Acórdão nº 832/13.0TTMTS.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelVERA SOTTOMAYOR
Data da Resolução17 de Dezembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

APELANTE: X – SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES, LDA.

APELADO: JOSÉ Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO JOSÉ, residente na Praceta …, Barcelos, com o patrocínio do Ministério Público, intentou acção especial emergente de acidente de trabalho contra COMPANHIA DE SEGUROS Y PORTUGAL, S.A.

com sede na Rua … - Lisboa e X – SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES, LDA com sede no Lugar …, freguesia de …, concelho de Ponte de Lima, pedindo a condenação das Rés a pagarem-lhe: a) a Ré seguradora - a pensão anual e vitalícia no valor de 7.544,44€, com início em 03/01/2014; - 4.217,51€ a título de subsídio de elevada incapacidade permanente; - 24,72€ de despesas de transporte; b) a Ré empregadora: - 2.159,00€ de diferenças nas indemnizações por incapacidade temporária; - a pensão anual e vitalícia no valor de 1.612,02€, com início em 03/01/2014; - 901,16€ a título de subsídio de elevada incapacidade permanente; - 5,28 € de despesas de transporte; sendo todas as quantias acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos à taxa de legal de 4% desde a data de vencimento de cada uma das referidas prestações até integral pagamento.

Foi proferido despacho saneador, fixados os factos assentes e organizada a base instrutória.

Foi proferida decisão no apenso de fixação de incapacidade, que considerou que o autor é portador de sequelas que lhe determinam uma incapacidade permanente parcial de 46,00% (0,46) desde o dia imediato ao da alta (alta que ocorreu em 02/01/2014).

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento e por fim, foi proferida sentença, que terminou com o seguinte dispositivo: “Assim, e nos termos expostos, julgo a ação parcialmente procedente por provada e, consequentemente, condeno as rés a pagarem ao autor JOSÉ, sem prejuízo dos juros que se mostrem devidos (art.º 135.º do Código de Processo do Trabalho), as seguintes quantias: I. a ré Companhia de Seguros Y Portugal, S.A.: a) 69,89€ (sessenta e nove euros e oitenta e nove cêntimos) a título de reembolso de despesas medicamentosas suportadas pelo autor para tratamento das lesões e sequelas sofridas no acidente; b) 30,00€ (trinta euros) a título de reembolso de despesas de transporte; c) a pensão anual e vitalícia, devida em 03/01/2014, no montante de 3.737,19€ (três mil, trezentos e trinta e sete euros e dezanove cêntimos), atualizada nos seguintes termos: i. em 01/01/2016 para 3.752,13€ (três mil, setecentos e cinquenta e dois euros e treze cêntimos); ii. em 01/01/2017 para 3.770,89€ (três mil, setecentos e setenta euros e oitenta e nove cêntimos); iii. em 01/01/2018 para 3.838,76€ (três mil, oitocentos e trinta e oito euros e setenta e seis cêntimos); II. a ré X – Sociedade de Construções, Lda.: a) 2.159,57€ (dois mil, cento e cinquenta e nove euros e cinquenta e sete cêntimos) a título de indemnização por incapacidade temporária absoluta; b) a pensão anual e vitalícia, devida em 03/01/2014, no montante de 798,78€ (setecentos e noventa e oito euros e setenta e oito cêntimos), atualizada nos seguintes termos: i. em 01/01/2016 para 801,98€ (oitocentos e um euros e noventa e oito cêntimos); ii. em 01/01/2017 para 805,99€ (oitocentos e cinco euros e noventa e nove cêntimos); iii. em 01/01/2018 para 820,50€ (oitocentos e vinte euros e cinquenta cêntimos); * Custas pelas rés, na proporção da sua responsabilidade.

*Valor da ação – 73.524,08€ - art.º 120.º do Código de Processo do Trabalho.

Registe e notifique.”*Inconformada com esta decisão apelou para este Tribunal da Relação de Guimarães, a Ré X – Sociedade de Construções, Lda., que apresentou as suas alegações, que depois de corrigidas terminam com as seguintes conclusões: “1. A Recorrente não se conforma com a decisão proferida, porquanto: A) O Tribunal a quo deu como provada matéria de facto que, mesmo sendo essencial, não foi alegada e, nessa medida, não figurou nem dos factos assentes, nem da matéria de facto controvertida; B) Independentemente disso e sem prescindir, o Tribunal a quo sempre teria julgado incorrectamente o ponto 6) da matéria de facto não provada, a qual, atenta a prova produzida, teria de ser dada como provada.

  1. Quanto à primeira questão, e para o que aqui releva, ficou a constar da base instrutória a seguinte matéria: 4.À data do acidente, para além dos montantes referidos em 6), o A. recebia, pago pela entidade patronal, 206,67€ x 12 meses, a título de prémio de produção, e que auferiu nos doze meses anteriores?” 6.O valor referido em 4) era pago ao A. apenas em determinados meses como compensação do seu esforço, em função dos objectivos alcançados pela empresa e do rendimento do trabalho? 7.E quando as possibilidades da ré empregadora o permitiam? 8.O que era do conhecimento do A.?” (Cfr. despacho saneador junto aos autos a fl.s…) 3. O ponto 4 da matéria de facto controvertida foi dado como não provado – cfr. sentença recorrida.

