Acórdão nº 2392/15.8T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelPEDRO DAMI
Data da Resolução15 de Março de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

  1. RELATÓRIO Maria intentou contra Cândido e mulher M. J.

, a presente acção sob a forma de processo comum.

A Autora pretende que se reconheça que é proprietária dos dois prédios rústicos e do prédio urbano identificados nos artigos 1º, 2º, 3º da petição inicial (pedido A)); reconhecer-se que a Autora é proprietária da água de nascente que aflui ao prédio dos réus e que deste é derivado por aqueduto para os prédios da Autora, por usucapião (B)).

Subsidiariamente a este pedido, peticiona que se reconheça que a Autora tem o direito de servidão ao aproveitamento das águas e servidão de aqueduto, por usucapião (B2).

Peticiona ainda a condenação dos Réus a reconhecer os aludidos direitos (C)); a desobstruir a mina, o tanque e o rego, para que a água aflua aos prédios da autora, no prazo máximo de 10 dias a partir do trânsito em julgado da sentença (D)); a absterem-se de, a partir do trânsito em julgado da sentença, de impedir a limpeza da mina, do tanque e do rego, bem como de praticarem quaisquer outros actos lesivos dos referidos direitos de propriedade e posse da Autora sobre os mesmos (E)); condenar-se os Réus a procederem à reparação do muro de suporte e vedação no prédio rústico da Autora (F)).

Em alternativa a este pedido, peticiona a condenação dos Réus a indemnizar a Autora pelo custo resultante da realização dessa obra, a liquidar em execução de sentença (F1)).

Por fim, peticiona a condenação dos Réus a procederem à remoção dos objectos (lenha e afins) que colocaram no caminho de servidão que onera o seu prédio, a favor do prédio da Autora (G)) e a condenação dos Réus, a título de sanção pecuniária compulsória, ao pagamento de quantia nunca inferior a € 150,00 (cento e cinquenta euros) por cada dia de atraso no cumprimento dos pedidos constantes das alíneas D); F1) e G)- (pedido H)).

Para o efeito, a Autora alegou que lhe pertencem dois prédios rústicos e um prédio urbano, identificados na petição inicial, prédios esses confinantes entre si e sem qualquer barreira divisória, prédios esses que adquiriu por doação, sendo que a Autora e os seus antecessores se encontravam na posse dos mesmos há mais de 20, 30 e 40 anos, adquirindo-os por via da usucapião.

Alegou ainda que pertence aos Réus um prédio misto, identificado no artigo 12º da petição inicial, que adveio à sua propriedade através de escritura de compra e venda, outorgada no dia 13 de Dezembro de 1995; o prédio rústico e urbano da Autora descrito nos artigos 1º e 3º da petição inicial confina com o prédio dos Réus, em parte pelo seu limite Norte e está a uma quota inferior em relação a ele, sendo que há de mais de 20, 30 e 40 anos, a Autora e seus antecessores têm água nos três prédios, através de uma nascente que nasce num prédio superior ao dos Réus, no Monte ali existente, que é derivado por obra humana, através de mina, para o prédio dos Réus, afluindo a um tanque, do qual era derivado através de rego a céu aberto, aqueduto, para o prédio do Autora, entrando no prédio da Autora identificado no artigo 1º da petição inicial, através de uma abertura existente no muro delimitativo das propriedades, indo por canal em pedra para um tanque de retenção de águas nesse terreno construído.

Mais alegou que deste tanque, as águas eram aproveitadas pela Autora e antecessores sem qualquer limitação ou restrição, nomeadamente para rega e lima dos seus dois prédios rústicos, bem como para as lides domésticas da casa de habitação daquele prédio urbano, confinantes entre si, que não dispunham de outras águas e sempre se arrogaram proprietários da água de nascente, fazendo há mais de 20, 30 e 40 anos, a sua captação e derivação, igualmente reparando e limpando a mina, bem como o tanque e o rego para onde ela deriva, na propriedade dos réus; alegando a aquisição, por via da usucapião, da propriedade da água ou, no caso de assim não se entender, o direito de servidão ao aproveitamento da água e à servidão de aqueduto que onera o prédio dos Réus.

Alegou ainda que os Réus, em data imprecisa do ano de 1996, recorrendo a homens e máquinas impediram a captação e derivação das águas de nascente para o prédio da Autora, passando a impedir o acesso ao seu prédio para a Autora e antecessores efectuarem a limpeza e manutenção da mina, do tanque e do rego, permitindo ainda os Réus que as águas da nascente andem perdidas no seu prédio, tendo as mesmas se acumulado junto ao muro de vedação do prédio da Autora, infiltrando-se nas suas fundações, provocando a queda do muro.

Por fim, alegou que por acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 31.01.2011, que confirmou a sentença proferida no Processo nº 297/96, do extinto 2º Juízo do Tribunal Judicial de Barcelos, foi reconhecido que o prédio da Autora tem direito a uma servidão de passagem pelo prédio dos Réus, situado no limite poente, tendo os Réus colocado lenha e objecto no caminho, em Junho de 2015, a fim de impedir a passagem.

