Acórdão nº 13/14.5T8PTL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelHELENA MELO
Data da Resolução19 de Abril de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães: I - RELATÓRIO Banco X, S.A., antes denominado Banco Y SA, intentou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra Miguel, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 15.170,39€, acrescida, de juros de mora vencidos até à data em que foi proposta a acção, às taxas de juro convencionadas entre as partes (incluindo a cláusula penal), bem com o imposto de selo sobre este montante de juros, e o pagamento dos juros de mora vincendos, calculados às mesmas taxas, até integral pagamento, e do imposto de selo sobre o montante dos juros.

Para tanto, alegou, em síntese, o seguinte: No exercício da sua actividade, celebrou com o R. um contrato de mútuo, em virtude do qual lhe disponibilizou a quantia de 21.450,00€ ( para aquisição de um veículo automóvel), sendo que aquele se obrigou a pagar mensalmente a prestação convencionada, até integral pagamento da quantia mutuada e demais acréscimos convencionados.

Mais alegou que o R. deixou de pagar as prestações a que se obrigou, e que se venceram, todas as restantes, tendo as partes acordado expressamente que nas prestações consideradas vencidas incluir-se-iam os juros remuneratórios, e demais encargos incorporados em cada prestação.

Conclui, afirmando que lhe assiste, face ao incumprimento do R, e nos termos do acordado, o direito de receber as quantias peticionadas.

O R. aceitou a celebração do acordo, confessando que deixou de pagar as prestações em virtude de ter deixado de trabalhar, por problemas de saúde, tendo requerido a reforma por invalidez, mais sustentando que, face ao seguro celebrado aquando do contrato de mútuo, os pagamentos ora peticionados devem ser exigidos à K Companhia de Seguros, S.A. requerendo a sua intervenção.

Respondeu o A. pugnando pela condenação imediato no pedido face à confissão de dívida, pelo R., das quantias em causa, avançando, ainda, que a seguradora declinou a responsabilidade nesta situação anulando, na sequência, da participação efectuada, o competente contrato.

Admitida a intervenção, veio a K contestar, alegando que o contrato de seguro em causa não cobre esta situação, uma vez que a incapacidade que afecta o R. é anterior à celebração do contrato.

Invocou ainda que declinou qualquer responsabilidade e procedeu, dadas as declarações inexactas dos R. aquando da celebração do contrato, à anulação do certificado individual, o que comunicou ao R. em 21.4.2014, tendo emitido o competente estorno a seu favor.

Foi proferido despacho saneador/sentença com o seguinte teor decisório: “- Julgar totalmente procedente a presente acção, condenando o R. Miguel a pagar à A as quantias peticionadas, incluindo juros vencidos e impostos de selo até à data de entrada da acção, num total de 16.219,32€, quantia acrescida dos juros de mora vencidos desde a data de entrada da acção e vincendos sob o capital reclamado, até integral pagamento, e respectivos impostos de selo que sobre esses juros recaírem, tudo nos termos peticionados.” O R. não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, onde formulou as seguintes conclusões: 1º O Réu, nunca negou a celebração do contrato de mútuo e que deixou de pagar as prestações, não concorda porém com a condenação no pagamento de todas as quantias peticionadas pela Autora, em particular com os juros remuneratórios.

2.º A questão em torno dos juros remuneratórios foi amplamente discutida na Doutrina e vertida em Jurisprudência abundante, que culminou com o acórdão de uniformização, do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 25.03.2009 que expressamente declarou a não obrigação de liquidação de juros remuneratórios incorporados nas prestações de um contrato de mútuo, no qual se verifica a perda do benefício do prazo.

3.º Através do Decreto-lei 133/2009 de 02 Junho, novas discussões surgiram em torno desta questão, porém, atendendo ao dispositivo do referido D.L., parece-nos que as alterações introduzidas visam trazer maior protecção dos consumidores e maior responsabilização dos credores em matéria de concessão de crédito ao consumo.

4.º Pelo que, não nos parece fazer qualquer sentido o entendimento de que estando previsto no contrato de mútuo a imputação de juros remuneratórios em caso de perda de benefício do prazo contratual, estes possam ser cobrados, sob pena de se desvirtuar o objectivo crescente de protecção do consumidor, face a este tipo de contratos.

