Acórdão nº 6090/17.0T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Julho de 2018
Magistrado Responsável | ANA CRISTINA DUARTE |
Data da Resolução | 10 de Julho de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO José deduziu ação declarativa contra Jerónimo, Rosa, Ricardo e “C. C., Lda.” pedindo a condenação dos RR a reconhecerem: a) que celebraram com o autor os contratos supra referidos, cujo objectivo foi a constituição e o apetrechamento, com máquinas, pessoal e carteira de encomendas, da sociedade por quotas “C. C., Lda”; b) a inteira validade e subsistência dos negócios ajuizados, mercê dos quais o autor fez cessar a actividade da sociedade “Irmãos C. – Confecções, Lda”, para integrar todo o seu património activo (máquinas, aviamento, pessoal, carteiras de encomendas) na sociedade “C. C., Lda”; c) nenhum preço pagaram ao autor, nem à sociedade “Irmãos C. – Confecções, Lda”, em correspondência com a transmissão para a sociedade “C. C., Lda” das máquinas, pessoal, carteira de encomendas e do aviamento dessa sociedade para a sociedade “C. C., Lda”; d) os negócios celebrados entre o autor e os réus e acima descritos não foram gratuitos, nem se destinavam a sê-lo, antes tendo como objectivo final a transmissão para a propriedade do autor de todo o capital e património da sociedade “C. C., Lda”; e) o autor, não sendo o único sócio da sociedade “Irmãos C. – Confecções, Lda”, no entanto, era na prática o seu único senhor e dono, visto que geria com total autonomia todos os seus negócios, e auferia todos os proventos que a mesma gerava; f) conforme combinado com o autor este se comprometeu a pagar todas as dívidas de “Irmãos C. – Confecções, Lda”, designadamente de natureza fiscal e perante a Segurança Social, como condição de, satisfeito esse passivo, o capital social da sociedade “C. C., Lda” ser transmitido para o autor; g) mercê do cumprimento pelo autor de todas as obrigações por ele assumidas, e do seu próprio incumprimento, deviam, conforme o contratado, transmitir para o autor todo o património e quotas da sociedade “C. C., Lda”.
h) mercê do incumprimento imotivado do que livremente contrataram com o autor, este sofreu elevados danos não patrimoniais, descritos supra, 2- E, em consequência, os réus condenados a pagar ao autor : a) indemnização pelos danos não patrimoniais por si sofridos de montante não inferior a 50.000,00€; b) indemnização por danos patrimoniais, a liquidar em execução de sentença, correspondente ao valor da sociedade “C. C., Lda”, integrada de todos os incrementos patrimoniais que lhe haviam sido transmitidos a partir da sociedade “Irmãos C. – Confecções, Lda”, designadamente dos bens e património desta, pelo menos a título de enriquecimento sem causa, visto que o seu património foi enriquecido com os bens e património do autor, sem causa justificativa, uma vez que os réus se apoderaram desses bens sem nada pagar ao autor património por ela transmitidos, e ao valor actual desta última sociedade.
Na petição inicial para fundamentar a sua pretensão e em síntese invocou que: 1 - Os 1º a 3ºRR constituíram a sociedade C. C. lda por forma tal que o autor viesse a ser futuramente o seu único e verdadeiro dono o que esconderam sob a capa de uma sociedade em que esses réus fingiam ser os sócios constituintes da mesma quando na verdade não o eram nem queriam ser e que a sociedade C. C. recebeu integralmente os bens ativos da sociedade Irmãos C. e pessoal que nesta trabalhava e as respectivas encomendas.
2 - Que a sociedade C. C. nunca cumpriu quaisquer obrigações contratuais pois o acordo era o de após o autor lograr pagar as suas dívidas lhe serem transmitidas as quotas sociais desta nova sociedade.
3 - Que a C. C. Lda ficou a ser efetivamente gerida, como se fosse seu proprietário exclusivo, pelo aqui autor, que era quem admitia e dirigia o pessoal, adquiria matérias-primas, ordenava a compra e reparação de máquinas, fazia negócios de venda dos produtos acabados, enfim, de tudo punha e dispunha, como verdadeiro e exclusivo proprietário que era.
4 - Foi entre ele e os réus combinado que, para justificar a remuneração da sua gerência efetiva na nova sociedade, e assim, a sua permanência diária nela, ficasse aí exercendo funções como motorista com contrato, com o ordenado próprio dessa categoria profissional.
5 - Aceitaram, por isso, a 2ª e o 3º réus, na sequência do também combinado com o 1º réu, o papel de subscreverem e assinarem, como gerentes formais, todos os documentos necessários à gestão da empresa, sob instruções do autor, nestes se incluindo a aquisição de novos equipamentos, que o autor decidiu.
