Acórdão nº 827/17.4GAEPS.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelARMANDO AZEVEDO
Data da Resolução05 de Março de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I- RELATÓRIO 1.

No processo sumário nº 827/17.4.GAEPS, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo de Competência Genérica de Esposende – J1, em que é arguido António, com os demais sinais nos autos, por sentença proferida e depositada em 25.10.2017, foi decidido, nomeadamente, o seguinte: [transcrição]: Condena-se o arguido António pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 292º, nº 1 do Código Penal, na pena de 4 (quatro) meses de prisão.

Condena-se o arguido, ao abrigo do disposto no art. 45º, nº 1, do Código Penal, a cumprir a pena de prisão ora aplicada, por dias livres, em 24 períodos sucessivos correspondentes a outros tantos fins-de-semana, entre as 19 horas de sexta-feira e as 19 horas de Domingo, com início no segundo fim-de-semana subsequente ao trânsito em julgado da presente decisão.

Condena-se o arguido na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 12 meses.

  1. Não se conformando com tal decisão, dela interpôs recurso o arguido, extraindo da respetiva motivação, as seguintes conclusões [transcrição]: 1- O ora recorrente, a fim de evitar que a bicicleta da sua namorada ficasse exposta dentro do carro que ficou estacionado na rua, entendeu levar a bicicleta consigo para deixa-la à guarda de um dos elementos responsáveis pela segurança da discoteca.

    2- Quando trazia a bicicleta para junto da segurança da discoteca, ao passar junto do Posto Móvel da GNR, considerou que a bicicleta ficaria mais segura junto dos militares dessa força, pelo que se dirigiu ao comandante da mesma, Tenente Silva, pedindo-lhe que lha guardasse, tendo este respondido que por ele não existia qualquer inconveniente em que a mesma ficasse lá, após o que lhe ordenou que se sujeitasse ao teste de álcool no sangue, o que, o recorrente fez sem qualquer objecção, embora considerasse o facto estranho.

    3- O recorrente estava convicto de que não poderia ser punido por conduzir uma bicicleta, e menos ainda por seguir com ela pela mão.

    4- Aliás, dos depoimentos das testemunhas militares da GNR ficou clara a ideia de que o recorrente não contrapôs qualquer justificação ou desculpa, demonstrando desconhecimento de que não podia conduzir uma bicicleta depois de ter ingerido álcool, ainda que em quantidade superior ao legalmente permitido, razão pela qual abordou o comandante da força, Tenente Silva, como este mesmo admitiu.

    5- Saliente-se que o comandante da força da GNR, apenas a instâncias do Meritíssimo Juiz, já no final do seu depoimento, admitiu a possibilidade de ter sido ele a mandar parar o recorrente, referindo não ter a certeza se o recorrente vinha a circular montado na bicicleta.

    6- Contrariamente, numa atitude que só pode ser entendida como de agradar ao seu superior, a testemunha Sofia, guarda da GNR, afirma perentoriamente que o recorrente seguia em cima da bicicleta, e que foi mandado parar pelo Tenente Silva para ser sujeito ao referido teste de álcool no sangue.

    7- Ora, esta discrepância entre ambos os depoimentos apenas poderia levar o Tribunal a quo a uma decisão diferente, dando por não provados os factos pelos quais o Ministério Público acusou o ora recorrente, e, em consequência, à absolvição do ora recorrente da prática de qualquer crime, de acordo com o princípio constitucional “in dúbio pro reo” (artigo 32.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa).

    8- Como resultado dos factos que o Tribunal a quo deu como provados foi o arguido condenado na pena de 4 meses de prisão e na pena acessória de inibição de conduzir pelo período de 12 meses.

    9- Ora, tal condenação incorre, salvo o devido respeito por opinião diversa, em erro na aplicação das normas reguladoras da escolha e determinação das penas, com a qual o recorrente frontalmente discorda, bem como com o tempo de duração de prisão determinado, visto existirem circunstâncias para que o mesmo seja alterado e o período para o seu cumprimento seja, igualmente, alterado.

    10- O recorrente, a ser condenado e a ser-lhe aplicada uma pena de prisão, então o Tribunal a quo tinha que ter optado pela suspensão da execução da pena privativa da liberdade.

    11- Nos termos do disposto no artigo 50.º, em conjugação com o artigo 70.º, ambos do Código Penal, incumbia ao Tribunal, num derradeiro esforço de verdadeira recuperação e ressocialização do arguido, aplicar a suspensão da execução da pena de prisão.

    12- No caso dos presentes autos o recorrente tem a seu favor o facto de o Tribunal a quo, valorando os depoimentos de duas testemunhas que, como se deixou claro supra, se contradisseram e limitaram a defender a posição que haviam tomado inicialmente, deu como provado ter o mesmo cometido o crime ao comando de um velocípede, cuja perigosidade é muito inferior à de qualquer veículo motorizado.

