Acórdão nº 442/13.1TBVLN-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelMIGUEL BALDAIA MORAIS
Data da Resolução21 de Janeiro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I- RELATÓRIO Declarada a insolvência de T., Lda., a interessada/credora I., SA. apresentou alegações escritas ao abrigo do disposto no artigo 188.º, n.º 1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), pugnando pela qualificação da insolvência como culposa.

O administrador da insolvência emitiu parecer, nos termos do disposto no artigo 188.º, n.º 2, do CIRE, pronunciando-se pela qualificação da insolvência como culposa e pela atribuição da responsabilidade de tal facto à sócia-gerente da devedora, S.

Os autos foram com vista ao Ministério Público, para os efeitos do artigo 188.º, n.º 3, do CIRE, aderindo à argumentação aduzida pelo administrador da insolvência, emitindo parecer no sentido da qualificação da insolvência como culposa.

Cumprido o disposto no artigo 188.º, n.º 5, do CIRE, a visada deduziu oposição, pugnando pela qualificação da insolvência como fortuita.

Respondeu a requerente I.Ldª, preconizando que seja julgada improcedente a oposição deduzida.

Designou-se data para realização da audiência prévia, no âmbito da qual se proferiu despacho saneador em termos tabelares, se definiu o objeto do litígio e se fixaram os temas da prova.

Realizou-se audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais.

Foi proferida sentença na qual se decidiu: a) Qualificar a insolvência da sociedade T., Lda. como culposa; b) Julgar afetado pela qualificação da insolvência como culposa a gerente da sociedade insolvente, S.; c) Decretar a inibição de S. para administrar patrimónios de terceiros por um período de 3 (três) anos; d) Declarar S. inibida para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa por um período de 3 (três) anos; e) Determinar a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente detidos por S. e a sua condenação na restituição dos bens ou direitos já recebidos em pagamento desses créditos; f) Condenar S. a indemnizar os credores do devedor declarado insolvente no montante dos créditos não satisfeitos, até às forças do seu património.

Não se conformando com o assim decidido, veio a identificada sócia-gerente S. interpor o presente recurso, o qual foi admitido como apelação, a subir nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes CONCLUSÕES: 1- A Douta Decisão proferida pelo Tribunal a quo viola por errada interpretação e aplicação o disposto nos artigos 83.º, n.º 3 e 186.º do C.I.R.E., pelo que deverá ser revogada e substituída por outra que qualifique como fortuita a insolvência da empresa T. Limitada, com todas as consequências legais.

2- O artigo 186.º do C.I.R.E. prevê a qualificação da insolvência como culposa quando da actuação dolosa ou com culpa grave dos seus administradores resulte a criação ou agravamento da situação de insolvência (n.º 1), fixando os comportamentos que objectivamente caracterizam como culposa a insolvência (n.º 2) e aqueles que fazem presumir a culpa grave do agente infractor (n.º 3).

3- O artigo 83.º n.º 3 deixa na livre disposição do julgador a qualificação da insolvência como culposa havendo recusa de prestação de informações ou de colaboração por parte do devedor.

4- É jurisprudência unanime que a verificação da existência de culpa grave do devedor (ou seu representante), não tem como consequência directa e necessária a qualificação da insolvência como culposa, tendo ainda de ser demonstrada a existência de nexo de causalidade entre tal conduta e a criação ou agravamento da situação de insolvência.

5- Os requisitos da insolvência culposa são efectivamente o facto praticado ou omitido pelo devedor, nos três anos anteriores ao início do processo de insolvência, a culpa qualificada e o nexo de causalidade entre a actuação e a criação ou agravamento da situação de insolvência.

6- Só os administradores que contribuam efectivamente e de forma relevante para a situação de insolvência é que podem ser afectados pela qualificação da insolvência como culposa. Cfr. AC. TRP de 20.10.2009- P 573/06.5TJVNG-G, R Guerra Baganha, a título de exemplo.

7- A douta sentença não imputa à recorrente qualquer comportamento criador da situação de insolvência.

8- O tribunal a quo entende que não houve nexo de causalidade entre a falta de depósito das contas da sociedade e a criação ou agravamento da situação de insolvência.

9- Não resulta dos factos provados a omissão do dever de apresentação à Insolvência e que este tenha contribuído para agravar a situação de insolvência; a sociedade devedora até apresenta resultados menos negativos em 2012 que em 2011 (facto provado 10.) e à data do requerimento de insolvência não estavam ainda fechadas as contas referentes a 2013; não havia quaisquer processos judiciais pendentes contra a empresa, designadamente por dívidas a fornecedores.

10- Não existe qualquer prova de que a recorrente exercesse na empresa uma qualquer tarefa própria da gerência, nem tal pode extrair-se do facto de acompanhar o António Portela Cividades nas negociações com a requerente da Qualificação (factos provados 18. e 20.) ou ser ela a assinar os cheques e letras entregues a esta fornecedora, pois foi unanime o reconhecimento de que a sociedade era gerida de facto pelo mencionado Cividades.

11- A matéria do facto não provado 1., designadamente a referente à gestão a empresa e pagamentos a fornecedores pelo AP., deverá ser levada aos factos provados, atendendo ao facto provado 18. e a que do facto provado 20. não resulta o contrário.

12- O facto não provado 5. deve ser levado aos factos provados, pois resulta quer do Relatório, inserto a fls…, quer do depoimento gravado do A.I. que a recorrente por intermédio da mandatária, no tempo limite lhe prestou colaboração escassa, mas que lha prestou, o que obviamente sucedeu até à elaboração do Parecer p. e p. no artigo 188.º do C.I.R.E.

13- Não estão preenchidos os pressupostos p. e p. no artigo 83.º n.º 3 do C.I.R.E., pois a recorrente não se recusou a prestar informações ou a colaborar com o A.I., prestou a colaboração que lhe foi possível, de acordo com os dados de que dispunha, através da sua mandatária e do gabinete de contabilidade, nada impondo na lei que tal colaboração tenha de ser pessoal: Assim a insolvência não deverá ser qualificada como culposa ao abrigo deste dispositivo legal, contrariamente ao doutamente entendido pelo Tribunal a quo.

14- A relação de tipo conjugal entre a recorrente e o AP. não se verificava à data da insolvência como resulta do depoimento das várias testemunhas que deram conta de que ele desapareceu para parte incerta e que ela emigrou para a Suíça, onde foi residir com a irmã.

15- O facto não provado 6. deverá ser levado aos factos provados, desde logo atendendo ao relatório do Sr. Administrador de Insolvência que refere a existência de créditos de montante considerável, que não conseguiu cobrar, o que apurou da leitura do último balancete que recebeu da contabilidade.

16- A alínea i) do n.º 2) do artigo 186.º do C.I.R.E. exige para se mostrar preenchida a verificação reiterada e cumulativa de duas condutas: violação dever de apresentação à insolvência e do dever de colaboração, até à data da elaboração do Parecer p. e p. no artigo 188.º n.º 2. do C.I.R.E.

17- Não consta da douta Sentença qualquer referência de que a recorrente não tenha reiteradamente apresentado a sociedade devedora à insolvência.

18- A requerente cumpriu o dever de colaboração p. e p. na segunda parte do dispositivo da al. i) do artigo 186.º do C.I.R.E., no limite do prazo concedido para a resposta à solicitação do Sr. Administrador, o que lhe permitiu, designadamente identificar credores e devedores e alcançar os valores mencionados nos factos provados 9. a 15. e facto não provado 6., sendo sintomático do respeito desse prazo o facto provado 8. e a data de elaboração do Relatório inserto a fls… para apreciação na Assembleia de Credores.

19- Ao considerar preenchidos os dispositivos da alínea i) o Mm.º Juiz violou este dispositivo por errada interpretação e aplicação, pois a realidade é que não se mostram preenchidos os requisitos cumulativos do seu preenchimento quer no que respeita à falta reiterada de apresentação à insolvência, quer quanto à falta de colaboração mencionada na segunda parte do dispositivo, que obviamente não se verificou.

20- A presunção p. e p. na al. b) do n.º 3 do artigo 186.º do C.I.R.E. foi afastada na Douta Sentença.

21- A recorrente não contribuiu para a criação ou agravamento da situação e insolvência ao não apresentar a empresa à insolvência nos três anos anteriores à declaração, pois como resulta do teor da Douta Sentença, de acordo com o A.I. a falência técnica já existia anteriormente.

22- Acresce que, no âmbito da empresa não existiam quaisquer sinais exteriores que apontassem à recorrente a precaridade da situação financeira – não havia quaisquer processos contra a empresa- e internamente a recorrente desconhecia os meandros da gestão, a cargo do A…, sendo que a TOC também nunca a alertou para qualquer situação relacionada com tal.

23- Cabia à requerente da qualificação da insolvência a demonstração do nexo de causalidade entre a situação que a empresa apresentava à data da declaração de insolvência e a que poderia existir se a recorrente tivesse requerido a apresentação à insolvência – tal prova não foi por qualquer forma efetuada.

24- A qualificação da insolvência como culposa pressupõe não apenas a existência de culpa grave do administrador ou gerente da sociedade, mas que tal culpa tenha como consequência, isto é, seja causadora, contribua de forma relevante e preponderante, para a insolvência, prova que cabia à requerente da Insolvência, prova que não se mostra realizada.

25- Pelo que, a Douta Decisão recorrida...

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