Acórdão nº 01539/17.4BELRA 0818/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelTERESA DE SOUSA
Data da Resolução17 de Janeiro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório B………. (B…), interpôs, para o TCA Sul, recurso da sentença do TAF de Leiria, que julgou improcedente a acção de contencioso pré-contratual, na qual se pedia a declaração de caducidade do acto de adjudicação e, consequentemente, a prática do acto de adjudicação a favor da autora.

Por acórdão datado de 10 de maio de 2018 foi decidido: - em conceder provimento ao recurso interposto, revogando a decisão recorrida; - em substituição, julga-se procedente a presente acção e condena-se a Entidade Adjudicante, ora demandada, a cumprir a formalidade da audiência prévia, tal como determinado no art.° 86.°, n.° 2 e 4, do CCP, devendo, após o cumprimento dessa formalidade, decidir pela preterição do prazo para a entrega pelo Adjudicatário dos documentos de habilitação e, nos termos do art.° 86.°, n.°s 1, aI. b) e 4, considerar caducada a (primitiva) adjudicação, passando a adjudicar à proposta ordenada em lugar subsequente, a saber, à proposta da A. e ora Recorrente; - custas em 1.ª instância pelos Recorridos, na proporção do decaimento, que se fixa de 2/3 para o Centro Hospitalar de Leiria, EPE e 1/3 para a A….. e custas em 2.ª instância, em partes iguais, para os Recorridos (cf. art.°s. 527.° n.°s 1 e 2 do CPC, 7.°, n.°s. 1, 2 e 12.°, n.° 2, tabelas I e II do RCP e 189.°, n.° 2 do CPTA).

Centro Hospitalar de Leiria, EPE vem recorrer deste acórdão para a Secção do Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal apresentando, para o efeito, alegações onde formulou as seguintes conclusões: 1ª- Dando por reproduzida a matéria de facto assente, salientam-se como questões que convocam a reapreciação do Direito que lhes é aplicável, em resumo as seguintes: d) O CHL iniciou em Maio de 2017 um procedimento pré-contratual de concurso público com vista á escolha de co-contratante para celebração de um contrato de prestação de serviços médicos de realização de exames de ressonância magnética; e) Nesse procedimento, por aplicação do critério de adjudicação adotado, o do melhor preço, foi em 14-Set.-2017 praticado ato de adjudicação à concorrente e aqui contra-interessada A……, tendo a proposta da A. sido ordenada em segundo lugar; f) Os concorrentes foram notificados desse ato por mensagem enviada em 18-Set.-2017, nos exatos termos da comunicação transcrita no ponto 8 da matéria de facto; g) A referida comunicação contém uma listagem dos documentos de habilitação a juntar, intitulada de “Documentos Obrigatórios”, a qual inclui todos os previstos no ponto 25.1 do Programa do Concurso, à exceção da declaração prevista no seu ponto 25.1.3; h) No dia 29-Set.-2017 a adjudicatária apresentou os documentos identificados na referida listagem; 1) Em 04-Out.-2017, o CHL remeteu à adjudicatária uma mensagem com o seguinte teor: “Exmos. Senhores, Após análise aos documentos apresentados e de acordo com o Programa de Concurso, verifica-se que estão em falta os seguintes: 25.2. Informação quanto aos titulares dos órgãos sociais da empresa, designadamente no que respeita à relação ou à participação de ex- colaboradores da entidade contratante, bem como do respetivo cônjuge, algum parente ou afim em linha reta ou até 2º grau da linha colateral, ou de qualquer pessoa com quem viva em economia comum; Nesses termos, solicita-se que providenciem a remessa do documento em falta no prazo determinado.

Com os melhores cumprimentos, O CRL, EPE” j) Em 25-Out.-2017 a adjudicatária apresentou no procedimento uma declaração subscrita pela respetiva administração, correspondente ao teor do ponto 25.1.3 do Programa do Concurso; k) O ponto 25.2 do Programa do Concurso, tem a seguinte redação: “Nos termos do disposto no artigo 35.º do CCP, o adjudicatário dispõe de 3 (três) dias úteis para suprir eventuais irregularidades detetadas nos documentos de habilitação apresentados que possam levar à caducidade da adjudicação.”.

1) Em 07-Nov.-2017, foi celebrado entre o CHL e a A…… o contrato de prestação de serviços objeto deste procedimento pré-contratual.

QUANTO À ADMISSIBILIDADE DA REVISTA: 2ª - A d. Sentença proferida em 1.ª Instância, em aplicação do Direito aos referidos factos, julgou a ação improcedente, com dois fundamentos autónomos: a) A desculpabilidade da falta de entrega atempada da declaração prevista no ponto 25.1.3 do PC por não constar do elenco legal, nem tampouco da lista dos documentos obrigatórios que notificada com a adjudicação, neste caso por erro imputável ao CHL; b) Por não ter essa declaração a natureza de documento de habilitação, não cabendo a mesma no conceito do artigo 81.º/6 do CCP, de “...quaisquer documentos comprovativos da titularidade das habilitações legalmente exigidas para a prestação dos serviços em causa.” e não sendo, por isso, exigível.

3 - O d. Acórdão recorrido aplicou o Direito de modo diametralmente oposto, concluindo: a) Pela exigibilidade da referida declaração como documento de habilitação e, assim, pela conformação ao Direito aplicável da previsão dessa exigência contida no ponto 25.1.3 do Programa do Concurso; b) Que a comunicação do CHL de 04-Out.-2017, supra citada, determinou ao adjudicatário o prazo de três dias úteis para juntar no procedimento a declaração em falta; c) Que essa comunicação equivale ao cumprimento, embora deficiente, do disposto no artigo 86.º/3 do CCP; d) Que a referida declaração, sendo exigível e não tendo sido entregue no prazo de 3 dias úteis mas apenas ao fim de 14 dias úteis contados de 04-Out., é extemporânea e determinou a caducidade da adjudicação; e) Que, pese embora essa caducidade esteja assim verificada inquestionavelmente, o CHL andou mal ao não ter cumprido a notificação da adjudicatária para se pronunciar em sede de Audiência Prévia sobre a falta de entrega do documento no prazo de 10 dias úteis indicado no Programa do Concurso (Ponto 25.1), dando desse modo cumprimento ao estabelecido no artigo 86.º do CCP.

f) Impondo-se, por isso, cumprir essa mera formalidade antes da prática do ato de declaração de caducidade da adjudicação, já decidido.

  1. - E assim decidiu julgar procedente a Apelação, condenando o G “... a cumprir a formalidade da Audiência Prévia tal como determinado no art 86.º, n.º 2 e 4 do CCP, devendo, após o cumprimento dessa formalidade, decidir pela preterição do prazo para a entrega pelo Adjudicatário dos documentos de habilitação e, nos termos do art 86.º n.º 1, al. 14 e 4, considerar caducada a (primitiva) adjudicação, passando a adjudicar à proposta ordenada em lugar subsequente, a saber, à proposta da A. e ora Recorrente;”.

  2. - A aplicação do Direito feita no d. Acórdão recorrido suscita, no essencial, em matéria substantiva, três questões: i) A relativa à determinação da concessão do exercício ao interessado do direito de audiência prévia como mera formalidade e da simultânea pré-determinação da decisão final no procedimento, convocando-se assim a apreciação da violação dos direitos fundamentais da participação dos interessados no procedimento e da separação de poderes, com consagração na Constituição; ii) A relativa à tempestividade da apresentação da declaração no procedimento; iii) A relativa à exigibilidade da apresentação da própria declaração.

  3. - Quanto à primeira questão: Ao condenar o CHL a notificar o adjudicatário nos termos artigo 86.º/2 do CCP, outorgando-lhe o direito de se pronunciar em sede de Audiência Prévia, como mera formalidade a cumprir sem qualquer possibilidade de influência na decisão final impondo-lhe simultaneamente o sentido desta, o d. Acórdão recorrido define assim o conteúdo do direito à audiência prévia: um mero formalismo procedimental a cumprir, quando omitido, sem possibilidade de influência na decisão final do procedimento; Esta definição contraria o conteúdo do direito da audiência do interessado previamente à emissão de um ato administrativo lesivo, como um princípio geral da atividade administrativa ditado por imposição constitucional, com o estabelecido no artigo 267.º/5 da CRP; O que suscita a inconstitucionalidade da norma aplicada do artigo 86.º/2 do CCP, se interpretada no sentido da supra descrita definição; inconstitucionalidade que aqui se invoca para todos os devidos e legais efeitos.

  4. - Não se entendendo que a norma possa ser interpretada no referido sentido, então o segmento da Decisão em apreço é ilegal, por violação do preceituado nos artigos 267.º da CRP, 86.º/2 do CCP e 121.º n.º 1, 2 e 3 do CPA.

  5. - O mesmo segmento da Decisão é, ainda ilegal, por violação do princípio constitucional da separação de poderes ínsito no princípio do Estado de Direito, conforme estabelecido nos artigos 22.º, 111.º/1, 202.º/2 e 267.º/5, todos da CRP, uma vez que a prática do ato administrativo de declaração da caducidade da adjudicação se insere num procedimento administrativo e é da competência da Administração e não dos Tribunais; cabendo aos tribunais julgar a atuação da administração, sindicar da validade dos atos por esta praticados e condená-la nos termos da lei, não podem determinar que um procedimento seja invalidado a partir do momento em que deveria ter sido concedido o direito de audiência prévia, e simultaneamente conduzir o procedimento a partir daí, pois que tal traduz a assunção das competências da Administração, por via de um julgamento apriorístico assente exclusivamente num juízo de prognose póstuma, que considera a audiência prévia uma mera formalidade.

  6. - Pelo que a norma do artigo 86.º/2 do CCP será também inconstitucional por violação do princípio do Estado de Direito e do princípio da Separação de poderes, consagrados nos artigos 22.º, 111.º/1, 202.º/2 e 267.º/5, todos da CRP, se interpretada no sentido de que o Tribunal não invade a esfera de competência da Administração, ao pré-determinar o sentido da decisão final a tomar por esta, quando simultaneamente a condena a conceder o direito de pronuncia ao interessado, em audiência prévia - o que aqui e invoca para os devidos e legais efeitos.

  7. -...

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