    13- Ainda o facto de o recorrente foi sujeito a fiscalização de álcool no sangue quando transitava em espaço situado em propriedade privada, ainda que de acesso livre, onde só transita quem para a discoteca P. especificamente se dirija, e não em qualquer via pública, em hora de grande movimento.

    14- Importa ainda referir que a condução(?) por parte do arguido de uma bicicleta em estado de embriaguez não teve, nem poderia ter, consequências nefastas, não tendo causado qualquer dano, tanto mais que o espaço percorrido não ultrapassou os 100 mts..

    15- Releva ainda o facto de o arguido ser pessoa social, profissional e familiarmente bem inserida.

    16- O recorrente exerce a profissão de técnico auxiliar de saúde, tendo ficado provado que trabalha em turnos rotativos, dispondo apenas de um fim de semana livre em cada mês, pelo que o cumprimento da pena de prisão em dias livres em 24 períodos sucessivos correspondentes a outros tantos fins de semana levará, forçosamente, à perda do seu posto de trabalho, uma fonte de rendimento, com as mais diversas consequências, designadamente o não poder pagar a prestação de alimentos à sua filha menor, proceder ao pagamento da prestação mensal relativa à compra da casa e do automóvel, ou cumprir os diversos encargos que tem.

    17- Não colhe o argumento de que o aqui recorrente já foi condenado por condução de veículo com álcool, pois se, de facto, o recorrente foi já condenado pela prática do crime de condução com álcool de veículos com motor, tendo o Tribunal decidido expressamente, aplicar-lhe a pena de inibição de condução de veículos com motor.

    18- Acresce que, como se conclui dos depoimentos transcritos supra, o recorrente encarou de bom grado, quiçá com bonomia, o facto de lhe ter sido ordenado que fosse sujeito ao teste do álcool por estar convicto que não se encontrava a praticar qualquer ilicitude.

    19- O recorrente não tinha qualquer consciência de estar a cometer uma ilicitude, pois, caso assim não fosse, e perante o aparato criado pela existência do posto móvel da GNR, não teria passado junto do mesmo com a bicicleta depois de já ter passado uma vez na direção da discoteca e outra quando se dirigiu ao automóvel para a ir buscar, e, menos ainda, ter-se-ia dirigido aos guardas em serviço.

    20- Assim, pode concluir-se que, na escolha e determinação da pena, o Tribunal a quo violou os princípios da culpa, as finalidades de prevenção e os critérios relevantes para a escolha e determinação da medida, previstos nos artigos 40.º, 50.º, 70.º, 71.º, nº 1 e 2, 72.º, n.º 2, alínea c) do Código Penal.

    21- Pelo exposto, é suficiente, justa e adequada em função dos princípios político-criminais da necessidade e da proporcionalidade das penas e das finalidades destas, a aplicação ao recorrente de uma pena de prisão suspensa na sua execução, acompanhada de regime de prova e de todos os deveres e condutas que o tribunal entender conveniente.

    NESTES TERMOS e nos mais de direito aplicáveis, que V. Exªs melhor e doutamente suprirão, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se a douta decisão recorrida, absolvendo-se o arguido da prática de qualquer crime, ou, caso assim se não entenda, seja aplicada ao recorrente uma pena de prisão suspensa na sua execução, acompanhada de regime de prova e de todos os deveres e condutas que o tribunal entender conveniente. Assim se fazendo, como sempre, serena e sã Justiça! 3.

    O Ministério Público, na primeira instância, respondeu ao recurso interposto pelo arguido, tendo concluído no sentido de que [transcrição]: 1- O princípio in dubio pro reo está reservado para aquelas situações em que, finda a produção da prova, o juiz se depara com uma dúvida insanável sobre os factos, dúvida essa que será ultrapassada por aplicação do princípio in dubio pro reo, visando evitar situações de non liquet.

    2- Não é esse o caso dos presentes autos perante a evidência dos depoimentos prestados pelas testemunhas militares da GNR e que fundamentam a douta sentença a quo.

    3- Atendendo às sucessivas condenações sofridas pelo arguido, inclusive em pena de prisão suspensa na sua execução, e no decurso da qual vem a cometer crime de idêntica natureza, é de concluir que inexiste qualquer juízo de prognose favorável que se possa fazer, tanto mais que não se vislumbra que o mesmo tenha interiorizado o desvalor da sua conduta delituosa.

    4- A simples censura do facto e a ameaça da pena de prisão, não realizam, de forma adequada, as exigências e finalidades da punição, que no caso se fazem sentir.

    5- O alegado desconhecimento de que o crime de condução de veículo em estado de embriaguez prevê igualmente a condução de veículo sem motor, onde se inclui a bicicleta, não constitui erro sobre as proibições, dado que o conhecimento da proibição e punição concreta não pode reputar-se razoavelmente indispensável para que o arguido tomasse consciência da ilicitude do facto.

    6- A perigosidade associada à actividade que é o exercício da condução em geral, a que adita a circunstância da condução de veículo em estado de embriaguez, são...

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