*Contestaram os Réus, admitindo a propriedade da Autora e Réus sobre os prédios identificados na petição inicial, impugnando os restantes factos alegados, alegando ainda que a Autora possui poço próprio, tendo o dever de se abastecer de água da rede pública e a água da mina sempre teve um caudal escasso nos meses em que seria necessária, pelo que nunca aquela poderia estar dependente dessa água e o anterior proprietário do prédio dos Réus procedeu à construção de dois poços.

Alegaram ainda que o muro caiu devido a desgaste natural, os Réus não colocaram qualquer entrave na passagem, existindo apenas mato, há mais de 27 anos que a Autora e antepossuidores não fazem proveito da água proveniente da mina, nem limpam ou reparam o tanque, existindo abastecimento público de água a menos de 20 metros do limite da propriedade.

Em reconvenção, os Réus alegam que a servidão de passagem reconhecida aos Autores foi constituída por usucapião, sendo que actualmente o acesso à via pública é possível pela parte Norte dos prédios rústicos a partir de um novo arruamento denominado “Rua Nova” não existindo qualquer necessidade de impor esse encargo ao prédio dos Réus, o que também requer caso se considere que existe uma servidão de águas.

Terminam, peticionando, a improcedência da acção e a absolvição dos Réus dos pedidos e a procedência da reconvenção, com a condenação da Autora a reconhecer a extinção das servições.

*A Autora replicou, impugnando a factualidade alegada pelos Réus.

*Foi admitido o pedido reconvencional formulado pelos Réus, proferido despacho saneador, onde se se julgou a instância válida e regular, dispensando-se a identificação do objecto do litígio e a enunciação dos temas da prova.

*Procedeu-se à realização da audiência de julgamento, com observância de todas as formalidades legais.

*Na sequência foi proferida a seguinte sentença: “IV – Dispositivo Pelo exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente e, em consequência: 1) Declaro que a autora é proprietária dos dois prédios rústicos e do prédio urbano, identificados nos artigos 1º, 2º e 3º da petição inicial.

2) Declaro que pertence à autora durante quatro dias na semana a água de nascente que aflui ao prédio dos réus e que deste é derivada por aqueduto para os prédios da autora.

3) Condeno os réus a reconhecer os aludidos direitos.

4) Condeno os réus a desobstruírem a mina, o tanque e o rego, para que a água aflua aos prédios da autora, no prazo máximo de dez dias a partir do trânsito em julgado da sentença.

5) Condeno os réus a absterem-se de impedir a limpeza da mina, bem como de praticarem quaisquer actos lesivos aos direitos de propriedade e posse da autora.

6) Condeno os réus a procederem à remoção da lenha e restantes objectos do caminho de servidão que onera o seu prédio a favor do prédio da autora.

7) Condeno os réus, a título de sanção pecuniária compulsória, no valor de € 75,00 (setenta e cinco euros), por cada dia de atraso no cumprimento do ordenado em 4) e 6).

8) No mais, absolvo os réus dos pedidos.

Custas por autora e réus, na proporção de ¼ e ¾.

9) Julgo totalmente improcedente a reconvenção formulada, absolvendo a reconvinda dos pedidos.

Custas pelos reconvintes.

Registe e notifique. …”.

*É justamente desta decisão que os Réus/Recorrentes vieram interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “CONCLUSÕES I - A sentença agora recorrida enferma de erro na apreciação das provas e na aplicabilidade do direito.

II - Os Recorrentes, além de não concordarem com a solução de direito, não concordam com a apreciação da matéria de facto que levou à procedência ainda que parcial da acção.

III - Os Recorrentes entendem haver contradição entre a fundamentação de direito e parte da decisão.

IV - Pretende-se, pois, além de uma reapreciação de direito, uma reapreciação da matéria de facto, nomeadamente por reapreciação da prova gravada.

Dos Factos V – Os primeiros 11 factos dados como provados estão relacionados com a propriedade dos prédios, algo que nunca foi posto em causa por nenhuma das partes.

VI – Os factos 12 a 18 no que concerne à existência e ao aproveitamento de águas não merecem discussão, ou seja, é pacífico e foi sempre assumido pelas partes e posteriormente confirmado pela prova produzida, que durante vários anos, mas sempre até data anterior a 9 de Julho de 1996, que as águas eram aproveitadas para os prédios.

VII – O facto 19 dado como provado deve ser alterado para o sentido oposto sendo que o máximo que poderá estar aqui em causa é um suposto direito de servidão de águas mas nunca a propriedade das mesmas uma vez que não se provou o elemento subjectivo “animus”.

VIII – Aliás, dos depoimentos das testemunhas F. P., M. B. e M. C. percebe-se que quem trabalhava os campos era “Caseiro” ou “Jornaleiro”, ou seja, não o faziam com o ânimo de serem proprietários.

IX – O facto 20 dado como provado deve ser dado como não provado devido à falta de produção de prova do vertido no mesmo e ser substituído pelos seguintes factos: - A...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT