Acórdão nº 19/17.2T8CBC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelJORGE TEIXEIRA
Data da Resolução30 de Maio de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: A. P..

Recorrido: Maria.

Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Juízo de Competência Genérica de Cabeceiras de Basto.

  1. P.

, residente na Rua …, freguesia de ..., do concelho de Cabeceiras de Basto, veio intentar a presente acção declarativa sob a forma de processo comum contra Maria, residente no Lugar …, freguesia de ..., do concelho de Cabeceiras de Basto, pedindo a condenação desta ré no pagamento da quantia global de €7.900,00 a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros à taxa legal de 4% ao ano, contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.

Em síntese, alegou o autor que, tendo sido executado no processo n.º 341/08.9GACBC-A, a requerimento da ora ré (que naquele processo figurava como exequente), foi-lhe penhorado o veículo de matrícula MO, afecto à sua actividade de taxista, o que lhe provocou, durante o tempo em que se manteve a penhora (que viria a ser levantada por ordem judicial), (1) prejuízo patrimonial de € 100,00 por dia – decorrente da paralisação – durante 49 dias, num total de € 4.900,00 e (2) danos não patrimoniais no valor de € 3.000,00.

Regularmente citada, a ré não apresentou contestação, nem constituiu mandatário, pelo que se declararam confessados os factos articulados na petição inicial e notificado o Ilustre Advogado do autor para apresentar alegações por escrito, o que veio a fazer, tendo pugnado aí pela procedência integral da petição inicial.

Por existirem factos, respeitantes ao processo n.º 341/08.9GACBC-A, que careciam de ser provados documentalmente, nos termos do disposto no artigo 568.º, alínea d), do Código de Processo Civil, foi, ainda, ordenada a passagem da respectiva certidão, que foi junta aos autos, de fls. 38 a 58, donde resulta que aqueles autos “se encontram arquivados desde 14-06-2017, tendo a execução sido extinta por decisão de 31-03-2017, por ter sido efectuado o pagamento integral da quantia exequenda e custas.

Da certidão em causa foi novamente notificado o autor.

Considerando que a manifesta simplicidade de que reveste a caus nos termos do disposto no artigo 567.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, foram dados por reproduzidos os factos da petição inicial, tendo-se o tribunal limitado à fundamentação de direito e à parte decisória.

Foi proferida decisão que julgou a acção totalmente improcedente.

Inconformados com esta decisão, dela interpôs recurso o Autor, sendo que, das respectivas alegações desses recursos extraiu, em suma, as seguintes conclusões: 1.

O disposto no art.º 858.º do Código de Processo Civil não tem pertinência e nem interesse para os factos em discussão nos presentes Autos; 2.

Estando em causa, nos presentes Autos, a ilegalidade/ilicitude dos actos de penhora e apreensão do veículo descrito sob o ponto 1 da fundamentação de facto, por terem incidido sobre instrumento de trabalho o A. (art.º 737.º, n.º 2 do CPC), a culpa da Ré na sua realização, a consequente privação do uso do aludido instrumento de trabalho e respectivas consequências na esfera jurídica do A., o objecto do litígio prende-se com a verificação dos requisitos da responsabilidade civil extracontratual (art.º 483.º do Código Civil).

3.

Nos Autos de Execução n.º 341/08.9GACBC-A, a Mm.ª Juiz de direito da Secção de Comp. Gen. da Instância Local de Cabeceiras de Basto proferiu douto despacho onde conclui pela ilegalidade da penhora, atento o regime do art.º 737.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, ordenando o levantamento da mesma; 4.

In casu, mostram-se preenchidos todos os requisitos do art.º 483.º do Código Civil: a.

Facto: Nos Autos de Execução n.º 341/08.9GACBC-A, foi penhorado e apreendido o veículo descrito sob o artigo 1.º da Petição Inicial; b.

Ilicitude: O veículo descrito sob o artigo 1.º da Petição Inicial (táxi) constituía o principal e mais indispensável instrumento de trabalho do Autor (taxista), estando legalmente vedada, por isso, a possibilidade da sua penhora (art.º 737.º, n.º 2 do Código de Processo Civil); c.

Culpa: no acto da apreensão, o A. deu conta, quer à Ré, quer à Sr.ª Agente de Execução, de que aquele veículo era usado por si na sua profissão de taxista, não tendo outro para a realizar, sendo que a Ré sabia que o A. precisava daquele veículo para a sua actividade profissional e, mesmo assim, perpetrou a penhora; d.

Dano: O A. viu-se privado daquele seu veículo táxi e das virtualidades económicas que o mesmo lhe proporciona durante 49 dias, período durante o qual viu-se impossibilitado de exercer a sua actividade por falta do instrumento de trabalho, perdeu clientes e foi forçado a recusar serviços, sentindo tristeza, humilhação, vexame, impotência e revolta; e.

Nexo de causalidade: Os actos de penhora, apreensão e constituição do A. como fiel depositário do veículo (táxi), com obrigação de o entregar assim que lhe fosse exigido, não o podendo utilizar enquanto se encontrasse à sua guarda, sendo intimado de que a utilização o faria incorrer em crime de desobediência, são causa adequada do dano.

5.

Os danos não patrimoniais sofridos pelo A., pela sua gravidade, merecem a tutela do direito (art.º 496.º, n.º 1 do Código Civil); 6.

A douta sentença recorrida viola os art.

os 483.º, n.º 1 e 496.º, n.º 1 do Código Civil.

*Os Apelados apresentaram contra-alegações concluindo pela improcedência da apelação interposta.

*Colhidos os vistos, cumpre decidir.

*II- Do objecto do recurso.

Sabendo-se que o objecto do recurso é definido pelas conclusões no mesmo formuladas, sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso, a questão decidenda é, no caso, as seguintes: - Analisar do enquadramento e da existência de responsabilidade civil por parte da Ré.

*III- FUNDAMENTAÇÃO.

Além dos factos que constam do relatório que antecede, e com relevância para a decisão do recurso, consta da fundamentação de direito da decisão recorrida o que a seguir se transcreve: (…) Considerando que a causa reveste manifesta simplicidade, nos termos do disposto no artigo 567.º, n.º3, do Código de Processo Civil, dando-se por reproduzidos os factos da petição inicial, o tribunal limitar-se-á à fundamentação de direito e à parte decisória.

Tais factos são os seguintes: 1. O A. é dono e legítimo possuidor do veículo ligeiro de passageiros, matrícula MO, da marca Skoda, modelo Octávia; 2. O A. exerce a actividade de transportes de aluguer em veículos automóveis ligeiros de passageiros (taxista) para o qual detém o Certificado de Aptidão Profissional n.º … emitido pelo IMTT, válido até 02/07/2017; 3. Utilizando aquele seu veículo identificado em 1. na sua actividade profissional de taxista, com carácter habitual e fim lucrativo; 4. Aquele táxi do A. é explorado a dois turnos; 5. Nos Autos de Execução n.º 341/08.9GACBC-A que correram termos neste Tribunal, em que foi exequente a aqui Ré e executado o aqui Autor, em 5 de Dezembro de 2014, foi penhorado e apreendido aquele veículo; 6. Tendo o A. ficado depositário, com obrigação de o entregar assim que lhe fosse exigido, não o podendo utilizar ou alienar por doação, venda ou qualquer outra forma, enquanto se encontrasse à sua guarda; 7. E sendo intimado de que a utilização o faria incorrer em crime de desobediência e a alienação em crime de furto; 8. No acto da apreensão, o A. deu conta, quer à Ré, quer à Sr.ª Agente de Execução, de que aquele veículo era usado por si na sua profissão de taxista, não tendo outro para a realizar; 9. Após a apreensão, o A. deduziu oposição à penhora daquele veículo, requerendo o seu levantamento por se tratar de um veículo afecto ao trabalho; 10. E por douto despacho proferido naqueles autos, em 21 de Janeiro de 2015, foi determinado o levantamento da penhora incidente sobre o referido veículo por ter considerado que se tratava de “(…) veículo táxi que é utilizado pelo Executado como instrumento de trabalho, assim se consubstanciando como bem isento de penhora, ao abrigo do citado regime previsto no art.º 737.º, n.º 2 do Código de Processo Civil (…)”; 11. Aquele despacho foi notificado às partes em 23 de Janeiro de 2015; 12. O A. viu-se privado daquele seu veículo táxi e das virtualidades económicas que o mesmo lhe proporciona desde 05/12/2014 até 23/01/2015, isto é, 49 dias; 13. O aludido veículo é diariamente utilizado pelo A. no exercício da sua actividade de transportes de aluguer em veículos automóveis ligeiros de passageiros (taxista); 14. Durante o período que se manteve a penhora e apreensão ilegal do veículo, o A. viu-se impossibilitado de exercer a sua actividade por falta do instrumento de trabalho; 15. A Associação Portuguesa de Seguradores (APS) e a Associação Nacional de Transportadores Rodoviários em Automóveis Ligeiros (ANTRAL) e a Federação Portuguesa do Táxi (FPT), no âmbito dos protocolos firmados com cada uma das instituições, acordaram os valores de paralisação a vigorar no período de 1 de Março de 2015 a 29 de Fevereiro de 2016, para os veículos ligeiros de aluguer para o transporte de passageiros, mormente Táxis (mais de 4 passageiros) em exploração 2 turnos -, no valor de cerca de €100,00/dia (concretamente €106,81).

16. Mercê da conduta da Ré, o A. sofreu um prejuízo patrimonial de €4.900,00 (€100,00 x 49 dias); 17. Mercê da conduta da Ré, o A. sofreu tristeza, humilhação, vexame, perante a atitude prepotente e arbitrária da Ré, em insistir na aludida penhora e apreensão ilegal do seu instrumento de trabalho, sentindo-se impotente e revoltado, por não poder evitar o impedimento forçado de usar aquele seu veículo, bem como de retirar os proveitos que o mesmo lhe oferece; 18. O A. foi forçado a recusar todos os serviços de táxi durante o período de durou a penhora e apreensão ilegal; 19. O que fez com que perdesse clientes, que já não conseguiu recuperar; 20. A Ré sabia que o A. precisava daquele veículo para a sua actividade profissional; 21. E, mesmo assim, perpetrou a penhora e apreensão ilegal em...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT