Acórdão nº 290/08.0TBMNC-E.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Dezembro de 2013

Magistrado ResponsávelFILIPE CARO
Data da Resolução10 de Dezembro de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I.

Em incidente de Incumprimento de Regulação das Responsabilidades Parentais, que V.., divorciado, residente no lugar.., Monção, deduziu, por apenso ao processo principal, contra E.., divorciada, residente na Rua.., Viana do Castelo, veio o mesmo requerer que se declare a requerida, mãe do menor V.., em situação de incumprimento, se ordene a sua notificação para que proceda ao pagamento das prestações alimentícias devidas ao menor, em falta (janeiro, fevereiro e março de 2013), no total de € 450,00, e que seja condenada a pagar multa e indemnização a favor do filho, em montantes a definir pelo tribunal.

Mais requereu que, “após a realização de todas as diligências tidas por indispensáveis e inquérito (COM APROVEITAMEMTO DE TODOS AS DILIGENCIAS E INQUÉRITOS CONSTANTES DO PROCESSO DE PROMOÇÃO E PROTECÇÃO DE MENORES N° 430/09.2TBMNC) se digne proferir decisão definitiva sobre a quantia a pagar mensalmente pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, em valor nunca inferior a 150,00€ mensais, em substituição da mãe do menor, enquanto se mantiver o incumprimento daquela, como preceitua o artigo 3°, n° 3 da Lei n°75/98 e os artigos 3° e 4° do Decreto-lei nº n°164/99 de 13 de maio, comunicando-se tal decisão ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, em conformidade com o disposto no cit. Artigo 4, n°3 do Decreto-lei nº nu 164/99”. (sic) Notificada pra o efeito previsto no art.º 181º, nº 2, da Organização Tutelar de Menores, a requerida alegou que não consegue pagar a quantia mensal de alimentos fixada (€ 150,00), por ter como único rendimento a quantia de € 264,00, proveniente do fundo de desemprego que afeta à sua sobrevivência. Entende que deve ser condenado o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores a pagar os alimentos que são por ela devidos.

Realizados inquéritos sociais às condições de vida dos progenitores da criança, o Ministério Público emitiu parecer pelo qual concluiu assim: “Tendo em consideração o teor dos relatórios sociais juntos aos autos, nos quais se dá conta que ambos os progenitores se encontram desempregados e não beneficiam de rendimentos de valor superior ao salário mínimo nacional, mais se promove que se determine a intervenção do Fundo de Garantia de Alimentos devidos a Menores, ao abrigo do disposto no artigo 3°, n.º 1 do Decreto-lei nº n.º 164/99, de 13 de Maio, entendendo-se que deverá ser fixada a quantia de € 200,00, atentos os critérios previstos pelo n.º 3 do mesmo preceito legal”.

Notificada que foi a promoção ao requerente e à requerida, apenas aquele se pronunciou, alegando que concorda com a posição ali defendida, requerendo que seja proferida decisão que verifique o incumprimento por parte da progenitora e, na impossibilidade desta pagar, se condene o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, a pagar ao menor o valor de € 200,00 mensais, em substituição daquela.

Foi então proferida sentença fundamentada que culminou com o seguinte dispositivo: “Deste modo, decide-se: - Julgar o incidente de incumprimento procedente, por provado.

- Fixar em 200 € (duzentos euros) o montante da prestação a cargo do Fundo de Garantia de Alimentos devidos a menores, nos termos do disposto nos arts. 2° e 3° n° 1 da Lei n° 75/98, de 19 de Novembro.

Custas pela requerida.

Registe e notifique.

*** Notifique o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social para que este providencie junto do Centro Regional de Segurança Social da residência do menor e do pai, com vista a iniciar o respectivo pagamento (forneça todos os elementos necessários (nomeadamente o NIB indicado pelo requerente a fls. 2 verso e 15).” (sic) Inconformado, recorreu o I.., IP, na qualidade de gestor do FGADM, produzindo alegações com as seguintes CONCLUSÕES: «I. Na douta decisão recorrida foi dado como provado que “2) No âmbito da acção nº 290/08.0 TBMNC-C a mãe ficou obrigada a pagar a quantia mensal de 150 a título de alimentos para o seu filho (acordo que foi homologado por sentença de 30 de Novembro de 2012).

… 4) A sentença transitou em julgado em 18/01/2013.”.

  1. Como decorre da douta decisão em recurso, na sentença homologatória não foi fixada ao progenitor obrigado a alimentos a obrigação de actualização da pensão de alimentos, nem sequer é estabelecido que tal pensão seria alvo de actualização.

  2. Como se disse supra, foi decidido na decisão em crise “Fixar em 200 (duzentos euros) o montante da prestação a cargo do Fundo de Garantia de Alimentos devidos a menores…, “.

  3. Verifica-se, assim, que pelo Tribunal a quo foi agora atribuída uma prestação alimentar a ser suportada pelo FGADM (H 200,00) de valor bem diferente do fixado judicialmente ao progenitor em incumprimento (H 150,00).

  4. Pela Lei nº 75/98, de 19 de Novembro, alterada pelo art. 183º da Lei 66-B/2012, de 31 de Dezembro, foi constituído o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores (FGADM), o qual se encontra regulado pelo DL nº 164/99, de 13 de Maio, com a redacção dada pela Lei 64/2012, de 20 de Dezembro de 2012.

  5. Resulta daqueles normativos que a obrigação do FGADM é a de assegurar/garantir os alimentos devidos a menores, quando - entre outros requisitos - a pessoa judicialmente obrigada a prestar alimentos não satisfizer as quantias em dívida pelas formas previstas no art. 189º do DL 314/78, de 27 de Outubro.

  6. Verifica-se, assim, que a obrigação legal de prestar alimentos pelo FGADM é diferente da obrigação judicial de os prestar, sendo que só existe obrigação judicial desde que o tribunal constitua alguém como devedor de alimentos, isto é, que condene alguém em determinada e quantificada prestação alimentar.

  7. Dos normativos que regulam a intervenção do Fundo, resulta que o Estado somente se substitui ao obrigado enquanto este não iniciar ou reiniciar o cumprimento da sua obrigação e pelo valor fixado judicialmente para esta.

  8. Tal significa que o FGADM não garante o pagamento da prestação de alimentos não satisfeita pela pessoa judicialmente obrigada a prestá-los, antes assegurando, face à verificação cumulativa de vários requisitos, o pagamento de uma prestação “a forfait” de um montante por regra equivalente – ou menor – ao que fora judicialmente fixado. – cfr. Remédio Marques, in “Algumas Notas Sobre Alimentos (Devidos A Menores”).

  9. Quer isto dizer que o FGADM – tal como decorre quer da letra quer do espírito da lei - apenas assegura/garante o pagamento dos alimentos judicialmente fixados, pelo que, XI. O FGADM não poderá ser condenado no pagamento de uma prestação substitutiva de valor superior à fixada ao devedor originário.

  10. Nos casos em que o FGADM paga ao menor/credor a prestação substitutiva de alimentos verifica-se uma situação de sub-rogação legal, concretamente prevista no nº 1 do art. 5º do DL 164/99, de 13 de Maio, com a redacção dada pela Lei 64/2012, de 20 de Dezembro de 2012, e não uma situação de exercício de direito de regresso contra o devedor da prestação alimentícia.

  11. É certo que, não obstante constituírem realidades jurídicas distintas, o exercício quer do direito de sub-rogação, quer do direito de regresso pressupõe sempre, por parte do respectivo titular, o cumprimento da obrigação.

  12. No entanto, a sub-rogação, como forma de transmissão das obrigações, atribui ao sub-rogado solvens o mesmo direito do credor, enquanto que o direito de regresso é um direito nascido ex novo na esfera jurídica daquele que extinguiu, ou à custa de quem foi extinta a obrigação, e esta distinção é importante para o caso dos autos.

  13. A prestação paga pelo FGADM é autónoma relativamente à do obrigado a alimentos, e, para a sua fixação, é necessária a verificação do incumprimento e da impossibilidade da sua satisfação por este último, pelo que, XVI. É que forçoso concluir que o FGADM, enquanto entidade sub-rogada, quando procede ao pagamento da prestação de alimentos, o faz no cumprimento de uma obrigação própria e não alheia, e, assim sendo, o Fundo deve substituir-se ao devedor originário apenas desde a notificação da decisão que determina a sub-rogação.

  14. A este respeito, é jurisprudência dominante que o montante da prestação de alimentos a cargo do FGADM está limitado pela fixada ao progenitor do menor, como bem decidiram recentemente o Tribunal da Relação de Coimbra – Proc. 3819/04 – 2ª Secção Cível - Acórdão de 19/02/2013 - e o Tribunal da Relação do Porto - Proc. 30/09 – 5ª Secção - Acórdão de 25/02/2013.

  15. Depois de pagar, o FGADM fica sub-rogado em todos os direitos do menor credor dos alimentos, sendo-lhe, pois, lícito exigir do devedor de alimentos uma prestação igual ou equivalente àquela com que tiver sido satisfeito o interesse do menor (credor), incluindo o direito de requerer execução judicial para reembolso das importâncias pagas.

  16. Tal significa que o FGADM é apenas um substituto do devedor dos alimentos, pelo que a sua prestação não pode exceder a fixada para o mesmo.

  17. Acresce que a sub-rogação não pode exceder a medida da sub-rogação total, porquanto, se o terceiro paga mais do que ao devedor competia pagar, ele não tem o direito de exigir do devedor o reembolso pelo excesso e só poderá exigir do credor a restituição do que este recebeu indevidamente.

  18. Dito de outra forma, não pode o terceiro, satisfazendo o credor, aumentar o montante do crédito contra o devedor – vide Vaz Serra in BMJ 37/56 – o que implica que, se o terceiro pagou mais do que era devido pelo devedor, no excesso não opera a sub-rogação e, portanto, o direito ao reembolso, como se retira do disposto no nº 1 do art. 593º do CC.

  19. Se a prestação social pudesse ser fixada em valor superior não se justificaria racionalmente que a lei a fizesse depender do incumprimento pelo obrigado, antes deveria depender apenas e tão só as necessidades actuais do menor.

  20. Aceitar que a prestação fosse superior seria instituir-se, sem apoio normativo, uma prestação social em parte não reembolsável e ainda por cima sem que o credor a tenha de restituir como “indevida” no sentido do...

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