Acórdão nº 1111/16.6T9BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 20 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelFERNANDO PINA
Data da Resolução20 de Fevereiro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM OS JUÍZES, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÂO DE GUIMARÃES: I. RELATÓRIO A – Nos presentes autos de Processo Comum Singular, com o nº 1111/16.6T9BCL, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Local Criminal de Barcelos – Juiz 1, o Ministério Público requereu o julgamento do arguido José, empresário, casado, filho de P. e de C., natural da freguesia de …, concelho de Barcelos, nascido em 01-10-1974 e, residente na Rua …, Barcelos, imputando-lhe a prática, em autoria material, de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal.

A ofendida “Distribuição de energia, S.A.” deduziu pedido de indemnização civil contra o demandado/arguido, por danos patrimoniais, peticionando a sua condenação no pagamento da quantia de € 11.514,85 (onze mil, quinhentos e catorze euros e, oitenta e cinco cêntimos), acrescida de juros, desde a notificação ao arguido da dedução do pedido de indemnização civil até efectivo e integral pagamento.

O arguido apresentou contestação escrita e indicou prova testemunhal.

Realizado o julgamento, veio a ser proferida pertinente sentença, na qual se decidiu condenar o arguido José, pela prática, como autor material, de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203º, nº 1 e, 204º, nº 1, alínea a), do Código Penal, na pena de 300 (trezentos) dias de multa, à razão diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz a quantia de € 1.650,00 (mil seiscentos e cinquenta euros).

Mais foi julgado procedente o pedido de indemnização formulado pela demandante “Distribuição de energia, S.A.” e, consequentemente, condeno o demandado/arguido José, no pagamento de € 11.514,85 (onze mil, quinhentos e catorze euros e, oitenta e cinco cêntimos), a título de indemnização por danos patrimoniais, acrescido de juros de 4%, desde a data da notificação para contestação do pedido de indemnização civil, até efectivo e integral pagamento.

Inconformado com esta decisão condenatória, o arguido José da mesma interpôs recurso, extraindo da respectiva motivação as seguintes extensas conclusões (transcrição): 1. Por sentença proferida a 17 de Maio de 2017, foi o arguido José condenado:

  1. Pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo artigo 203º, nº1 e 204º nº1, al. a) do Código Penal; na pena de 300 dias de multa, à taxa diária de €5,50, no montante global de €1.650,00 (mil seiscentos e cinquenta euros); b) No pagamento à demandante Distribuição de energia SA, de uma indemnização a título de danos patrimoniais que se fixa em €11.514,85 (onze mil, quinhentos e catorze euros e oitenta e cinco cêntimos), a que acrescem juros actualmente de 4% desde a data da notificação para contestação do pedido de indemnização cível até efectivo e integral pagamento; c) No pagamento das custas criminais do processo, fixando-se a taxa de Justiça em 2 UC; e, por fim, condenado no pagamento das custas cíveis.

    1. O presente recurso, que tem como objecto matéria de direito, pretende sindicar o mérito daquela douta sentença quanto à produção da prova, que exigia que uma das testemunhas, pelo recorrente arrolada, e notificada, tivesse sido ouvida, 3. Mesmo que o tribunal tenha entendido que aquela não tivesse sido notificada por “endereço insuficiente” não obstante a posição da defesa.

    2. E, portanto, passa por saber se a rejeição do pedido de audição da testemunha consubstancia, na sua prática, a omissão de diligência essencial para a descoberta da verdade e, consequentemente, dela resulta a nulidade da sentença por violação do disposto na alínea c) do artigo 379º do CPP.

    3. Entende-se, pois, que o Tribunal não fez as diligências de prova que se impunham, nomeadamente com vista a determinar a inquirição da testemunha, sem ter sequer formulado um juízo acerca da sua necessidade e imprescindibilidade para a descoberta e da boa e criteriosa decisão da causa, 6. Pelo que devia a audiência de discussão e julgamento ser declarada nula, e consequentemente, serem declarados nulos todos os actos praticados posteriormente.

    4. Por ali devia e, por que não foi, deverá a sentença recorrida ser declarada nula e ser ordenada a sua remessa à primeira instância a fim de ser ouvida a testemunha e, após, ser proferida nova sentença.

    5. É sabido que a convicção do juiz é formada, nunca de forma arbitrária, mas livre. O que bem se compreende, até porque nela desempenham um papel de relevo não só a actividade cognitiva, mas também elementos racionalmente não explicáveis.

    6. Salvo quando a lei dispuser em contrário, a prova será apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador, e há de ser no equilíbrio destas duas vertentes que aquela vai ser apreciada.

    7. Assim, releva, a este contexto, referir o procedimento probatório, e que há de permitir ao juiz as provas sobre as quais recairá a sua convicção, e que lhe concederão os fundamentos para uma decisão justa e criteriosa.

