Acórdão nº 450/18.6T8BRG-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelALCIDES RODRIGUES
Data da Resolução08 de Novembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório S. F. instaurou contra 1) Hospital X - Escala X - Sociedade Gestora do Estabelecimento S.A.; 2) Y - Companhia de Seguros, S.A., 3) Maria e 4) K Portugal - Companhia de Seguros, S.A., procedimento cautelar de arbitramento de reparação provisória, com os fundamentos expostos no requerimento inicial, peticionando a condenação dos Requeridos a pagar a renda mensal em valor não inferior a €1.000,00 (mil euros).

*As requeridas apresentaram oposição, pugnando pela improcedência da providência cautelar requerida (cfr. fls. 47 a 55, 89 a 93 e 97 a 130).

*Realizada a produção de prova, o Tribunal “a quo” julgou procedente a providência requerida e, em consequência, condenou solidariamente os requeridos a pagar a renda mensal de € 750,00 a título de reparação provisória do dano, conforme o n.º 3 do art. 388º do CPCivil até à data em que for proferida sentença no processo principal (cfr. fls. 172 a 177).

*Inconformadas com esta decisão, todas as requeridas dela interpuseram recurso.

*A Y – Companhia de Seguros, SA., formulou as seguintes conclusões (cfr. fls. 179 a 192): «1- Considerando as conclusões infra, as quais delimitam o objecto do recurso, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso (artigos 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1 e 608.º, n.º 2, do CPC), as questões essenciais a decidir são: Impugnação da decisão sobre a matéria de facto e, Dos pressupostos do decretamento do arbitramento de reparação provisória.

DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO: 2- O Tribunal a quo, de forma genérica e sem qualquer rigor, deu como não provada a factualidade alegada em sede de oposição por todas as requeridas.

3- Ora, salvo o devido respeito por melhor opinião, bastaria a prova documental junta aos autos para que a factualidade dada como não provada fosse outra.

4- E esta prova documental foi confirmada ao pormenor, quer pela 3ª requerida, em sede de declarações, quer pelas testemunhas indicadas pelo requerido hospital.

5- A factualidade dada como não provada deverá ser dada como provada in totum, o que se requer.

6- Assim, deverá ser dada como provada a seguinte factualidade: A paciente tinha indicação para repouso, no internamento.

A paciente no pós operatório imediato e já no internamento apresentou dor controlada.

Mais tarde referiu (já no período da manhã do dia seguinte), dor intensa na perna esquerda, motivo pelo qual a enfermagem contactou o serviço de anestesiologia.

A paciente foi observada pela 3ª Requerida pelas 10h40m e foi retirado o cateter epidural com reversão completa das queixas (dor irradiada ao membro inferior esquerdo com perda de força, cervicalgias e alguma fotofobia, não tendo referido cefaleias ou tonturas) – veja-se as notas do internamento do documento 4 junto.

Foi novamente observada pela 3ª Requerida cerca das 13h45m, estando assintomática, sem queixas significativas de cefaleias com a deambulação; Foi explicado à A. que se tratava de uma intercorrência, tendo-se aconselhado a ingestão de cafeína por estar indicada clinicamente para cefaleias.

No decurso do internamento, a paciente realizou medicação analgésica.

A alta foi dada estando a A. sem queixas significativas de cefaleias com a deambulação, motivo pelo qual não foi medicada para o domicílio.

Apenas em 19 de Agosto, referiu a A. pela primeira vez após a alta – cerca de um mês e uma semana após a cirurgia - dor lombar e cefaleias, pelo que lhe foi solicitada Ressonância Magnética (RMN) para confirmação de síndrome de hipotensão de liquor; Sendo que a A. apenas regressou ao Serviço em 25 de Setembro por cefaleias.

A A. nunca referiu parestesias, tonturas nem alodinia, circunscrevendo-se o quadro ao supra referido.

Neste último dia 25 de Setembro foi realizada RMN do crânio que afasta a hipótese diagnóstica colocada de síndrome de hipotensão de liquor; Os exames imagiológicos realizados e electromiografia comprovam que a Requerente não padece de qualquer lesão motivada pela punção acidental da dura mater.

A Requerente em Julho de 2015 – no mês posterior à cirurgia - não tinha quaisquer queixas de cefaleias ou perda de força nos membros inferiores tendo recorrido ao Serviço de Urgência do Hospital X por motivos conexos com a cirurgia realizada e não com os actos anestésicos.

Isto é, a Requerente não apresentava sintomas nem clinica compatível com aquilo de que se vinha queixando, quando examinada.

Foi observada pela especialidade de neurologia que descartou qualquer patologia do foro neurológico nomeadamente síndrome de hipotensão de liquor.

Daqui resulta que a punção acidental da dura mater não causou qualquer lesão à Requente, facto comprovado inequivocamente pelos exames imagiológicos realizados.

