Acórdão nº 445/14.8PBGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelAUSENDA GON
Data da Resolução24 de Setembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório No processo supra identificado, do Juízo Central Criminal de Guimarães, da Comarca de Braga, os arguidos José e A. S., foram julgados e condenados por sentença proferida e depositada a 12/2/2018, o primeiro como autor material de um crime de furto qualificado na forma continuada, p. e p. pelos artigos pelos arts. 203º, n.º 1, 204º, n.º 1, al. f) e 30º, n.º 2, do C. Penal, e o segundo como autor material de um crime de receptação, na forma continuada, p. e p. pelos arts. 231º, n.º 2 e 30º, n.º 2, do mesmo Código, nas penas de sete e de dois meses de prisão, respectivamente, sendo a pena de dois meses de prisão substituída por 60 horas de trabalho a favor da comunidade.

Inconformado, o arguido José interpôs recurso, insurgindo-se contra a medida da pena que lhe foi aplicada, dizendo que a mesma é excessiva apenas se tendo atentado nos seus antecedentes criminais, olvidando-se todo o circunstancialismo em que cresceu e desenvolveu a sua personalidade e sobretudo à sua condição de sem abrigo, pugnando pela fixação da medida da pena em 4 meses, mediante a formulação, na sua motivação, das seguintes conclusões: «1ª - Vem o presente recurso interposto da sentença que julgando a acusação pública, na parte que respeita ao aqui recorrente, parcialmente procedente por provada, o condena pela prática de um crime de furto qualificado, na forma continuada, p. e p. pelos arts. 203º n.º 1, 204.º n.º 1 al. f) e 30º n.º 2 do Código Penal, na pena de 7 (sete) meses de prisão efectiva.

  1. - A pena concretamente aplicada ao Recorrente é manifestamente excessiva, devendo situar-se próxima do mínimo legal.

  2. - O apuramento da medida concreta da pena centrou-se apenas nos antecedentes criminais do arguido, olvidando-se por completo outros os factos provados (pontos 12 a 22 e 24) que militam a favor do recorrente, designadamente a realidade de abandono e desestruturação em que cresceu o arguido e todos os seus antecedentes sociais; a falta de resposta eficaz por parte do Estado nas suas duas tentativas de desintoxicação; a sua situação de sem-abrigo e ainda o valor manifestamente pouco elevado dos objectos furtados.

  3. - Funda-se o presente recurso no disposto nos Art. 40º, 71º, 77º e 78º, todos do Código Penal.».

O recurso foi regularmente admitido.

O Ministério Público, junto da 1ª instância, respondeu ao recurso, dizendo que na pena aplicada ao arguido foram ponderadas todas as suas condições pessoais, bem como o valor dos bens subtraídos e nesse juízo de ponderação a pena aplicada corresponde à medida da sua culpa. E neste Tribunal, a Exma. Sra. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, pugnando pela improcedência do recurso, remetendo para a argumentação de 1ª Instância.

Foi cumprido o disposto no nº 2, do art. 417º, do CPP.

Feito o exame preliminar e, colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.

*II- Fundamentação Na medida em que o âmbito dos recursos se delimita pelas respectivas conclusões (art. 412º, nº 1, do CPP), sem prejuízo das questões que importe conhecer oficiosamente, por obstarem à apreciação do seu mérito, no presente recurso suscitam-se as seguintes questões: 1ª- o enquadramento jurídico-penal dos factos; 2ª- a medida da pena.

Importa apreciar as enunciadas questões e decidir. Para tanto, deve considerar-se como pertinentes ao conhecimento do objecto do recurso os factos considerados na decisão recorrida e considerações atinentes à determinação da sanção (transcrição): 1. No período compreendido entre as 18h do dia 11.05.2014 e as 21h do dia 16.05.2014, o arguido José dirigiu-se, pelo menos em três dias distintos, ao Centro do Núcleo de Guimarães, do Corpo Nacional de Escutas, sito na Rua (…), Guimarães, com o propósito de daí retirar e levar consigo bens e valores que aí se encontrassem.

  1. Uma vez aí chegado, das três vezes que ali se deslocou, o arguido José transpôs a vedação existente, e na parte em que estava tombada, dirigiu-se à zona fechada dos balneários e daí retirou e levou consigo os seguintes objectos, cujo valor total em concreto não foi possível apurar mas sempre superior a 1 UC: - 40 metros de fio eléctrico; 1 passador bicone; 9 chuveiros com joelhos bicone 15mm; 1 válvula; 3 válvulas; 2 chuveiros e 10 Acessórios bicone; 3. Em cada um dos três dias, no período considerado em 1., após subtrair os objectos mencionados em 2. e na posse dos mesmos, o arguido José dirigiu-se à casa do arguido A. S., sita na Travessa (…) Guimarães, a quem vendeu, em três momentos distintos, os objectos que subtraíra, referidos em 2., e pelo valor não concretamente apurado mas sempre inferior ao preço real daqueles mesmos objectos.

