Acórdão nº 833/17 de Tribunal Constitucional (Port, 13 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelCons. Fernando Vaz Ventura
Data da Resolução13 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 833/2017

Processo n.º 1349/2017

2ª Secção

Relator: Conselheiro Fernando Ventura

Acordam, em conferência, na 2.ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Através da decisão sumária n.º 784/2017, foi decidido não conhecer do recurso interposto por A., ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, da decisão proferida pelo Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, que indeferiu a reclamação apresentada, ao abrigo do artigo 405.º do CPP, do despacho que não admitiu o recurso para aquele tribunal do despacho que revogou a suspensão de execução da pena, proferido em 24 de maio de 2012.

Importa reter que o recurso interposto comporta a colocação de três questões de inconstitucionalidade, com a seguinte formulação:

«1) Pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade da norma contida no art.º 196.º, n.º 3, al. c), conjugada com a contida no art.º 214.º, n.º 1, al. e) do CPP, ambas na redação anterior à Lei n.º 20/2013, de 21/02 (redação anterior aplicável ao caso dos autos), com a interpretação com que foi aplicada pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa e pelo Tribunal Central Criminal de Cascais, que adotaram o entendimento de que o arguido se considera notificado na morada do TIR, apesar de decisão judicial, transitada em julgado, ter declarado extinta essa medida de coação e de a Lei dispor que as medidas de coação extinguem-se de imediato com o trânsito em julgado da sentença condenatória, por violação dos art. 29.º (princípio da legalidade), 20.º, n.º 4 (acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva, direito a processo equitativo), art.º 32.º (garantias de processo criminal), 202.º (função jurisdicional) da CRP, art.ºs 6.º, 7.º da CEDH.

2) Pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade da norma dos artigos 113.º, n.º 9, 411.º, n.º 1, al. a) do CPP, na redação anterior à Lei n.º 20/2013, de 21/02 (redação anterior aplicável ao caso dos autos), conjugadas com a norma contida no art.º 56.º, n.º 1, al. a) do CP, com a interpretação com que foi aplicada pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa e pelo Tribunal Central Criminal de Cascais, que adotaram o entendimento de que o prazo para interposição de recurso, pelo condenado, de decisão que revogou a suspensão da execução de pena de prisão se conta da data em que se considera efetivada a sua notificação dessa decisão por via postal simples, sem excetuar os casos em que este não tenha obtido efetivo conhecimento pessoal dessa decisão, por violação dos art.º 32.º (garantias de processo criminal), art.º 29.º (princípio da legalidade), 20.º n.º 4 (acesso ao direito e tuteia jurisdicional efetiva, direito a processo equitativo), 202.º (função jurisdicional) da CRP, art.ºs 6.º, 7.º da CEDH. Inconstitucionalidade que fica expressamente suscitada, à cautela, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1, do art.º 70.º (designadamente, na sua alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional e art.º 204.º da CRP.

3) Pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade da norma contida nos artigos 411.º, n.º 1, e 333.º, n.º 5, do CPP, na redação anterior à Lei n.º 20/2013, de 21/02 (redação anterior aplicável ao caso dos autos), conjugada com a contida no artigo 56.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, com a interpretação com que foi aplicada pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa e pelo Tribunal Central Criminal de Cascais, que adotaram o entendimento de que as decisões que revogam as suspensões das penas não precisam ser notificadas pessoalmente aos arguidos, por violação, pelo menos, do artigo 32.º, n.º 1, da CRP.»

A decisão sumária afastou o conhecimento de todas as questões, com os seguintes fundamentos:

«3. Resulta desde já manifesto que não se encontram reunidos todos os pressupostos de que depende o conhecimento do recurso, o que determina a prolação da presente decisão sumária (artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC).

4. A jurisprudência constitucional vem entendendo, como pressupostos gerais cumulativos, que todos os recursos de fiscalização concreta da constitucionalidade e da legalidade (i) comportam objeto normativo necessário, devendo incidir sobre normas ou interpretações normativas, e não sobre as decisões judiciais, em si mesmas consideradas e (ii) revestem natureza instrumental, devendo a solução da questão de inconstitucionalidade ou de ilegalidade normativa submetida à apreciação do Tribunal Constitucional, poder repercutir-se, de forma útil e efetiva, na decisão recorrida.

Como amiúde salientado, não incumbe ao Tribunal Constitucional apreciar os factos materiais da causa, definir a correta conformação da lide ou determinar a melhor interpretação do direito ordinário, devendo a apreciação efetuada pelo tribunal a quo nesses domínios ser tomada como um dado. Assim, por imperativo do artigo 280.º da Constituição, objeto do recurso (em sentido material) são exclusiva e necessariamente normas jurídicas, tomadas com o sentido que a decisão recorrida lhes tenha conferido, sem que caiba ao Tribunal Constitucional sindicar a atuação dos demais tribunais, a partir da direta imputação a tais decisões da violação da Constituição.

Acresce que, considerando o caráter ou função instrumental dos recursos de fiscalização concreta, este Tribunal só deve conhecer das questões cuja decisão possa influir, de forma útil e eficaz, na decisão recorrida, de modo a alterar, no todo ou em parte, a solução jurídica que se obteve no caso concreto. Mostra-se, então, necessário, considerando a via de fiscalização concreta invocada pelo ora recorrente, que tenha ocorrido a efetiva aplicação, expressa ou implícita, da norma ou interpretação normativa a que vem reportado o recurso interposto perante o Tribunal Constitucional, em termos de a mesma constituir “ratio decidendi” ou fundamento jurídico determinante da decisão proferida no caso concreto, pois só assim um eventual juízo de inconstitucionalidade poderá determinar a reforma do julgado (artigo 80.º, n.º 2, da LTC).

5. Ora, tomando as três questões colocadas, verifica-se que nenhuma delas permite ter como verificados tais pressupostos.

5.1. Desde logo, são irrelevantes as menções ao “Tribunal Central Criminal de Cascais”, que não proferiu a decisão recorrida.

5.2. Depois, no que respeita à primeira questão, reportada a norma extraída da conjugação dos artigos 196.º, n.º 3, alínea c) e 214.º, n.º 1, alínea e) do CPP (na redação anterior à Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro), a...

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