Acórdão nº 3194/15.7T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Abril de 2016
Magistrado Responsável | ESTELITA DE MENDON |
Data da Resolução | 21 de Abril de 2016 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 1ª Secção Civil do Tribunal da Relação de Guimarães: *** I – B., C.R.L., com sede na Rua…, propôs a presente acção declarativa sob a forma de processo ordinário contra C., residente em…, D. e mulher E. e F., todos residentes em …, pedindo a condenação solidária destes a pagarem-lhe as seguintes quantias: 1 – 36.819,95 € de capital; 2 – 83.223,47 € de juros; 3 - 4.987,97 € de despesas judiciais e extrajudiciais.
Alegou, para tal, ter celebrado um contrato de mútuo com hipoteca sobre um imóvel, o qual posteriormente veio a ser objecto de penhora a favor do 1º Réu no âmbito de uma execução para a qual nunca foi citada com vista à reclamação do seu crédito.
Este imóvel veio, posteriormente, a ser adjudicado aos aqui 2ºs Réus, estes sim credores reclamantes no âmbito da referida execução, não obstante a aqui Autora ser detentora da aludida garantia real, que determinaria que o seu crédito viesse a ser graduado em primeiro lugar.
Invocou, ainda, ter deduzido em 24 de Setembro de 2007 (e não 2009, como por notório lapso consta do art. 35º da petição inicial) e no âmbito dessa execução incidente de nulidade, pedindo a anulação de todo o processado posterior ao momento em que a sua citação deveria ter ocorrido, o cancelamento das inscrições prediais entretanto lavradas e a imediata comunicação do incidente à Conservatória do registo Predial competente.
Apreciado tal incidente, o mesmo veio a ser indeferido por decisão transitada em julgado * Os 2º, 3º e 4º Réus contestaram, nos termos constantes de fls. 118 e segs. do processo físico, impugnando os factos alegados e excepcionando a sua ilegitimidade e, ainda, a prescrição do direito a que a Autora se arroga.
* Também o 1º. Réu contestou (fls. 139 e segs. do processo físico), tendo de igual forma excepcionado a sua ilegitimidade, bem como a prescrição do direito da Autora, pelo decurso do prazo previsto no art. 498º nº 1 do Cód. Civil.
* A Autora replicou (fls. 184 e segs. do processo físico), invocando que apenas ficou conhecedora do direito que lhe assistia com o trânsito em julgado do despacho que indeferiu a nulidade arguida na identificada acção executiva, ou seja a partir de 10 de Janeiro de 2008, data a partir da qual se terá que contar o prazo de prescrição de três anos previsto no art. 498º nº 1 do Cód. Civil.
Defendeu, também, que os Réus foram notificados do incidente deduzido pela Autora a 1 de Outubro de 2007, acto este que é interruptivo do aludido prazo de prescrição, de acordo com o disposto no art. 323º nº 1 do Cód. Civil.
* Foi, ainda, ordenada a intervenção principal de G., que apresentou contestação a fls. 206 e segs. do processo principal excepcionando de igual forma a prescrição, a intervenção acessória de H., Ltd. (contestação a fls. 238 e segs. do processo físico com igual excepção de prescrição) e, por fim, a intervenção principal do Estado Português, representado pelo Mº Pº, o qual excepcionou a incompetência em razão da matéria do tribunal, a sua ilegitimidade e, ainda, a prescrição do direito.
* Por despacho de fls. 468 foi o Tribunal Judicial de Amares considerado absolutamente incompetente em razão da matéria e os Réus absolvidos da instância.
* Remetidos os autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, o mesmo declarou-se igualmente incompetente em razão da matéria.
* Por Acórdão proferido a fls. 786 e segs. do processo físico, na sequência do conflito negativo de jurisdição, o Tribunal dos Conflitos julgou que a competência para a acção cabe aos tribunais judiciais.
* Procedeu-se a uma audiência prévia (cfr. acta de fls. 723 e 724), na qual foram discutidas as excepções de ilegitimidade e de prescrição suscitadas pelos Réus nas respectivas contestações, tendo no entanto sido mantidas pelas partes as posições já defendidas nos respectivos articulados.
A final foi proferida a seguinte decisão: “Pelo exposto, decide-se: - julgar procedente a excepção peremptória de prescrição do direito invocado pela Autora, deduzida pelos Réus e pelos intervenientes principais, e, em consequência, absolver os mesmos do pedido”.
Inconformada com o assim decidido veio a Autora B., C.R.L., interpor recurso de Apelação, finalizando com as seguintes Conclusões: 1 – A recorrente não se conforma com a d. sentença no que respeita a esta ter julgado procedente a excepção de prescrição.
2 - Em 24 de Setembro de 2007, no âmbito dos autos de execução nº 40/99, do então Tribunal Judicial da Comarca de Amares, a aqui Recorrente deduziu incidente de arguição de nulidade da venda judicial do imóvel que lhe estava hipotecado (cfr. facto provado nº10 e doc. nº1 da contestação do R. C. e para cujos termos não foi citada, razão pela qual não reclamou créditos, perdendo, assim, a sua garantia e privilégio daí decorrentes.
