Acórdão nº 110/15.0T8CMN.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 22 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA DA PURIFICA
Data da Resolução22 de Fevereiro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

- Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães – I.

RELATÓRIO Laura, casada, separada de pessoas e bens de Manuel, ambos residentes na Rua …, União de Freguesias de Viana do Castelo (Santa Maria Maior e Monserrate) e Meadela, Viana do Castelo intentou estes autos de acção declarativa sob a forma de processo comum contra o Estado Português, pedindo: - se declare a inconstitucionalidade da primeira parte do segmento da norma prevista no art.º 5.º n.º 5 al. c) da Lei n.º 54/2005, de 15 de Novembro, por violação do princípio da não retroactividade da lei das Leis restritivas de direito, liberdades e garantias, quando interpretado no sentido de que, para que o reconhecimento da propriedade privada de construções que datam antes de 1951, sobre terrenos situados em parcelas de leitos ou margens das águas do mar ou de águas navegáveis ou flutuáveis, possa ser obtido sem sujeição ao regime de prova estabelecido nos números anteriores do mesmo normativo legal, têm aqueles (terrenos) de estar integrados em zona urbana consolidada como tal definida no Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação, fora da zona de risco de erosão ou de invasão do mar; - se declare a inconstitucionalidade das normas previstas nos artºs 2.º, 3.º, 4.º, 11.º n.º 2, 12.º e 15.º nº 2 e 5 da Lei n.º 54/2005, de 15 de Novembro, quando interpretados no sentido de que a mera classificação de certos bens como do domínio público implica a sua automática transferência para tal domínio, independentemente de justa indemnização, por violação do direito fundamental de propriedade, do princípio da não retroactividade das leis restritivas de direitos, liberdades e garantias e do princípio de Estado de direito democrático, na sua dimensão relativa à segurança jurídica, por colocar em causa a confiança depositada no registo público da propriedade, plasmados nos artºs. 17.º, 18.º e 62.º n.º 1 e 2 da CRP; - se declare que a Autora é dona e legítima possuidora, com exclusão de outrem, Réu incluído, do prédio urbano descrito no art.º 1.º da petição inicial e que se mantém na sua titularidade e na dos seus antecessores, desde antes de 1951, nos termos e para os efeitos do disposto nos artºs. 1256.º, 1260.º, 1287.º, 1288.º, 1316.º e 1317.º CC e 10.º, 11.º, 15.º da Lei n.º 54/2005, de 15 de Novembro; - se condene o Réu a reconhecer e respeitar os direitos de propriedade plena da autora e a abster-se da prática de quaisquer actos ofensivos do mesmo.

Alega, para tanto e em súmula, que a Autora é a única e legítima proprietária de um barracão de rés-do-chão e terreno de rossio ou logradouro, atravessado por caminho público, a confrontar do Norte com João, do sul e poente com domínio público hídrico e de Nascente com Maria, com a área de 1.337,20 m2, sito no Lugar de …, na freguesia de …, concelho de Caminha, inscrito na matriz urbana sob o artigo n.º ... e descrito na CRP de Caminha sob número ....

Tal prédio, de acordo com o Plano Director Municipal do concelho de Caminha e de harmonia com a localização do mesmo, insere-se, na carta de Ordenamento, em Espaço Urbanizável de média densidade (H2), com uma tipologia dominante de moradia isolada, geminada ou em banda (COS ≤ 0.50 e R/chão + 1).

Conforme carta de condicionantes, o prédio urbano localiza-se na faixa do Domínio Público Marítimo.

O artigo n.º ... foi inscrito na matriz no ano de 1950 e o prédio urbano sub judice já se encontra cadastrado, representado e identificado na carta militar desde 1949.

A edificação de tal prédio urbano tem a área actual de implantação de 105,80 m2 e a edificação está integrada em zona de perímetro urbano, fora da zona de risco de erosão ou de evasão do mar, e numa área urbana consolidada em termos de morfologia urbana e infra-estruturada.

O PDM de Caminha não adoptou a definição de zona urbana consolidada – que apenas existe no ordenamento jurídico desde a entrada em vigor do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, como não classifica nenhum tipo de espaço de uso da área do concelho com esta designação.

Alega os factos atinentes à aquisição do dito prédio por usucapião.

Mais alega a inconstitucionalidade da primeira parte do segmento da norma prevista no art. 5º, nº 5, al. c) da Lei nº 54/2005, de 15 de Novembro, por violação do princípio da não retroactividade da lei das Leis restritivas de direitos, liberdades e garantias, quando interpretado no sentido de que, para o reconhecimento da propriedade privada de construções que datam antes de 1951, sobre terrenos situados em parcelas de leitos ou margens das águas do mar ou de águas navegáveis ou flutuáveis, possa ser obtido sem sujeição ao regime de prova estabelecido nos números anteriores do mesmo normativo legal, têm aqueles (terrenos) de estar integrados em zona urbana consolidada como tal definida no Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação, fora da zona de risco de erosão ou de invasão do mar.

