Acórdão nº 956/15.9PBGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 22 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelF
Data da Resolução22 de Janeiro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

(Secção penal) Relatora: Fátima Furtado; adjunta: Laura Maurício.

  1. RELATÓRIO No processo comum singular nº 956/15.9PBGMR, do juízo local criminal de Guimarães, juiz 4, da comarca de Braga, foi submetido a julgamento a arguida Maria, com os demais sinais dos autos.

A sentença, proferida a 3 de julho de 2017 e depositada no mesmo dia, tem o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, julga-se a acusação procedente e consequentemente decide-se:

  1. Condenar a arguida Maria, pela prática de um crime de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos artigo 203º, nº 1, 204º nº 2 alínea e), todos do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, suspensão que é subordinada ao dever da arguida, durante o período da suspensão, proceder, mensalmente e até ao dia 10 de cada mês, à entrega à ofendida Manuela da quantia de € 80,00 (oitenta euros).

  2. Condenar a arguida no pagamento das custas processuais a que deu causa, fixando-se a taxa de justiça em 03 (três) UC – artigos 513º e 514º, do CPP, artigo 8º, nº 5 e Tabela III do RCP.

Notifique.

Após trânsito em julgado, remeta boletim ao Registo Criminal e abra imediatamente conclusão para eventual cúmulo jurídico.

Proceda ao depósito – artigo 372º nº 5 do CPP.» *Inconformada, a arguida interpôs recurso, apresentando a competente motivação que remata com as seguintes conclusões: «1- O Tribunal a quo fundou a sua convicção essencialmente nos fotogramas que constam de fls. 32/33 dos autos e nos depoimentos prestados pela ofendida Manuela, pela sua filha Antónia e ainda pelo ex-companheiro da ofendida, Joaquim.

2- Conforme resulta da sentença recorrida, a Arguida foi identificada pela filha da ofendida Antónia nas gravações do sistema de videovigilância instalado no prédio da Ofendida, os quais deram origem aos referidos fotogramas constantes de fls. 32/33 dos autos, tendo, efetivamente, sido este o facto preponderante para que o Tribunal a quo considerasse ter a Arguida praticado os factos de que vinha acusada.

3- Dos fotogramas tidos como essenciais para a formação da convicção dos Tribunal a quo, uma vez que foram estes que permitiram identificar a Arguida, apenas é possível concluir que a Arguida, reconhecida pela filha da Ofendida e, em sede de audiência de julgamento, pelo próprio pai da Arguida, a testemunha Josefino, que não teve dúvidas, confrontado com as imagens, em afirmar que se tratava da sua filha, efetivamente entrou no prédio da Ofendida.

4- Nada mais se podendo retirar das imagens em causa, porquanto, conforme resulta dos próprios fotogramas, a câmara de vídeo que captou as imagens encontra-se instalada no interior do hall de entrada do prédio da Ofendida e esta reside efetivamente no 4.º andar do prédio em causa, onde inexiste qualquer câmara.

5- As imagens em causa apenas permitem concluir que a Arguida efetivamente acedeu às partes comuns do edifício, o que conforme resultou da audiência de julgamento, sucedeu por várias vezes, uma vez que a Arguida já havia acompanhado a sua mãe, quando esta esteve ao serviço da Ofendida como empregada doméstica, à casa da Ofendida.

6- Inexiste, conforme resulta notório da sentença que ora se recorre, qualquer prova, documental ou testemunhal, que permitisse concluir que foi a Arguida quem, nas circunstâncias de tempo e lugar constantes da acusação, acedeu e ilegitimamente se apropriou dos bens pertencentes à Ofendida.

7- Conforme resultou provado, no momento em que alegadamente os factos ocorreram não se encontrava ninguém em casa da Ofendida, inexistindo qualquer prova, nomeadamente testemunhal, da prática dos mesmos, tendo a Ofendida efetivamente referido que não se encontrava em casa quando os factos alegadamente ocorreram, apenas referindo, conforme resulta expressamente da sentença, que se ausentou de casa para ir visitar a sua mãe, o que faz todos os domingos, e no regresso, verificou que tinha sido assaltada.

8- Diga-se, aliás, que, para além do que se refere ao tablet Samsung Galaxy, constante da acusação, nenhuma prova foi feita de que os restantes objetos foram efetivamente subtraídos nas circunstâncias de tempo e lugar descritos na acusação, uma vez que, conforme referiu a Ofendida os mesmos se encontravam guardados e no período compreendido entre Julho e Agosto de 2015, a Ofendida esteve ausente da sua residência, por motivos de férias, sendo certo, que segundo consta da acusação os factos que se imputaram à Arguida terão ocorrido em 20 de setembro de 2015.

9- Inexiste suporte probatório que permita concluir que a totalidade dos objetos constantes da Acusação foram efetivamente subtraídos nas circunstâncias de tempo e lugar constantes da acusação, tanto mais que a Ofendida apenas se apercebeu que os mesmos haviam desaparecido quando, no final do referido dia 20 de setembro de 2015, não encontrou o tablet que havia deixado no interior do seu apartamento, antes de se ausentar do mesmo.

10- Os fotogramas constantes dos autos que, como se disse permitiram a identificação da Arguida, foram extraídos das gravações do circuito de videovigilância do prédio da Ofendida, não constando dos autos que o mesmo haja sido, por qualquer forma ou por qualquer entidade, certificado.

11- Nada garantindo, portando, que as referências temporais constantes dos fotogramas em causa correspondam efetivamente à realidade e bem assim ao dia e horas em que alegadamente os factos constantes da acusação se verificaram, ou seja, o dia 20 de setembro de 2015, no período compreendido entre as 12h00 e as 19h30.

12- Não obstante terem efetivamente sido recolhidas imagens da Arguida a aceder ao interior do prédio em que a Ofendida reside, em concreto às partes comuns do rés-do-chão do mesmo, nada nos permite garantir, sem qualquer dúvida, que as referidas imagens se reportem efetivamente ao lapso de tempo constantes dos fotogramas juntos aos autos, pois que efetivamente não resulta dos autos que as mesmas hajam sido certificadas pro qualquer meio ou entidade.

13- Deveria ter sido levado em linha de conta pelo Tribunal a quo que pelo pai da Arguida que, apesar dessa qualidade, testemunhou de forma segura e desprendida, tendo inclusivamente conformado que a pessoa constante das imagens era a sua filha, foi referido que, no dia 25 de setembro de 2015, dia do seu aniversário, foi almoçar fora com a família, tendo estado com a sua filha até ao meio da tarde, altura em que a mesma se ausentou, o que se afigura manifestamente incompatível com as referências temporais constantes dos fotogramas juntos aos autos.

14- Mesmo que se admita que a Arguida efetivamente acedeu ao interior do prédio da Ofendida no dia 25 de setembro de 2015, nada se podendo retirar, com certeza, como supra se deixou dito, quanto ao período do dia e quanto à duração, sempre se deverá considerar que efetivamente não se logrou provar que foi a Arguida quem efetivamente se introduziu no apartamento da Ofendida e daí retirou os objetos constantes da acusação, uma vez que inexiste in totum qualquer prova testemunhal, e as imagens recolhidas apenas permitem colocar a Arguida na entrada do prédio da Ofendida.

15- Quer pela testemunha Antónia, filha da Ofendida, quer pelo ex-companheiro da mesma, e até mesmo pelo pai da Arguida, foi referido que a mesma terá dito que acedeu ao prédio para ir buscar água para colocar no seu veículo, o que seria de todo normal, atendendo a que a Arguida não reside nas imediações e conforme resultou provado a Arguida conhecia e já havia estado no prédio por força das funções desempenhadas pela sua mãe ao serviço da Ofendida, o que, não foi de todo valorado pelo tribunal.

16- Conforme foi referido pela Ofendida e o Tribunal a quo valorou, ainda que, salvo o devido respeito, de forma errada, entendemos nós, não foram detetados quaisquer sinais de arrombamento na porta do seu apartamento, que se encontrava fechada, conforme a deixara.

17- Atento tal facto e o teor da acusação, impunha-se apurar, de forma inequívoca, de que modo poderia a Arguida ter-se introduzido no interior da residência da Ofendida, o que manifestamente não sucedeu.

18- Nos termos constantes da acusação “…a arguida fazendo uso da chave que havia sido entregue à sua mãe pela patroa no mês de Julho/Agosto, abriu a porta de entrada da dita residência e através dela acedeu ao seu interior., tendo o Tribunal a quo considerado como não provado que “Que a arguida tenha usado a própria chave que a ofendida tinha entregue à sua mãe.”, e, por outro lado, julgado provado que a “… A Arguida fazendo uso de cópia da chave que havia sido entregue à sua mãe pela patroa no mês de Julho/Agosto, abriu a porta de entrada da dita residência e através dela acedeu ao seu interior”. - negrito nosso.

19- Entendeu o Tribunal a quo considerar como provado que a Arguida acedeu ao interior da residência da Ofendida através de cópia da chave que a mesma forneceu à sua mãe quando se ausentou para férias no mês de Junho, ou seja, em momento muito anterior à data da ocorrência dos factos, quando, de facto, nenhuma prova neste sentido foi produzida.

20- Limitando-se, assim, o Tribunal a quo, conforme resulta manifesta da sentença que ora se recorre, a supor ou concluir tal facto, sem qualquer suporte ou fundamento probatório, o que é, de facto, inaceitável, à luz dos princípios que norteiam o nosso direito penal.

21- Sendo certo que apenas o fez, porque, efetivamente, pela Ofendida foi expressamente mencionado, conforme resulta da sentença, que a chave que havia entregue à mãe da Arguida já lhe havia sido devolvida por esta em momento prévio à ocorrência dos factos descritos na acusação.

22- Não se tendo provado de que forma poderia a Arguida ter acedido ao interior da residência da Ofendida, tanto mais que pela Ofendida foi expressamente referido que quer a porta, quer as janelas do seu apartamento se encontravam fechadas e uma vez que as imagens captadas pelo sistema de videovigilância do prédio da...

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