Acórdão nº 8529/15.0T8VNF-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA DOS ANJOS NOGUEIRA
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – Relatório José e esposa Maria, residentes na Rua … Cavalões, vieram instaurar contra os executados Manuel e Filipa, residentes na Rua …, Vila Nova de Famalicão, bem como contra Manuela, com residência na Rua ….

Fundamentando a sua pretensão, alegaram, em síntese que são donos e legítimos possuidores das fracções autónomas designadas pelas letras "DS" e "0", destinadas a habitação e garagem respectivamente, num edifício constituído em propriedade horizontal designado por "Edifício X", sito na Rua …, na união de freguesias de …, no concelho de Vila Nova de Famalicão.

Invocaram, ainda, que, em 19 de Agosto de 2011, deram de arrendamento aos executados Manuel e mulher Filipa as referidas fracções autónomas, e que, no referido contrato de arrendamento figurava como fiadora dos arrendatários/executados Manuela.

Mais invocaram que os arrendatários/executados deixaram de pagar as rendas, que se venceram desde Outubro de 2014 a Julho de 2015, ascendendo o seu débito a Eur 4 500,00 (Quatro mil e quinhentos euros), e que aos valores vencidos a titulo de rendas vencidas e não pagas acresceu o valor de Eur 2 250,00 (dois mil duzentos e cinquenta euros), correspondente à indemnização prevista no n.º 1 do artigo 1041.º do Código Civil.

Por último que, por Notificação Judicial Avulsa os exequentes, ora recorrentes, comunicaram aos arrendatários e à sua fiadora a resolução do contrato de arrendamento, o valor em divida, esclarecendo que a referida comunicação lhes foi feita pessoalmente por Agente de Execução, que lavrou certidão de citação, sem que os arrendatários e/ou a sua fiadora tivessem procedido ao pagamento das quantias em divida.

*Foi, então, proferido despacho liminar com o seguinte teor: “Compulsados os autos, constato que a pretensão executiva consiste no pagamento de quantia certa, sendo dirigida contra os arrendatários e contra a fiadora daqueles arrendatários, com base no contrato de arrendamento e na comunicação de rendas vencidas e não pagas efectuada aos executados.

Embora nos presentes autos não haja lugar a despacho liminar, nada impede, neste momento, de apreciar a regularidade dos mesmos, nomeadamente a questão da (in)existência de título executivo (cf. artigo 734.°, n.01 do Código de Processo Civil).

Nos termos do artigo 14.o-A do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU/2012), aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, com as alterações da Lei n.º 31/2012, de 14 de Agosto, "o contrato de arrendamento, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em divida, é titulo executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente às rendas, aos encargos ou às despesas que corram por conta do arrendatário." Antes das alterações introduzidas pela Lei n.º 31/20]2 citada, o NRAU regulava esta matéria no artigo no artigo 15.°, n.º 2, que dispunha o seguinte: "O contrato de arrendamento é titulo executivo para a acção de pagamento de renda quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida." Estamos perante um título executivo complexo, cuja possibilidade de formação passou a ser maior: também constitui título executivo o conjunto formado pelo contrato de arrendamento e pelo comprovativo da comunicação ao arrendatário quando referido a rendas, a encargos e as despesas que corram por conta do arrendatário.

Pois bem, é conhecida diversa jurisprudência dos nossos tribunais superiores que tem considerado o fiador abrangido pela força executiva dos referidos documentos. Entre os que defendem esta posição, discute-se ainda se para haver título executivo contra o fiador é necessário comprovativo da comunicação ao próprio ou basta a comunicação ao arrendatário, havendo partidários de ambas as soluções.

Ora, na nossa opinião, e salvo o devido respeito por entendimento contrário, a razão está do lado dos defensores da inexistência de título executivo contra o fiador, ainda que seja comprovada a comunicação ao mesmo do montante em dívida.

Neste sentido se pronunciaram, na doutrina, Rui Pinto Duarte, Manual da Execução e Despejo, Coimbra Editora, 2013, pp. 1164 e 1165, Fernando de Gravata Morais, Cadernos de Direito Privado, n.º 27, p. 57 e segs., e Falta de Pagamento da Renda no Arrendamento Urbano, p. 76 e segs., e Miguel Teixeira de Sousa, Leis do Arrendamento Urbano Anotadas, Almedina, 2014, p. 406, e, na jurisprudência, o Ac. da RP de 24.04.2014, proc. 69/13.9YYPRT.P1, www.dgsi.pt, com um voto de vencido.

Rui Pinto Duarte apresenta os seguintes argumentos: a norma (artigo 14.O-A do NRAU/2012) não prevê a formação de título executivo contra o fiador e por força do princípio da taxatividade dos títulos executivos e da natureza restritiva das normas que os preveem não é possível fazer interpretações extensivas da norma; o título executivo é complexo e pressupõe a reunião conjunta de dois documentos, pelo que se o fiador não consta de um deles não existe título executivo contra ele; a alteração do NRAU pela Lei n.º 31/2012, de 14 de Agosto deixou intocado o texto quando a questão já se discutia, num sinal de que o legislador não pretendeu tomar claro que o fiador também pode ser executado; o Decreto-Lei n.º 1/2013, de 7 de Janeiro, denuncia essa intenção legislativa ao consagrar expressamente que só o arrendatário pode ser objeto do procedimento especial de despejo quando nele está compreendido a execução das rendas em dívida.

Fernando de Gravato Morais, por seu turno, defende que não se forma título executivo contra o fiador com o fundamento essencial de que não sendo a norma clara no sentido de incluir o fiador e havendo elementos literais que indiciam que o quis excluir, uma vez que o fiador se encontra numa posição mais débil, não lhe deve corresponder um regime mais agravado do ponto de vista processual, como sucede se inclusivamente se prescindir da notificação dele.

Segundo Miguel Teixeira de Sousa, o preceito (artigo 14.0~A do NRAU/2ü12) apenas admite que a comunicação seja realizada ao arrendatário, certamente porque somente esta parte está em condições de controlar a veracidade do seu conteúdo e de deduzir alguma eventual oposição. Por isso, o título executivo só se pode formar contra o próprio arrendatário, o que significa que o mesmo não se estende ao fiador que seja responsável pelo pagamento das rendas em dívida.

Finalmente, no Ac. da RP de 24104/2004 citado, a posição que fez vencimento apresenta, designadamente, os seguintes argumentos: com o novo Código de Processo Civil (CPC) os...

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