Acórdão nº 2248/12.6TBVCT-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA PURIFICA
Data da Resolução02 de Maio de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES – I.Relatório Banco, SA exequente nos autos de execução supra identificados que correm seus termos no Tribunal da Comarca de Viana do Castelo-Instância Local- Secção Cível-J4 em que são executados JL, Lda.; José C e Maria M veio interpor recurso de apelação da seguinte decisão proferida na execução: “A entrega do veículo objecto do contrato de locação financeira subjacente à emissão da livrança reconduz-se a uma dação "pro solvendo" que não extinguindo imediatamente a dívida, pode determinar a sua extinção total ou parcial, condicionada à efectiva satisfação do credor e na medida dessa satisfação.

Se é certo que a obrigação do avalista subsiste independentemente da obrigação do avalizado, também é certo que o avalista responde na mesma medida que a pessoa por ele afiançada (art.º 32º da LULL, por remissão do art.º 77º, último parágrafo).

Aderindo ao entendimento que a jurisprudência tem perfilhado, entende-se que o avalista poderá opor ao credor a excepção de liberação por extinção total ou parcial da obrigação do avalizado, quer pelo pagamento ou outra forma de satisfação da dívida, incluindo a dação em pagamento ou cumprimento, desde que o portador seja o mesmo em relação ao qual o avalizado extinguiu, ainda que parcialmente, a sua obrigação (neste sentido, a título meramente exemplificativo, Acórdãos do STJ, de 27/04/1999 e 24/01/2008).

Nestes termos, defiro o requerido pelos executados, ordenando a notificação do exequente para, no prazo de 10 dias, vir informar se o veículo foi vendido, e, em caso afirmativo, qual o valor da venda “ Não foram apresentadas contra-alegações.

O recurso foi recebido como recurso de apelação, com subida imediata, em separado e efeito meramente devolutivo.

Nas alegações de recurso que apresentou, o apelante formula as seguintes conclusões: [transcrição]: 19. A presente execução tem como título executivo uma livrança, que titula o montante que se encontra em dívida pelo incumprimento de um contrato de locação financeira celebrado entre o exequente/recorrente e a sociedade executada “JL, Lda.”, onde se incluem não só as rendas em dívida, mas também a indemnização pelo incumprimento do contrato – cf. requerimento executivo.

19.1. No momento processual próprio, tanto a sociedade subscritora da livrança, “JL, Lda.”, como os avalistas executados José C e Maria M, não colocaram em causa a existência da dívida titulada pela livrança dada à execução.

19.2. Apenas após o decurso de mais de um ano desde a entrega do veículo automóvel objecto do contrato de locação financeira (4 de Junho de 2014) caucionado pela livrança, mais propriamente a 23 de Setembro de 2015, é que os executados José C e Maria M alegaram, através de mero requerimento, que esta entrega tratava-se de uma dação, com virtualidade extintiva da obrigação principal subjacente à livrança dada à execução – cf. requerimento com a referência electrónica 20603677.

19.3. A invocação de uma causa extintiva da obrigação jurídica alvo de execução, como é o caso da dação “pro solvendo”, deve ser feita por apenso à acção executiva, através de embargos de executado (artºs. 728.º e ss. do CPC).

19.4. Os embargos de executado tratam-se de um incidente declarativo que permite que os princípios da igualdade de armas e do contraditório vigorem, de modo a verificar se existe ou não uma causa extintiva da obrigação jurídica exequenda.

19.5. Se os executados não respeitam o ónus de excepcionar, imposto pelo art. 728.º do CPC, estão a admitir a existência da obrigação jurídica exequenda, nos precisos termos invocados pelo exequente, formando-se caso julgado formal a este respeito (art. 580.º n.º 1, 2.ª parte do CPC).

19.6. Por essa razão, quando o Tribunal a quo admitiu a pretensão dos executados, deduzida por mero requerimento, ordenando que o recorrente informasse se vendeu o veículo locado e que lhe foi devolvido, violou o caso julgado formal quanto à existência da obrigação jurídica exequenda, ou, pelo menos, quanto à inexistência de uma dação pro solvendo.

19.7. Deste modo, não só é legítima a interposição deste recurso, por força do art. 629.º n.º 2, al. a) do CPC, como também é ilegal o despacho proferido pelo Tribunal a quo a 20 de Outubro de 2015 – cf. despacho de 20/10/2015, de que se recorre.

19.8. Mesmo partindo do princípio (errado) que na acção executiva vigoram os princípios da igualdade de armas e do contraditório e admitindo que não se formou caso julgado formal quanto à existência da obrigação jurídica exequenda, o despacho de que se recorre sempre será ilegal, por ordenar a emissão de um meio de prova inadmissível.

19.9. A acção executiva não tem como finalidade verificar a existência do direito de crédito com base no qual é instaurada, partindo-se do princípio que existe.

19.10. O Tribunal a quo extravasou os seus poderes cognitivos quando admitiu o requerimento dos executados José C e Maria M, o que é cominado com nulidade (art. 195.º n.º 1 do CPC).

19.11. O despacho proferido pelo Tribunal a quo, a 20 de Outubro de 2015, só poderia ser compreensível se fosse suposto ter poderes cognitivos para analisar a existência do direito de crédito exequendo, mesmo não sendo deduzido o incidente declarativo com esta finalidade específica, que designamos por embargos de executado.

19.12. Nesta hipótese, com a qual não concordamos, mas que não podemos deixar de colocar, seremos obrigados a analisar o despacho de que se recorre como um acto processual que inaugura uma fase processual declarativa na própria acção executiva, conformado por um determinado objecto do litígio, que seria saber se houve ou não uma dação “pro solvendo” e por temas da prova reconduzíveis aos pressupostos desta figura extintiva de obrigações jurídicas (art. 410.º do CPC e art. 840.º n.º 1 do CC).

19.13. O problema é que é manifestamente improcedente a alegação de que a entrega ao exequente/recorrente do veículo automóvel, que foi objecto de um contrato de locação financeira, constituiria uma dação “pro solvendo”, ao contrário do que é dito no despacho de que se recorre: “A entrega do veículo objecto do contrato de locação financeira subjacente à emissão da livrança reconduz-se a uma dação “pro solvendo” (…)”.

19.14. De tal forma que se estivéssemos perante embargos de executado, poderiam ser liminarmente indeferidos por manifesta improcedência (art. 732.º n.º 1, al. c)).

19.15. Não estando perante embargos de executado, o Tribunal a quo não pode erigir como matéria relevante para a justa composição do litígio saber se o recorrente vendeu o veículo automóvel que sempre lhe pertenceu e que lhe foi devolvido, por força do incumprimento do contrato de locação financeira.

19.16. A locação financeira constitui na esfera jurídica do locatário um direito pessoal de gozo, por tempo certo, de um determinado bem (art. 1.º do Regime Jurídico do Contrato de Locação Financeira).

19.17. Este direito pessoal de gozo só se consolida num direito real de propriedade se todas as rendas estipuladas forem pagas, bem como for pago o valor determinado para a aquisição do bem, uma vez decorrido o período de vigência do contrato (art. 1.º do mesmo diploma legal).

19.18. No caso concreto, a sociedade locatária “JL, Lda.” Não pagou todas as rendas a que se tinha vinculado, nunca se tendo formado na sua esfera jurídica a possibilidade de adquirir o bem locado.

19.19. Por isso, outra alternativa não lhe restava que não fosse devolver o bem (art. 10.º n.º 1, al. k) do Regime Jurídico do Contrato de Locação...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT