Acórdão nº 307/17 de Tribunal Constitucional (Port, 08 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelCons. Maria José Rangel de Mesquita
Data da Resolução08 de Junho de 2017
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 307/2017

3.ª Secção

Relatora: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Coimbra (TRC), em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi pelo primeiro interposto recurso (cfr. fls. 750-757, reiterado a fls. 759-767), ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b) da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (LTC), do acórdão daquele Tribunal da Relação proferido em conferência, em 12 de outubro de 2016 (cfr. requerimento de interposição de recurso, fls. 750) – o qual (fls. 741-745) julgou irreconhecida a nulidade por omissão de pronúncia do precedente acórdão do TRC de fls. 711/715 (Acórdão de 4 de maio de 2016 que indeferiu a reclamação apresentada e confirmou a precedente decisão-sumária que rejeitou, por manifesta improcedência, o recurso interposto pelo arguido, ora recorrente, dirigido contra a decisão condenatória de 1ª instância) e condenou o ora recorrente no pagamento de 3 UC de taxa de justiça e 3 UC a título de taxa sancionatória excecional (cfr. fls. 745).

Como decorre do requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade, pretendia o recorrente ver apreciada pelo Tribunal Constitucional a constitucionalidade dos «artigos 4°, 374 n.º 2, 379 n.ºs 1 al. c) e 2.° e 425.°, n.º 4, do Código de Processo Penal e 613 n° 1 e 2 do C.P.Civil quando interpretados no sentido de que existe inexorável esgotamento do poder jurisdicional do Tribunal a quo, quando se verifica no seu Acórdãos, uma clara omissão de pronúncia sobre a matéria de facto e de Direito questão da unicidade do trato sucessivo, e omissão de pronuncia relativamente às nulidades suscitadas» (cfr. requerimento de recurso para o Tribunal Constitucional, fls. 755).

2. Na Decisão Sumária n.º 129/2017 (cfr. fls. 775-784), ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, decidiu-se não conhecer do objeto do recurso, por não se mostrarem verificados os pressupostos relativos à suscitação prévia e de forma processual adequada da questão de constitucionalidade perante o Tribunal a quo, de modo a dela poder conhecer (cfr. Decisão Sumária n.º 129/2007, II – Fundamentação, 7., fls. 781), à dimensão normativa (Cfr. idem, II-8., fls. 781-783) e à ratio decidendi (cfr. idem, II-9., fls. 783).

3. Tendo sido deduzida reclamação contra a Decisão Sumária (cfr. Reclamação, fls. 788-802-verso), foi proferido o Acórdão n.º 217/2017 (disponível, bem como os demais citados, em www.tribunalconstitucional.pt), no qual se decidiu indeferir a mesma.

Isto, com os seguintes fundamentos (cfr. Acórdão n.º 217/2017, II, 5. a 8., fls. 831-836):

«II – Fundamentação

5. Na Decisão Sumária n.º 129/2017 decidiu-se não conhecer do objeto do recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, por não verificação do pressuposto relativo à suscitação prévia adequada da questão de constitucionalidade que pretende ver apreciada pelo Tribunal Constitucional, por não verificação do pressuposto relativo à ratio decidendi e por ausência de dimensão normativa do objeto do recurso.

Analisada a presente reclamação, verifica-se que a mesma não infirma as conclusões alcançadas na Decisão Sumária ora reclamada.

6. Quanto ao primeiro fundamento de não conhecimento do objeto do recurso de constitucionalidade – a falta de suscitação prévia adequada da questão de constitucionalidade junto do Tribunal ora recorrido, de modo a dela dever conhecer – o recorrente reitera que cumpriu tal ónus sem que, todavia, ponha em crise o sustentado na Decisão Sumária ora reclamada.

Tal como se diz no Acórdão n.º 128/98:

“(...) Sendo o presente recurso de constitucionalidade interposto ao abrigo do artigo 70º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, é necessário, para que se possa tomar conhecimento do seu objeto, que o recorrente tenha suscitado uma questão de constitucionalidade normativa durante o processo.

Ora, uma questão de constitucionalidade só se considera suscitada de modo adequado durante o processo quando o recorrente identifica com precisão a ou as normas que entende serem inconstitucionais, quando indica as normas ou princípios constitucionais que considera violados e quando apresenta uma fundamentação, ainda que sucinta, da inconstitucionalidade suscitada”.

Assim, recai sobre os recorrentes o ónus de individualizar o fundamento da questão de constitucionalidade normativa durante o processo e de modo processualmente adequado, desenvolvendo, minimamente, o entendimento que permitisse concluir que as normas (ou interpretações normativas) aplicadas seriam inconstitucionais.

Contudo, o recorrente, nos presentes autos – como decorre da leitura das peças processuais «Reclamação para a Conferência» e «Arguição de nulidades» e conclui a Decisão Sumária ora reclamada em II-7. (supra transcrita em I-2.) –, apenas intentou submeter à apreciação do tribunal a quo a constitucionalidade e, por essa via, a validade da decisão judicial então reclamada, nunca questionando verdadeiramente uma norma ou interpretação normativa.

Ora, diferentemente do exposto pelo ora reclamante na presente Reclamação, em especial nas Conclusões 8. e 9. a omissão ai referida dificilmente poderia ser suprida pelas instâncias mediante o convite ao aperfeiçoamento do recurso, como pretende o ora reclamante. E, seguramente, não caberia ao Juiz Relator do Tribunal Constitucional, por via do convite ao aperfeiçoamento do requerimento de interposição de recurso (para o Tribunal Constitucional) lograr tal objetivo. Esclareça-se:

O artigo 75.º-A da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), nos seus n.ºs 1 a 4, define os requisitos formais do requerimento de interposição do recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade. Assim, seja qual for o tipo de recurso interposto, deve o recorrente indicar obrigatoriamente a alínea do n.º 1 do artigo 70.º da LTC ao abrigo da qual o recurso é interposto, assim como a norma ou interpretação normativa que constitui objeto de tal recurso e cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade se pretende fazer sindicar pelo Tribunal Constitucional (n.º 1). Para além destas duas especificações genéricas, carece ainda o recorrente, nos recursos fundados na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC (como no presente caso), de indicar a norma ou princípio constitucional ou legal que considera violado pela norma ou interpretação normativa que integra o objeto do recurso, bem como a peça processual em que o recorrente suscitou, durante o processo, a questão de inconstitucionalidade ou de ilegalidade (n.º 2).

Para além destes requisitos formais, recai ainda sobre o recorrente o ónus de identificar a decisão que pretende impugnar perante o Tribunal Constitucional.

Caso o requerimento de interposição do recurso seja deficiente, ou seja, não indique algum dos elementos previstos no artigo 75.º-A da LTC, é facultado ao recorrente oportunidade processual para suprir as deficiências notadas através do convite ao aperfeiçoamento previsto nos n.ºs 5 e 6 do mesmo artigo. Se o recorrente não corresponder satisfatoriamente ao convite, o recurso é logo julgado deserto (n.º 6 do mesmo artigo 75.º-A).

Ora, o exercício da faculdade cometida ao relator pelo artigo 75.º-A, n.º 5, da LTC, de formulação de despacho de aperfeiçoamento, convidando o recorrente a indicar os elementos em falta no requerimento de interposição de recurso, só se justifica para esse mesmo fim, em nada contendendo com as peças processuais constantes dos autos.

E, por fim, também o invocado pelo ora reclamante quanto à «surpresa da decisão» (cfr. Reclamação, conclusão 36.) não se mostra procedente, já que que sendo objetivamente possível antecipar qual o sentido decisório e respetiva base normativa da decisão judicial recorrida (muito semelhante ao aresto então impugnado), não se mostra devidamente justificada a razão de inobservância do ónus de suscitação prévia da questão de constitucionalidade junto das instâncias.

Assim, importa concluir que, por esta razão, não pode o Tribunal Constitucional conhecer do objeto do presente recurso, faltando ao recorrente o requisito de legitimidade previsto no artigo 72.º, n.º 2, da LTC.

7. Depois, da leitura da Reclamação deduzida da Decisão Sumária n.º 129/2017 resulta que o recorrente não apresenta qualquer argumento especificamente dirigido aos fundamentos de não conhecimento da questão que pretende sindicar junto deste Tribunal relativos à ratio decidendi e à dimensão normativa, pelo que os mesmos não se mostram postos em crise.

7.1 Com efeito, a Reclamação ora em análise não aduz qualquer razão quanto ao argumento (cfr. Decisão Sumária reclamada, II-9., supra transcrita em I-2.) de falta de aplicação, pelo Tribunal recorrido, da pretensa norma ou dimensão normativa que vem impugnar no Tribunal Constitucional.

Assim, e sendo os pressupostos de que depende o conhecimento do recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º de verificação cumulativa, tanto bastaria para o indeferimento da presente reclamação.

7.2 Já quanto à falta de dimensão normativa da questão de constitucionalidade, também se verifica que não são aduzidas quaisquer razões, pelo reclamante, que habilitassem conclusão diversa da alcançada na Decisão Sumária, em especial no seu ponto II-8. (supra transcrita em I-2.), no sentido de o objeto do recurso de constitucionalidade se dirigir à própria decisão judicial recorrida e não a qualquer critério normativo passível de sindicância pelo Tribunal Constitucional.

Ora, não basta o ora reclamante referir-se ao objeto do seu recurso como «a dimensão normativa» ou «as normas (…) na interpretação que o...

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