Acórdão nº 1510/12.2TBFAF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelANABELA TENREIRO
Data da Resolução09 de Junho de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I—RELATÓRIO A "BM, Sucursal Portuguesa" instaurou acção executiva para pagamento da quantia exequenda contra a "Bri Têxteis Unipessoal, Lda." e Gabriela F, dando à execução uma livrança e pedindo que as executadas sejam condenadas a pagar a quantia de € 22.207,55 a título de capital acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde o vencimento em 25.06.2012 até integral pagamento e que, em 20.08.2012, ascendiam ao valor de €.136,09.

* Gabriela F, executada nos autos principais, deduziu oposição à execução contra a exequente "BM Sucursal Portuguesa", alegando, em síntese, que: - A citação é nula por não lhe ter sido entregue cópia do título executivo.

- Não aceita como sua a assinatura aposta na livrança.

- A livrança encontra-se no âmbito das relações imediatas, sendo que a mesma foi subscrita pela sociedade e avalizada por si totalmente em branco e foi entregue como garantia do contrato de aluguer de longa duração celebrado entre a exequente e a Bri.

- A exequente resolveu o contrato de ALD em Janeiro de 2012, por efeito da insolvência da executada sociedade, apesar de nessa data não haver prestações em atraso e o contrato estar a ser cumprido.

- A opoente pretendeu cumprir o contrato, mas foi impedida de o fazer pela exequente.

- A exequente não permitiu que a opoente adquirisse o veículo já depois da resolução por ter indicado um preço muito elevado, que consubstancia até uma conduta usurária.

- Antes de o exequente ter procedido à recolha do veículo já tinha recebido € 8.339,04.

- O veículo valia entre €.15.000,00 a €.17.500,00, podendo ser vendido por esse valor.

- Considerando a quantia recebida pela exequente e o valor do veículo que foi entregue, a executada sociedade só ficou a dever a quantia de €.4.737,44, pelo que a conduta da exequente ao pedir o pagamento de €.22.343,89 consubstancia um manifesto abuso do direito.

- Não deu, nem dá autorização para o preenchimento da livrança, tendo a mesma sido preenchida à revelia e sem consentimento da opoente, sendo que a opoente não teve conhecimento da data de preenchimento da livrança.

- A opoente não negociou o contrato, sendo que à opoente apenas cabia aderir ou não ao mesmo.

- A exequente não leu, nem explicou à opoente as cláusulas contratuais gerais inseridas no contrato, pelo que tal cláusula é nula e tem de ser excluída do contrato.

Conclui a opoente pedindo que a citação seja declarada nula e que a oposição seja julgada procedente por provada e, consequentemente, que a opoente seja desobrigada de pagar a quantia exequenda e o exequente condenado no pagamento das custas e demais encargos.

* Notificada para contestar, a exequente veio defender-se, alegando que: - Desconhece qualquer irregularidade na citação, mas de qualquer forma não se viu limitada no seu direito de defesa.

- A assinatura aposta na livrança, quer na frente, quer no verso, foi aposta pelo punho da opoente.

- É verdade que a livrança foi subscrita em branco como garantia do cumprimento do contrato de ALD.

- É verdade que o contrato de ALD foi resolvido pela exequente, e uma vez resolvido o contrato, o veículo ficou a pertencer à exequente que é sua única e exclusiva proprietária, pelo que podia dispor do mesmo livremente, não existindo motivos para que a opoente soubesse o valor pelo qual foi vendido.

- Os valores peticionados encontram-se de harmonia com o contratualmente previsto, correspondendo aos alugueres vencidos e não pagos, acrescidos dos respectivos juros de mora, ao valor da indemnização pela não entrega atempada do veículo, ao valor da indemnização decorrente da rescisão contratual e ao valor das despesas com a recuperação do veículo.

- É falso que a opoente não tenha consentido no preenchimento da livrança, pois assinou o pacto de preenchimento da livrança.

- É falso que não tenha dado conhecimento do vencimento da livrança e do seu preenchimento, pois foi enviada uma carta à opoente, na qual era concedido um prazo de 8 dias para pagamento da quantia em dívida.

- Não é verdade que a celebração do contrato tenha sido imposta pela exequente, tal como não é verdade que não tenha havido negociação, pois foram ajustadas e negociadas as condições particulares.

- A exequente cumpriu os deveres de comunicação e informação, pois as cláusulas estão redigidas com clareza de forma a serem compreendidas pelo homem médio ao que acresce que a opoente nunca pediu qualquer esclarecimento, e bem ainda que a opoente declarou que as referidas condições lhe foram comunicadas com a antecedência e o modo necessário.

- Mesmo que o contrato fosse nulo por violação do dever de comunicação das cláusulas, tal nulidade não obstaria a que a exequente peticionasse os valores que pede, pois tais valores sempre assentariam no regime legal supletivo da locação.

Termina, pedindo que a oposição à execução seja julgada improcedente por não provados os factos alegados e, consequentemente que a execução siga os seus trâmites até final.

* A oponente, ao abrigo do princípio do contraditório, veio impugnar os documentos juntos pela exequente com a contestação.

* Proferiu-se sentença que julgou totalmente improcedente a oposição à execução deduzida por Gabriela F e, em consequência, determinou o prosseguimento da acção executiva.

* Inconformada com a sentença, a Oponente interpôs recurso, terminando com as seguintes CONCLUSÕES 1 - A ambiguidade ou obscuridade da sentença consiste tanto na contradição entre a matéria de facto dada como provada ou como provada e não provada, como também entre a fundamentação probatória da matéria de facto, ou até mesmo entre a fundamentação e a decisão; 2 - Descendo à analise do presente caso concreto, a Mma Juiz "a quo" dá como provado no ponto g) dos Factos Provados que "O veículo tinha na altura o valor de mercado de, pelo menos, €.17.200,00" e, simultaneamente como não provado que "não resultou provado que apenas ficou por pagar pela Bri à exequente a quantia de €.4.727,44", esclarecendo na motivação da sua decisão que "não resultou provado que apenas ficou em dívida a quantia de €.4.727,44, mesmo considerando a recuperação do veículo automóvel e o valor do mesmo, não se sabe o valor pelo qual foi vendido. (. .. ) Ou seja, não se pode considerar só o valor que a exequente despendeu com a aquisição do veículo e o valor do mesmo, é pois também necessário ponderar os demais factores."; 3 - Ora, aplicando-se in casu, como aliás defende a sentença apelada, o Decreto-Lei nº 354/86, de 23 de Outubro, importa chamar à colação a visão que do presente contrato é dada por Pedro Paes de Vasconcelos segundo o qual o ALD constitui um contrato indirecto, em que o tipo de referência é o aluguer e o fim indirecto a compra e venda a prestações com reserva de propriedade (fim que no caso sub judice está explícito e que na realidade molda o negócio); 4 - Neste caso, quando o "aluguer" não é apenas, e sobretudo não é essencialmente, o rendimento obtido de um bem, pela cessão do seu gozo, que é retribuído mediante o pagamento do valor locativo (artigo 1022º do CC), mas uma prestação calculada em função de um plano de amortização de uma dívida de financiamento (dívida de capital) e respectiva remuneração (juros) e outros encargos, então não tem cabimento indemnizar a retenção indevida do bem através do pagamento de "alugueres", tanto mais que, com o decurso do tempo, o valor de capital, juros e lucro foi sendo amortizado e o bem está a ser parcial e gradualmente pago; 5 - Não se nega que, quando a obrigação de restituir o bem é antecipada por força da resolução do contrato pelo locador, devido a incumprimento do locatário, o primeiro deixa de receber a parte correspondente de amortização, juros e lucro que fora repartido pelos "alugueres" vincendos, porém com a consequente restituição do veículo decorrente da resolução poderá colocar de novo, de imediato, o bem no mercado de venda ou de ALD; 6 - Com efeito, no presente caso estamos perante um tipo de contrato (ALD) em que a prestação é calculada em função de um plano de amortização de uma dívida de financiamento (dívida de capital) e respectiva remuneração (juros) e outros encargos; 7 - O que se traduz no presente caso no seguinte: à quantia mutuada de € 30.576,48, deverá ser descontado o valor já pago (€ 8.619,13), bem como o valor do veículo à data da retoma e que foi objecto de avaliação no presente processo (€ 17.200,00), pelo que a admitir-se ser devida pela apelante qualquer quantia apenas poderá resultar da diferença entre aqueles, a saber € 4.756,85; 8 - Existe, assim, contradição entre o facto dado como provado pela Mma Juiz no ponto g) e o facto não provado, o que conduz a uma flagrante contradição entre a fundamentação e a decisão de iure, uma vez que o facto julgado provado no ponto g) aponta para um sentido e a decisão de direito foi em sentido oposto, em consequência do que o facto não provado deverá ser considerado provado com a seguinte redacção "Ficou por pagar pela Brilhifusão à exequente a quantia de € 4.756,85".

9 - O presente recurso estende-se quer à decisão de facto, quer à decisão de direito, e observado que se mostra o exigido pelo artigo 640º, do CPC, pode-se afirmar que o Tribunal "a quo' fez errada apreciação e valoração dos depoimentos prestados, em audiência de julgamento pelas testemunhas cujos passos mas significativos se transcreveram, o que acarreta o errado enquadramento jurídico a protestar após a produção da prova; 10 - Encontram-se incorrectamente julgados os Pontos i) e j) dos Factos Provados, os quais atenta a análise dos depoimentos transcritos (Nelson C e José R) e Prova Documental junta aos autos a resposta tem de ser "Não Provado"; 11 - Efectuada que seja a alteração da matéria de facto no sentido acabado de propor, outro terá de ser, como é evidente, o enquadramento jurídico dessa nova factualidade; 12- Importa, pois, saber se a exequente/apelada cumpriu o ónus de comunicação e de informação relativamente às cláusulas contratuais gerais do...

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