6 - Concretizando os compromissos assumidos e para manterem essa aparência, o autor e os sócios formais de “C. C., Lda” celebraram em 1 de Junho de 2003 um contrato de trabalho por tempo indeterminado, através do qual o autor se comprometeu, mediante a remuneração estipulada de 199,75€, a exercer as funções inerentes à categoria profissional de motorista, remuneração essa, que, de facto, era o seu ordenado de gerência e que até foi depois elevada, por decisão dele, autor, para 400€ por mês.
7 - Em 10 de Outubro de 2006, o autor recebeu uma carta registada com aviso de receção, datada de 9 de Outubro de 2006, e subscrita pela ré Rosa, invocando a qualidade de gerente de “C. C., Lda”, na qual lhe era comunicado que considerasse “sem efeito o contrato de trabalho que o liga a esta empresa, a partir do dia 13 de Outubro do presente ano, dado não termos condições de colaboração no trabalho” (sic).
8 - O autor conseguiu resolver todos os problemas, pelo que ficou em condições de plenamente assumir a propriedade das quotas, e, por via dela, do património da “C. C., Lda”.
9 - Instados, porém, os réus para que lhe entregassem a empresa, os 2ª e 3º réus recusaram a transmitir-lhe qualquer das quotas de que eram titulares na “C. C., Lda”, porque pretendiam que fossem suas em definitivo.
10 - O resultado prático para o autor do incumprimento dos réus, em relação aos negócios descritos, foi o seguinte: a) perdeu a sociedade “Irmãos C. - Confecções, Lda”, e o seu direito ao aviamento e trespasse, que lhe asseguraria os proventos necessários à satisfação das suas necessidades pessoais e económicas na sua vida quotidiana, e com a perda dessa sociedade perdeu tudo o que nela investira desde a sua fundação até ao seu fecho, incluindo o passivo atrás descrito que só pagou na expectativa frustrada do cumprimento pelos réus daquilo a que se haviam obrigado; b) perdeu a possibilidade de adquirir, como previra, a sociedade industrial “C. C., Lda”, por si montada e em condições de funcionamento e solvência que de igual modo lhe garantiria a satisfação em termos de uma vida económica acima da média das duas necessidades pessoais, projecto em que investiu o que tinha e o que não tinha, e tudo necessário a atingir esse fim; c) perdeu todo o capital que despendeu para pagar as dívidas, sobretudo fiscais e à Segurança Social, de “Irmãos C. - Confecções, Lda”; d) perdeu a tranquilidade pessoal, o seu sossego, e viu destruídas legítimas expectativas de uma vida mais risonha, sofreu dores e arrelias ante as frustradas expectativas descritas, o que tudo lhe causou prejuízos irreparáveis, de tal gravidade que o levaram a tentar suicidar-se, em cúmulo do desespero, mais a mais por acção de pessoas que estimava, em quem tinha uma confiança cega, e por quem se viu traído.
11 - O autor a) perdeu o capital social com que entrou para a empresa “Irmãos C. – Confecções, Lda”, e esta perda corresponde a um prejuízo de 5.000,00€ b)perdeu o valor que despendeu do seu bolso a pagar as dívidas de “Irmãos C. - Confecções, Lda”, incluindo as relativas às penhoras atrás citadas, e esse valor não foi inferior a 120.000,00€ c) perdeu o direito de adquirir o capital da nova sociedade “C. C., Lda.”, bem como o valor do património, aviamento e “know how”, adquirido pela “Irmãos C. – Confecções, Lda”, e transmitido a “C. C., Lda”, bem como o que foi constituído já pela nova sociedade, e esses valores não são inferiores a 175.000,00.
Contestaram os réus, excecionando o caso julgado, bem como a prescrição relativa ao fundamento do enriquecimento sem causa. Contestaram, também, por impugnação.
Na oportunidade que lhe foi dada pelo tribunal, o autor respondeu à exceção de caso julgado, e à possibilidade de vir a ser condenado como litigante de má-fé, pugnando pela sua improcedência.
Foi proferida sentença que julgou verificada a exceção de força e autoridade de caso julgado entre esta ação e a ação 31/12.8TCGMR, absolvendo os réus da instância. Mais condenou o autor como litigante de má-fé na multa de cinco UCs.
O autor interpôs recurso, tendo finalizado a sua alegação com as seguintes Conclusões: 1ª - O despacho saneador sob recurso absolveu os réus do pedido julgando verificada a exceção dilatória do caso julgado por erradamente sustentar que entre a presente ação (Proc. nº 6090/17.OT8 GMR – Juízo Central Cível de Guimarães, J2) e uma anterior (Proc. nº 31/12.8TCGMR do mesmo Tribunal) ocorre identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir que obstam à propositura de uma nova ação, ou, pelo menos, ocorre, na falta de coincidência daquela tríplice identidade, o efeito impositivo do caso julgado.
-
- Para assim decidir, o despacho saneador, admitindo, embora, ocorrer uma “ausência formal de identidade de sujeitos” (sic), entendeu que o acordo contratual invocado na presente ação foi dado como não provado na ação precedente, o que é completamente falso, mas, ainda que fosse verdadeiro, não significava a existência de caso julgado, porquanto...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO