Acórdão nº 421/18 de Tribunal Constitucional (Port, 09 de Agosto de 2018

Magistrado ResponsávelCons. Maria José Rangel de Mesquita
Data da Resolução09 de Agosto de 2018
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 421/2018

3.ª Secção

Relatora: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi pelo primeiro interposto recurso de constitucionalidade (cfr. fls. 230-232), ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b) da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (Lei do Tribunal Constitucional, doravante designada pela sigla LTC), do acórdão daquele Tribunal da Relação de 17 de maio de 2017 (cfr. fls. 167-219) que negou provimento aos recursos interpostos pelos arguidos, incluindo o interposto pelo ora recorrente, e confirmou a decisão recorrida, proferida em primeira instância pelo Juiz de Instrução Criminal em 6 de dezembro de 2017, nos termos da qual foi decretada a aplicação de medida de coação de prisão preventiva dos arguidos, incluindo o ora recorrente.

2. Na Decisão Sumária n.º 467/2018, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, decidiu-se (cfr. II – Fundamentação, n.º 4. e ss., em especial n.º 6 e ss.):

«(…) 7. Cabendo ao recorrente delinear o objeto do recurso (norma ou interpretação normativa cuja constitucionalidade pretende ver apreciada), a aferição do preenchimento dos requisitos de que depende a admissibilidade de recurso para o Tribunal Constitucional e, bem assim, a delimitação do objeto do recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade devem ter por base o invocado no requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional e reportar-se à decisão recorrida (ou decisões recorridas), tal como identificada(s) pelo recorrente no requerimento de interposição de recurso (aperfeiçoado) e que fixam o respetivo objeto – in casu, o Acórdão do TRL proferido em 17 de maio de 2018 (de fls. 167-219 e parcialmente transcrito supra em 6., g)).

Do requerimento de interposição de recurso de constitucionalidade resulta que são cinco as questões de constitucionalidade que o recorrente pretende ver apreciadas pelo Tribunal Constitucional tendo a primeira sido colocada ao TRL nas alegações de recurso apresentadas pelo ora recorrente e as quatro últimas questões sido enunciadas junto das instâncias na resposta apresentada pelo ora recorrente à resposta e pronúncia do Ministério Público representado nas instâncias (cfr. requerimento de interposição de recurso, supra transcrito em I- 2.),

Vejamos quanto a cada uma delas.

8. As três primeiras questões de constitucionalidade enunciadas pelo recorrente no requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional têm como elemento comum a qualificação, alegadamente conferida pelo TRL no acórdão ora recorrido, à violação de normas legais (contidas nos artigos 194.º, n.º 7 e 141.º, n.º 4, do CPP) no sentido de tal violação configurar nulidade ou irregularidade sanáveis.

Assim, a primeira questão enunciada pelo recorrente reporta-se à «inconstitucionalidade da norma constante do art.º 194.°, n.º 7, do C.P.P., quando interpretada no sentido constante do Acórdão proferido a 17/05/2018 pelo Tribunal da Relação de Lisboa, ou seja, quando interpretada no sentido de que, a violação de tal comando legal configura nulidade ou irregularidade sanáveis», considerando o recorrente que a mesma interpretação viola «quer o disposto no art.º 28.°, n.º 1, da C.R.P., quer, ainda, o preceituado no art.º 32.°, n.ºs 1, 5 e 7, da C.R.P.» (cfr. requerimento de interposição de recurso, 2., a)).

A segunda questão é assim formulada: «a interpretação da norma constante do art.º 194.°, n.º 7, do C.P.P., quando interpretada no sentido constante do Acórdão proferido a 17/05/2018 pelo Tribunal da Relação de Lisboa, ou seja, quando interpretada no sentido de que, a violação de tal comando legal configura nulidade ou irregularidade sanáveis, podendo, os factos e elementos do processo que não tenham sido comunicados ao arguido, ser, ainda assim, com excepção do T.I.R., considerados para fundamentar a aplicação, ao mesmo, de medida de coacção ou de garantia patrimonial» (cfr. requerimento de interposição de recurso, 2., b)).

Já a terceira questão incide sobre «a interpretação da norma constante do art.º 141.°, n.º 4, do C.P.P., quando interpretada no sentido constante do Acórdão proferido a 17/05/2018 pelo Tribunal da Relação de Lisboa, ou seja, quando interpretada no sentido de que, a violação de tal comando legal configura nulidade ou irregularidade sanáveis, podendo, os factos e elementos do processo que não tenham sido comunicados ao arguido, ser, ainda assim, com excepção do T.I.R., considerados para fundamentar a aplicação, ao mesmo, de medida de coacção ou de garantia patrimonial» (cfr. requerimento de interposição de recurso, 2., c)).

