Acórdão nº 1152/10.7TBVVD.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelFILIPE CARO
Data da Resolução21 de Maio de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I.

C.., e mulher S.., residentes no lugar do.., Vila Verde, intentaram ação declarativa de condenação, com forma de processo ordinário, contra J.., solteira, maior, residente no lugar do.., da mesma freguesia e concelho, alegando essencialmente que são donos de um prédio urbano, cuja aquisição, por compra e venda, está registada a seu favor, para além de que o adquiriam por usucapião, conforme factos relativos à posse que descrevem.

Sendo a R. proprietária de um outro prédio urbano, ambos os imóveis referidos pertenceram, até agosto de 1997, aos mesmos donos, A.. e marido, D.., que neles circulavam por um caminho que partia de sul até ao atual prédio dos A.A. e deste até à estrema norte (EN nº 205). A partir de agosto de 1997, data em que passaram a ter donos diferentes, conforme ficou acordado e definido com os vendedores, cada um dos seus novos possuidores acedia aos respetivos prédios pela mesma entrada. Daí que, os A.A., desde aquela data, em que a R. também adquiriu o prédio onde reside, utilizam o acesso pedonal e de automóvel para aceder ao seu prédio pela Rua .., entrando pelo lado norte do caminho referido no artigo 15°, precisamente o mesmo que os moradores dessa casa já utilizavam há mais de 20 e 30 anos. E também a R. passou a ter por aí acesso ao seu prédio. Tal vem acontecendo há mais de 12 anos, ininterruptamente e sem oposição de quem quer que seja, nomeadamente da R.

Já os vendedores dos dois prédios ou os seus arrendatários, para acederem ao imóvel agora dos A.A., vindos da Rua.., a pé, de automóvel ou com animais, ingressavam no citado caminho e seguiam no sentido norte para sul, atravessando integralmente o logradouro do prédio que agora pertence à R. até chegarem ao logradouro do prédio que aos A.A. agora pertence, o que foi continuado por todos, incluindo agora os demandantes, onerando o imóvel da demandada, há mais de 40 anos, sem qualquer interrupção, sempre no seu interesse e proveito com ânimo de quem exercem direitos próprios, à vista e com o conhecimento de toda a gente nisso interessada, nestes se incluindo a R. e seus antecessores, na ignorância de prejudicarem direitos de outrem e sem qualquer estorvo ou embaraço.

O prédio dos A.A. não tem qualquer outro acesso à via pública que permita a passagem de automóvel.

No início de 2007, a R. começou a opor-se a que os A.A. por ali transitassem de automóvel, através de sucessivos atos obstrutivos, vendo-se agora obrigados a aceder ao seu prédio exclusivamente a pé, o que lhes causa grande prejuízo.

Culminaram o seu articulado com o seguinte pedido: «Termos em que deve a presente acção ser julgada procedente, por provada, e em consequência, ser a Ré condenada a: a) reconhecer o direito de propriedade dos Autores sobre o prédio identificado no art. 1º supra da p.i., abstendo-se de praticar quaisquer actos que atentem ou perturbem tal direito; b) declarar-se constituída, por destinação de pai de família e por usucapião, uma servidão de passagem a pé e de automóvel, mercê do reconhecimento da posse que os Autores têm sobre o caminho, pedonal e de automóvel, referido e descrito nos antecedentes artigos 15° a 20º, como assento da servidão de passagem também aí alegada, na parte em que tal caminho atravessa o prédio possuído pela Ré, identificado no artigo 10° e a respeitarem essa posse, abstendo-se de a turbar ou estorvar seja por que modo for; d) repor a situação no estado anterior, através da correcta reparação do caminho em causa nos autos, tapando devidamente a vala que aí executou; e) pagar aos AA. uma indemnização, a liquidar em execução de sentença; e h) pagar as custas e procuradoria do presente processo, bem como tudo o mais que for legal.» (sic) Citada, a R. contestou a ação, invocando, além do mais, a exceção da litispendência, com base na pendência de uma ação por ela instaurada contra os aqui A.A. no mesmo tribunal, sob o nº 379/07 3TBVVD, onde foi pedida a condenação daqueles: “a reconhecerem a autora como dona e legítima proprietária do prédio identificado no artigo 1° da p.i.; A reconhecer a posse que a autora tem sobre o caminho pedonal referido nos artigos 14º e 15°, da p.i. como assento da servidão de passagem também aí alegada, na parte em que tal caminho atravessa o prédio possuído pelos réus identificado no artigo 10° da p. i. e a respeitarem essa posse, abstendo-se de a turbar ou estorvar seja por que modo for; a reconstruírem os canteiros do jardim da autora e ajardiná-los nos moldes em que os mesmos se encontravam antes de ser destruídos; a permitir que a autora execute todas e quaisquer obras no seu prédio identificado no artigo 1° da p.i., de modo a impedir o acesso de pessoas e animais ou veículos automóveis estranhos à autora, seja vindos do lado da Estrada Nacional, seja vindo do lado do prédio dos réus; a absterem-se de penetrar no prédio da autora identificado no artigo 1° desta p.i., com animais, veículos motorizados, automóveis ou quaisquer outros veículos com ou sem motor, a respeitarem a posse e propriedade da autora sobre o referido prédio, abstendo-se de a turbar ou estorvar seja por que modo for.” Nessa ação foi proferida sentença pela qual os ali réus (aqui A.A.) foram condenados: “- a reconhecer o direito de propriedade da autora sobre o prédio identificado no artigo 1° da p.i.; - a reconhecer a posse sobre o caminho pedonal referido nos artigos 14° e 15°, da p.i., pontos 9) e 10) da matéria assente na sentença, como assento da servidão de passagem, na parte em que tal caminho atravessa o prédio dos réus e a respeitarem essa posse, abstendo-se de a turbar ou estorvar seja por que modo for; - a reconstruir os canteiros do jardim da autora nos moldes em que os mesmos se encontravam antes de ser destruídos; - a abster-se de passar no caminho provindo da E N 205 se inicia na Rua.. e passa junto do prédio da autora com veículos motorizados ou aí estacionar veículos.” Da sentença foi interposto recurso pelos aqui A.A.

