Acórdão nº 1101/15.6T8PVZ-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 31 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelJORGE TEIXEIRA
Data da Resolução31 de Outubro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

X – MADEIRAS DE PORTUGAL UNIPESSOAL, LDA, instaurou providência cautelar de arresto, contra Y SOCIEDADE COMERCIAL DE MADEIRAS, LDA., Com os fundamentos expostos no requerimento inicial, pediu que fosse decretado o arresto dos imóveis que identifica, sendo que, por despacho indeferiu liminarmente o requerimento inicial.

Inconformado com o assim decidido, apela a Requerente, pretendendo se decrete o procedimento, termina as suas alegações com as seguintes conclusões: A.

Por Decisão proferida a 10 de Novembro de 2016, confirmada pelo Douto Tribunal da Relação e já transitada em julgado foi a Recorrida condenada a liquidar à Recorrente, a quantia de €279.159,2, acrescida de juros.

B.

Na mesma Decisão, foi a Recorrente e em sede de Reconvenção condenada a liquidar à Recorrida a quantia de €62.582,77, acrescida de juros.

C.

Mais ainda, decorre da Decisão – sem que o mesmo tivesse sido alegado, demonstrado ou comprovado, mesmo indiciariamente – a suposta ou eventual probabilidade da existência de um contrato mercantil, também alegadamente outorgado entre Recorrente e Recorrida.

D. E, que nos termos legais, porque por falta de qualquer prova nesse sentido, a existir um contrato de depósito mercantil, poder-se-ia considerar aquele oneroso e, por tal, a eventual existência de um suposto crédito da Recorrida sobre a Recorrente.

São muitas as suposições… E.

Ora, sucede que após a Decisão, confirmada por Acórdão de Relação, a Recorrida deu início à alienação de todo o seu património imobiliário, causa da providencia cautelar de arresto interposta, tendo a Recorrente interposto execução em conformidade com o seu direito e ainda, interposto procedimento cautelar de arresto sobre os bens que a Recorrida pretendia alienar.

F.

O procedimento cautelar de arresto viria a ser liminarmente indeferido.

G. Não com o fundamento na não verificação daquele por falta de pressupostos processuais que levam ao seu decretamento, mas na suposta inexistência global do direito e do crédito da Recorrente sobre a Recorrida e, assente numa eventualidade futura de que a Recorrida pudesse demonstrar em juízo a existência de um direito sobre a Recorrente e, na eventual hipótese de aquele direito pudesse vir a ser superior ao crédito da Recorrente, o qual já confirmado por Decisão transitada.

H. Da Decisão resulta a incerteza, iliquidez, ou até a segurança da ilegibilidade daquele direito da Recorrida: Vejamos: “Não se tendo provado qual das partes que mais lucrou com o depósito, deve ser repartido por ambas o valor do mesmo, não devendo a Autora pagar à Ré mais do que metade do valor que for liquidado posteriormente em quantia cuja fixação se remete para decisão ulterior, nos termos do disposto no artigo 609º, nº 2, do Código de Processo Civil, e que corresponder aos “usos da praça” nos termos do artigo 404º do Código Comercial.” I. Isto porque a mercadoria foi entregue em consignação (o que é conflituante e contraditório com o suposto direito a ser num futuro reconhecido à Recorrida e, que a Decisão invoca); J. Isto porque a Recorrida vendeu a mercadoria, dai obtendo mais valias e retendo tais quantias – incontornável o fim e o contrato, quando em conflito com o contrato de depósito mercantil; K.

Mas igualmente, porque cabendo-lhe o impulso processual de tramitar um eventual direito (se é que existe), a negligência da Recorrida, sempre faria transitar o Direito da Recorrente na Decisão proferida para a deserção.

L.

Negligência da parte (Recorrida) na observância do ónus de impulso processual, que não obriga a parte (Recorrente) a agir em conformidade com o suposto ou alegado direito da Recorrida, que a Recorrente nega e desconhece a sua existência.

Ora, M. O princípio do contraditório (art. 3.º, n.º 3 C.P.C.) visa facultar à parte a oportunidade de se pronunciar sobre os pedidos, ou sobre os argumentos, de direito ou de facto, eventualmente formulados pela outra parte, previamente ao douto desígnio do Tribunal, e que tem uma incidência concreta, relativamente a toda e qualquer questão suscitada no processo, procurando evitar as proibidas decisões-surpresa.

N. É esta a ratio que subjaz ao pensamento que presidiu o legislador aquando da criação da norma jurídica invocada e que justifica que o juiz deva facultar às partes a oportunidade de se pronunciarem sobre qualquer questão que as possa afectar e que ainda não tenham tido possibilidade de contraditar, mesmo tratando-se de questões meramente de direito e que sejam de conhecimento oficioso.

O. O certo é que o douto Despacho-Sentença sub judice acaba por assumir a natureza, pelo menos para o Recorrente, de decisão surpresa, pois que não foi precedido de um acto, que o mesmo considera legalmente exigível, direccionado ao exercício do contraditório relativamente ao elemento – “do saldo positivo a favor do Recorrente na liquidação” – do qual o Julgador se socorreu para proferir decisão sumária.

