Acórdão nº 328/14.2T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelJORGE SEABRA
Data da Resolução03 de Março de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: B.

Recorrida: C..

* Viana do Castelo – Instância Local – Secção Cível – Jz. 2 * 1. C. intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra B., E. e D., pedindo: que se declare a resolução do contrato de arrendamento identificado no artigo 2.º da p.i., por falta de pagamento de rendas; que se condenem os 1º e 2ª réus, na qualidade de inquilinos, a despejar imediatamente o local arrendado, deixando-o devoluto de pessoas e bens; que se condenem todos os réus no pagamento à autora das rendas vencidas e não pagas até à data de interposição da presente acção, no [...] montante de € 2.706,54 (dois mil setecentos e seis euros e cinquenta e quatro cêntimos), bem como a rendas vincendas até à entrega efectiva à autora do local arrendado, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal até efectivo e integral pagamento.

  1. Regularmente citados, apenas o Réu B. apresentou articulado de contestação, pelo qual, além de excepcionar a incompetência absoluta deste tribunal, em razão da matéria, invocou a excepção de não cumprimento do contrato, por falta de condições de habitabilidade e falta de realização de obras no locado.

  2. Ao abrigo do princípio do contraditório, foi a Autora notificada da contestação e para, querendo, responder, em 10 dias, à matéria de excepção alegada pelo Réu B., o que a Autora efectuou por meio de articulado constante de fls. 39-42 dos autos, pugnando a final pela improcedência das ditas excepções.

  3. Dispensada a realização de audiência prévia, foi lavrado despacho saneador (julgando improcedente a excepção de incompetência em razão da matéria do tribunal), foi dispensada também a fixação do objecto do litígio e dos temas de prova, foram admitidos os meios de prova oferecidos pelas partes e designada data para a audiência de julgamento.

  4. Efectuado o julgamento, veio a ser proferida sentença que: i. declarou resolvido o contrato de arrendamento celebrado entre a Autora e os 1.º e 2ª réus, relativo à fracção autónoma id. correspondente ao R/C esquerdo do Bloco 2 do Bairro do Atlântico, inscrito na respectiva matriz predial sob o artº 4.288º.

    ii. condenou os réus B. e E. a despejar, imediatamente, o imóvel mencionado em a), livre de pessoas e bens, e a entregá-lo à autora.

    iii. condenou os mesmos réus B., E. e D. a pagar à A. a quantia de € 2.706,54 (dois mil setecentos e seis euros e cinquenta e quatro cêntimos), bem como a rendas vincendas até trânsito em julgado da decisão e o valor de € 161,57 por cada mês de ocupação [correspondente ao valor actual da renda], a título de indemnização, até efectiva entrega do locado.

    * * 6. Inconformado com a aludida sentença, veio o Réu B. a interpor recurso da mesma, deduzindo as seguintes conclusões recursivas: a)- Vem presente recurso interposta da sentença que declara resolvido o contrato de arrendamento entre AA. e RR. e condena os RR ao pagamento da quantia de dois mil setecentos e seis euros e cinquenta e quatro cêntimos, bem como das rendas vincendas.

    b)- O imóvel arrendado não permitia uma utilização plena do mesmo, e nestes termos, suspende-se o dever de pagamento da renda quando a falta de condições de habitabilidade não permita ao prédio realizar cabalmente o fim a que é destinado.

    c)- Os factos que fundamentam a excepção invocada encontram-se especificamente narrados na contestação.

    d)- A A. não respondeu à excepção invocada em qualquer momento processual, nem sequer fazendo prova da inexistência dos factos elencados que suportam a excepção. Assim, e desde logo se entende que admitem tais factos, pelo que, tal deveria ser atendido em sede de sentença, o que não sucedeu.

    e)- A testemunha Núria, com referência à acta do dia 26 de Junho de 2015 [depoimento gravado no sistema de gravação digital - H@bilus Média Studio - desde 00:00:01 a 00:07:76.], foi clara em manifestar que nada sabe acerca do estado real do imóvel.

    f)- Aliás, a testemunha informa que “há inspecções periódicas ao local”, no entanto não soube esclarecer qual a periodicidade, atestando que não foram feitas obras no interior do imóvel que o R. habita, o que corrobora os seguintes artigos da conclusão.

    g)- Ora perante este testemunho e perante a admissão da Ré dos factos vertidos na contestação entende-se não haver fundamentação quanto à matéria dada por não provada.

    h)- Muito pelo contrário. Entendemos que, os factos não provados a), b), c), d), e e) deveriam ser dados por provados.

    i)- Assim, não se entende o percurso lógico feito nem o que fundou a convicção do Tribunal em tais juízos.

    j)- Termos pelos quais: deverá ser a sentença tida como nula por falta de fundamentação, assim não se entendendo, deverá a factualidade não provada descrita de a) a e) ser dada como provada, sendo julgada procedente a excepção invocada pelo Réu, dando consequentemente a acção de despejo como improcedente.