Numa e noutra ações estão em causa os mesmos prédios e a mesma questão jurídica, de saber quem beneficia de servidão de passagem e qual a sua dimensão.

Naquela decisão reconheceu-se o direito de passar a pé sobre a passagem situada no prédio da aqui R., mas foram os aqui A.A. condenados a “abster-se de passar no caminho provindo da EN. 205 se inicia na Rua.. e passa junto do prédio da autora com veículos motorizados ou ai estacionar veículos”. Este foi o pomo dos fundamentos do recurso interposto naquela ação. Se a Relação ali der razão aos réus (aqui A.A.), a aqui R. e autora naquela ação, terá o seu prédio onerado com uma servidão de passagem a pé e de automóvel; o que tudo significa que, nesta medida, o efeito jurídico pretendido é o mesmo nas duas ações.

Pede, por isso, além do mais, a sua absolvição da instância, nos termos dos art.ºs 499°, alínea i), 494.°, al. i) e 493.°, nº 2, do Código de Processo Civil.

Em resposta à exceção, os A.A. negam a litispendência, por falta de pressupostos, ainda que concedendo no facto da existência de identidade de sujeitos, dado as partes serem as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.

Na sua perspetiva não há, numa e noutra ações, identidade de pedido e de causa de pedir. Enquanto, nesta ação, os A.A. pretendem que se declare constituída, por destinação de pai de família e por usucapião, uma servidão de passagem a pé e de automóvel, na parte em que tal caminho atravessa o prédio possuído pela R., já naqueloutros autos a autora (aqui R.) pretende que lhe seja reconhecida servidão de passagem pedonal, na parte em que tal caminho atravessa o prédio dos A.A. (ali réus).

A exceção da litispendência foi julgada improcedente, por despacho fundamentado de fl.s 119 e seg.s, de onde se destaca a seguinte argumentação final: “Na acção n.º 379/07.7TBVVD a causa de pedir são os factos constitutivos do direito de propriedade da ali autora sobre o prédio ali identificado e os actos reiterados de passagem sobre o prédio dos réus.

Na presente acção a causa de pedir são os factos constitutivos do direito de propriedade sobre o prédio dos aqui autores e o facto de os autores acederem ao seu imóvel através do prédio da ré, acesso determinado já pelos seus antecessores na posse do prédio, fazendo-o igualmente de forma reiterada.

Com efeito, os factos constitutivos do direito de servidão que aqui se pretende ver reconhecido não foram alegados na acção n.º 379/07.3TBWD, concluindo-se assim que não se encontram preenchidos todos os pressupostos de que depende a verificação da litispendência: a proposição de uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir artigos 497.º e 498.º do Código de Processo Civil.”. (sic) Após vicissitudes várias e junta que foi certidão da sentença proferida no proc. nº 379/07.3TBVVD, com nota de que houve interposição de recurso para esta Relação, foi proferido despacho que ordenou a suspensão da instância, nos seguintes termos: «Pelo exposto, e ao abrigo do disposto no artigo 279°, n° 1, do Código de Processo Civil determina-se a suspensão da presente instância, até que se mostre transitada em julgado a decisão proferida no âmbito da acção declarativa de condenação n° 379/07.3TBVVD (2° Juízo do Tribunal Judicial de Vila Verde), onde figura como autora J.. (aqui ré) e como réus C.. e mulher S.. (aqui autores).» (sic) Foi depois junta nova certidão, com nota de trânsito em julgado da sentença recorrida, confirmada pela Relação em acórdão, por sua vez, confirmado pelo Supremo Tribunal de Justiça (fl.s 311 e seg.s).

Nessa sequência foi proferida decisão que, conhecendo da autoridade do caso julgado, julgou verificada esta exceção e absolveu os R.R. da instância, ao abrigo dos art.ºs 493°, 494° e 495° do Código de Processo Civil.

Inconformados, os A.A. interpuseram apelação, cujas alegações fizeram culminar com as seguintes CONCLUSÕES: «1. Vem o presente recurso interposto da, aliás, douta decisão que, julgando verificada a excepção dilatória inominada...

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