Acórdão nº 429/17 de Tribunal Constitucional (Port, 20 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelCons. Claudio Monteiro
Data da Resolução20 de Julho de 2017
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 429/17

Processo n.º 682/2017

Plenário

Relator: Conselheiro Claudio Monteiro

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. A Comissão Nacional de Eleições deliberou, em 11 de julho de 2017, o seguinte (cfr. fls. 54):

«Determina-se ao Presidente da Câmara Municipal da Maia que se abstenha de remover (ou que promova a sua reposição, no prazo de 36 horas, caso já tenha procedido à sua remoção) o material de propaganda do PS da Maia a que se refere o presente processo, sob pena de incorrer na prática do crime de desobediência previsto e punido pelo artigo 348.º do Código Penal.

Desta deliberação cabe recurso para o Tribunal Constitucional a interpor no prazo de um dia, nos termos do artigo 102.º-B da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro.»

2. A deliberação foi proferida na sequência de participação apresentada por Jorge Luís Ferreira Catarino, Presidente da Comissão Política Concelhia da Maia do Partido Socialista, por referência ao “Mandado de Intimação” emitido, em 8 de junho de 2017, pelo Presidente da Câmara Municipal da Maia, para a remoção de dez painéis de propaganda política (cfr. fls. 67 a 68).

3. A deliberação encontra-se suportada na informação n.º I-CNE/2017/148, a qual assentou, no essencial, nos seguintes fundamentos (cfr. fls. 60 a 66):

«(…) Remoção de propaganda

19. No que diz respeito à remoção de propaganda, há que distinguir a propaganda legalmente afixada por contraposição daquela que está colocada em locais especificamente proibidos por lei.

20. Quanto à primeira, dispõe o artigo 6.º da Lei n.º 97/88 que a sua remoção é da responsabilidade das entidades que a tiverem instalado, competindo às câmaras municipais, ouvidos os interessados, definir os prazos e condições de remoção dos meios de propaganda utilizados.

21. De acordo com o entendimento da CNE a este respeito, as entidades administrativas apenas podem remover meios amovíveis de propaganda que não conflituem com o disposto no n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 97/88, de 17 de agosto, quando tal for determinado por tribunal competente ou os interessados, depois de ouvidos e com eles fixados os prazos e condições de remoção, o não façam naqueles prazos e condições, sem prejuízo do direito de recurso que a estes assista.

22. Excecionalmente poderão ser removidos meios amovíveis de propaganda que afetem direta e comprovadamente a segurança das pessoas ou das coisas, constituindo perigo iminente, situação incompatível com a observância das formalidades legais, sem prejuízo de os interessados serem imediatamente notificados.

23. Quanto à propaganda colocada em locais especificamente proibidos por lei, as câmaras municipais são, nos termos do n.º 2 do artigo 5.° da Lei n.º 97/88, de 17 de agosto, competentes para ordenar a remoção das mensagens de propaganda e para embargar ou demolir obras quando contrárias ao disposto na lei, mas só após serem notificados os interessados.

24. A decisão de qualquer entidade que ordene a remoção de propaganda deve, assim, ser fundamentada relativamente a cada meio de propaganda cuja remoção esteja em causa e precedida de notificação à candidatura respetiva, sendo necessário justificar e indicar concretamente as razões de facto e de direito pelas quais o exercício da atividade de propaganda não obedece, em determinado local, aos requisitos legais, não bastando a mera invocação dos preceitos da lei.

IV - Da situação objeto de comunicação pela Comissão Política Concelhia do PS da Maia e dos fundamentos invocados pela Câmara Municipal da Maia para a remoção da propaganda

25. De acordo com o "Mandado de intimação", o PS da Maia foi intimado pela Câmara Municipal da Maia para "remover as estruturas em ferro que suportam propaganda política, colocadas nas seguintes rotundas: (...)" identificando em seguida os locais concretos de afixação das estruturas em causa, concedendo um prazo de 10 dias úteis para o participante, querendo, se pronunciar, ao abrigo dos artigos 121.° e 122.° do CPA.

26. Para o efeito, invoca as proibições estabelecidas no n.º 2, do artigo 45.°, da LEOAL e informa que a colocação de painéis deverá respeitar os princípios contidos no n.º 1 do artigo 4.°, conjugado com o n.º 1 do artigo 6.°, da Lei n.º 97/88, de 17 de agosto.

"Nesse sentido pedimos especial atenção para que não sejam colocados painéis em ilhas de rotunda e em espaços ajardinados do Município, por contrariarem aquelas disposições legais antes referidas, designadamente por influírem na circulação rodoviária, afetarem a estética e paisagem local e prejudicarem sistemas de manutenção municipal como sejam o sistema de rega ali implementado.

Assim sendo, ficam V. Exas. notificados para retirarem as referidas estruturas num prazo de dez dias a contar da receção deste ofício. No caso, porém, de se verificar o não cumprimento do ora estatuído, a câmara municipal exercerá as competências que a Lei lhe conferiu, promovendo a sua remoção com os inerentes custos ao partido político infrator. (Doc. 2)».

(…)

29.No entanto, e de acordo com as fotos enviadas pelo participante, afigura-se que nenhum dos argumentos aduzidos pela autarquia pode considerar-se procedente à luz das normas - e do entendimento da Comissão - que regulam a atividade de propaganda, porquanto os locais onde a mesma foi realizada não estão vedados pela lei.

30. De facto, a autarquia limita-se a descrever os locais onde estão afixados os materiais de propaganda, alegando de forma vaga e genérica que contrariam as citadas disposições legais, "(...) designadamente por influírem na circulação rodoviária, afetarem a estética e paisagem local e prejudicarem sistemas de manutenção municipal como sejam o sistema de rega ali implementado.", não referindo a situação factual de cada um daqueles materiais.

31.O n.º 1, do artigo 4.°, da Lei n.º 97/88, estabelece apenas objetivos a prosseguir, e não, proibições ou limitações taxativas e absolutas à afixação de cartazes ou à realização de inscrições ou pinturas murais.

32.Cite-se, a este propósito, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 475/2013, o qual, embora incida sobre a alínea b) do n.º 1 do artigo 4.° da Lei n.º 97/88, julgamos transponível para qualquer das outras alíneas do n.º 1: " ... cabe referir que a invocada alínea b) do n. ° 1 do artigo 4.° da Lei n.º 97/88, de 17 de agosto, se limita a enunciar, como critério teleológico de exercício das atividades de propaganda, o respeito pela «beleza ou o enquadramento de monumentos nacionais, de edifícios de interesse público ou outros suscetíveis de ser classificados pelas entidades públicas», apenas estando vedado, «em qualquer caso», a realização de inscrições ou pinturas murais em específicos locais, como sejam monumentos nacionais e centros históricos como tal declarados (n.º 3 do citado normativo legal). "

33. E prossegue: "Fora das hipóteses de proibição absoluta, como as previstas no referido n.º 3 do artigo 4.º da Lei nº 97/98, impor-se-á, sempre, pois, a avaliação casuística da cada dispositivo de propaganda eleitoral instalado, em ordem a apurar se, no caso concreto, o exercício da atividade de propaganda particularmente desenvolvido compromete ou prejudica, em termos relevantes, os valores tutelados pelas diversas hipótese normativas constantes do n.º 1 do citado preceito legal."

(…)

36. Quanto ao alegado prejuízo para "(...) os sistemas de manutenção municipal como sejam o sistema de rega ali implementado", trata-se de um critério não expressamente previsto pela lei, pelo que não deve ter aplicação em matéria de afixação de propaganda.

37. Em suma, no caso vertente e dos elementos carreados para o presente processo, não resultam elementos que possam sustentar ou que permitam afirmar que, no caso concreto, o exercício da atividade de propaganda desenvolvida compromete ou prejudica qualquer dos valores protegidos pelo disposto no n.º 1 do artigo 4.° da Lei n.º 97/88, de 17 de agosto.

38. Assim, parece-nos que carece, em absoluto, de fundamento, o teor dos ofícios dirigidos ao requerente para a remoção das estruturas de propaganda ali fundamentadas, contrariando o disposto na lei e na jurisprudência constitucional sobre a matéria da liberdade de propaganda política.

V - Proposta

Face ao que antecede, propõe-se ao plenário da Comissão Nacional de Eleições que delibere determinar ao Presidente da Câmara Municipal da Maia que se abstenha de remover (ou que promova a sua reposição. no prazo de 36 horas, caso já tenha procedido à sua remoção) o material de propaganda do PS da Maia a que se refere a presente exposição, sob pena de incorrer na prática do crime de desobediência previsto e punido pelo artigo 348.° do Código Penal.

Desta deliberação cabe recurso para o Tribunal Constitucional a interpor no prazo de um dia, nos termos do artigo 102.°-B da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro.»

4. O presente recurso, interposto pelo Município da Maia ao...

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