Acórdão nº 8496/15.0T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Junho de 2016
Magistrado Responsável | HELENA MELO |
Data da Resolução | 02 de Junho de 2016 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório BANCO… S.A. (antes denominado BANCO .., SA, e antes ainda denominado BANCO … S.A., sociedade anónima) intentou contra C., LDA., D… e E…, ambos casados, a presente providência cautelar de apreensão judicial do veículo da marca Volvo, com a matrícula xxx, modelo 13 4x2 trator L2 H2, e subsequente entrega ao Banco Requerente. Cumulativamente, pediu seja antecipado o juízo de mérito na acção principal, invertendo-se o contencioso:
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Restituindo-se definitivamente o veículo ao Banco Requerente; b) Condenando-se os Requeridos, pessoas singulares, no pagamento da quantia de € 5.977,74 (cinco mil novecentos e setenta e sete euros e setenta e quatro cêntimos), acrescida dos juros até integral pagamento, e da quantia de € 4.301,76 (quatro mil trezentos e um euros e setenta e seis cêntimos), com juros à taxa legal de 4% desde a citação.
Para tanto, alegou, em síntese, que celebrou com a Requerida pessoa colectiva(C…) um contrato de locação financeira que teve como objecto o veículo cuja apreensão se requer, em que aquela se obrigou ao pagamento de 40 rendas, sendo a primeira no montante de € 975,73 e as restantes na quantia de € 996,29; a sociedade Requerida não pagou as prestações 12ª à 17ª na data dos respectivo vencimento; por força disso, a Requerente interpelou, a 12.06.2015, a Requerida ao cumprimento das prestações em dívida, sob pena de resolução do contrato; a Requerida não pagou, nem entregou o veículo; os Requeridos pessoas singulares constituíram-se fiadores e principais pagadores das obrigações decorrentes do contrato para a Requerida locatária.
Regularmente citados, os Requeridos deduziram oposição, tendo sustentado que em 07.01.2011, celebraram com a Requerente um contrato de locação financeira com fiança, no montante de € 34.963,41, o qual foi objecto de renegociação; a Requerida pessoa colectiva encontra-se em processo de revitalização, tendo o plano respectivo sido já homologado e aprovado; a Requerida encontra-se a cumprir o plano financeiro aprovado; a Requerente atua com abuso de direito; o bem cuja apreensão se pretende está incluído no plano da Requerida pessoa colectiva e o deferimento da providência tornará inexequível o cumprimento das suas obrigações (cfr. fls. 94 a 97).
Procedeu-se à inquirição das testemunhas e foi proferida sentença com o seguinte teor no seu segmento decisório: “a. Julgo procedente a providência de apreensão judicial do veículo da marca Volvo, matrícula 93-LF-53, modelo 13 4x2 trator L2 H2, e subsequente entrega ao Banco Requerente; b. Antecipo parcialmente o juízo de mérito a realizar na ação principal, determinando a restituição definitiva do veículo identificado em a. ao Banco Requerente; c. Julgo improcedente, com dispensa de propositura da ação principal, o pedido de antecipação do juízo de mérito a realizar naquela quanto à condenação solidária dos Requeridos no pagamento ao Banco Requerente das quantias aludidas no artigo 18º, do requerimento inicial. “ A requerida não se conformou e interpôs o presente recurso, concluindo do seguinte modo: “A. Vem o presente recurso interposto da sentença de fls… que condenou os Recorrentes na restituição definitiva do veículo da marca Volvo, com matrícula xxx, modelo 13 4x2 trator L2 H2.
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Os Recorrentes rejeitam, veementemente, tal sentença, na parte que os condenou na restituição definitiva do veículo em causa ao Banco recorrido.
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E fazem-no porque, na verdade, ela se assume, de modo manifesto iníqua na medida em que não ponderou, devidamente, a prova produzida em audiência de julgamento, e, particularmente, a circunstância de em relação à Recorrente ter sido iniciado um Processo Especial de Revitalização.
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Com a resolução do contrato de locação financeira inviabiliza por completo a atividade da ora aqui Recorrente, coloca em causa a sobrevivência da empresa, paralisando a sua atividade e impedindo o prosseguimento da mesma.
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Há notória violação do princípio da proporcionalidade com o decretamento da providência cautelar com a consequente obrigação de entrega do veículo, causando efeitos devastadores, quer para a Recorrente, quer para os restantes credores, uma vez que impossibilita a revitalização da empresa e, eventualmente, determine a sua insolvência.
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Privilegiando, sem qualquer razão válida, o Banco Recorrido com total prejuízo para a aqui Recorrente e os restantes credores, pelo que deve a sentença recorrida ser revogada como V/Exas. Venerandos Desembargadores com toda a certeza o farão, dando provimento ao presente recurso.