8.1 Assim dispõem os invocados artigos 194.º e 141.º do Código de Processo Penal:

«Artigo 194.º

Audição do arguido e despacho de aplicação

1 - À exceção do termo de identidade e residência, as medidas de coação e de garantia patrimonial são aplicadas por despacho do juiz, durante o inquérito a requerimento do Ministério Público e depois do inquérito mesmo oficiosamente, ouvido o Ministério Público, sob pena de nulidade.

2 - Durante o inquérito, o juiz pode aplicar medida de coação diversa, ainda que mais grave, quanto à sua natureza, medida ou modalidade de execução, da requerida pelo Ministério Público, com fundamento nas alíneas a) e c) do artigo 204.º

3 - Durante o inquérito, o juiz não pode aplicar medida de coação mais grave, quanto à sua natureza, medida ou modalidade de execução, com fundamento na alínea b) do artigo 204.º nem medida de garantia patrimonial mais grave do que a requerida pelo Ministério Público, sob pena de nulidade.

4 - A aplicação referida no n.º 1 é precedida de audição do arguido, ressalvados os casos de impossibilidade devidamente fundamentada, e pode ter lugar no acto de primeiro interrogatório judicial, aplicando-se sempre à audição o disposto no n.º 4 do artigo 141.º

5 - Durante o inquérito, e salvo impossibilidade devidamente fundamentada, o juiz decide a aplicação de medida de coacção ou de garantia patrimonial a arguido não detido, no prazo de cinco dias a contar do recebimento da promoção do Ministério Público.

6 - A fundamentação do despacho que aplicar qualquer medida de coacção ou de garantia patrimonial, à excepção do termo de identidade e residência, contém, sob pena de nulidade:

a) A descrição dos factos concretamente imputados ao arguido, incluindo, sempre que forem conhecidas, as circunstâncias de tempo, lugar e modo;

b) A enunciação dos elementos do processo que indiciam os factos imputados, sempre que a sua comunicação não puser gravemente em causa a investigação, impossibilitar a descoberta da verdade ou criar perigo para a vida, a integridade física ou psíquica ou a liberdade dos participantes processuais ou das vítimas do crime;

c) A qualificação jurídica dos factos imputados;

d) A referência aos factos concretos que preenchem os pressupostos de aplicação da medida, incluindo os previstos nos artigos 193.º e 204.º

7 - Sem prejuízo do disposto na alínea b) do número anterior, não podem ser considerados para fundamentar a aplicação ao arguido de medida de coacção ou de garantia patrimonial, à excepção do termo de identidade e residência, quaisquer factos ou elementos do processo que lhe não tenham sido comunicados durante a audição a que se refere o n.º 3.

8 - Sem prejuízo do disposto na alínea b) do n.º 6, o arguido e o seu defensor podem consultar os elementos do processo determinantes da aplicação da medida de coação ou de garantia patrimonial, à exceção do termo de identidade e residência, durante o interrogatório judicial e no prazo previsto para a interposição de recurso.

9 - O despacho referido no n.º 1, com a advertência das consequências do incumprimento das obrigações impostas, é notificado ao arguido.

10 - No caso de prisão preventiva, o despacho é comunicado de imediato ao defensor e, sempre que o arguido o pretenda, a parente ou a pessoa da sua confiança.

Artigo 141.º

Primeiro interrogatório judicial de arguido detido

1 - O arguido detido que não deva ser de imediato julgado é interrogado pelo juiz de instrução, no prazo máximo de quarenta e oito horas após a detenção, logo que lhe for presente com a indicação circunstanciada dos motivos da detenção e das provas que a fundamentam.

2 - O interrogatório é feito exclusivamente pelo juiz, com assistência do Ministério Público e do defensor e estando presente o funcionário de justiça. Não é admitida a presença de qualquer outra pessoa, a não ser que, por motivo de segurança, o detido deva ser guardado à vista.

3 - O arguido é perguntado pelo seu nome, filiação, freguesia e concelho de naturalidade, data de nascimento, estado civil, profissão, residência, local de trabalho, sendo-lhe exigida, se necessário, a exibição de documento oficial bastante de identificação. Deve ser advertido de que a falta de resposta a estas perguntas ou a falsidade das respostas o pode fazer incorrer em responsabilidade penal.

4 - Seguidamente, o juiz informa o arguido:

a) Dos direitos referidos no n.º 1 do artigo 61.º, explicando-lhos se isso for necessário;

b) De que não exercendo o direito ao silêncio as declarações que prestar poderão ser utilizadas no processo, mesmo que seja julgado na ausência, ou não preste declarações em audiência de julgamento, estando sujeitas à livre apreciação da prova;

c) Dos motivos da detenção;

d) Dos factos que lhe são concretamente imputados, incluindo, sempre que forem conhecidas, as circunstâncias de tempo, lugar e modo; e

e) Dos elementos do processo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT