Acórdão nº 428/17.7T8FAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Setembro de 2018
Magistrado Responsável | ALCIDES RODRIGUES |
Data da Resolução | 13 de Setembro de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório Carmen intentou (1) ação declarativa de condenação contra X – Companhia Portuguesa de Seguros de Vida S.A. e Banco A S.A., peticionando: 1. a condenação solidária dos RR. a pagar: a) – à demandante a quantia de 4.883,97 € a título de prestações pagas a partir desde o mês de Setembro de 2016 até ao mês de Abril de 2017; b) – à demandante a quantia de 5.000 € a título de mora no cumprimento da obrigação de indemnizar o co-demandado Banco A; e c) – à demandante a quantia que se vier a apurar em consequência do alegado nos artigos 115º a 117º da petição inicial e que se relega para liquidação de sentença; d) – a liquidar o remanescente em dívida ao co-demandado Banco A; 2. – seja declarada excluída do contrato de seguro identificado no artigo 9º da petição inicial, no que à definição da cobertura de Invalidez Total e Permanente diz respeito, e constante do artigo 1º das Condições Especiais da apólice identificada nestes autos, devendo manter-se, contudo, no contrato dos autos a cobertura de Invalidez Total e Permanente para uma incapacidade igual ou superior a 66,6%, tal como foi comunicado à demandante e ao seu marido, tudo em cumprimento do disposto nos artigos 5º, 7º e 8º da LCCG; 3) juros de mora contabilizados desde a citação e até integral e efetivo pagamento.
Para o efeito e em síntese, alegou que celebrou com o réu banco um contrato de mútuo para habitação, garantido com hipoteca, e com a ré X um contrato de seguro do ramo vida para garantia do valor mutuado, a favor do réu banco.
Para além de não lhe não terem sido entregues na data da celebração do contrato de seguro, o conteúdo das condições gerais e especiais não lhe foi lido, nem explicado.
Em 23 de junho de 2015 foi atribuída à autora uma incapacidade permanente global de 69,4% em virtude de doença do foro oncológico.
Efetuadas as comunicações, a ré X declinou a responsabilidade escudando-se na inobservância das condições necessárias ao acionamento do seguro, designadamente a falta de entrega de documento que atesta a incapacidade total para o trabalho.
Alega a autora que tal condição não lhe foi explicada, nem comunicada, pelo que o réu banco, a quem incumbia tal dever, não o cumpriu, devendo ao abrigo do regime das cláusulas contratuais gerais, aplicáveis no caso por se tratar de seguro de grupo, ser excluída do contrato.
*Contestaram ambas as rés nos termos constantes de fls. 42 a 51 e 69 a 75, respetivamente, pugnando pela total improcedência da ação.
O réu Banco A aceitou a celebração dos contratos.
Invocou que a autora e marido tiveram acesso às condições dos contratos, cujo conteúdo lhes foi lido e explicado, tendo assinado depois de esclarecidos.
Mais referiu que, por ser advogada de profissão, a autora tem especiais conhecimentos na matéria em causa*A ré X aceitou a celebração do contrato e seguro do ramo vida, nos termos alegados pela A., mas invocou que as condições gerais e especiais do mesmo foram entregues, o conteúdo foi lido e explicado, conforme foi declarado pela A. e marido na proposta de adesão, referindo ainda que sobre a autora, que é advogada de profissão, recaem especiais conhecimentos na matéria.
Mais invocou que a autora não logrou provar que ficou definitivamente incapaz para o exercício da profissão ou atividade lucrativa, pelo que com base em tal alta declinou a sua responsabilidade.
E a incapacidade pela autora não é definitiva, sendo antes reavaliável no ano de 2020.
*Foi dispensada a audiência prévia, tendo sido elaborado despacho saneador, no qual foi afirmada a validade e regularidade da instância; procedeu-se à identificação do objeto do processo, à enunciação dos temas da prova, à concretização dos factos assentes e controvertidos, bem como foram admitidos os meios de prova (cfr. fls. 142 a 145).
*Procedeu-se à realização de audiência de discussão e julgamento (cfr. acta de fls. 151 e 152).
*Posteriormente, a Mmª. Julgadora “a quo” proferiu sentença (cfr. fls. 153 a 162), nos termos da qual, julgando a ação parcialmente procedente, decidiu declarar “excluída do contrato de seguro de grupo identificado” [na] “sentença a cláusula contratual de seguro no artigo 1º, al e) das Condições especiais da referida apólice, sob a epígrafe DEFINIÇÕES, a parte em que refere Invalidez Total e Permanente – A Pessoa Segura encontra-se na situação de Invalidez Total e Permanente se, em consequência de doença ou acidente, estiver total e definitivamente incapaz de exercer uma atividade remunerada”.
Quanto ao mais, julgou improcedente a ação, pelo que absolveu os Réus.
*Inconformada, a autora interpôs recurso da sentença (cfr. fls. 167 a 187) e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem): «1ª A recorrente, não obstante o muito respeito e consideração que tem pela Meritíssima Juíza a quo, a quem reconhece a maior competência, não pode conformar-se com o teor da douta decisão proferida, atenta a prova que foi produzida nos autos.
