Acórdão nº 594/05.4TBCBT.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução17 de Setembro de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes na 2ª Secção CÍVEL do Tribunal da Relação de Guimarães * 1.Relatório. A.. instaurou acção declarativa com processo comum ordinário contra B.., peticionando que seja declarado que os bens descriminados na petição inicial são comuns do extinto casal que formou com o réu, condenando-se este a tal reconhecimento.

Para tanto, alegou a autora e em síntese que: - Contraiu casamento com o réu, o qual viria a ser declarado dissolvido por divórcio em 1997, sendo que, durante o casamento, adquiriu o réu um bem imóvel com dinheiro do casal ; - Acresce que, por ambos, foram ainda efectuadas benfeitorias em dois outros imóveis que eram bens próprios do réu, as quais igualmente são bens comuns, e , ainda , ambos tinham, também, bens móveis por si adquiridos e instalados numa das referidas casas que era bem próprio do réu , existindo finalmente uma sepultura dupla, no cemitério de Caçarilhe, que foi também adquirida pelos dois, razão por que é igualmente bem comum.

- Sendo verdade que em sede de processo de inventário que correu para partilha dos bens do casal, apresentou a autora reclamação à relação de bens, certo é que foi ela julgada extemporânea, e , tendo depois da sentença homologatória da partilha requerido a partilha adicional, também esta viria a ser indeferida - por se entender que os bens dela constantes eram os mesmos da reclamação que não havia sido admitida, haveria ofensa de caso julgado, encontrando-se esgotado o poder jurisdicional do tribunal nessa matéria .

1.1.- Citado, o réu contestou negando que os bens reclamados sejam comuns do extinto casal, impugnando ainda tudo o demais alegado pela autora e concluindo a final pela improcedência da acção com a consequente absolvição do pedido , e , seguindo-se a réplica, neste último articulado pretendeu a autora alterar a causa de pedir e o pedido, alterações estas que não viriam porém a ser admitidas.

1.2.- Prosseguindo os autos, foi proferido o despacho saneador, organizada a matéria de facto assente e seleccionada a base instrutória, peças estas que não foram alvo de qualquer reclamação, e , realizada a audiência de discussão e julgamento, com observância de todos os formalismos legalmente prescritos, proferiu finalmente o tribunal a quo sentença cujo excerto decisório foi do seguinte teor : “ II. DECISÃO Nos termos de tudo quanto acaba de se expender, existindo a indicada tríplice identidade de sujeitos, pedido e causa de pedir, decide-se julgar oficiosamente procedente a excepção de caso julgado e, nessa concernência, absolver o réu da instância.

Custas pela autora (art. 446º, nº1 e 2, do Código de Processo Civil) Registe e notifique. “ 1.3.- Não se conformando com a decisão/sentença indicada em 1.2, da mesma apelou então a autora, vindo o tribunal ad quem, após corrigir a espécie do recurso interposto para o agravo, a proferir em 21/12/2012 decisão sumária, no âmbito da qual foi a sentença referida em 1.2. anulada, sendo determinado o cumprimento do contraditório.

1.4.- Cumprido o determinado por este Tribunal da Relação na decisão indicada em 1.3., voltou a primeira instância a proferir “nova” sentença, a 15/3/2013, sendo o respectivo excerto decisório coincidente com o da sentença referida em 1.2., a saber : “ (…) II. DECISÃO Nos termos de tudo quanto acaba de se expender, existindo a indicada tríplice identidade de sujeitos, pedido e causa de pedir, decide-se julgar oficiosamente procedente a excepção de caso julgado e, nessa concernência, absolver o réu da instância.

Custas pela autora (art. 446º, nº1 e 2, do Código de Processo Civil) Registe e notifique.” 1.5.- Não se conformando, mais uma vez, com a sentença indicada em 1.4., da mesma apelou ( errando novamente na espécie de recurso, sendo a espécie adequada a do agravo ) então a autora, aduzindo as seguintes conclusões: 1- Salvo o devido respeito, que é muito, não andou bem o tribunal “a quo” ao decidir-se pelo caso julgado entre a presente acção e o incidente de reclamação à relação de bens apresentado no âmbito do processo de inventário/partilha de bens em casos especiais, que correu termos sob o n.º 345/1999, pelo Tribunal Judicial de Celorico de Basto, uma vez que não estamos perante “causas”, mas sim, em face de uma causa e um incidente suscitado numa outra causa, de Inventário/Partilha de Bens.

2- Todavia, e ainda que assim não se entenda, se é certo que a presente acção declarativa, de simples apreciação e de condenação, possui, em relação aos autos de inventário identificados, identidade de sujeitos, já não se repete quanto ao pedido e à causa de pedir, desde logo porque, nos autos de Inventário visa-se por termo, através da partilha, à comunhão patrimonial dos bens adquiridos na pendência do matrimónio e na sequência do divórcio.

3 - Ora, o inventário é um processo de partilha e, como tal, não inclui uma causa de pedir, propriamente dita, pois, quando muito, o que se pode equiparar àquela é a causa da partilha, no caso, a dissolução do casamento, não se reportando a quaisquer bens em concreto.

4- Também, não existe identidade do pedido, pois no inventário pretendia-se a partilha de determinados bens, ao passo que na presente acção visa-se a declaração da natureza comum de determinados bens e a obtenção da condenação do R. a reconhecer tal natureza comum.

5- E não existe identidade entre ambas, pois a presente acção vem na sequência da decisão proferida em sede de reclamação de bens dos autos de inventário, que não conheceu da natureza comum ou própria dos bens aí reclamados.

6- Todavia, e ainda sem prescindir, ainda que se considere que são idênticos a causa de pedir, o pedido e as partes, o que não se concebe nem concede, isso não basta, sendo necessário ainda apurar-se se estamos perante uma situação de caso julgado material, ou apenas formal, ou seja, se o despacho proferido no processo de inventário conheceu do mérito da questão ou não; 7- Isto porque, se o caso julgado material, previsto nos artºs494º, al. i), e 671º, cobre a decisão proferida sobre o fundo ou mérito da causa e tem força obrigatória, não só dentro do processo, mas principalmente fora dele, já o caso julgado formal, especialmente previsto no artº 672º, abrange as decisões sobre as questões de carácter processual e apenas tem força obrigatória dentro do processo.

8- Na verdade, não nos podemos olvidar que o caso julgado destina-se a evitar uma contradição prática de decisões, obstando a decisões concretamente incompatíveis, pelo que, o princípio orientador que permite remover as dúvidas, se determinada acção é idêntica a outra, e se, por isso, existe caso julgado, é o da existência ou inexistência da possibilidade de duas ou mais decisões judiciais se poderem contradizer na prática.

9- In casu, a decisão proferida nos autos de inventário/partilha de bens não conheceu do mérito ou demérito da pretensão deduzida pela reclamante, limitando-se a não atender a tal reclamação em virtude da extemporaneidade da junção de prova, e não por inexistência do direito invocado ou que tal direito pertencesse a outrem que não à reclamante; 10- Pelo que, tal despacho deve ser interpretado, apenas, no sentido de que a reclamante ali não produziu qualquer prova, em virtude da extemporaneidade na sua apresentação, daí a reclamação não ter sido atendida, e não no sentido de que o direito não existe ou que, existindo, não lhe pertence, sendo certo que, atenta à prova produzida e dada por provada no âmbito da presente acção, tudo indica que tais bens sejam, efectivamente, bens comuns do extinto casal.

11- Pelo que, a decisão proferida no âmbito dos autos de inventário apenas constitui caso julgado formal e, como tal, tem força obrigatória dentro do processo de inventário a que o incidente de reclamação de bens respeita, mas já não fora dele; 12- O que acaba de ser dito é, precisamente, o que resulta do confronto dos arts. 671º, nº 1 e 672º e, bem assim, do despacho proferido no âmbito da requerida partilha adicional de bens quando decide que tais bens não podem ser reclamados “(…) neste processo ”.

13- No mesmo sentido, ver acórdão deste Tribunal, proferido nos presentes autos ( penúltimo parágrafo, fls. 582): “Acresce dizer que esta decisão, além de não nos parecer a correcta, pois no processo de inventário nunca foi proferida decisão de mérito acerca da questão em apreciação nestes autos por forma a formar caso julgado – foi...

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