Acórdão nº 29/16.7T8PTL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 22 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA CRISTINA CERDEIRA
Data da Resolução22 de Novembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO L. C.

, G. M.

, M. V.

, D. C.

e M. F.

intentaram a presente acção popular, sob a forma de processo comum, contra C. R.

e mulher M. M.

, J. R.

e mulher M. P., pedindo que: a) se declare que o denominado “Caminho F.”, referido nos artºs 3º, 4º, 5º e 6º da petição inicial, é público; b) os Réus sejam condenados a removerem do leito do “Caminho F.” as duas cancelas mencionadas nos artºs 33º, 34º, 35º e 36º da petição inicial, dentro do prazo de 8 dias a contar do trânsito em julgado da sentença; c) os Réus sejam condenados a desobstruírem o “Caminho F.”, deixando-o totalmente livre e desimpedido para a passagem dos utentes; d) se fixe, a título de sanção pecuniária compulsória, o pagamento pelos Réus de uma importância, que sugerem não seja inferior a € 100,00 por cada dia de atraso na remoção das mencionadas cancelas e desobstrução do “Caminho F.”, a dividir, nos termos do disposto no artº. 829º-A, nº. 3 do Código Civil, pelos Autores e pelo Estado.

Para tanto alegam, em síntese, que são cidadãos no gozo dos seus direitos sociais e políticos, residentes na vila e freguesia de (...), concelho de Ponte de Lima.

No lugar de (...), freguesia de (...), existe um caminho público denominado “Caminho F.” que, tendo em consideração a orientação nascente/poente, tem início na estrada camarária nº. (...)-1, desemboca no caminho público denominado “Caminho C.”, tem o comprimento de cerca de 1000 metros e a largura média de 3 metros.

Acrescentam que, desde tempos imemoriais, este caminho é usado diariamente pelas pessoas da freguesia de (...), nomeadamente, as residentes nos lugares de (...), (...).

Este caminho, conhecido inicialmente por “Caminho A.”, porque por ele passavam as pessoas que se dirigiam ao lagar de azeite e alambique, situado no prédio urbano hoje dos Réus identificado no artº. 28º - alínea a) da petição inicial, era um caminho com cerca de dois metros de largura, permitindo a passagem a pé e com carro de gado.

Desde há cerca de 50 anos, ao longo do tempo, os proprietários confinantes com este caminho cederam parcelas de terreno para o seu alargamento até atingir a dimensão que hoje apresenta, sendo que o caminho sempre esteve pisado, calcado, duro e com leito definido e sempre foi utilizado pelos cidadãos da freguesia de (...) e de outras freguesias, quando nele precisavam de passar.

Referem, ainda, que há dezenas de anos era o caminho de acesso às minas do (...), quando estas laboravam, e ao fontanário de (...), para além de que as pessoas residentes nos lugares de (...) e (...) passam no “Caminho F.” para se dirigirem desde as suas casas de habitação à Igreja de (...), à Junta de Freguesia e aos demais locais públicos e privados da freguesia de (...), situados a nascente, passando naquele caminho também consortes de água de rega e lima, para tapagem e condução das águas, sendo estas passagens feitas publicamente, à vista de toda a agente, sem oposição de quem quer que seja, sem interrupções no tempo, e na fé de quem passa num caminho do domínio público da freguesia.

Após invocarem as obras que têm sido feitas, ao longo dos anos, pela Junta de Freguesia de (...) no aludido caminho, referem que os prédios dos RR. identificados no artº. 28º da petição inicial confinam com parte do “Caminho F.”, tendo aqueles, entre os dias 14 e 19 de Dezembro de 2013, vedado o dito caminho colocando duas cancelas de ferro - uma na estrema nascente e outra na estrema poente dos prédios dos Réus – sendo que, na cancela do lado nascente, os RR. colocaram uma fechadura com chave e na cancela do lado poente, uma corrente com cadeado, mantendo-as fechadas, pelo que os cidadãos utentes do “Caminho F.” estão impedidos de nele passarem no sentido estrada camarária nº (...)-1 – “Caminho C.” e vice-versa.

Em Dezembro de 2013 dezenas de moradores da freguesia de (...) entregaram um abaixo-assinado ao Presidente da Junta de Freguesia e à Presidente da Assembleia de Freguesia de (...), bem como ao Presidente da Câmara Municipal (...), solicitando a realização de diligências para a reposição do caminho público do (...), não tendo a Junta de Freguesia defendido os direitos e interesses dos seus cidadãos.

Foram afixados os editais previstos na lei e o Ministério Público, chamado ao processo, veio apresentar requerimento probatório oferecendo a prova testemunhal indicada pelos Autores.

Os RR. contestaram, impugnando a factualidade alegada na petição inicial e alegando que em finais de 2013, colocaram dois portões gradeados a fechar as entradas por onde é feito o acesso e passagem dos seus prédios no exercício do seu legítimo direito previsto no artº. 1356º do Código Civil.

