Acórdão nº 338/07.6TBAMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA AM
Data da Resolução10 de Março de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Relatora: Maria Amália Santos 1ª Adjunta: Desembargadora Ana Cristina Duarte 2º Adjunto: Desembargador Francisco Xavier * Banco B, S.A., sociedade anónima com sede na Avenida 24 de Julho, n.º 98, Lisboa, demanda, nesta acção declarativa com processo comum, António F, divorciado, residente na Avenida Santo António, Amares, pedindo a condenação do réu a pagar-lhe a quantia total de 34.730,38 euros, acrescida de € 5.260,47, de juros vencidos até 6-07-2007, da quantia de € 210,42, de imposto de selo sobre estes juros, e dos juros vincendos à taxa anual de 18,49%, desde 7 de Julho de 2007 até integral pagamento, bem como do respetivo imposto de selo sobres estes juros, à taxa de 4 %.

* Alegou para tanto que no exercício da sua atividade comercial e com destino à aquisição de um veículo automóvel de marca BMW, modelo 320 D, com a matrícula 84-BR-76, por contrato constante de título particular datado de 1 de Junho de 2006, concedeu ao R. crédito direto, sob a forma de um contrato de mútuo, tendo assim emprestado ao dito R. a importância de € 22.950,00, conforme contrato junto aos autos fls. 9.

Acontece que o R não pagou ao A. a 3.ª prestação e seguintes do contrato, no valor de € 477,00 cada, vencida a primeira no dia 10 de Setembro de 2006, vencendo-se então as restantes em dívida.

Atentas as atualizações da taxa Euribor, o prazo do contrato foi alargado para 75 prestações, sendo o valor das 73.º e 74.º prestações de € 477,00 euros e o valor da 75.º e última prestação de € 386,38.

* O R. contestou dizendo que não corresponde à verdade o alegado pelo demandante, pois jamais estabeleceu qualquer contacto ou celebrou com o autor qualquer acordo ou contrato de financiamento, pelo que o contrato de mútuo junto aos autos pelo autor como documento nº1 é falso, não pertencendo ao réu as assinaturas que se encontram apostas no aludido contrato.

Deduz pedido reconvencional contra o A. e contra os chamados José E, C, Unipessoal., Lda., e David C (cujo chamamento foi admitido nos autos, assim como o pedido reconvencional contra eles deduzido).

* O A. veio responder à reconvenção apresentada, pedindo a improcedência da mesma.

Também os chamados vieram responder à reconvenção do R., pedindo a sua improcedência.

* Tramitados regularmente os autos foi proferida decisão a julgar a ação procedente e, em consequência, a condenar o réu a pagar ao autor a quantia total de € 34.730,38, acrescida de € 5.260,47, de juros vencidos até 6-07-2007, da quantia de € 210,42 de imposto de selo sobre esses juros, e dos juros vincendos à taxa anual de 18,49%, desde 7 de Julho de 2007 até integral pagamento, bem como do respetivo imposto de selo sobres esses juros, à taxa de 4 %, e a julgar a reconvenção improcedente e, em consequência, a absolver os reconvindos do pedido reconvencional contra eles deduzido.

* Não se conformando com a decisão proferida, veio o Réu dela interpor o presente recurso de Apelação, apresentando Alegações e formulando as seguintes Conclusões: 1. O Tribunal recorrido não fez um acertado julgamento da decisão de facto e, consequentemente, os factos 8. e 9. dos factos provados foram incorrectamente julgados.

  1. A prova produzida, maxime a prova testemunhal, complementada com o recurso às regras da experiência comum e da normalidade, impunham que fosse proferida decisão diferente quanto àquela concreta matéria de facto.

  2. Na reapreciação da prova, as Relações têm «a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância, devendo proceder à audição dos depoimentos ou fazer incidir as regras da experiência, como efectiva garantia de um segundo grau de jurisdição». E, quando um Tribunal de 2ª instância, ao reapreciar a prova ali produzida, valorando-a de acordo com o princípio da livre convicção, “conseguir formar, relativamente aos concretos pontos impugnados, uma convicção segura acerca da existência de erro de julgamento da matéria de facto, deve proceder à modificação da decisão, fazendo «jus» ao reforço dos poderes que lhe foram atribuídos enquanto tribunal de instância que garante um segundo grau de jurisdição” (assim, Abrantes Geraldes, in “Reforma dos Recursos em Processo Civil”, Revista Julgar, nº4, Janeiro-Abril 2008, págs. 69 a 76.).