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E nada tem a apontar quanto a parte da matéria de facto que foi tida por provada e não provada.
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Antes de mais importa referir que nos presentes autos estava em discussão, primordialmente, saber-se se a recorrida X ou o recorrido Banco A (tomador do contrato de seguro melhor identificado nos autos) tinha comunicado e/ou informado a recorrente (e o marido desta) do clausulado que compõe o referido contrato de seguro, nomeadamente o teor da definição de Invalidez Total e Permanente, constante da alínea e) do artigo 1º das Condições Especiais, epigrafado como Definições.
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Assim, e como muito bem foi referido pela Meritíssima Juíza a quo na decisão recorrida, foi a recorrente ouvida em sede de audiência de discussão e julgamento aquando da tomada de declarações nos termos do disposto no artigo 466º do Cód. Proc. Civil, depoimento que não foi contrariado por qualquer outro meio de prova.
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Resultou, por isso, quer dessas declarações de parte, quer do depoimento da testemunha Fernando, marido da recorrente (que ficaram transcritas no corpo destas alegações), que no que toca à cobertura de invalidez apenas foram informados pelo funcionário do recorrido Banco A que com eles tratou quer do financiamento, quer do contrato de seguro de vida, que para acionarem essa garantia necessitavam ter uma incapacidade igual ou superior a 66,6%.
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Ora, tendo sido atribuída à recorrente uma incapacidade permanente global, através do relatório de incapacidade multiuso (junto ao autos com a petição inicial) de 69,4%, a mesma participou esse sinistro à recorrida X, pois estava preenchido o único requisito que lhe tinha sido comunicado/informado.
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E só após essa participação tomou a recorrente conhecimento de que afinal de contas não era bem como lhe tinha sido comunicado, uma vez que a recorrida X, tal como consta dos pontos 4º, 5º, 6º e 8º dos factos provados, lhe foi exigindo uma série de documentos, nomeadamente relatório médico e documento da segurança social (no caso da recorrente da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores) que atestasse que a recorrente não tinha capacidade para exercer qualquer actividade remunerada e que, por esse motivo, lhe tinha sido atribuída uma pensão de invalidez.
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E só nesse momento, a pedido da recorrente, e por intermédio do seu mandatário, lhe foram fornecidas todas as condições da apólice, o que, até àquele momento nunca tinha sucedido; nem sequer para as ler antes de ter subscrito aquele contrato de seguro de vida.
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E veja-se, ainda a este propósito, que a recorrida X chegou mesmo a referir à recorrente que necessitava, para o pagamento da indemnização, de averiguar se existia ou não risco efectivo de perda do rendimento familiar.
Todavia, compulsado todo o clausulado, essa exigência não consta seja de que cláusula seja. E é caso para perguntar: - se não existisse perda de rendimento familiar estaria a recorrida X dispensada de pagar a indemnização nos moldes que tinham sido contratados? Seguramente que NÃO...! 10ª Como é sabido, o contrato de seguro em discussão nos presentes autos é um contrato de seguro de grupo, em que é simultaneamente tomador e beneficiário do mesmo o recorrido Banco A, pessoas seguras a recorrente e o marido e seguradora a recorrida X.
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Assim, competia ao recorrido Banco A comunicar e informar a recorrente e o seu marido de todo o clausulado, uma vez que esse contrato é classificado como um contrato de adesão, ao qual estes apenas podem aderir, subscrevendo-o.
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E a ser a assim, como efectivamente é, aplica-se-lhe o disposto no Dec.-Lei nº 446/95, de 25/10 e as subsequentes alterações, atendendo até ao que vai disposto no artigo 1º do referido Decreto Lei.
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Por isso, e nos termos do disposto no artigo 5º do referido diploma legal, incumbia ao tomador do seguro (o recorrido Banco A) comunicar na íntegra as cláusulas contratuais gerais, o que devia ter sido realizado de modo adequado (fornecendo-lhes cópia integral do clausulado) e com antecedência necessária para que se tornasse possível que tivessem conhecimento completo e efectivo do mesmo.
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E esta comunicação, como se demonstrou em sede de audiência de discussão e julgamento, nem foi integral, nem teve a necessária antecedência e, muito menos, permitiu à recorrente e ao seu marido terem um conhecimento efectivo e completo do clausulado.
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Mas para a recorrida X tudo se reduzia ao facto de a recorrente ser advogada de profissão; mas também aqui não lhe assiste nenhuma razão, pois como se demonstrou a recorrente e o seu marido, como sucederia com qualquer um de nós, confiou na pessoa com quem estava a contratar, até porque existia já uma relação de amizade de longos anos, uma vez que o funcionário do recorrido Banco A, Pedro, tinha trabalhado muitos anos numa sociedade do sogro da recorrente.
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Todavia, como referiu uma outra testemunha arrolada pelo recorrido Banco A, de seu nome João, sendo a recorrente advogada, o cuidado da comunicação e da informação teria ainda...
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