    * * 7. Por seu turno, a Recorrida apresentou contra-alegações, nas quais pugnou pela improcedência da apelação e pela manutenção da sentença recorrida.

    * * Após os vistos legais, cumpre decidir.

    * * II – FUNDAMENTOS.

    O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. arts. 635º, n.º 3, e 639º, nºs 1 e 2, do NCPC.

    * No seguimento desta orientação, cumpre decidir.

    Neste âmbito, em função das conclusões recursivas as questões que se colocam são as seguintes: 1º nulidade da sentença por falta de fundamentação (quanto à matéria julgada como não provada na sentença recorrida).

    1. alteração da factualidade julgada como não provada na sentença recorrida; 3º excepção de não cumprimento.

    * * III – FUNDAMENTOS de FACTO.

    Na sentença recorrida, foi julgada provada a seguinte factualidade (ipsis verbis): 1. A Autora é dona e legitima proprietária do prédio urbano sito na Avenida …, bloco 2, integrado no denominado “Bairro…”, inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo 4.288º.

  5. Mediante contrato escrito, a autora deu de arrendamento aos 1º e 2ª réus, para fins habitacionais, o rés-do-chão esquerdo do prédio identificado no artigo precedente, pelo prazo de seis meses, renovável por iguais períodos, com início no dia 01 de Agosto de 2009, mediante a renda mensal de € 150,00, a pagar nos primeiros oito dias do mês a que disser respeito, na secretaria da autora.

  6. Em virtude das actualizações anuais legalmente previstas, a renda do referido locado foi de € 154,79 por mês a partir de 01 de Janeiro de 2012, de € 159,99 a partir de 01 de Janeiro de 2013 e de € 161,57 a partir de 01 de Janeiro de 2014.

  7. Os réus não pagaram à autora parte da renda relativa ao mês de Junho de 2012, no montante de € 18,52, bem como a totalidade das rendas respeitantes aos meses de Julho, Agosto, Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro também de 2012, como também não pagaram a totalidade das rendas respeitantes aos meses de Julho, Agosto, Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro de 2013, e também não pagaram parte da renda relativa ao mês de Abril, no montante de € 149,28, parte da renda relativa ao mês de Maio, no montante de € 6,78, e a totalidade das rendas relativas aos meses de Junho, Julho, Agosto e Setembro de 2014.

  8. Tudo num total de € 2.706,54, à data da interposição da presente acção.

    * * Por seu turno, na mesma sentença foi julgada como não provada a seguinte factualidade (ipsis verbis): a)- O locado apresenta inúmeros defeitos e necessita de obras urgentes, o que os 1º e 2ª réus já solicitaram por inúmeras vezes ao senhorio.

    b)- As portas do locado encontram-se partidas, com fendas por onde entram ratos, tendo os inquilinos de colocar várias ratoeiras na habitação.

    c)- O esgoto entope regularmente e funciona mal.

    d)- A canalização está gasta e a água sai turva do seu interior.

    e)- As janelas são em madeira, cujos vidros estão partidos, que se encontram em mau estado de conservação, entrando as intempéries para a habitação.

    * * IV – FUNDAMENTAÇÃO de DIREITO.

    4.1. Da nulidade da sentença por falta de fundamentação: A primeira questão que, por razões de ordem lógica, cumpre conhecer e decidir reporta-se à alegada nulidade da sentença por falta de fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, em concreto, quanto à factualidade que, na sentença recorrida, foi julgada não provada. – vide conclusões g)- e j)- da apelação.

    Decidindo.

    A propósito da nulidade da sentença reza o art. 615º, n.º 1 al. b)- do CPC., que a sentença é nula quando «não especifique os fundamentos de facto e de direito e que justificam a decisão;» (sublinhado nosso) Por seu turno, quanto à fundamentação da sentença, preceitua o art. 607º, n.º 4 do mesmo Código que «na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, (...) e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção...» No que se refere à fundamentação da convicção subjacente à decisão de facto constitui ela, sem dúvida, uma das mais delicadas, significativas (e espinhosas) vertentes da intervenção do juiz do processo, porquanto, mais do que um mero acto mecânico de declaração dos factos provados e não provados, é indispensável que o julgador explicite as razões pelas quais optou por uma determinada decisão da matéria de facto provada e/ou não provada em detrimento de outra.

    A explicitação cabal destas razões (enquanto forma que melhor exprime o âmago da actividade jurisdicional) exige sempre a análise crítica das provas e a especificação de todos os demais fundamentos decisivos para a convicção do juiz, que devem, por isso, sempre figurar na dita fundamentação da decisão.

    Neste sentido, a fundamentação da sentença constitui, não só, um imperativo constitucional (cfr. art. 205º da Constituição da República Portuguesa), mas, ainda, um instrumento de compreensão da decisão por parte...

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