Alega, ainda, a inconstitucionalidade das normas previstas nos artºs 2.º, 3.º, 4.º, 11.º n.º 2, 12.º e 15.º nº 2 e 5 da Lei n.º 54/2005, de 15 de Novembro, quando interpretados no sentido de que a mera classificação de certos bens como do domínio público implica a sua automática transferência para tal domínio, independentemente de justa indemnização, por violação do direito fundamental de propriedade, do princípio da não retroactividade das leis restritivas de direitos, liberdades e garantias e do princípio de Estado de direito democrático, na sua dimensão relativa à segurança jurídica, por colocar em causa a confiança depositada no registo público da propriedade, plasmados nos arts. 17.º, 18.º e 62.º n.º 1 e 2 da CRP.

O Réu Estado defendeu-se por excepção e por impugnação, nos termos constantes de fls. 80 a 83, que aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.

Foi realizada audiência prévia, sem que tenha havido qualquer reclamação.

Admitidas as testemunhas arroladas e a documentação da prova, realizou-se audiência de discussão e julgamento com observância de todo o formalismo legal.

Seguiu-se sentença que terminou com o seguinte dispositivo.

Pelo exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente e consequentemente decido: I - Reconhecer ou declarar a inconstitucionalidade das normas previstas nos artºs 2º, 3º, 4º, 11º nº 2, 12º e 15º nºs 2 e 5 da Lei n.º 54/2005, de 15 de Novembro, quando interpretados no sentido deque a mera classificação de certos bens como do domínio público implica a sua automática transferência para tal domínio, independentemente de justa indemnização, por violação do direito fundamental de propriedade, plasmada no artº 62º nºs 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa.

II - Julgar improcedentes todos os restantes pedidos- alíneas a), c), d) e e) -e consequentemente deles absolvo do pedido o Réu Estado Português.

*Custas por A e R sem prejuízo de isenções tributárias, com taxa de justiça fixada em 5/6 para a primeira e 1/6 para o segundo.

Notifique e Registe.

Descontente com a sentença a autora apresenta recurso que termina com as seguintes “conclusões”: I- DA NULIDADE DA SENTENÇA 1. Estipula o disposto no art.º 615.º n.º al. c) CPC que a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.

2. O vício da decisão a que alude o art.º 615.º n.º 1 al. c) do NCPC (2013) – contradição entre os fundamentos e a decisão – existe quando a fundamentação de facto ou de direito aponta para um sentido, que lógica e formalmente não é comportado pela decisão, estando com ela em frontal colisão, tornando-a incoerente e ininteligível.

3. Isto balizado, peticionou a Autora na acção o disposto nas alíneas c), d) e e) da p.i., cujo teor, por economia e brevidade processual, se remete para as alegações do presente recurso, se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais e se encontra supra citado.

4. Consta do item “II. Factualidade assente” da sentença proferida pelo Tribunal a quo os factos provados elencados nos n.º 1, 4, 6, 7, 8, 9, 10 e 12, cujo teor, por economia e brevidade processual, se remete para as alegações do presente recurso, se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais e se encontra supra transcrito.

5. Discorre o Tribunal a quo no item “III. Da subsunção jurídica” da sentença proferida a fundamentação supra referida nas alegações de recurso, que ora se remete e se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.

6. Acontece, porém, que, no final da sentença, no item “Decisão”, o Tribunal a quo julgou a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, decidiu: “I - Reconhecer ou declarar a inconstitucionalidade das normas previstas nos artºs 2º, 3º, 4º, 11º nº 2, 12º e 15º nºs 2 e 5 da Lei n.º 54/2005, de 15 de Novembro, quando interpretados no sentido de que a mera classificação de certos bens como do domínio público implica a sua automática transferência para tal domínio, independentemente de justa indemnização, por violação do direito fundamental de propriedade, plasmada no artº 62º nºs 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa.

II - Julgar improcedentes todos os restantes pedidos - alíneas a), c), d) e e) -e consequentemente deles absolvo do pedido o Réu Estado Português.” 7. O Tribunal a quo ao declarar a inconstitucionalidade das normas previstas nos art.°s 2.º, 3.º, 4.º, 11.º n.º 2, 12.º e 15.º n.º 2 e 5 da Lei 54/2005, de 15 de Novembro, quando interpretados no sentido de que a mera classificação de certos bens como do domínio público implica a sua automática transferência para tal domínio, independentemente de justa indemnização, por violação do disposto no art.º 62.º n.º 1 e 2 CRP, 8. tendo dado como provada a matéria de facto supra citada, constante do item “II. Factualidade assente” da sentença proferida, 9. considerado no ponto “III. Da Subsunção jurídica” i) que se as coisas eram propriedade particular, como tal têm de continuar, enquanto não forem expropriadas mediante a adequada indeminização...

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