  2. O arguido José agiu sempre livre e conscientemente e com o propósito concretizado de fazer seus os bens referidos em 2., não ignorando que os mesmos, bem como o local onde se encontravam, não lhe pertenciam e que actuava contra a vontade do seu legítimo dono.

  3. Os objectos de que o arguido José se apropriou foram entretanto recuperados na casa, mais precisamente na garagem, do arguido A. S., e entregues ao queixoso.

  4. Ao proceder conforme o supra descrito o arguido A. S. agiu livre e voluntariamente; 7. E sabendo o arguido A. S. que o preço pelo qual os aludidos bens eram vendidos pelo arguido José e por si comprados, era inferior ao respectivo preço real; que o José era consumidor de estupefacientes e sem-abrigo, admitiu, o arguido A. S., a possibilidade de os aludidos bens terem sido furtados e não cuidou de afastar essa possibilidade, antes havendo actuado conformado com tal possibilidade; 8. e agiu, além do mais, com intenção, conseguida, de adquirir tais bens para si por um preço inferior ao preço de mercado, com o objectivo de depois vendê-los a um preço superior, obtendo, por essa via, uma vantagem patrimonial ilegítima.

  5. Os arguidos agiram bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

  6. O arguido José sofreu as seguintes condenações: a) Por decisão transitada em julgado aos 4.5.2009 e pela prática, em 20.6.2008, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3º, n.º 2, do DL n.º 2/98 de 3.1, na pena de 70 dias de multa à taxa diária de 5 euros - pena extinta por despacho datado de 11.3.2011; b) Por decisão transitada em julgado aos 23.4.2012 e pela prática, em 30.12.2010, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 204º, do Código Penal, na pena de 300 dias de multa à taxa diária de 5,00 euros - pena, esta, extinta por despacho datado de 21.8.2013; c) Por decisão transitada em julgado aos 16.1.2014 e pela prática, em 22.7.2012, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3º, do DL n.º 2/98 de 3.1, na pena de 180 dias de multa à taxa diária de 5,50 euros - pena extinta por despacho datado de 11.3.2011; d) Por decisão transitada em julgado aos 12.4.2016 e pela prática, em 12.1.2011, de um crime de furto, p. e p. pelo art. 203º, do Código Penal, na pena de 180 dias de multa à taxa diária de 5,00 euros - pena, esta, extinta por despacho datado de 21.8.2013; e) Por decisão transitada em julgado aos 22.4.2014 e pela prática, em 22.1.2011, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 204º, n.º 1, al. f), do Código Penal, na pena de 12 meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de 12 meses; f) Por decisão transitada em julgado aos 16.10.2017 e pela prática, em 22.11.2014, de um crime de furto, p. e p. pelo art. 203º, do Código Penal, na pena de 3 meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de 1 ano; g) Por decisão transitada em julgado aos 22.10.2015 e pela prática, em 2014, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 204º, do Código Penal, na pena de 2 anos e 10 meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de 2 anos e 10 meses e sujeita a regime de prova; h) Por decisão transitada em julgado aos 23.2.2016 e pela prática, em 17.5.2014, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 204º, n.º 2, al. e), do Código Penal, na pena de 3 anos de prisão suspensa na sua execução pelo período de 3 anos e sujeita a regime de prova.

    O arguido José provém de um agregado familiar constituído pelos progenitores e pelos cinco irmãos; 13. O pai era pedreiro e a mãe efetuava limpezas; 14. Devido às dificuldades económicas dos pais do arguido este foi entregue, aos 8 anos, aos avós paternos.

  7. O arguido tem 2º ano de escolaridade; 16. Iniciou o consumo de heroína e cocaína com 11/12 anos.

  8. Após abandonar a escola auxiliou os avós, em trabalhos agrícolas, e como servente de pedreiro.

  9. Regista algumas experiências profissionais estáveis, no setor têxtil, onde trabalhou durante cerca de 12 anos; 19. em 2009/2010 ficou desempregado, após despedimento de pessoal efetuado pela empresa, e não mais trabalhou de forma estruturada e formal.

  10. Casou aos 19 anos de idade, teve quatro descendentes; o casamento terminou em 2011, devido à problemática aditiva do arguido, e os filhos ficaram aos cuidados da mãe.

  11. Em dois períodos esteve ligado ao Centro de Respostas...

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