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Com o decretamento da providência cautelar e restituição definitiva do bem locado inviabiliza impreterivelmente o cumprimento do Plano Especial de Recuperação.
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Dado que, o Processo Especial de Revitalização é concedido de modo a que todos os credores, participando ou não no processo, fiquem vinculados ao mesmo nos termos do art.º 17.º-F n.º6 do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas, doravante C.I.R.E., não havendo qualquer ponderação das consequências que o P.E.R. poderá ter face aos seus credores.
I. Há que acrescentar ainda que, apesar do julgador ser livre na formação da sua convicção, essa liberdade tem-se como condicionada à prova produzida em audiência de julgamento, que não pode ser apreciada de modo seletivo a fim de validar apenas o que foi alegado pela Requerente e infirmar a prova cabal dos Requeridos.
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E no caso sub judice o julgador da 1.ª Instância, erradamente, apenas valorou a prova produzida pela Recorrida e não a prova produzida pelos Recorrentes.
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O Recorrente discorda inteiramente das conclusões tiradas na sentença recorrida com relação a esta matéria factual dos factos dados como provados 8.º,9º, 15º e 17.º L. Tais factos não permitem, contrariamente ao que consta na sentença recorrida, a conclusão de que a declaração resolutiva emitida pela Recorrida para o aqui Recorrente em nada contende, em nada afeta o Plano Especial de Recuperação da sociedade.
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Há que dizer, antes de tudo a este propósito, que está provado em 9.º que: a carta registada com aviso de receção que a Recorrida remeteu à aqui recorrente foi datada de 12/06/2015 e recebida por esta em 15/06/2015 concedia àquela um novo prazo adicional de 20 dias para o cumprimento, N. O que significa que, como é facto notório, a recorrente tinha até ao dia 05/07/2015 para cumprir com o ajustado contratualmente com a recorrida.
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Sucede que a aqui Recorrente em 29/06/2015 expediu, como se impunha, uma carta registada à recorrida rececionada por esta em 30/06/2015, conforme documento que só agora se junta por virtude do teor da sentença recorrida.
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E conforme resulta do artigo 651º, nº 1 do CPC, a junção dos documentos tornou-se necessária em virtude do julgamento proferido na primeira instância, ou seja, de a questão decisória justificativa da junção dos documentos com o recurso como questão operante.
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Informando, nessa missiva, que se tinha iniciado o Processo Especial de Revitalização, convidando a Recorrida, na qualidade de credora, a participar nas negociações em curso, R. Tendo, esta, efetivamente participado em tal processo negocial da forma que entendeu, não podendo, assim, ancorar-se na sua suposta “ desconsideração” do plano de recuperação da recorrente, nem podendo esta alegar-se cumpridora dos princípios subjacentes ao referido P.E.R.
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Aquando da interpelação por parte da Recorrida já decorriam as negociações para aprovação do plano e no momento da resolução do contrato já havia sido remetida a respetiva missiva, supra referida, para que a mesma participasse nas negociações em curso.
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E, como é bem sabido, a homologação (que se verificou no caso sub judice) do plano aprovado pela maioria dos credores “ vincula os credores- (n.º6 do art.º17.ºF do C.I.R.E), sendo certo que tal vinculação se faz de igual forma para os credores participantes e não participantes, para os credores com voto positivo e para os credores com voto negativo.
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A Recorrida não podia ignorar as negociações e o plano, e muito menos, por virtude disso, reclamar o pagamento das rendas e impor a resolução do contrato por tal contrariar, desde logo, o princípio da boa-fé vertido na resolução de Conselho de Ministros n.º43/2011, para que remete o n.º10 do art.º17.º-D do C.I.R.E.
V. No mesmo sentido o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24/02/2015 no qual se salienta na mesma linha de pensamento e de decisão que tal resolução não pode operar como pressuposto da pretendida apreensão e restituição do bem locado.
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Contrariamente ao entendimento da decisão recorrida.
X. É que destinando-se o P.E.R. a concluir um acordo do devedor com os credores de modo a possibilitar a recuperação económica do primeiro, esta finalidade ficaria muito comprometida, se qualquer credor pudesse praticar atos, como o recorrido praticou, inviabilizadores da mesma.
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Plano esse, que como se sabe, implica alterações no que respeita aos prazos de cumprimento de obrigações, aos quais a devedora inicialmente estava vinculada, em suma, quanto às obrigações da devedora para com todos os credores.
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O que implica que com a homologação do plano de recuperação deixará de existir, como sucede no caso sub judice, fundamento para a resolução dos contratos baseada no incumprimento contratual.
AA. Destarte, e fazendo-se, por brevidade uma análise sintética da questão, uma vez que a mesma já foi aflorada supra, se dirá, referenciando o facto provado n.º17, que em 18/06/2015 (data do despacho de nomeação do administrador...
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