Acrescentam que se trata de um caminho de consortes, com início na estrada camarária situada a nascente, que corre de nascente para poente e serve exclusivamente diversos prédios rústicos particulares, de diferentes donos, com várias entradas/saídas que para ele deitam e que entesta nos prédios dos Réus.

No espaço situado entre as duas cancelas que foram colocadas pelos RR. o que existe é um caminho particular próprio, que atravessa o interior de uma “Q.” que pertenceu, no seu todo, a um único dono – M. R. e mulher R. C., pais dos RR. – a qual foi partilhada em vida por estes, e hoje pertence aos Réus. Essa “Q.” corresponde aos prédios descritos nas verbas nºs 1, 6 e 8 da escritura de partilha em vida celebrada pelos pais dos RR. e seus filhos em 31/03/1992, sendo que o conjunto formado por esses prédios compreendia terrenos agrícolas, terrenos de monte e no centro a casa de morada de família, cobertos, anexos, eira, espigueiro, logradouro e ainda um lagar de azeite, um alambique e um moinho.

Referem, ainda, que estas instalações tinham muita freguesia, por causa do lagar e do moinho, e para facilitar o acesso e promover o negócio, o dono retirou as cancelas da entrada do lado nascente da propriedade, que dava acesso ao caminho de consortes e depois à estrada municipal, e da entrada do lado poente que deita para o “Caminho C.”. Aproveitando a existência dessas duas entradas sem cancelas, pessoas estranhas ao negócio do lagar e do moinho utilizavam essa passagem e atravessavam pelo interior da propriedade para encurtar distâncias, tempo e diminuir o cansaço, como era o caso dos pedreiros que trabalhavam em terrenos a nascente da propriedade e das mulheres que, a pé, lhes levavam o almoço – faziam-no por hábito, mera tolerância e por ser costume, servindo essa passagem de atravessadouro, não obstante os donos, por vezes se insurgissem contra os abusadores ou desconhecidos com ameaças ou até expulsão.

Mais alegam que foram sempre os RR. e seus antecessores quem zelou por esse caminho, o conservou e melhorou e referem que o saneamento foi colocado no caminho dos consortes referido no artº. 3º da contestação somente até à entrada nascente dos prédios dos RR., encontrando-se do lado de fora do respectivo portão a última caixa e respectiva tampa de ferro, sendo que a água pública também está canalizada através desse mesmo caminho e somente até à mesma entrada, onde está colocada a respectiva caixa.

Além da aquisição derivada, alegam, também, factos inerentes à aquisição originária, por via da usucapião, do direito de propriedade dos RR. sobre as parcelas A) a E) identificadas no artº. 55º da contestação, provenientes da divisão e demarcação dos mencionados prédios efectuada pelos Réus.

Deduziram, ainda, reconvenção pedindo que: (i) se declare que os RR. reconvintes J. R. e mulher M. P. são legítimos e exclusivos donos e possuidores das parcelas A, C e D descritas no artº. 55º da contestação; (ii) se declare que os RR. reconvintes C. R. e mulher M. M. são legítimos e exclusivos donos e possuidores das parcelas B e E descritas no artº. 55º da contestação, e do prédio descrito no artº. 54º - alínea c) do mesmo articulado; (iii) se declare que faz parte integrante desses prédios, o caminho particular de consortes, interior da primitiva quinta e actualmente nas condições descritas nos artºs 69º e 70º da contestação; (iv) os Autores sejam condenados a verem, acatarem e reconhecerem esses direitos dos Réus reconvintes e a absterem-se da prática de qualquer acto que os possa prejudicar, afectar ou violar.

Concluem, pugnando pela improcedência da acção e procedência do pedido reconvencional.

O Ministério Público replicou, impugnando os factos alegados na contestação/reconvenção.

Termina, pugnando pela improcedência do pedido reconvencional e procedência da acção.

Os AA. também apresentaram réplica, invocando a inadmissibilidade do pedido reconvencional na acção popular e impugnando os factos alegados pelos Réus.

Realizada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador, no qual foi admitida a reconvenção, tendo sido, ainda, identificado o objecto do litígio e enunciados os temas de prova, que não sofreram reclamações.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo.

Após, foi proferida sentença que julgou a presente acção improcedente e, em consequência, absolveu os Réus dos pedidos contra si deduzidos.

Mais julgou a reconvenção deduzida pelos Réus contra os Autores, sendo destes associado, como interveniente principal, o Ministério Público, procedente e, consequentemente: · Declarou a divisão do prédio inscrito na matriz predial sob o artigo ..., nas três parcelas (A, B e C) identificadas na alínea b) do ponto II.1., por remissão para a planta anexa e constante de fls. 326 dos presentes autos; · Declarou a divisão do prédio inscrito na matriz predial sob o artigo ..., nas duas parcelas (D e E) identificadas na alínea b) do ponto II.1., por remissão para a planta anexa e constante de fls. 326 dos presentes autos; · Tendo por referência aquela alínea e aquela planta, declarou que os Réus J. R. e mulher M. P., adquiriram, por usucapião, a propriedade das referidas parcelas A, B e C nos termos já delimitados e configurados supra; · Tendo por referência aquela...

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