Acórdão nº 1549/16.9T9GMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2018
Magistrado Responsável | F |
Data da Resolução | 17 de Dezembro de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães.
Secção penal Relatora: Fátima Furtado; adjunta: Maria José Matos.
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RELATÓRIO No processo de instrução nº 1549/16.9T9GMR, do Juízo de Instrução Criminal de Guimarães, Juiz 1, da comarca de Braga, em que é arguido A. G., com os demais sinais dos autos, foi, em 8 de junho de 2018, proferido despacho que rejeitou o requerimento de abertura da instrução apresentado pelos assistentes A. J. e L. M..
*Inconformado, o assistente A. J. interpôs recurso, apresentando a competente motivação que remata com as seguintes conclusões: «I- Os Assistentes, nos presentes autos, vieram requerer a abertura de instrução, por causa da decisão de arquivamento do Inquérito, quanto aos crimes de falsidade de testemunho e de suborno, que aqueles imputam ao Arguido.
II- O mesmo requerimento foi rejeitado pelo Ex.mo Sr. JUIZ DE INSTRUÇÃO CRIMINAL, com fundamento na inexequibilidade da instrução por falta de objecto e com fundamento na nulidade do mesmo requerimento, em suma, com fundamento na inadmissibilidade legal da instrução, por referência aos arts. 287º nºs 2 e 3 e 283º nº3 al. b), ambos do Código de Processo Penal.
III- O Recorrente/Assistente não se conforma com tal decisão, vindo pelo presente interpor Recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães.
IV- Entende o mesmo que se acham preenchidos e respeitados todos os requisitos legalmente fixados nas mesmas normas em que se baseia a decisão recorrida, isto é, nos arts. 287º n.ºs 2 e 3 e 283.º n.º3 al. b), ambos do Código de Processo Penal.
V- Para tal, alega-se, supra, quais os motivos de discordância da decisão de rejeição de abertura de instrução.
VI- O Recorrente aponta, a par e passo, todos os factos, que no seu entender, integram a prática dos tipos legais de crime em causa, alegados e inscritos no seu requerimento de abertura de instrução.
VII- Em resumo, aponta os factos concretos praticados pelo Arguido, bem como, sempre que possível e até ao melhor dos seus conhecimentos, as circunstâncias de modo, tempo e motivação, em que tais factos foram praticados.
VIII- Faz ainda referência aos factos, qualificando-os, que descrevem o animus com que o Arguido agiu, classificando a conduta como praticada sob a forma de dolo directo, a que se refere o art. 14º n.º1 do Código Penal.
IX- No referido requerimento vai ainda claramente alegada a qualificação do Arguido como autor, bem como a qualificação da prática dos actos, nas formas consumada e tentada, respectivamente.
X- Todo o supra alegado se reporta aos factos alegados e constantes no requerimento de abertura de instrução, e que, na perspectiva do Recorrente, são subsumíveis nos tipos legais de crime p. e p. pelos arts. 360.º nºs 1 e 3 e 363º, ambos do Código Penal.
XI- O Arguido praticou, já, no processo, acto que comprova o seu cabal e actual conhecimento e compreensão do requerimento de abertura de instrução, tendo tomado a iniciativa de sobre o mesmo se pronunciar, quer quanto ao conteúdo, quer quanto à finalidade do mesmo, ficando demonstrado o efectivo exercício dos direitos de defesa e ao contraditório.
XII- O despacho recorrido viola arts. 287.º nºs 2 e 3 e 283.º nº3 al. b), ambos do Código de Processo Penal.
XIII- Deve a mesma decisão ser revogada, admitindo-se a abertura de instrução.
XIV- Praticando-se as diligências instrutórias requeridas pelos Assistentes.
XV- A fim de, a final, ser proferido despacho de pronúncia quanto aos crimes imputados ao Arguido.
XVI- Revogando-se, igualmente, por directamente prejudicada, a condenação em custas, constante do dispositivo do despacho recorrido.»*O recurso foi admitido para este Tribunal da Relação de Guimarães com o regime e efeito próprios.
O Ministério Público junto do Tribunal a quo e o arguido responderam, ambos pugnando pela improcedência do recurso.
Nesta Relação, o Ex.mo Senhor Procurador-Geral adjunto emitiu douto parecer no sentido do provimento do recurso e revogação do despacho criticado, apresentando fundamentada justificação de que o requerimento de abertura da instrução do assistente respeita, na sua expressão mínima, o formalismo previsto no artigo 287.º, n.º 2 do Código de Processo Penal.
*Foi cumprido o artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, na sequência do que o recorrente apresentou resposta.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
*II. FUNDAMENTAÇÃO Conforme é jurisprudência assente, o âmbito do recurso delimita-se pelas conclusões extraídas pelo recorrente a partir da respetiva motivação, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer(1).
*1. Questão a decidir Face às conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, a questão a decidir é a de saber se é admissível o requerimento de abertura de instrução formulado pelo assistente A. J..
*2. A decisão recorrida tem o seguinte teor: «Requerimento de abertura de instrução formulado pelos assistentes A. J. e L. M. a fls. 172 e ss Não se conformando com o despacho de arquivamento proferido a fls. 136 e ss, os assistentes A. J. e L. M. vieram, a fls. 172 e ss, requer a abertura de instrução.
Alegaram, para tal e em síntese, que discordam dos fundamentos do despacho de arquivamento e apresentam os motivos (cfr- artºs 5º e ss).
***Cumpre proferir despacho liminar, sendo certo que o requerimento só pode ser rejeitado por extemporâneo, por incompetência do juiz ou por inadmissibilidade legal da instrução – artigo 287º, n.º 3 do Código de Processo Penal.
O tribunal é competente.
O requerimento é tempestivo.
O requerente tem legitimidade – artigo 287º, n.º 1, al. b).
Importa, agora, apreciar a admissibilidade legal da instrução.
Findo o Inquérito, o Ministério Público proferiu despacho de arquivamento (cfr. Fls. 136 e ss).
Inconformados, os denunciantes, constituídos assistentes, vieram a fls. 172 e ss, abertura de instrução.
Nesse requerimento, conforme se alcança da simples leitura do mesmo, os assistentes coloca em crise os fundamentos do despacho de arquivamento, com a apresentação das razões de facto de discordância relativamente ao despacho de arquivamento e com a invocação que o deveria ter sido proferido despacho de acusação quanto a crime de suborno e de falsidade de testemunho.
No entanto, e pese embora a exposição das razões de facto relativamente ao despacho de arquivamento, o requerimento não reveste o formalismo de uma acusação, definindo e delimitando o objecto da instrução.
Analisada a peça processual de abertura de instrução, conclui este Tribunal que não se verificam os requisitos necessários para permitir uma abertura de instrução.
Vejamos.
Preceitua o artigo 287º n.º 2 do CPP que o requerimento de abertura de instrução pelo assistente (…) deve conter, em súmula, as razões de facto e de direito da discordância relativamente à acusação ou não acusação.
Trata-se de uma imposição legal essencial para que o arguido tenha a plena noção daquilo que o assistente o acusa e possa defender-se convenientemente, em respeito ao princípio do contraditório.
O assistente tem que, ainda que sumariamente, delimitar os factos suficientes para integrar todos os elementos objectivos e subjectivos do tipo criminal que entende ter sido violado, sendo estes factos que delimitam a actividade investigatória do juiz de instrução criminal. Como resulta do artigo 303.º e 309.º do CPP o juiz de instrução criminal está limitado nos seus poderes de cognição pelo requerimento do assistente para que se abra a instrução. Os factos apresentados pelo assistente são a base de trabalho do juiz de instrução criminal, já que a instrução não é um suplemento de investigação e não visa a substituição do MP na função investigatória. O escopo legal da instrução é a comprovação judicial da decisão acusatória ou do arquivamento em ordem a submeter ou não a causa a julgamento. Não é uma segunda fase investigatória desta feita levada a cabo pelo juiz (2), mas sim uma fase processual essencialmente garantística, adequando-se perfeitamente à natureza, que segundo a Constituição lhe cabe, de direito das pessoas e garantia do Processo Penal (3).
A necessidade do assistente indicar no seu requerimento os factos que considere indiciados ou que pretende vir a indiciar justifica-se pelo facto do requerimento equivaler à acusação, definindo e delimitando o objecto do processo a partir da sua apresentação.
Substancialmente o requerimento de abertura de instrução formulado pelo assistente contém uma verdadeira acusação (4).
Os requisitos a que deve obedecer uma acusação constam do artigo 283.º do CPP, ali se estabelecendo, nomeadamente nas alíneas a), b) e c), aplicável ao requerimento de abertura de instrução ex vi n.º 2 do artigo 287.º CPP, que a acusação contém, sob pena de nulidade, as indicações tendentes à identificação do arguido, a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma...
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