Acórdão nº 9217/15.2T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 01 de Março de 2018
Magistrado Responsável | EUG |
Data da Resolução | 01 de Março de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães Sumário (elaborado pela relatora - cfr nº 7, do art.º 663º, do CPC): 1- Vários princípios gerais do processo civil têm dignidade constitucional por respeitarem a direitos considerados fundamentais, entre eles o da equidade, nomeadamente nas vertentes da contrariedade e da igualdade de armas das partes; 2- Existe, presentemente, uma conceção ampla do princípio do contraditório, a qual teve origem em garantia constitucional da República Federal Alemã, tendo a doutrina e jurisprudência começando a ligar ao princípio do contraditório ideias de participação efetiva das partes no desenvolvimento do litígio e de influência na decisão, passando o processo visto como um sistema de comunicações entre as partes e o Tribunal; 3- Cabe ao juiz respeitar e fazer observar o princípio do contraditório ao longo de todo o processo, não lhe sendo lícito conhecer de questões sem dar a oportunidade às partes de, previamente, sobre elas se pronunciarem; 4- Em ação contestada, de valor superior a metade da alçada da Relação, caso o juiz entenda, finda a fase dos articulados, que o processo deverá findar imediatamente com decisão de mérito, deve convocar audiência prévia, a fim de proporcionar às partes prévia discussão de facto e de direito, sem o que a prolação de decisão final de mérito em saneador-sentença viola o princípio do contraditório (constituindo uma decisão-surpresa, caso a questão não tenha sido debatida nos articulados); 5- Com o aditamento do nº 3, do art. 3º, do CPC, e a proibição de decisões-surpresa, pretendeu-se uma maior eficácia do sistema, colocando, com maior ênfase e utilidade prática, a contraditoriedade ao serviço da boa administração da justiça, reforçando-se, assim, a colaboração e o contributo das partes com vista à melhor satisfação dos seus próprios interesses e à justa composição dos litígios.
*I.
RELATÓRIO João propôs a presente ação declarativa, com forma de processo comum, contra António, proprietário do estabelecimento individual que gira sob o nome de Stand Auto – S., cujo estabelecimento principal se situa na Avenida … Joane e Banco X S.A., pedindo que seja reconhecido que o contrato compra e venda e o contrato de crédito ao consumo para compra do veículo Opel Astra de matrícula HE foram resolvidos com justa causa, e, consequentemente, se condene: I - o primeiro Réu, António, a pagar: a) ao Banco x, S.A. a quantia de € 9.762,63 (nove mil setecentos e sessenta e dois euros e sessenta e três cêntimos) correspondente ao valor que o Banco X mutuou e lhe entregou para que o A. comprasse o veículo automóvel Opel Astra HE; b) ao Autor a quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros) correspondente à diferença de preço da venda do veículo Opel Astra HE, que foi paga com a entrega do veículo Seat Ibiza de matrícula PH; c) ao Autor a quantia de € 500,00 ( quinhentos euros) a título de danos patrimoniais e não patrimoniais; II - o segundo Réu, Banco X, S.A., a pagar ao A. a quantia de € 801,35 (oitocentos e um euros e trinta e cinco cêntimos) correspondente ao dinheiro que recebeu de remuneração do capital que emprestou durante a vigência do contrato, devendo ainda ser o Banco condenado a devolver a Livrança que por força do contrato de mútuo lhe foi entregue sem a preencher.
Alegou, para tanto e em síntese, ter comprado ao Réu António, com financiamento do Réu Banco X, um automóvel que apresentou inúmeras avarias/desconformidades, tendo, por último, deixado de funcionar, pelo que o autor resolveu os contratos de compra e venda e de financiamento, que são interdependentes, sendo que a anulabilidade de um arrasta a anulabilidade do outro.
Contestou António, defendendo-se por exceção, ao invocar a ineptidão da petição inicial e a ilegitimidade ativa, e por impugnação, ao negar as desconformidades alegadas, concluindo pela inexistência de fundamento para a resolução do contrato e, em consequência, pela improcedência da ação.
O Banco contestou, afirmando a independência do contrato de crédito em relação à compra e venda e deduziu reconvenção a título subsidiário, para a hipótese de vir a ser declarada a invalidade do contrato de mútuo e o pedido do A. ser julgado procedente, devendo então o Autor ser condenado a devolver o veículo ao Réu António, bem como o mesmo Réu ser condenado a pagar (devolver) ao Réu Banco X a quantia que oportunamente lhe foi entregue, ou seja, 9.762,63 € (nove mil setecentos e sessenta e dois euros e sessenta e três cêntimos), acrescida dos juros devidos.
O A. respondeu, exercendo o contraditório.
*Foi proferida decisão a não admitir a reconvenção deduzida pelo Banco X e a absolver o A. da instância reconvencional e despacho saneador, onde as arguidas exceções dilatórias da nulidade de todo o processo e da ilegitimidade ativa foram julgadas improcedentes.
*Por se considerar que o estado dos autos permitia conhecer, de imediato, dos pedidos, foi (invocando-se a al. b), do n.º 1, do art. 595º, do CPC) proferido despacho saneador- sentença, onde se julgou a ação improcedente e se absolveram os Réus dos pedidos, com custas a cargo do Autor, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia.