5.º Nessa medida parece-nos que, o entendimento do tribunal deste Tribunal da Relação de Guimarães, como exposto no acórdão de 13.01.2011, em dgsi.pt a que faz referência o acórdão do Tribunal Relação de Lisboa de 07.02.2013, em dgsi.pt, vai de encontro ao que se pretendeu com as alterações legislativas: A cláusula de contratos de empréstimo em que se prevê que o mutuante, perante a falta de pagamento de três ou mais prestações sucessivas, possa considerar vencidas todas as restantes prestações incluindo nelas juros remuneratórios, nada mais diz, devidamente interpretada, do que outras cláusulas antigas já diziam, ou seja, de que “no valor das prestações estão incluídos o capital [e] os juros de financiamento […]” E, quanto a estas, o AUJ do STJ, nº. 7/2009, já tinha esclarecido que não tinham o poder de incluir, no vencimento antecipado, também os juros remuneratórios.

Isto se não se entender, mais simplesmente, que essas cláusulas nem sequer devem ser consideradas admissíveis nos contratos de crédito ao consumo.

(…) Pelo que são nulas as cláusulas que contrariem a interpretação dessa norma, o que se declara quanto à Cláusula 7ª, alínea b), na parte em que faculta ao credor exigir juros remuneratórios sobre as prestações que se venceram imediatamente por via da invocação da perda do benefício do prazo.” 6.º E assim, também, se entendeu no acórdão de 12.02.2015 do tribunal da relação de Évora: Em suma, se o credor quiser receber os juros remuneratórios até ao termo do contrato pode optar por não desencadear a perda do benefício do prazo; fazendo o, não pode exigir a remuneração associada à disponibilização do crédito durante o período de tempo contratualmente previsto, independentemente de cláusula estipulada nesse sentido pelas partes.

7.º Cremos que, não obstante não ter sido invocado, deveria ter sido apreciada a validade do contrato e das cláusulas nele vertidas, em especial a referida cláusula 7.b, que previa a contabilização de juros remuneratórios, concluindo-se pela sua nulidade, nessa parte, pois a causa, tem de ser julgada conforme for de direito.

8.º Como refere o tribunal a quo na fundamentação de direito, “incumbia-lhe durante aquele prazo e daquela forma, proceder à restituição de igual montante acrescido de juros remuneratórios, calculados à taxa acordada, tal como estipulado entre as partes, cf, art. 1145 do código civil) ” 9.º A contabilização dos juros remuneratórios faz sentido se o contrato vencesse na data que estaria prevista, 10.º Se a tendência é a protecção cada vez maior dos consumidores, o que se tem revelado e que será mais latente nas alterações que se prevêem levar a cabo no crédito à habitação, em consonância com diretivas europeias, incluindo um período de reflecção alargado, durante o qual as condições propostas pela entidade bancária se têm de manter e ainda a possibilidade de o consumidor se poder arrepender, mais nos faz pensar que as alterações levadas a cabo naquele DL 133/2009 de 02 Junho nunca poderiam interpretar-se em sentido prejudicial ao consumidor.

11.º Pelo que deverá este Tribunal julgar nula tal cláusula na parte indicada, nulidade que expressamente se invoca, e o recorrente absolvido do pagamento dos juros remuneratórios, alterando-se, ainda, a decisão no sentido de ser liquidado em execução de sentença o valor efectivamente em dívida pelo Recorrente, pois a Recorrida na petição inicial não diferencia os valores incluídos no somatório.

Termos em que declarando-se a nulidade parcial do artigo 7.º b) das condições gerais do contrato de mútuo, e o Recorrente absolvido do pagamento dos juros remuneratórios, sendo o Recorrente condenado no valor que vier a liquidar-se em execução de sentença, farão V. Exc.as inteira e costumada justiça.

O Banco C., S.A. contra-alegou, invocando que o apelante apenas suscitou a questão que pretende ver apreciada em sede de recurso e nunca antes, pelo que constituindo questão nova o tribunal da Relação não deverá apreciá-la. No entanto, se assim não se entender, não assiste razão ao apelante, devendo ser confirmada a decisão recorrida.

II – Objeto do recurso Considerando que: . o objeto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado a este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso; e, . os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu acto, em princípio delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, as questões a decidir são as seguintes: . se o tribunal da Relação pode conhecer da questão nova suscitada apenas nas alegações de recurso relativa à nulidade da cláusula 8ª, b) do contrato celebrado entre as partes e, em caso afirmativo, se a referida cláusula é nula.

III – Fundamentação Na 1ª instância foram considerados provados os seguintes factos: 1. O A., no exercício da sua actividade comercial, por contrato, celebrado nos...

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