Acórdão nº 158/12.6GDGMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelAUSENDA GON
Data da Resolução21 de Maio de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: No âmbito do referenciado processo comum singular da Instância Local Criminal de Guimarães, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, por decisão proferida em 8/11/2017, foi indeferida a promoção da notificação da acusação ao arguido M. N.

, declarado contumaz e residente na Alemanha, por a mesma não ter a virtualidade de fazer cessar os efeitos da declaração de contumácia.

Inconformado com a referida decisão, o Ministério Público interpôs recurso, cujo objecto delimitou com as seguintes conclusões (sic): «1. O arguido encontra-se declarado contumaz.

  1. Perante a localização do paradeiro do arguido num outro país da União Europeia, o Ministério Público promoveu que se designasse nova data para julgamento do arguido e que o arguido fosse notificado da acusação e do despacho que designou data para audiência na modalidade prevista no art.º 113º/1, al. a), do Código de Processo Penal, ou seja, mediante contacto pessoal por parte de autoridade oficial do país onde o arguido se encontra, no contexto de um pedido de cooperação judiciário internacional.

  2. O despacho recorrido indeferiu o promovido, com base nos considerandos do AUJ 5/2014, segundo os quais “a notificação de um arguido português (que se mostra declarado contumaz) do despacho de acusação, em morada fora do território nacional, não faz cessar os efeitos da declaração de contumácia”.

  3. Sucede que o AUJ 5/2014 apenas se debruçou sobre a ineficácia das notificações realizadas por via postal de arguido residente no estrangeiro e, consequentemente, na irrelevância da recolha de TIR para efeitos de cessação da contumácia.

  4. O AUJ 5/2014 nunca defendeu, directa ou indirectamente, que a notificação de arguido contumaz residente no estrangeiro não faz cessar os efeitos da declaração de contumácia.

  5. O AUJ 5/2014 também não fez uma só menção relativamente à notificação de arguido contumaz residente no estrangeiro, nos termos previstos no art.º 113º/1, al. a), do Código de Processo Penal.

  6. O promovido pelo Ministério Público, portanto, não viola, directa ou indirectamente, o dispositivo ou os fundamentos do AUJ 5/2014.

  7. Por outro lado, a interpretação do despacho recorrido implica a absoluta impossibilidade jurídica (não prática) de notificação de arguidos e a consequente paralisação dos respectivos processos, só porque os arguidos se encontram contumazes e residem no estrangeiro.

  8. Não se vislumbra razão justificativa para que, no espaço de justiça europeu, se possa notificar validamente uma sentença mediante contacto pessoal e executar (quase) automaticamente os mais diversos pedidos de cooperação judiciária emanados pelos tribunais dos outros Estados Membros (nomeadamente relativos a decisões de apreensões, aplicações de sanções pecuniárias, perda de vantagens e bens e mesmo de detenções ou prisões), mas já não se possa confiar um acto tão simples e “corriqueiro” como contactar pessoalmente um arguido e realizar uma notificação.

  9. Para além disso, permitir que a contumácia sirva de empecilho para a eficácia da notificação dos despachos em causa nos autos constitui uma total inversão/deturpação da lógica do instituto, que visa conseguir, precisamente, essa notificação.

  10. Quando o art.º 336º/1 do Código de Processo Penal refere que a contumácia cessa com a “apresentação” do arguido, esta norma, tal como o AUJ 5/2014 também o refere, quer-se reportar ao contacto pessoal do arguido com o Tribunal, uma vez que é a falta desse contacto pessoal, traduzido na falta de notificação do despacho que designou data para julgamento, que dá origem à contumácia - art.º 335º/1 do Código de Processo Penal.

  11. Ora, existe um claro contacto pessoal entre o tribunal e o arguido quando uma autoridade oficial estrangeira contacta pessoalmente com o arguido e notifica-o da acusação e do despacho que designa data para audiência, uma vez que aquela autoridade funciona como uma mera longa manus do tribunal português, no contexto de um pedido de cooperação internacional.

  12. Pelo exposto, a realização da notificação dos despachos de acusação e...

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