Acórdão nº 1447/12.5TTBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Maio de 2016
Magistrado Responsável | S |
Data da Resolução | 02 de Maio de 2016 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Guimarães: RELATÓRIO A.: Comissão de Trabalhadores da B., EM R.: B…, EM.
A A. demandou a R. alegando que esta reduziu unilateralmente o vencimento dos 15 trabalhadores identificados nos meses de 2011, redução que se manteve no ano de 2012, não tendo igualmente pago total ou parcialmente os subsídios de férias e de natal. No entanto, a diminuição das retribuições e o não pagamento de subsídios não tem qualquer repercussão na redução do défice público, antes representa um enriquecimento directo dos accionistas privados da ré, pois que os valores peticionados nesta acção não foram nem serão entregues nos cofres do Estado. Acresce que a ré não consta da Conta Geral do Estado para 2011, documento onde estão registadas todas as despesas e receitas da administração pública e de todos os seus subsetores, incluindo a administração local e regional, pelo que não se mostra abrangida pelas medidas de controlo de défice público. Por outro lado, a ré não lançou mão do regime de adaptação previsto no art.º 19º, n.º 9, al. t) da Lei n.º 55-A/2010, como podia e deveria ter feito. Acresce que o volume de negócios da ré tem vindo a aumentar, tendo obtido resultados líquidos do exercício positivos nos anos em causa.
Com estes fundamentos pediu a condenação da R.: a. a pagar a cada um dos trabalhadores discriminados nos documentos que junta os valores ali constantes, acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos a calcular à taxa legal supletiva até integral pagamento, ou, em alternativa, os mesmos valores, na proporção da participação dos accionistas privados no seu capital social, igualmente acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos a calcular à taxa legal supletiva até integral pagamento; b. a pagar a parte da remuneração ou de quaisquer subsídios que venha a reduzir, suspender ou reter a qualquer um dos seus trabalhadores após a propositura da presente acção; c. a adaptar à sua natureza empresarial a aplicação das Leis n.º 55-A/2010 de 31 de Dezembro e 64-B/2011 de 30 de Dezembro, por forma a não aplicar aos seus trabalhadores quaisquer reduções ali previstas, com efeitos retroactivos à data da sua entrada em vigor.
* A R. contestou, alegando que a A. não expõe os fundamentos de direito da sua pretensão, pois o que no fundo pretende é apenas a impugnação das Leis do Orçamento de Estado para os anos de 2011 e 2012, pretensão essa que não poderá ter qualquer atendimento na jurisdição laboral. Para além deste ponto, considerando que a ré é uma empresa local, integrante do sector empresarial municipal, norteada pela prossecução do interesse público, não tendo autonomia financeira e patrimonial, todo o universo laboral da ré encontra-se abrangido pelo âmbito subjectivo das apontadas Leis de Orçamento, como decorre da própria LOE/2011 ao considerar abrangidos pelas suas disposições os trabalhadores das entidades que integram o sector empresarial municipal. Desta feita, o regime previstos nas LOE em causa têm natureza imperativa e excepcional, prevalecendo sobre quaisquer outras normas em contrário e sobre IRCT e contratos de trabalho, pelo que a ré tão somente actuou em obediência a tais comandos legais, atendendo ao principio da legalidade. Por último, o regime de adaptação invocado pela A. apenas é efectuada pelos titulares dos órgãos executivos próprios da administração local, no caso o Presidente da Câmara Municipal de …, ao abrigo do princípio da discricionariedade, extravasando a capacidade de exercício da ré, sendo ainda insindicável pela jurisdição administrativa, atenta a natureza do mesmo, a decisão quanto à aplicação de tal regime.
* Respondeu a A. alegando que, como resulta da PI, o que se pretende com a ação é aferir da legalidade da redução dos vencimentos dos trabalhadores da ré, uma vez que daí resulta uma flagrante inconstitucionalidade e deturpação do espírito da Lei do Orçamento de Estado. Acresce que a ré não procedeu à adaptação como impõe a LOE/2011, sendo que é a própria ré quem sustenta a imprescindibilidade de tal regime de adaptação, pelo que com tal alegação contradiz todos os argumentos apresentados em contestação.
* Em 2013 o Tribunal proferiu decisão declarando-se materialmente incompetente.
A A. recorreu, vindo a Relação, então do Porto, a dar provimento ao recurso, declarando-o competente e ordenando a prossecução dos autos.
* Efetuado o julgamento, o Tribunal a quo julgou a acção parcialmente procedente e decidiu: 1. Condenar a ré a pagar a cada um dos trabalhadores discriminados nos documentos que a autora juntou os valores ali constantes, na proporção da participação dos accionistas privados no seu capital social, acrescidos de juros de mora a calcular à taxa legal supletiva desde a citação até integral pagamento; 2. Condenar a ré a pagar a parte da remuneração ou de quaisquer subsídios que venha a reduzir, suspender ou reter a qualquer um dos seus trabalhadores após a propositura da presente acção, ao abrigo das Leis nº55-A/2010 de 31 de Dezembro e 64-B/2011 de 30 de Dezembro, na proporção da participação dos accionistas privados no seu capital social, acrescida de juros de mora a calcular à taxa legal supletiva desde a citação até integral pagamento; 3. No mais, absolver a ré dos pedidos contra si formulados.
* Inconformada, a A. recorreu, concluindo: 1. Não estando em crise a condenação já operada e atendendo aos argumentos utilizados na sentença, podia e devia o pedido ser julgado totalmente procedente.
2. Contrariamente ao decidido a Ré não contribui para as contas gerais do Estado.
3. A Ré nunca constou das Contas Gerais do Estado (e para o que ora interessa desde 2011 até à presente data).
4. No documento das contas públicas do Estado estão registadas todas as despe-sas e receitas da administração pública e de todos os seus subsectores, incluindo a admi-nistração local e regional, e encontram-se elencadas todas as empresas afectas ao sector público empresarial local cujas contas se repercutem nas despesas públicas a diminuir.
5. Não obstante constarem diversas sociedades com o mesmo objecto a Ré não consta dessa lista! 6. Pelo que é o próprio Estado a reconhecer que a Ré não é abrangida pelas medidas de controlo do défice público.
7. Na última lista publicada pelo INE verificamos que a Ré (B…, EM) continua a não fazer parte das entidades do setor institucional das administrações públicas.
8. O legislador reconhece que a Ré não está abrangida pelas medidas de controlo do défice público.
9. Por este motivo deveria a ação ser julgada totalmente procedente.
10. Por outro lado, apenas são permitidas as reduções salariais no que se refere a empresas privadas de capitais públicos ou maioritariamente públicos, se estas permitirem uma diminuição do défice do Estado ou para o interesse público.
11. É certo que sentença fundamenta desta forma a aplicação constitucional das leis orçamentais, certo é também que depois não tira as devidas consequências e aplicação ao caso concreto.
12. Ficou provado que as quantias retidas não foram entregues ao Estado (cfr. 22 da matéria de facto provada).
13. Não tendo sido entregue quaisquer quantias ao Estado, por maioria de razões, estas nunca contribuíram para a diminuição do défice.
14. Também não se diga que se verifica o interesse público, pois nenhum facto resultou provado neste sentido.
15. Na esteira das decisões constitucionais já supra referidas, apenas podem ser aceites estas reduções quando o objectivo da diminuição do défice público esteja presen-te, pelo que caberia à Ré fazer a prova do cumprimento desse objecivo o que claramente não se alcançou no presente processo nem resulta dos factos dados como provados.
16. Nem mesmo indiretamente. – até porque nada foi devolvido.
17. Refira-se que quanto a este argumento, mesmo a entender-se que a divisão de dividendos pela CMB, a existir, constituiria sempre um ativo para o erário público, - o que in casu - não se concede, estaríamos perante uma forma tão indireta ou excessiva-mente indireta, que não seria admissível, até por violadora da garantia fundamental do direito à retribuição previsto no artº 12º da Constituição.
18. Também aqui concordamos com a fundamentação da sentença, quando a este assunto se refere (anotação 10), no entanto, mais uma vez, apesar de fazer uma correta abordagem, como devido respeito por opinião contrária, depois não reflete esses mesmos argumentos na decisão proferida.
19. Dos factos provados resultou que as quantias retidas se traduziram na constituição de reservas e num acréscimo de dividendos a distribuir, sendo certo que as reservas legais numa sociedade seguramente não representam diminuição do défice.
20. Pois no âmbito das sociedades privadas, mesmo de capitais maioritariamente públicos, a distribuição dos lucros não se faz necessariamente na proporção das partici-pações sociais, pelo que, não existindo nenhuma prova sobre esse facto, nunca poderia ter sido decidido que das retenções operadas nos salários, 49% foi distribuído aos particulares.
21. Não se aceita, assim, que apenas se tenha condenado a Ré a restituir o correspondente a 49% das diminuições efetuadas.
22. Em conclusão, nenhuma prova há que permita afiançar, com a certeza que as decisões de condenação têm de ter que, das retenções efetuadas nos salários dos trabalhadores representados pela A., 51% destinaram-se a diminuir o défice do Estado.
23. Por outro lado, considerou a sentença que não poderia condenar a Ré a pagar a parte da remuneração ou de qualquer subsídio que a Ré viesse a reduzir a qualquer dos seus trabalhadores após a propositura da presente acção, pois isso implicaria uma concreta análise das normas legais posteriores.
24. Não poderíamos estar em mais desacordo, desde logo porque cabe ao Tribunal aplicar a lei e, nesse sentido, fazer uma apreciação das normas legais vigentes à data da prolação da sentença – in casu, leis de Orçamento - para apreciação do pedido formulado.
25. O Tribunal entendeu que só poderia analisar a...
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