*O Autor apresentou recurso de apelação, pugnando por que seja dado provimento ao recurso, julgando-se o mesmo procedente. Formula as seguintes CONCLUSÕES: 1.ª - Alteração da matéria de facto, documentalmente ter-se-á de dar por provado, que: 7. - o A. formalizou o pedido de financiamento em 10 de Setembro de 2014 e levou o automóvel no dia 12 de Setembro de 2014 com garantia total de 12 meses, doc. 4 da P.I.; 8. - em 27 de Outubro de 2014 o carro avariou tendo sido logo rebocado com ordens do primeiro R. para uma oficina indicada por este, vd. doc. 5 da P.I.
-
- O A. enviou ao primeiro R. carta registada com aviso de receção, datada de 10 de Fevereiro de 2015, enunciando todos os seus defeitos solicitando numa prazo de 10 dias a sua reparação definitiva, bem como as facturas de eventuais peças novas que tivesse que usar na reparação do automóvel: "Dificuldade a pegar em frio e em quente, principalmente em frio; Problemas na válvula EGR.; Verte óleo do motor no local onde pernoita o mesmo na parte inferior encontra-se completamente ensopado/ babado em óleo; Chauffage apenas deita ar frio ou morno, no seu perfeito estado de funcionamento deveria de deitar frio, morno e quente; Deita imenso fumo pelo escape após ligar o motor, e em andamento; necessário arranjar um copo do filtro do gasóleo compatível com o carro, porque não foi possível encaixar a tampa pertencente ao mesmo quando foi anteriormente trocado, derivado a não ser totalmente indicado; Avaria no Controlo de Estabilidade, (Ângulo de Direcção); após ter sido substituída a placa CIM (Fita de Airbag) na última vez que esteve na Opel, não fez o alinhamento da direcção, logo a mesma, verifica-se desalinhada; sensores de estacionamento, livro de revisões completo, vidro da frente substituído e escovas e gancho de reboque", doc. 6 da P.I..
10 - Neste novo concerto o automóvel ficou 16 dias para reparar, tendo sido entregue ao A. no dia 27 de Fevereiro de 2015, vd. doc. 7 da P.I..
11 - No dia 3 de Setembro de 2015, dentro ainda do período de garantia, o veículo avariou, doc. 4.
-
– A viatura teve de ser rebocada para a residência do A. vd. doc. 8 P.I..
-
- Por carta registada datada de 7 de Setembro de 2015, com aviso de receção, resolveu o contrato de compra e venda de veículo automóvel e o contrato de crédito coligado com o Banco x, S.A., doc. 9 P.I..
-
- O A. enviou carta registada datada de 7 de Setembro de 2015 ao segundo R., o Banco X, resolvendo o contrato de financiamento, informando-o que existiu um incumprimento ou desconformidade – na medida em que o bem vendido não cumpre com a função precípua entre o contrato de compra e venda coligado com o presente contrato de crédito, e uma vez que já interpelou o fornecedor/ vendedor para eliminar os problemas ou desconformidades este não o fez, vd. Doc. 10 P.I..
-
- O A. informou ainda o Banco X que não iria pagar mais prestações, pois não está a usar o bem vendido. Explicou ainda que o automóvel após a sua ultima avaria datada em 3 de Setembro de 2015 foi rebocado para a sua residência pois não o poderia levar para outro lugar, e que este segundo R. o poderia levantar quando assim o entendessem.
-
– Além do que deverá ser alterado da matéria de facto, foram alegados factos que se impunha que fossem apurados assim como temas de prova que urgia apurar nomeadamente: Temas de prova: 1.º - compra e venda de veículo automóvel em segunda mão; 2.º - Coligação de contratos, de compra e venda com o contrato de financiamento: 3.º- cumprimento defeituoso do contrato de compra e venda; 4.º - resolução do contrato de compra e venda do veículo automóvel; 5.º - resolução do contrato de financiamento para a aquisição do veículo automóvel.
-
- Para tanto, impunha-se apurar e pelo menos ver se se provava (documental, testemunhal e eventualmente pericial): - Se o vendedor garantiu que o automóvel estava em excelentes condições, como novo e que era um excelente negócio que tinha sido sujeito a rigorosa inspeção e não apresentava quaisquer defeitos - Se o A. ficou bastante entusiasmado com o automóvel, ao mesmo tempo que se lamentava das suas dificuldades de vida ao vendedor, explicando que não o podia pagar a pronto e que teria de recorrer a um financiamento.
- Se o vendedor trabalhava com uma agência financiadora mesmo em frente ao seu Stand estes lhe fariam uma simulação, podendo sempre comprar o automóvel pagando-o às prestações, facilitando a financiadora todo o processo relativamente à aquisição de viaturas novas e usadas, e, que o A. deveria considerar como a oportunidade de concretizar o sonho de ter aquela viatura.
- Qual a prestação que o A. podia pagar e como foram feitas as contas para poder comprar a viatura.- Se o mecânico andou com o carro uns metros e apagou os erros que o sistema eletrónico acusava fazendo o carro muito fumo...
-
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO