Acórdão nº 401/17 de Tribunal Constitucional (Port, 12 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelCons. Maria José Rangel de Mesquita
Data da Resolução12 de Julho de 2017
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 401/17

Processo n.º 658/16

3.ª Secção

Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro – Instância Central (Aveiro) – 1ª Secção do Comércio, em que é recorrente o Ministério Público e recorridos A., Lda. e Outros, foi pelo primeiro interposto recurso, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), na sua atual versão, da sentença daquele Tribunal de 1 de julho de 2016 (de fls. 267-280), que determinou o encerramento dos autos de insolvência da ora recorrida A., Lda., iniciados com a emissão de parecer no sentido da sua insolvência, pela Administradora Judicial Provisória, ao abrigo do disposto no artigo 17.º-G, n.º 4, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), no âmbito dos autos de Processo Especial de Revitalização (PER) da devedora, julgando «inconstitucional a norma do disposto no art.º 17.º-G, n.º 4 [do CIRE], quando interpretada no sentido de o parecer do administrador judicial provisório equivaler a apresentação à insolvência por parte do devedor, se este discordar de tal situação de insolvência» e «desaplicando-a» (cfr. Sentença de 1/07/2016, ora recorrida, fls. 275).

2. Dos autos resulta, com interesse para o presente recurso, o que de seguida se relata:

a) No âmbito do Processo Especial de Revitalização (PER) n.º 57/15.0T8AVR – respeitante a A., Lda., ora recorrida –, que correu termos pela 1.ª Secção de Comércio da Instância Central de Aveiro, Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro (J3-Núcleo da Anadia), foi, em 28/07/2015, emitido parecer pela Administradora Judicial Provisória (cfr. fls. 1-8), concluindo «encontrarem-se reunidos os pressupostos para que seja declarada a Insolvência imediata da Devedora, sem a administração pelo Devedor, o que se requer» e requerendo ao Juiz do processo que «ao abrigo do artigo 17º-G N.º 3 e 4 do CIRE se digne decretar a Insolvência da devedora, com as legais consequências.» (cfr. fls. 8).

b) Determinou então a Juíza do processo (PER) a distribuição daquele parecer como processo de insolvência – Processo de Insolvência n.º 3089/15.4T8AVR (cfr. fls. 27), correndo igualmente os seus termos na 1.ª Secção de Comércio da Instância Central de Aveiro, Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro (J3-Núcleo da Anadia) – sendo oportunamente os autos de PER apensos ao processo de insolvência, aí se notificando a devedora para se pronunciar sobre o parecer emitido (cfr. despacho da Juíza de 17/09/2015, fls. 26-26-verso).

c) A devedora, ora recorrida, veio pronunciar-se sobre o parecer emitido (cfr. fls. 30-32-verso), manifestando a sua discordância quanto ao mesmo e requerendo ao Juiz que determine (fls. 32):

«I. Deverá improceder o parecer da Administradora Judicial Provisória, NÃO SE VERIFICANDO o estado de Insolvência da requerente/devedora, com as legais consequências;

II. A improceder a argumentação supra,

III. Manifestar a intenção de apresentação de um Plano de Insolvência, no prazo de 30 dias após a sentença de declaração de insolvência, que preveja a continuidade da exploração da empresa;

IV. Seja determinado que a administração do património continue a seu cargo, nos termos do art.º 224º, n.º 1 e 2 do CIRE (…), bem como se obriga a apresentar um plano de insolvência, no prazo legal, que vá de encontro aos interesses dos credores e consequentemente resulte na aprovação e homologação do mesmo, complementando a douta sentença nesse sentido.»

d) Em 23/10/2015, a Juíza do processo (n.º 3089/15.4T8AVR) proferiu o seguinte despacho (cfr. fls. 141-142)

«Seguindo a orientação de alguma jurisprudência que se vem firmando nos tribunais superiores, indicando-se a título de exemplo o recente Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 26/03/2015, Processo 89115.8T8AMT-C.Pl, in www.dgsi.pt, é meu entendimento que "A unidade do sistema jurídico concretamente o direito de defesa e a exigência de um processo equitativo consagrados no art. 20° n. °1 e 4 da C.R.P e o principio do contraditório plasmado nos artigos 29° e 30° do CIRE e 3° do CPC, impedem que se interpretem os artigos 17º G n.° 4 e 28° do CIRE, no sentido de equiparar o parecer do Administrador Judicial da Insolvência de que o devedor está em situação de insolvência ao reconhecimento da insolvência pelo devedor, quando este declarou no processo de revitalização que não se encontrava insolvente. Nesse caso, tem de lhe ser concedido o direito de se defender e provar a sua solvência, atento o disposto no art. 30° n. ° 4 do CIRE ou ainda que o activo é superior ao passivo, segundo os critérios do art. 3° n. ° 3 do CIRE ." No caso, cumprido o contraditório, caberia designar data para realização de audiência de discussão e julgamento.

Sucede, porém, que nos autos de PER da devedora, que antecederam e deram origem aos presentes, foi interposto recurso da decisão que considerou não aprovado o plano de revitalização da devedora.

Pese embora àquele recurso tenha sido fixado efeito devolutivo, em observância do disposto no art.º 14.°, n.º 5 do CIRE, o certo é que a sua eventual procedência, com consequente aprovação de um plano de revitalização da devedora, terá como consequência a impossibilidade legal desta lide (processo de insolvência da devedora), não se descurando os efeitos perniciosos e nefastos que uma eventual declaração de insolvência da devedora, antes de decidido o recurso, causam.

Deve, pois, fazer-se aplicação do disposto no art.º 17º-E. n.º 1 do CIRE, interpretando-o no sentido de a pendência daqueles autos de PER obstar à instauração da presente acção que, neste momento, deve ser suspensa.

Termos em que determino a suspensão destes autos, até que seja proferida decisão naqueles autos de recurso no PER da devedora.

Notifique.».

e) Em 14 de dezembro de 2015, a solicitação do Tribunal da Comarca de Aveiro, foi prestada informação pelo Tribunal da Relação do Porto (cfr. fls. 195), com a indicação de já ter sido proferido acórdão nos autos do PER (57/15.OT8AVR).

Nesse acórdão, proferido a 24/11/2015 (cfr. fls. 196-208), o Tribunal da Relação do Porto julgou improcedente o recurso interposto pela devedora relativamente à decisão de não se considerar aprovado o plano de recuperação da empresa em causa por os votos emitidos não terem cumprido o quórum exigido pela alínea a) do n.º 3 do artigo 17º-F do CIRE e por não se ter apurado a maioria prevista na alínea b) da referida disposição legal (e, bem assim, julgou improcedente o recurso interposto da decisão que não procedeu à destituição da Administradora judicial provisória designada para o PER, tal como requerido pela devedora).

f) Em requerimento apresentado em 17/05/2016 (fls. 257-258), a devedora, ora recorrida, veio expor e requerer ao Juiz do processo (Processos 57/15.OT8AVR e 3089/15.4T8AVR) que, tendo a mesma decidido apresentar-se à insolvência – correndo o processo os seus termos na 1ª Secção de Comércio/J2/Instância Central/Tribunal da Comarca de Aveiro, sob o n.º 1574/16OT7AVR – «a devedora é do entendimento que é no supra referido processo que deve ser decretada a insolvência» (cfr. fls. 257-verso).

Mais requereu:

«8. A devedora é do entendimento que é no supra referido processo que dever decretada a insolvência por todas as razões e fundamentos que se passam a discriminar e ainda, e essencialmente por uma questão de celeridade.

9. No entanto, e caso assim não se entenda, o que por mera cautela de patrocínio se admite, a devedora é do entendimento que a Sra. Administradora Judicial Provisória não deve manter-se como Administradora de Insolvência face a todos os conflitos evidentes nos autos e que em nada ajudaram na recuperação da devedora, nomeadamente porque a prestação da mesma foi sempre o encerramento imediato da empresa.

10. Esta atitude da Sra. Administradora opõe-se claramente ao espírito e letra do atual CIRE, nomeadamente no seu artigo 1.º onde se lê que que o processo de insolvência é um processo de execução universal que em como objetivo a satisfação dos credores pela forma prevista num plano de insolvência, baseado, nomeadamente, na recuperação da empresa compreenda na massa insolvente ou, (e apenas) quando tal não seja possível na liquidação do património do devedor insolvente.

11. Face ao supra exposto, e apenas no caso de a insolvência não vir a ser decretada no processo referido no ponto 7 deste requerimento, deve ser nomeado como Administrador de Insolvência o Dr. B. inscrito nas listas oficiais de Administradores Judicias, com escritório na Rua …, …, .., 1600-548 Lisboa nos termos e com os fundamentos alegados na petição de apresentação à insolvência, que se dão por integralmente reproduzidos».

g) Em novo requerimento apresentado em 17/06/2016 (cfr. fls. 265), a devedora, ora recorrida, veio expor e requerer ao Juiz do processo o seguinte:

«A., Lda., devedora nos autos supra referenciados melhor identificada, vem expor e requerer a V. Exa. o seguinte:

1. Em 11.05.2016 a devedora apresentou-se à insolvência, correndo o processo nesta Instância Central de Comércio sob o n.º 1574/16.0T8AVR.

2. No âmbito do supra processo o Mmo. Juiz decretou a suspensão a instância até que nos processos 57/15.0T8AVR e 3089/15.4T8AVR desta Instância Central de Comércio, seja proferida decisão que não decrete a insolvência da Requerente / devedora ou de encerramento de tais processo sem declaração de insolvência, ou até que nalgum desses ocorra o trânsito em julgado da eventual declaração de insolvência da Requerente - cfr despacho que se junta como Doc. 1

3. Face ao douto despacho proferido e tendo em conta a não aprovação do...

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