3 – Resulta desse incidente que, à data em que o mesmo foi deduzido, a Recorrente, com base nos elementos que tinha, considerava que a falta fora do tribunal, razão pela qual o direito que julgava que podia exercer era o de requerer a anulação da venda (isto é, não tinha aplicação a parte final do art. 864º, nº3 do Cód. Proc. Civil); 4 – Entretanto, por carta de notificação expedida em 10 de Dezembro de 2007, o então Tribunal da Comarca de Amares notificou a aqui Recorrente do Despacho que julgou improcedente o incidente (cfr. facto provado nº12 e doc. nº2 da contestação do R. C.).
5 – Resulta desse despacho, pelas razões de facto e de direito aí expostas, que o Tribunal considerou que a responsabilidade pela falta de citação da aqui Recorrente era do exequente que à altura promoveu a citação dos credores.
6 – Foi apenas nesta data e nos termos desse despacho, que a A,. ficou conhecedora do direito que lhe assistia, bem como da pessoa contra quem o poderia exercer.
7 – O trânsito em julgado do Despacho que indeferiu a arguição de nulidade apenas ocorreu no dia 10 de Janeiro de 2008, sendo a partir desse dia que devem contar-se os 3 anos de prescrição.
8 – Por isso, o prazo de 3 anos iniciado em 10 de Janeiro de 2008 terminou em 9 de Janeiro de 2011, pelo que, tendo a acção sido proposta em 29 de Novembro de 2010, a invocada prescrição não operou.
9 – Antes de se voltar “contra” os exequentes/reclamantes, a Recorrente lançou mão do mecanismo que lhe pareceu ser o mais justo e sensato (face aos elementos de que dispunha), ou seja, pediu a anulação da venda que se acabara de fazer, com o que se conseguiria o mínimo de despesas/prejuízos/transtornos para aqueles.
10 – Agiu, deste modo, a Recorrente, de boa-fé, com vista a salvaguardar o seu direito de crédito sem “incomodar” os exequentes/reclamantes.
11 – Ora, esta actuação de boa-fé e com vista a “poupar” os exequentes/reclamantes não pode ser ignorada e sancionada como se a Recorrente tivesse sido desleixada e não actuasse dentro do prazo.
12 – Aliás, em situações que podem considerar-se semelhantes (acção judicial tendente a obter a indemnização/reparação do direito por outra via), os tribunais têm entendido que o prazo de prescrição apenas se inicia após o trânsito em julgado da decisão da “outra via”.
13 – Assim, e pelo conjunto de razões que vêm de se alegar, deverá considerar-se que a prescrição não operou, já que, num primeiro momento, a recorrente tentou salvaguardar o seu direito “por outra via”.
14 – Acresce que, em 1 de Outubro de 2007 os Recorridos foram notificados do incidente deduzido pela Recorrente (cfr. facto provado nº11).
15 – Muito concretamente, os aqui Recorridos, ao serem notificados do teor do incidente de arguição de nulidade deduzido no âmbito daquela execução 40/99, tomaram conhecimento de que, caso a ali exponente viesse a ter elementos para verificar que a falta não fora do tribunal, ou no caso de improcedência desse incidente, lhes poderia vir a reclamar uma indemnização (se arguia a nulidade da venda para defender os seus direitos, era de esperar que não deixaria de pedir indemnização, caso verificasse que, afinal, tinha este direito e não aquele, ou caso lhe fosse decretado que agisse antes daquela forma, como efectivamente veio a suceder).
16 – A recorrente, ao referir-se, no requerimento em que tentou anular a venda, a ”reclamar indemnização” ao executado, e ao dizer que “…do que para já a exponente se apercebeu, a sua falta de citação não terá ocorrido por culpa do exequente…”, é bem patente que não está de forma nenhuma a descartar a possibilidade de lhes (aos recorridos) vir a dirigir um pedido ressarcitório.
17 – Antes pelo contrário, o que se entende claramente é que, caso o pedido de anulação da venda não fosse acolhido, então a aqui Recorrente iria reclamar os seus danos aos exequentes/reclamantes 18 – Por isso, o prazo prescricional iniciado em Setembro desse ano de 2007 terá que se considerar interrompido com a notificação dos RR. para o incidente de arguição de nulidade (cfr. art. 323º, nº1 do Cód. Civil), 19 – iniciando-se um novo prazo prescricional de 3 anos apenas após o trânsito em julgado da decisão prolatada acerca daquele incidente, ou seja, a partir do dia 10 de Janeiro de 2008 (que de todo o modo coincide com o do cenário exposto supra de 2 a 13 destas conclusões).
20 – Pelas mesmas razões já acima expostas, terminando o prazo dos 3 anos em 9 de Janeiro de 2011 e tendo a acção sido proposta em 29 de Novembro de 2010, igualmente neste cenário a prescrição não operou: a) é um facto que apenas em 11 de Março de 2011 foram expedidas cartas para citação dos RR; b) porém, nos termos do art. 323º, nº2 do Cód. Civil, “Se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram cinco dias.
21 – Consequentemente, tendo a acção sido proposta em 29 de Novembro de 2010, o prazo prescricional que se iniciara em 10 de Janeiro de 2008 e que terminava em 9 de Janeiro de 2011, interrompeu-se em 4 de Dezembro de 2010.
22 – Por todas as razões acima expostas, as excepções de prescrição invocadas pelos RR. deveriam ter...
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