DA (IN)VERIFICAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS DA PROVIDÊNCIA: 7- Resulta do art. 388º os requisitos de que depende o deferimento da providência de arbitramento de reparação provisória: a)Uma acção de indemnização onde o eventual responsável dos danos será demandado e onde se terão que verificar os pressupostos cumulativos da obrigação de indemnizar, o facto, o dano e o nexo causal entre o facto e o dano e ainda, se for caso disso, a ilicitude e a culpa; b)A situação de necessidade do requerente; c)O nexo causal entre os danos sofridos e a situação de necessidade; d)Os indícios da obrigação de indemnizar por parte do requerido (que se consubstanciam na prática nos pressupostos da obrigação indemnizatória).

8- Note-se que esta prova sumária do bem fundado da pretensão pertence à requerente da providência. A esta incumbe provar, ainda que indiciariamente, que no processo principal irá com alguma verosimilhança vencer a sua pretensão.

9- Todos estes 4 requisitos são de verificação cumulativa e faltando algum deles esvai-se por completo a pretensão cautelar do requerente.

10- A responsabilidade civil por factos ilícitos tem como pressupostos ou elementos a ocorrência do facto ilícito, o dano, o nexo de causalidade entre o facto e o dano e a culpa do agente (artigos 483.º, 487.º n. o 2, 488.º, 562.º, 563.º do Código Civil).

11- Um dos requisitos que cai logo à partida consiste na probabilidade séria da existência do direito à indemnização invocado (fumus boni iuris), que terá de se extrair, através de um juízo de verosimilhança, da factualidade alegada e demonstrada nos autos.

12- Ora, ficou mais que provado através das declarações de parte da Dr.ª Maria que não omitiu nenhum comportamento devido, que actuou com a devida diligência, de acordo com as leges artis, isto é, actuou com a observância das normas e obrigações profissionais, bem como das regras de conduta aplicáveis ao caso concreto, afastando assim qualquer ilicitude e qualquer tipo de actuação culposa.

13- Ficou também provado que não existe qualquer nexo de causalidade entre o facto alegado pela requerente e o dano alegado.

14- Ao lesado compete, por regra, não só a prova da culpa do autor da lesão (artigo 487º, n.º 1, do CC), mas também o ónus de alegação e prova dos factos constitutivos do direito invocado (artigo 342º, n.º 1, do CC).

15- Ora, face à prova produzida neste procedimento cautelar, não poderia, obviamente, o Tribunal a quo considerar este pressuposto preenchido.

16- Para decretar a providência competia ao Tribunal, de acordo com o disposto no n.º 2 do art. 403º do CPC apurar a ocorrência de factos que indiciassem a existência da obrigação de indemnizar. O que, com o devido respeito, não conseguiu fazer.

17- Aliás, a requerente, em lado algum do seu requerimento inicial, invoca a existência de um nexo de causalidade entre a perfuração da dura-mater e as sequelas de que padece, nem tão pouco, foi feita qualquer prova – testemunhal e/ou documental – nesse sentido.

18- Note-se, os pressupostos de responsabilidade civil são cumulativos, claudicando um, caem todos.

19- No caso dos autos, não está um pressuposto em falta, mas sim 3! 20- Ou seja, dos factos provados e da motivação indicada na decisão recorrida não é possível concluir, mesmo que indiciariamente, que exista uma obrigação de indemnizar a cargo dos requeridos, advenientes de responsabilidade por acto médico.

21- Ou seja, não está sequer indiciada a obrigação de indemnizar por parte da requerida.

22- Pelo contrário, a realidade dos factos é incompatível com todas as pressuposições e hipóteses apresentadas e comprovam uma correcta actuação dos requeridos em rigoroso respeito das legis artis.

23- A principal razão que motiva esta providência é a necessidade económica e financeira da requerida em resultado das sequelas provocadas por um facto ilícito imputável ao médico.

24- Ora, com o devido respeito, este estado de necessidade ficou por provar.

25- Para além das testemunhas da requerente, mais nada foi apresentado.

26- Foi requerido pela ora recorrente que fosse oficiado o ISS, IP – Centro Nacional de Pensões para que indicasse a situação contributiva da requerente e se a mesma auferia subvenções, a que título, de que valor e até que data.

27- Requerimento ao qual a requerente se opôs, criando assim um maior obstáculo à procura da verdade material.

28- À falta de elementos trazidos aos autos por quem neles tinha interesse, atenta a repartição do ónus probatório: a requerente, sobretudo declaração de IRS, comprovativo emitido pelo Instituto de Segurança Social em como não recebia qualquer rendimento, vulgo subvenção, os requeridos requereram que o ISS, IP fosse oficiado no sentido de prestar essas mesmas informações.

29- Assim, por falta de prova e violação do princípio da repartição do ónus probatório, também este requisito/pressuposto não se encontra verificado em concreto.

DAS DISPOSIÇÕES JURÍDICAS VIOLADAS 30- Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo violou os arts. , , 411º e 388º, entre outros, todos do Código de Processo Civil, 342º e 483º, entre outros do Código Civil, TERMOS EM QUE: deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, ser a sentença que decretou a providência de arbitramento de reparação...

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