado diversos pedidos de amizade para pessoas de Fafe, por forma a que estes utilizadores pudessem associar a página aos respectivos contactos e, desse modo, acompanharem a evolução da informação introduzida.
7- E, em 10 de Novembro de 2009 o arguido já tinha “41 amigos” associados, que acederam ao conteúdo da página.
8- Só não tendo mais “amigos” associados, porque muitas pessoas, ao aperceberem-se do conteúdo da página, não aceitavam o pedido de amizade enviado pelo arguido.
9- Como o arguido não impôs qualquer restrição à visualização do conteúdo da página, qualquer contacto dos “41 amigos” associados da página, bem como, qualquer curioso, pesquisador ou utilizador das redes sociais podia aceder à dita página da “HI5”.
10- Pelo que, o conteúdo da referida página de “HI5” foi vista por um número de pessoas que não é possível calcular.
11- Muitas delas amigas e/ou conhecidas da assistente.
12- E nem o facto de várias pessoas se terem insurgido contra o conteúdo da página e atitude do seu criador, através de comentários que deixaram ali escritos, fez o arguido retirar a página daquela rede social.
13- O arguido, com as expressões que escreveu e manteve na página quis, com todas elas, difamar a assistente identificando-a nos termos expostos na página e supra referenciados.
14- Além disso, o arguido sabia que a assistente era pessoa conhecida e referenciada em muitos locais.
15- Pois o arguido sabia que a assistente, além de ser advogada, também, na altura da prática dos factos era candidata à vereação da Câmara Municipal de Fafe, tendo sido eleita vereadora daquele município em Outubro de 2009.
16- Pretendendo, assim, com a sua actuação e o meio usado divulgar aqueles conteúdos ao maior número de pessoas que conhecessem ou tivessem referências da assistente.
17- Além disso, o arguido agiu com deliberada malvadez dirigindo convites a pessoas de Fafe imputando à assistente factos e condutas ofensivas da sua honra e consideração.
18- Com o intuito de ofender a assistente, como ofendeu, e bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
19- A assistente ficou muito ofendida com a conduta do arguido e com os juízos, factos e condutas que este lhe imputou.
20- Das quais só veio a tomar conhecimento porque os seus amigos lhe chamaram à atenção para a página e para o seu conteúdo.
21- E, de imediato, a assistente enviou um e-mail ao “HI5”, denunciando o conteúdo abusivo da página, que mandou cancelar, tendo apresentado queixa à Polícia Judiciária.
22- As redes sociais, como o HI5, são consideradas um dos meios mais utilizados de comunicação social.
23- O arguido é companheiro da irmã do companheiro da assistente.
24- O arguido efectuou a mencionada página para se vingar da assistente em virtude de uma desavença ocorrida em Setembro de 2009.
25- A assistente devido à conduta do arguido sofreu vergonha, humilhação, perda de auto-confiança e auto-estima.
26- A conduta do arguido determinou que a assistente suspeitasse de várias pessoas conhecidas suas, de correligionários e adversários políticos, de colegas de profissão e de qualquer pessoa que tivesse qualquer atitude ou expressão menos compreensível.
27- O que causou à demandante o receio de andar em público.
28- A assistente tem receio que pessoas que tiveram acesso à página formulem sobre ela juízos depreciativos.
29- A assistente refugiou-se em casa e no escritório sofrendo, assim, dano no desempenho da sua profissão.
30- Deixou de comparecer a várias reuniões políticas ou a actividades políticas públicas e até reuniões de grupos muito alargadas que não fossem da sua restrita confiança pessoal, com prejuízo do seu desempenho político e da sua promoção como figura política.
31- Começou a evitar a comparecer em cafés, tertúlias e em todos os locais onde estivesse mais pessoas do que os seus amigos muito chegados.
32- O arguido é professor de educação física, auferindo o rendimento mensal de €1.300,00 (mil e trezentos euros).
33- É proprietário de um apartamento T3, liquidando a prestação mensal a título de mútuo bancário, no valor de € 600,00 (seiscentos euros).
34- O arguido não tem antecedentes criminais.
* B) Motivação de Facto O tribunal fundou a sua convicção na análise crítica e conjunta de toda a prova produzida em audiência de julgamento, alicerçada nas regras da experiência comum (cf. art.º 127.º do Código de Processo Penal).
Pertinentemente refere JUAN-LUIS GÓMEZ COLOMER, El juicio oral, in Juan Montero et all, Derecho Jurisdicional III Processo Penal, 9ª ed., Valência 2000, p. 331, que é necessário que o julgador na descrição fáctica explicite de maneira clara, terminante e não contraditória os factos que ficaram provados sempre que os mesmos interessem à boa decisão da causa; havendo dúvidas, deverá explicar-se porque é que o juiz não está seguro dos factos e o motivo da dúvida; a prova deverá ser concretamente valorada, tornando-se necessário que o arguido e as restantes “partes” saibam donde extraiu o julgador os seus elementos de convicção.
No que concerne aos antecedentes criminais do arguido atendeu-se ao CRC junto aos autos.
Relativamente às condições sócio económicas do arguido valoramos as declarações espontaneamente prestadas pelo próprio, sendo que o modo seguro como foram efectuadas fez com que o Tribunal não duvidasse sobre o seu teor.
O arguido, no âmbito de um direito que lhe assiste, não prestou declarações.
A assistente, bem como a testemunha Carlos R..., mencionou que antes de ter visualizado a página na internet (no HI5) tinha existido quezílias com o arguido.
Atendendo à apresentação da queixa (10/11/2009) – cf. fls. 3 – o facto da impressão da página de fls. 79 e ss., datar de 19/11/2009 (parte final de cada página) e a fls. 81 referir a data “18/Out 15:16”, o Tribunal deu como provado as datas referenciadas em 5.º Os factos 6.º, 8.º, 9.º e 12.º resultaram dos depoimentos das testemunhas que visualizaram a página na internet, mormente a de Paula C..., a qual no âmbito de um depoimento calmo, coerente e muito objectivo, salientou que se tratava de uma página que se encontrava acessível a qualquer utilizador. Referiram que a página da internet que visualizaram está de acordo com o doc. de fls. 79 e ss. faltando, nomeadamente, o comentário de utilizadores que se insurgiam para com o teor da página.
O ponto 7.º resultou da análise do doc. de fls. 79 e ss.
Os factos 14.º e 15.º resultam desde logo do mencionado pela assistente não tendo o tribunal ignorado a ligação existente entre arguido/assistente.
Dos autos e do depoimento prestado pelos Inspectores da Polícia Judiciária verificamos que foi apurado (cf. fls. 17) que a página de Internet em apreço foi acedida, no dia 9/11/2009, por alguém com privilégio de administrador, por intermédio de um endereço titulado pela empresa Claranet Portugal.
Tendo sido averiguado (cf. fls. 26) que o IP foi atribuído à OK Pneus – Comércio de Pneus, S.A. –.
Em sede de julgamento o Inspector da Polícia Judiciária que acompanhou a investigação (Armando B...) esclareceu que foi efectuado um acesso à página na internet, na oficina – OK Pneus –, por um utilizador que conseguiria modificar a página por ter acesso de administrador.
Em termos contabilísticos, junto da OK Pneus, foram apuradas facturas de serviços prestados no dia 9/11/2009 - sendo...
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