Acórdão nº 1346/15.9T8CHV.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Dezembro de 2018
Magistrado Responsável | AFONSO CABRAL DE ANDRADE |
Data da Resolução | 06 de Dezembro de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Sumário: 1.
Quando na petição inicial o requerente do inventário alega que a herança é constituída exclusivamente por bens imóveis, pode-se retirar dessa frase não apenas a negação da existência de outro tipo de bens como também a negação da existência de dívidas.
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Recai sobre os outros interessados o ónus de alegar a existência de dívidas, bem como de alegar a existência de despesas sujeitas a colação.
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Se nenhum dos interessados alegar e provar a existência de dívidas da herança e de despesas sujeitas a colação, então o Juiz deve concluir, para todos os efeitos práticos, que não existem.
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Neste cenário, não é legítimo concluir que faltam factos sobre a existência ou inexistência de despesas sujeitas a colação e sobre a existência de dívidas da herança, nomeadamente para efeitos do cálculo da legítima e para determinação da eventual inoficiosidade de liberalidades.
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Estando em Juízo todos os interessados na herança, se nenhum deles alegar a existência de despesas sujeitas a colação nem a existência de dívidas da herança, não faria sentido deixar de efectuar os cálculos da legítima com fundamento numa puramente hipotética existência de despesas sujeitas a colação e dívidas.
I- Relatório Os Autores M. F., M. P.
e marido A. P., F. C.
e mulher A. R., intentaram no Juízo Central Cível de Vila Real, Juíz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real, acção declarativa de simples apreciação e de condenação, materializada sob a forma de processo comum, contra ADÉLIA, E. T., e D. B. e C. B., todos com os sinais dos autos, formulando os seguintes pedidos: a) devem os RR. ser condenados a reconhecer -e isso mesmo ser declarado e reconhecido- que os autores são os únicos e universais herdeiros legitimários do falecido J. C.; b) devem os RR. ser condenados a reconhecer -e isso mesmo ser declarado e reconhecido- que o valor total dos bens pertencentes ao falecido J. C., tendo em conta os bens deixados, os bens doados e o bem incluído no testamento, perfazem o valor total de € 74.418,74; c) devem os RR. ser condenados a reconhecer -e isso mesmo ser declarado e reconhecido- que o valor da legítima dos herdeiros legitimários (descendentes) do falecido J. C. perfaz o montante de € 49.612,50; d) devem os RR. ser condenados a reconhecer -e isso mesmo ser declarado e reconhecido- que o valor da segunda liberalidade (segunda doação a favor da R. ADÉLIA), é, em parte, inoficiosa porque ofende a dita legítima no montante de € 23.881,75.
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devem os RR. ser condenados a reconhecer -e isso mesmo ser declarado e reconhecido- que a deixa testamentária é totalmente inoficiosa.
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deve a R. ADÉLIA ser condenada a repor à herança a quantia de € 23.881,75, a qual deverá ser feita com a verba n.º 3 da segunda doação no valor de € 24.000,00; Para tanto, alegam sinteticamente que: (i) No dia 1 de Março de 2015 faleceu J. C., de 82 anos de idade, no estado de solteiro, natural da freguesia de (...); (ii) O falecido não deixou ascendentes vivos, deixou 3 filhos, os autores M. F., M. P. e F. C.; (iii) A herança aberta por óbito do falecido J. C. é constituída apenas por bens imóveis situados no limite da dita União das freguesias de (...) e (...), concelho de C.; (iv) O falecido J. C. outorgou, no dia 11 de Agosto de 1999, escritura de doação a favor da R. ADÉLIA, exarada no Livro de Escrituras Diversas n.º (...)-C, de fls. 88 a 88 verso, do Cartório Notarial de C.; (v) O falecido J. C. fez, ainda, no dia 18 de Fevereiro de 2015, testamento público a favor dos RR. E. T. e D. B. e, ainda da autora M. F., exarado no Livro de Testamentos e Escrituras de Revogação de Testamentos n.º 4-T do Cartório Notarial de H. R., Notário em V..
Os Réus ADÉLIA, E. T.
e D. B.
deduziram contestação, contra-alegando, sinteticamente, que: (a) O meio processual não é o adequado; (b) Corre termos no Cartório Notarial de C. o competente processo de inventário nº. (...) por óbito de J. C., ocorrendo a excepção de litispendência; (c) Não aceitam a avaliação dos imóveis; (d) Os Autores omitem créditos da herança.
Concluíram, pedindo a absolvição da instância ou a absolvição do pedido.
Foi proferido saneador-sentença, o qual: A) Julgou procedente a excepção dilatória de erro na forma do processo e absolveu os Réus ADÉLIA, E. T., D. B. e C. B. da instância atinente aos 2.º, 3.º, 4.º, 5.º e 6.º pedidos formulados pelos Autores; B) Julgou a excepção de litispendência improcedente; C) Reconheceu os Autores M. F., M. P. e F. C. como herdeiros legitimários do falecido J. C..
Os Autores recorreram desta sentença, não se conformando com o segmento que julgou procedente a excepção de erro na forma do processo.
Este Tribunal da Relação de Guimarães julgou o recurso procedente e determinou o prosseguimento dos autos.
Foi proferido despacho que enunciou o objecto do litígio e os temas da prova.