P. O facto de não se ter dado oportunidade ao Recorrente para exercer o contraditório viola também o Princípio da Proporcionalidade ínsito no Estado de Direito Democrático – plasmado no art. 2.º C.R.P. – e, ainda, os Princípios dos direitos fundamentais a uma tutela judicial efectiva e a um processo equitativo – previsto no art. 20.º, n.ºs 1, 2 e 5 da C.R.P. – o que se invoca com as devidas consequências.

Q. Não se poderá sustentar que a nulidade cometida não tem potencialidade para influenciar a decisão sobre a matéria em apreço pois que certamente o exercício do contraditório poderia, abstractamente, influenciar a decisão a proferir.

R. Por tal facto, não foi possibilitado ao Recorrente exercer o seu contraditório, seja quanto à alegada falta de indicação de factos que permitam ao Tribunal concluir sobre o seu saldo positivo do seu direito de crédito sobre a Requerida, aquando da liquidação de sentença, mas também quanto à possibilidade de esclarecer sobre o documento junto sob o n.º 4, da P.I.

S. Assim, o Tribunal “a quo” ao proferir uma decisão e, ao violar o dever de ficar adstrito ao pedido formulado pelas partes, para impedir que se configurem os conhecidos vícios de decisões, sucumbe na presente Decisão, designadamente ao ter um “entendimento” muito para além do pedido formulado, designadamente o pedido realizado pelo Recorrente.

T. Pedido a que não corresponde qualquer contrapartida formulada pela Recorrida no âmbito de qualquer compensação, não consubstanciado por falta de concretização dos factos pela sociedade Y, Lda.

U. Ademais, os limites da decisão devem respeitar não apenas o pedido, mas também a causa de pedir e os sujeitos da relação processual. É que se chama de limites objectivos e subjectivos da sentença.

V. Nesse sentido, é vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objecto diverso do que lhe foi demandado.

W. Os limites objectivos da sentença, objecto da Decisão, vêm regulados pelo art. 407.º n. 2 do C.P.C.

X.

A doutrina costuma chamar essa vinculação do juiz de princípio da adstrição, congruência ou correlação.

Y. Tal falta de jurisdição, por se tratar de vício essencial da sentença ou despacho, determinante da invalidade do acto, não constitui uma nulidade stricto sensu mas inexistência jurídica da citada decisão, que é outra forma de invalidade para além da nulidade.

Z. Dado que a nulidade em apreço acabou por ficar implicitamente coberta ou sancionada pelo Despacho Liminar-Sentença proferido, pois que se situa a seu montante e o dever omitido se encontra funcionalizado à sua prolação, temos que tal nulidade se tornou também vício formal da sentença que lhe deu cobertura.

AA. Motivo pelo qual se invoca o cometimento de uma nulidade processual prevista no art. 195.º C.P.C., por violação dos artigos 3º nº 3 e 590º do C.P.C. e arts. 2.º e 20.º, n.º 1, 2 e 5 Constituição R.P., com as devidas e legais consequências.

BB. O Recorrente é do modesto entendimento de que a nulidade apontada igualmente afecta o Saneador-Sentença proferido, por excesso de pronúncia, mormente por se ter pronunciado sobre o mérito da causa quando, como entendemos, dele não podia conhecer, atenta a omissão de um acto legalmente previsto que precede a sua prolação.

CC.

Ademais, os limites da decisão devem respeitar não apenas o pedido, mas também a causa de pedir e os sujeitos da relação processual. É que se chama de limites objectivos e subjectivos da sentença.

DD. Atento o exposto, o Apelante entende que o despacho liminar sentença recorrido padece do vício de excesso de pronúncia, o que configura fundamento de nulidade, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, al.ª d) C.P.C., e que ora se invoca, com as devidas e legais consequências.

EE.

Compulsado o douto Despacho Liminar-Sentença proferido constata-se que o Julgador, por força de um raciocínio que expende acerca da “alegada falta de demonstração de saldo positivo a favor do Recorrente, na liquidação da sentença”, considerou que, no caso que nos ocupa, “caberia à Requerente, nesta sede alegar factos que demonstrasse que a liquidação da obrigação ilíquida resultaria num saldo positivo a seu favor” FF.

Ora, sem prejuízo do que infra se dirá quanto ao raciocínio explanado pelo Tribunal a quo, com o qual, adiante-se, o Recorrente não se conforma – pois que entende ser legítimo credor da Recorrida, até porque dos usos e costumes, que a sentença indicou para efectuar a liquidação do depósito mercantil, o Recorrente já havia dado a conhecer ao douto tribunal a quo no requerimento junto aos autos de processo de execução comum, com a referência citius n.º 29169122, também ali melhor exposta e que aqui, ao abrigo do princípio da economia processual se dá por integralmente reproduzida, resulta um saldo bastante positivo a seu favor, bem como, se encontra patente e donde se retira do documento n.º4, junto à P.I. - Regulamento de Tarifas Para a Utilização de Bens Dominiais do porto W- 2018 - que o Recorrente...

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