  3. De acordo com os depoimentos prestados pelas testemunhas Hugo B, Júlio L, Sérgio O, bem como os depoimentos de parte prestados por José E e João O, de que se transcreveram algumas passagens, o Tribunal recorrido não podia dar como provados os factos vertidos em 8. e 9. dos factos , a saber: 8. “O funcionário da C, Lda, Sérgio O, com quem o réu negociou a aquisição desse veículo, comunicou ao réu António F as cláusulas do contrato identificado em A., nomeadamente, prazo do contrato, valor de cada prestação, número das prestações, no momento em que este, com o seu punho, o subscreveu.”; 9. “Nessa data, foi entregue ao réu António F um exemplar desse contrato.” 5. A testemunha Hugo B disse: “a partir do momento em que a proposta é remetida para análise e aprovada, depois é remetido o contrato para o stand. Os detalhes do contrato é entre o cliente e o stand. E, perante a pergunta: sabe que informações é que a C deu ao mutuário?, a testemunha respondeu: “não, não estava presente.” E, perante a pergunta: sabe se foi entregue algum exemplar do contrato?, respondeu: foi enviado para a casa do cliente, sim; dois, três dias depois. É provável que seja enviado por correio normal. (Cfr. depoimento de Hugo B, prestado na audiência de 07.05.2015, o qual se encontra gravado em registo áudio das 10:09:33 horas às 10:23:36 horas).

  4. A testemunha Júlio L disse: “há uma proposta. A proposta é enviada para o nosso departamento de análise e havendo aprovação vai dar seguimento a contrato e tem que regressar às nossas instalações dados para confirmar identidade etc.. e só depois é que há contrato. Depois de o contrato vir à nossa delegação para ser conferido e assinado, enviamos para a morada e não veio devolvido. A posteriori. No seguimento do que eu disse, o contrato vem para as nossas instalações, com os dados para fazer uma conferência, para saber se está em conformidade. Estando em conformidade, depois enviamos para o cliente, para a morada indicada. O contrato tem data de um dos seis. Deve ter sido num desses dias. Uma data certa agora não sei. Que enviamos, enviamos. O correio não veio devolvido. (Cfr. depoimento de Júlio L, prestado na audiência de 07.05.2015, o qual se encontra gravado em registo áudio das 10:24:38 horas às 10:44:15 horas).

  5. A testemunha Sérgio O não referiu em nenhum momento do seu depoimento ter procedido à entrega de um exemplar do contrato quando este foi assinado pelo Apelante. (Cfr. depoimento de Sérgio O, prestado na audiência de 04.05.2015, o qual se encontra gravado em registo áudio das 11.58.19 horas às 12.23.00 horas).

  6. No seu depoimento de parte, José E, perante a pergunta: “o Sr. Sérgio não lhe explicou as cláusulas?, disse: meretíssimo … o Sr. Sérgio na altura não leu as cláusulas, porque aquilo era letra para a frente e para trás. Aquilo para explicar aquilo tudo, letra atrás, Deus me livre, aquilo teríamos que estar ali …. E, perante a pergunta do advogado do Réu: “sabe se na altura da assinatura do contrato, aqui num café de Amares, foi entregue alguma cópia do contrato ao Sr. António Fernandes?, disse: “julgo que não! (Cfr. depoimento de José Rodrigues Esteves, prestado na audiência de 21.05.2015, o qual se encontra gravado em registo áudio das 14:28:35 horas às 15:08:51 horas).

  7. O legal representante da C, Lda, João O, perante a pergunta: “receberam algum tipo de formação por parte das financeiras a quem recorriam para a celebração dos contratos de crédito?, disse: “não, porque normalmente os contratos eram depois encaminhados directamente pela financeira. Não tenho conhecimento que houvesse uma formação específica para esse tipo de função. Não sei sequer se era necessária.” (Cfr. depoimento de João O, prestado na audiência de 21.05.2015, o qual se encontra gravado em registo áudio das 15:09:29 horas às 15:13:49 horas).

  8. Como resulta inequivocamente da reapreciação da prova produzida e da transcrição dos depoimentos já referidas, todas as testemunhas e as partes ouvidas reconheceram por unanimidade que na data da assinatura do contrato de crédito pelo Apelante não lhe foi entregue qualquer cópia ou exemplar de tal contrato.

  9. Aliás, a C, Lda, não estava autorizada a entregar ao Apelante (nem tal fazia sentido) a cópia de um contrato, que nem sequer estava completo – faltava a assinatura do banco – concedente do crédito.

  10. As testemunhas arroladas pelo Autor, aqui Apelado, descreveram minuciosamente o procedimento contratual em causa. E esclareceram que a cópia e/ou exemplar do contrato de crédito ao consumo só foi remetida pelo correio para o domicílio do Réu/Apelante, dias depois da assinatura do contrato pelo representante do Autor, o que também aconteceu dias depois da assinatura do contrato pelo Réu/Apelante.

  11. O Tribunal recorrido decidiu mal, em manifesto e notório erro de apreciação da prova. Com efeito, como se viu e demonstrou, o Tribunal recorrido não podia ter dado como provada a factualidade vertida em 8. e 9. dos factos provados.

  12. O chamado – José E – confessou que assistiu à assinatura do contrato pelo Réu/Apelante e reconheceu que nessa data o funcionário da C, Lda – Sérgio O - não entregou ao Réu/Apelado qualquer exemplar do contrato de crédito ao...

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