Teve lugar a audiência final.
A final, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e em consequência ABSOLVEU os Réus do peticionado.
Inconformados com esta decisão, os autores dela interpuseram recurso, que foi recebido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos, e com efeito meramente devolutivo, findando a respectiva motivação com as seguintes conclusões: I- Os AA., ora recorrentes, não podem deixar de discordar da mui douta sentença, ora recorrida, uma vez que existem nos autos elementos suficientes para suportar a decisão da causa que consideram correcta e justa, ou seja, a total procedência da presente acção e a consequente condenação dos RR. nos pedidos formulados em sede de P.I.
II- No mui douto despacho saneador, dando-se cumprimento ao disposto no artigo 596º do CPC, foi fixado o seguinte: OBJECTO DE LITÍGIO "A) Da inoficiosidade da doação outorgada por J. C. com referência à Ré Adélia; B) Da inoficiosidade da deixa testamentária exarada por J. C.; C) Da obrigação imputável à Ré Adélia de reposição à herança de J. C. da quantia de 23.881.75€." III- E enunciados como TEMAS DE PROVA: "O valor dos imóveis descritos nos artigos 7° a 10° da petição inicial." IV- Na verdade, da P.I. constam única e simplesmente - A relação de Bens- ou seja, todos os bens que fazem parte da herança aberta por óbito do falecido J. C.- os bens deixados, os bens doados e o bem incluído no testamento.
V- Tal como resulta do inventário nº (...), o qual corre termos pelo aí citado Cartório Notarial, da Relação de Bens apresentada constam todos os bens existentes.
VI- Apesar de os RR., na sua contestação, alegarem a existência, para além de todos os referidos bens, de possíveis créditos e de possíveis bens móveis, não concretizaram qualquer crédito, nem qualquer bem móvel.
VII- Por essa razão é que também, no douto despacho saneador, foi fixado como único tema de prova: "O valor dos imóveis descritos nos artigos 7° a 10° da petição inicial." VIII- Todavia, A douta sentença, ora recorrida, na sua fundamentação, refere: "Porém, os Autores não alegam (e tampouco provaram - ónus imputável aos mesmos) a existência ou inexistência de despesas sujeitas a colação e a existência ou inexistência de dívidas da herança, matéria fáctica imprescindível para efectivação do cálculo da legítima, limitando-se tão-só a invocar os bens imóveis que integram o acervo hereditário (no artigo 7°) da petição inicial." IX- Refere, ainda: "consequentemente, afere-se que os factos vertidos na petição inicial são manifestamente insuficientes para sustentar a efectivação das operações do cálculo da legítima, nos termos plasmados no art. 2162° do Código Civil (vd. Acórdão do TRC de 5.3.2013, proc. n° 930/11.4T2AVR.C1, in www.dgsi.pt)".
X- E conclui: "destarte, inviabilizado o cálculo da legítima dos Autores, sucumbe a premissa sine qua non para a aferição da impetrada inoficiosidade, pelo que se demanda a improcedência dos 2.°) a 6°) pedidos formulados nos autos." XI- A afirmação feita na douta sentença de que os AA. se limitaram a invocar os bens imóveis que integram o acervo hereditário é totalmente falsa e nada tem a ver com os elementos concretos e objectivos que constam, como já referido, dos presentes autos.
XII- No artigo 7° da P.I. refere-se expressamente que a herança aberta por óbito do falecido J. C. é constituída apenas pelos bens imóveis situados no limite da dita União de Freguesias de (...) e (...), concelho de C.".
XIII- Não é admissível que se possa, assim, afirmar que os AA. se limitaram a invocar os bens imóveis que integram o acervo hereditário.
XIV- O artigo 25° do RJPI, sob o título "Relação de Bens", enumera as seguintes verbas possíveis: "direitos de crédito; títulos de crédito; dinheiro; moedas estrangeiras; objectos de ouro; prata e pedras preciosas e semelhantes; outras coisas móveis e bens imóveis".
XV- De igual modo o faziam todos os anteriores diplomas legais relativos ao processo de inventário.
XVI- Pelo que, não podem subsistir quaisquer dúvidas de que os AA. incluíram na presente acção todos os bens possuídos pelo inventariado J. C. à data do seu falecimento.
XVII- Na verdade, os RR. não adiantaram/identificaram qualquer outro bem na sua contestação para além dos constantes da relação de bens dos autos.
XVIII- O que determinou, por isso, o teor do despacho saneador proferido nos presentes autos.
XIX- Mal e erradamente andou o meritíssimo Juiz ao concluir que: "os AA. se limitaram a invocar os bens imóveis que integram o acervo hereditário".
XX- O que, além de tudo o mais, também está em nítida contradição com o anteriormente decidido em sede de despacho saneador.
XXI- O que constitui causa de nulidade da sentença, de acordo com o disposto no artigo 615°, nº 1, alínea c), do CPC.
XXII- Também a douta sentença, ora recorrida, é nula por conhecer de questões de que não podia tomar conhecimento, nos termos do disposto na alínea d) do citado preceito legal.
XXIII- Na verdade, como já sobejamente referido, a douta sentença acaba por alegar que: "os AA. se limitaram a invocar os bens imóveis que integram o...
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