Acórdão nº 2223/13.0TBBRG-G.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelALCIDES RODRIGUES
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório No Juízo Local Cível de Braga – Juiz 4 - do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, nos autos de insolvência em que foi declarada a insolvência de Manuel e Paula, estes apresentaram requerimento com o seguinte teor: «(…) foi proferido Despacho Inicial Exoneração de Passivo Restante e Nomeação de Fiduciário em 14-12-2012, e processo foi encerrado em 23-03-2015.

Atento o lapso de tempo verificado, vêm requerer junto aos autos, que o encerramento do processo produza efeitos desde a data do despacho inicial do incidente de exoneração do passivo restante, conforme expresso no n.º 1, aI. e) do art. 230.° do ClRE, até porque os Insolventes são de todo alheios ao atraso na liquidação do ativo.

O que se requer e agradece.

(…)».

*Datado de 16 de novembro de 2017, a Mmª Juiz a quo proferiu o seguinte despacho: «Fls. 526 e ss.: Indefiro o requerido posto que é meu entendimento, ao arrimo dos inúmeros Acórdão já proferidos a tal respeito (vide, entre outros, o Ac. da RP de 24/1/2017, processo n." 870/14.5TBMAI-E.Pl, e Ac. da RE de 9/2/2017, processo n." 2698/10.2TBSTB.El), que, tendo sido ordenado que se procedesse a liquidação dos bens existentes, o período de cessão só começou a contar após a data do rateio final (cfr. o artigo 230.°, n." 1, alínea a), do CIRE), momento em que a lei prevê o encerramento do processo.

Assim, no caso dos autos, tendo os autos prosseguido com a liquidação do activo, não pode considerar-se iniciado o período da cessão de rendimentos antes do encerramento do processo de insolvência ocorrido em 20/3/2015 (vide fls. 365).

Braga, ds (…)»*Inconformados com esta decisão, os insolventes, Manuel e Paula, dela interpuseram recurso e formularam, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões: «I. O despacho ora recorrido, violou o disposto no artigo 230.

0 n.º 1, alínea e) do CIRE, ao decidir que, o período de cessão de rendimentos apenas se iniciou em 20/03/2015, data em que se dera por encerrado o processo por via de liquidação total do ativo da massa insolvente.

  1. Contudo, com a entrada em vigor da Lei nº 16/2012, de 20- 04, que alterou o CIRE, a alínea e) do artigo 230.° pretendeu imprimir uma maior celeridade ao processo e que o período de cessão se iniciasse ainda com ativos não liquidados.

  2. E, este argumento interpretativo bastaria para a improcedência do despacho proferido pelo Tribunal a quo.

  3. Em bom rigor e honra da verdade, o presente processo perdura no tempo por factos não imputáveis aos próprios Devedores, ou seja, os insolventes, seja por atuação ou omissão, não influenciaram na demora do presente processo.

  4. Pelo que se entende que, a criação dum normativo como a alínea e) do n.º 1 do artigo 230.° do CIRE, visou precaver situações, como os de insolvência, se mantenham em tribunal por 9, 10 ou mais anos, como acontecerá no caso em apreço, se o recurso não merecer provimento.

  5. A alínea e) do art.° 230.° do CIRE, atenta a natureza processual, é aplicável aos presentes autos, já que o Despacho Inicial de Exoneração do Passivo Restante data de 13-12-2012.

  6. A introdução da alínea e) do art.° 230.° do ClRE na senda do pensamento do legislador, permite encerrar o processo de insolvência quando for requerida a exoneração do passivo por pessoa singular e exista património por liquidar.

  7. Razão pela qual, à data do despacho inicial do incidente de exoneração do passivo restante, deveria ter começado a contar o período de cessão de rendimentos.

  8. O art.° 2.° da Lei n." 16/2012, de 20 de abril, aditou ao art. 230.°, n.º 1 do CIRE a alínea e), cujo teor é o seguinte: "quando este ainda não haja sido declarado, no despacho inicial do incidente de exoneração do passivo restante referido na alínea b) do artigo 237.°.

  9. Daí resulta que: prosseguindo o processo após a declaração de insolvência, o juiz declara o seu encerramento quando este ainda não haja sido declarado, no despacho inicial do incidente de exoneração do passivo restante referido na alínea b) do artigo 237.°.

  10. Em 13-12-2012, foi proferido nestes autos despacho a deferir liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante, determinando-se que no período de cessão (cinco anos subsequentes ao encerramento do processo) o rendimento disponível que os devedores viessem a auferir seria cedido ao fiduciário.

  11. Não foi declarado o encerramento do processo de insolvência, somente o foi, em 23-03-2015.

  12. O art.° 6.° da Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril, prescreve que entra em vigor 30 dias após a data da sua publicação, pelo que entrou em vigor em 21 de maio de 2012.

  13. Daqui se extrai que o despacho que deferiu liminarmente a exoneração do passivo restante foi proferido depois desta lei ter entrado em vigor.

  14. A alínea e) do n.º 1 do art.° 230.° do CIRE, introduzida pelo art.° 2.° da Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril, acrescentou um quinto fundamento para o encerramento do processo de insolvência. (Leitão, Luís, Direito da Insolvência, 4.

    a edição, Edições Almedina, SA, Coimbra, maio 2012, p, 303.) XVI. Esta norma legal deve ser interpretada em conjugação com o prescrito no art. 237.° al, b) do CIRE, nos termos da qual a concessão efetiva da exoneração do passivo restante pressupõe que o juiz profira despacho declarando que a exoneração será concedida uma vez observadas pelo devedor as condições previstas no art.° 239.° durante os cinco anos posteriores ao encerramento do processo de insolvência, neste capítulo designado despacho inicial.

  15. Da conjugação dos artigos 237.° alíneas b) e d), 239.° e 244.° do CIRE, resulta que este despacho inicial tem em vista fixar as condições que devem ser observadas pelos devedores para ser proferido, no termo do prazo da cessão, o despacho definitivo sobre a exoneração ou não do passivo. (Fernandes, Luís e Labareda, João, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, reimpressão de Agosto, Quid Iuris, Lisboa, 2009, p. 787).

  16. Durante o prazo de cinco anos em que o rendimento disponível do devedor é cedido a um fiduciário, o processo de insolvência fica encerrado.

  17. A decisão judicial a declarar o encerramento do processo de insolvência é um ato jurisdicional a praticar no processo.

    XX.

    Assim, tendo a alínea e) do n." 1 do art.° 230.

    0 do CIRE, introduzida pelo art.° 2.° da Lei n." 16/2012, de 20 de Abril, acrescentado um quinto fundamento para o encerramento do processo de insolvência, deve este fundamento ser apreciado pelo juiz, em processo pendente para este efeito.

  18. Sufragamos por isso que, o despacho recorrido deve ser substituído, para efeitos de decidir sobre o período de cessão, com base no fundamento previsto no art.° 230.° n." 1 al, e) do ClRE.

  19. Uma decisão contrária, perfilha solução que viola o princípio da igualdade.

  20. Um devedor sem bens para liquidar, quando se determine a insuficiência da massa nos termos do art. 232.° do CIRE, a data do início do período de cessão poderá começar a contar da data do despacho inicial.

  21. Um devedor com bens para liquidar, quando se determina que se proceda à liquidação dos bens existentes, o período de cessão iniciará a contar da data do rateio final (cfr. o artigo 230.° n." 1, al, a) do CIRE), momento em que a lei prevê o encerramento do processo, e esse encerramento, poderá alongar-se por anos.

  22. Ademais, não são raros os casos em que, a liquidação se arrasta por anos, no caso dos autos o foi por 3 anos e, sem que seja declarado o encerramento, não haveria possibilidade de iniciar o período de cessão.

  23. O Devedor sem bens para liquidar, fica em "vantagem" temporal, relativamente a um devedor com bens para liquidar, violando o princípio de igualdade.

  24. O princípio da igualdade, considera não poder haver tratamento desigual, e tratamento desigual resulta da consideração decisiva de um fator - a existência de ativo e, por isso imprestável para suportar a distinção entre devedores insolventes no acesso temporal ao encerramento do processo, mais curto ou mais longo, quanto à cessão de rendimentos.

  25. Desta forma, na interpretação/aplicação seguida de tal normativo, o mesmo é violado, por não ter sido interpretado corretamente, de acordo e em conformidade com os princípios de coerência e equidade.

  26. No despacho ora recorrido, considera-se que é necessário um ato formal de encerramento do processo para o início do período da cessão, sendo que, só com a prolação do despacho de encerramento é que se inicia, jurídica e materialmente, a cedência do rendimento disponível do devedor que for fixado no despacho liminar.

  27. Porém considera-se que, o período de cessão e a referida cedência do rendimento disponível pode ocorrer independentemente da prolação do despacho de encerramento, após o despacho inicial, porque em boa verdade se existissem rendimentos que excedessem o mínimo essencial à subsistência destes e do seu agregado familiar, sempre os insolventes teriam de ter entregue ao fiduciário, tais valores, desde o despacho inicial.

  28. ln caso, tal apenas não ocorrera, porque os insolventes se encontravam desempregados à data do despacho inicial sendo que, se não se encontrassem nessa condição teriam de ceder os rendimentos excedentes ao Exmo. senhor Fiduciário.

  29. E como tal, devendo considerar-se que o período de cessão se iniciara em 14/12/2012, e sabendo que esse dito período de cessão nunca poderá exceder os 5 anos fixados na lei, então só terá de ser proferido despacho final de exoneração do passivo restante nos 10 dias subsequentes à data de 14/12/2017.

  30. Uma vez que é razoável uma interpretação extensiva do disposto no art. 239.°, n.º 2 do CIRE, que permita considerar que o período de cessão (de 5 anos) e a referida cedência do rendimento disponível pode legalmente e de facto ocorrer, independentemente da prolação do despacho de encerramento, após o despacho de admissão liminar do pedido de exoneração do passivo.

  31. Sendo a fonte da cessão a lei (ainda que na dependência de despacho judicial) e sabendo-se que a cessão se dá, desde o despacho inicial e...

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