    8. O procedimento probatório compreende duas fases: uma primeira implica a produção, propriamente dita, da prova, em que se vão produzir as provas admitidas; a segunda fase, por sua vez, respeita à sua apreciação e avaliação.

    9. Quanto à primeira temos que, nos termos do artigo 340º do Código de Processo Penal, “o tribunal ordena, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa”, 13. E que “os requerimentos de prova são ainda indeferidos se for notório que: a) As provas requeridas são irrelevantes ou supérfluas; b) O meio de prova é inadequado, de obtenção impossível ou muito duvidosa; ou c) O requerimento tem finalidade meramente dilatória.” 14. Naqueles termos, devia o tribunal a quo ter ordenado a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se afigurasse necessário à boa decisão da causa.

    10. Porém, na audiência de julgamento, realizada no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Local Criminal de Barcelos, no dia 8 de Maio de 2017, pelas 9h30, não foi ouvida a testemunha Pedro, tempestivamente arrolada e devidamente notificada, quando daquela não se prescindiu.

    11. Ao não o ter feito, cometeu o juiz a omissão de um ato que influiu no exame ou na decisão da causa, podendo ter-se mostrado aquele decisivo no sentido de alterar as respostas aos quesitos que poderiam levar a uma decisão diferente.

    12. Incorreu, assim, o tribunal na nulidade prevista no artigo 120º, nº2, alínea d), parte final, a qual se enquadra na omissão de diligências que possam reportar-se essenciais para a descoberta da verdade.

    13. Foi dirigido requerimento ao processo a fim de se colmatar esta nulidade, requerendo que fossem realizados os actos que deveriam ser declarados nulos, na sequência da omissão daqueloutro.

    14. O tribunal não se pronunciou e, desta forma, viu o arguido o seu direito de defesa violado.

    15. O direito de defesa do arguido concretiza-se, fundamentalmente e sobretudo, através do exercício do principio do contraditório, ao nível da produção da prova, devendo ao arguido ser facultada a possibilidade de se fazer ouvir ou produzir contraprova sobre as provas apresentadas e exercidas relativamente a factos contra si deduzidos.

    16. Devia a audiência de julgamento ter sido considerada inválida, pelo menos quando se requereu a sua legal renovação.

    17. A solução consignada, além de contribuir para a busca da verdade no quadro do processo criminal, não subtraia ao arguido os meios de defesa legítimos, nem afectaria as condições da sua participação paritária na dialéctica inerente ao processo na fase de audiência de julgamento, 23. O que sempre se exigia num processo justo, em que deve haver uma imposição de meios de defesa idênticos às partes controvertidas.

    18. Sem prescindir, mesmo que se entenda, nos termos do nº3 do artigo 120º, que devia a arguição da nulidade ser feita nos termos nele previsto, o que sempre exigia que fosse arguida a nulidade antes do término do ato, 25. Sabe-se que, não sendo razoável que a invocação da nulidade tivesse sido efectuada até ao termo do ato, deve aceitar-se a aplicação da regra geral de arguição de nulidades sanáveis.

    19. Ou seja, arguição no prazo de dez dias, pelo disposto no artigo 105º, nº1, a contar daquele em que o interessado foi notificado por qualquer termo do processo ou teve intervenção em ato nele praticado.

    20. Para que o Tribunal possa, com segurança, apurar da veracidade ou não das provas conducentes à verdade material, é necessário garantir o princípio do contraditório.

    21. No que respeita especificamente à produção das provas, o princípio exige que toda a prova deva ser, por regra, produzida em audiência, a menos que se afigure inútil ou procrastinatória.

    22. O que não reflecte de todo a situação aqui em causa, porquanto a testemunha não foi inquirida, não porque se revelou inútil o seu depoimento, mas porque o tribunal entendeu que aquela não tinha sido notificada, pelo que, perante tal, não poderia depor.

    23. A requerida audição da testemunha tornava-se necessária à descoberta da verdade e à boa decisão da causa e não, a contrario, tratava-se de prova notoriamente irrelevante ou supérflua, de obtenção impossível ou duvidosa.

    24. O arguido encontrou-se impossibilitado de exercer, na plenitude, o direito ao contraditório e direito de defesa, por não ter, através da testemunha por si arrolada, sido ouvida versão dos factos.

    25. Por fim, as nulidades traduzem-se em defeitos jurídicos que tornam inválidos ou destituem o valor de um ato, de forma total ou parcial.

    26. Em decorrência da declaração da nulidade cometida no processo quer o acto em que a mesma ocorreu quer os que com ela se encontram conexos ficam inválidos.

    27. Deve dizer-se quais os actos que sofrem este efeito, porquanto a declaração de invalidade irá produzir a destruição dos actos imperfeitos pelo que se torna imperiosa a sua à renovação, a menos que a mesma não seja possível nem necessária.

    28. A renovação surge como o único remédio para a inexistência e para as nulidades...

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