Acórdão nº 528/17 de Tribunal Constitucional (Port, 11 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelCons. Fernando Vaz Ventura
Data da Resolução11 de Setembro de 2017
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 528/2017

Processo n.º 839/2017

Plenário

Relator: Conselheiro Fernando Vaz Ventura

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional.

I. Relatório

1. No processo relativo à eleição para a Câmara Municipal de Vila Real de Santo António, o mandatário da candidatura do Partido Socialista (PS) e o candidato a Presidente da Câmara Municipal pelo PS, interpuseram, ao abrigo do artigo 31.º da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais (LEOAL) — Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto, atualmente na versão conferida pela Lei Orgânica n.º 2/2017, de 2 de maio — recurso da decisão do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Local de Competência Genérica de Vila Real de Santo António, de 22 de agosto de 2017, que indeferiu a reclamação apresentada pelos recorrentes quanto à admissão da candidatura de Luís Miguel Guerreiro Romão, pelo Partido Social Democrata (PSD).

2. No despacho recorrido, o tribunal a quo manteve a decisão de admissão da candidatura de Luís Miguel Guerreiro Romão, pelo PSD, julgando improcedente a invocação da inelegibilidade especial prevista na alínea c) do n.º 2 do artigo 7.º da LEOAL pelo facto de o candidato ter celebrado com o Município de Vila Real de Santo António um contrato de prestação de serviços para “criação de uma política cultural que visa a promoção do concelho de Vila Real de Santo António no âmbito da eurocidade”.

Pode ler-se em tal decisão:

«Nos termos de tal preceito, não são elegíveis para os órgãos das autarquias locais "os membros dos corpos sociais e os gerentes de sociedades, bem como os proprietários de empresas que tenham contrato com a autarquia não integralmente cumprido ou de execução continuada".

Assim, para concluirmos pela existência da inelegibilidade invocada, será necessário concluir que o candidato reclamado é, ou membro de corpo social ou gerente de sociedade, ou proprietário de empresa, que tenha com o município de Vila Real de Santo António contrato não integralmente cumprido ou de execução continuada.

Ora, da leitura do contrato junto com a reclamação, e de acordo com o alegado pelos próprios reclamantes, o candidato reclamado Luís Romão não é nem gerente nem membro de corpo social de qualquer sociedade que tenha celebrado contrato com a autarquia a que concorre.

Assim, a inelegibilidade invocada não se pode assim fundar na assunção subjetiva de tais qualidades.

Só se poderá assim fundar na qualidade de proprietário de empresa, nos termos do citado art. 7º, n.º 2, al. c) da LEOAL.

Na interpretação de tal conceito, e como já se referiu na apreciação da reclamação apresentada à candidatura de Pedra Pires, há que levar a cabo uma interpretação o menos restritiva possível do direito fundamental de capacidade eleitoral passiva aqui em causa.

E, nessa interpretação, somos forçados a concluir que não assiste razão aos reclamantes.

É certo que a LEOAL não indica como define o conceito de "empresa" a que alude na norma em apreço.

No entanto, não deixa de apontar para a circunstância do inelegível ter de ser "proprietário" da mesma.

Assim, aponta para uma ideia de algo autónomo e passível de apropriação.

E, de facto, o conceito de empresa, no demais sistema jurídico, indica uma determinada organização de capital e de trabalho destinada ao exercício duma atividade económica, com carácter autónomo. Neste sentido, vide o disposto no art. 5º do CIRE, que definindo a noção de empresa para efeitos de tal Código de tal forma, não deixa de denunciar o sentido que o legislador dá a este conceito.

Ora, no caso concreto nada é alegado que aponte no sentido duma qualquer propriedade pelo candidato reclamado duma organização de capital e de trabalho, destinada ao exercício duma atividade económica, que tenha celebrado com a autarquia um qualquer contrato ainda vigente.

É mencionado unicamente um contrato de prestação de serviços, mas que, por si só, não atesta nem indicia a existência de qualquer empresa nos termos em que a definimos, antes parecendo que o reclamado prestou os serviços em causa de forma isolada e independente de qualquer ente ou organização autónoma e organizada por si para prestação duradoura e profissional duma atividade económica - in casu, de promoção cultural.

Não podemos assim considerar, em face do alegado, que o reclamado é proprietário de qualquer empresa, e isto independentemente da classificação que é anteriormente dada ao contrato celebrado pela autarquia (de forma breve e que não se afigura ser vinculativa nem taxativa).

E, como tal, não é possível concluir pela assunção de qualquer qualidade subjetiva pelo candidato que justifique a aplicação da inelegibilidade prevista no art. 7º, n.º 2, al. c) da LEOAL.

Em acréscimo, em face da documentação junta aos autos a 21-8-2017 conclui-se que o contrato em causa não mais se encontra vigente, tendo sido revogado por mútuo acordo.

Ora, inexistindo atualmente tal contrato, e sendo este o momento de verificação da inelegibilidade, há que concluir que inexiste qualquer perigo futuro para um exercício isento e imparcial das funções a que se candidata que pudesse emergir de contrato de prestação de serviços aqui em crise.

Seguindo os Acs. do Tribunal Constitucional 717/93 e 495/2001, "interessa é que para os órgãos de determinada autarquia local, não seja eleito quem, ao iniciar o exercício do cargo, seja membro dos corpos sociais ou proprietário de uma empresa que tenha contratos pendentes com essa autarquia. E isso, tanto no caso de a subsistência do contrato, nesse momento, se dever ao facto de se tratar de negócio cuja execução se protrai no tempo, como naquele em que, sendo um contrato de outro tipo, as obrigações que dele decorrem ainda se acharem nessa altura por cumprir, ao menos em parte".

Assim, e também por aqui, se conclui pelo necessário soçobrar desta reclamação.

3. Inconformados, os recorrentes interpuseram o presente recurso, alegando, em síntese:

«2. Sucede que, no dia 20 de janeiro de 2017 o candidato Luís Romão celebrou com o Município de Vila Real de Santo António um contrato de prestação de serviços com o n.º 1/2017, visando a "criação de uma política...

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