  2. Ao contrário do que sucede quanto aos factos instrumentais – relativamente aos quais o tribunal não está sujeito à alegação das partes, podendo oficiosamente carreá-los para o processo e sujeitá-los a prova – quanto aos factos essenciais funciona o PRINCÍPIO DA AUTO-RESPONSABILIDADE DAS PARTES.

  3. Não obstante, o Tribunal a quo, quanto ao dito “prémio de produção”, deu como provada a matéria do ponto L) dos factos provados, matéria essa que, sendo essencial, não foi alegada, nem tão pouco ficou a constar da matéria incluída na base instrutória.

  4. Ao dar-se como provada a matéria inserta no ponto L) dos factos provados, o Tribunal a quo fez recair sobre a Recorrida o ónus de demonstrar que aqueles pagamentos – que não foram alegados – não integravam a retribuição do Autor, o que constitui um caso de “decisão surpresa” – artigo 3.º, n.º 3 do CPC –, já que a Recorrente só munida de poderes de “adivinhação” poderia tentar demonstrar o contrário daquilo que nem alegado foi.

  5. Tendo o Tribunal se pronunciado sobre matéria – essencial – de que não podia conhecer, estamos perante uma nulidade da sentença, nos termos da al. d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.

  6. Pelo exposto, deve a sentença recorrida ser revogada nesta parte, sendo eliminado dos factos provados o respectivo ponto L), e, em consequência, a Recorrente absolvida do pedido.

  7. Por outro lado, o Tribunal a quo deveria ter dado como provado o ponto 6) da matéria de facto dada como não provada.

  8. Em audiência de julgamento foram apenas inquiridas duas testemunhas: D. L., esposa do Recorrido – que se recusou a prestar depoimento – e P. L., cunhado do Recorrido – Cfr. sentença recorrida.

  9. Com relevância para a matéria em discussão, a dita testemunha P. L. declarou: Nada saber sobre a retribuição do Recorrido; Nunca sequer ter conversado com ele sobre essa matéria; Não saber que valores lhe seriam pagos e a que título (cfr. minutos 01:28 a 2:22 do depoimento da testemunha, ouvida em audiência de julgamento, no dia 11.06.2018) 12. Para além da referida testemunha, apenas o Autor, ora Recorrido, prestou declarações, segundo que, quanto ao “prémio de produção”, declarou o seguinte: - Que o dito prémio de produção não fazia parte do seu vencimento; - Que o pagamento do prémio se deveu ao facto de o gerente da Recorrente ter delegado no Recorrido a responsabilidade acrescida de garantir o cumprimento dos prazos das obras em curso no período temporal em causa nos autos, altura em que a empresa tinha muito trabalho e prazos curtos para entrega de obras e o gerente da Recorrida adoeceu, tendo ficado ele próprio impossibilitado de exercer essa função; - Que o prémio de produção só lhe era pago se fossem cumpridos os prazos das obras; - Que só recebeu o prémio naqueles meses, que não o recebia antes, nem depois, mesmo continuando a trabalhar ao serviço da Recorrente; - Que o recebimento do dito “prémio de produção” se tratou de uma situação extraordinária, excepcional, um “caso esporádico”; - Que não tinha acordado com a entidade patronal nenhum valor específico para o dito prémio e que o mesmo era pago de acordo com as possibilidades da Recorrente.

    (Cfr. minutos 1:28 a 3:54; 04:58 a 06:09; 06;25 a 07:50; 08:04 a 08:08 das declarações do Autor, ouvido em audiência de julgamento) 13. “I – Face ao disposto no artigo 258.º do CT e no artigo 71.º, n.º 2 e 3 da LAT, para que as prestações pagas ao trabalhador/sinistrado integrem a retribuição devem assumir carácter regular e não se destinam a compensar custos aleatórios do sinistrado; II – De acordo com a jurisprudência mais recente do STJ, esse carácter regular só se verifica se a prestação for paga durante 11 dos 12 meses que se tiverem por referência temporal”.

    (Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 07.12.2016, processo n.º 67/14) 14. Ou seja, não tendo sido pago durante onze dos doze meses que constituem o período de referência em causa nos autos, o referido “prémio de produção” nunca poderia sequer ter sido integrado na previsão do n.º 2 do artigo 71.º da Lei n.º 98/2009, de 04 de Setembro, porquanto o mesmo não se reveste de carácter de regularidade.

  10. Acresce que, nos termos do n.º 3 do artigo 466.º do Código de Processo Civil, para o qual remete o artigo 1.º, n.º 2, al. b) do Código de Processo do Trabalho: “O tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão”.

  11. Essa liberdade não se pode traduzir, no entanto, em arbitrariedade, permitindo ao Tribunal esvaziar de conteúdo as declarações prestadas ou, mais grave do que isso, dar como provada matéria que a própria, ouvida em declarações, desmentiu.

  12. O Recorrido explicou ao Tribunal que, devido à doença do gerente da Recorrente, ficou com a responsabilidade acrescida de garantir o cumprimento dos prazos da obra, uma vez que, antes da doença “ele [o gerente da Recorrente] estava todos os dias nas obras”, “a orientar” – Cfr., além dos trechos acima já referidos, minutos 09:41 a 09:54 das declarações do Autor, prestadas em audiência de julgamento.

  13. Explicou ainda, de forma clara, que, o recebimento do prémio de produção era...

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