Acórdão nº 1156/12.5TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Novembro de 2018
Magistrado Responsável | SOUSA LAMEIRA |
Data da Resolução | 22 de Novembro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO l.
AA, Lda., intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário contra BB, S.A., CC - Viagens e Turismo, Lda. e DD, alegando: A A., desde 2003, tem por objecto a actividade de agente de viagens tendo conseguido consolidar uma forte carteira de clientes, o que permitiu que o volume de facturação fosse crescendo ao longo dos anos, sendo a mesma de € 4.781.860,00 em 2009, de € 6.420.280,64 em 2010, e de € 6.025.564,90 em 2011, variando a margem de lucro entre os 8 a 10%.
Por ser uma empresa de sólida reputação, em finais de Junho inícios de Julho de 2011, recebeu uma manifestação de interesse na aquisição do estabelecimento comercial da A por parte da 3ª R., na qualidade de Directora Geral da 1ª R., tendo-se iniciado um longo, e com algumas intermitências, processo negocial, durante o qual foram transmitidas à 3ª R informações vitais e confidenciais da A, na convicção fundada de que o mesmo seria levado a bom porto pelo valor de €300.000,00, a que acresceria a quantia de €43.000,00 a título de indemnização aos funcionários que, de acordo com as indicações da 2ª e 3ª RR. teriam de ser despedidos e indemnizados.
Tais valores não só foram previamente verbalizados e acordados, como foram depois plasmados na proposta de Contrato de Trespasse com Condição Suspensiva que a 2ª R., de que são sócias a 1ª e 3ª RR., apresentou ao sócio gerente da A. em 5.4.2012, e que este aceitou, tendo ficado acordado que o mesmo seria assinado nunca em data posterior a 13.4.2012, uma vez que o montante de €150.000,00 que a A ia receber se destinavam a regularizar o BSP do mês de Abril, condição essencial para que a A aceitasse o contrato que lhe foi proposto, do que as RR. tinham conhecimento.
Na sequência desse acordo, a A. diligenciou no sentido de serem transferidos para a 2ª R. os acordos com os clientes.
No dia 16.4.2012, não obstante os sucessivos adiamentos e indefinições das RR., já havia sido concluído com sucesso a migração de todas as reservas da A., no total de 826, para a Pcc PE2, em estrita conformidade com o que havia sido acordado, bem como a equipa da A. passou a estar integrada na equipa da 2ª R.
Também no cumprimento das negociações, a A. comunicou aos clientes o acordo e foi informada pela ANCP, EPE que foi aprovado em 19.5.2012 o projecto de deliberação de exclusão da A. do acordo quadro de viagens transporte aéreos e alojamentos.
No dia 27.04.2012, a A. recebeu da 3ª R. um novo contrato com alterações, tendo respondido em 30.04.2012 alertando para a responsabilidade pré-contratual das RR., ao que não obteve resposta, tendo os respectivos mandatários tentado ultrapassar a situação, sem sucesso.
As 1ª e 2ªRR. decidiram fazer tábua rasa dos direitos dos trabalhadores que haviam aceite, e, em 16.5.2012, comunicaram-lhes que as negociações não se tinham concretizado e que regressavam à A., ao mesmo tempo que denunciavam o contrato apresentado à A.
As RR actuaram de má-fé, destruíram o estabelecimento comercial da A. e toda a organização de factores produtivos, bem como a reputação comercial da A., e respectivo gerente, conseguindo transferir para si toda a carteira de clientes desta, fizeram com que a A. despedisse um conjunto de trabalhadores, por cujas indemnizações se tornou responsável, que rescindisse o contrato que lhe permitia a utilização das instalações onde sempre desenvolveu a sua actividade, tendo todos os dados informáticos migrado para o sistema informático das RR., e até os elementos corpóreos do estabelecimento foram entregues às RR., inviabilizando o cumprimento das suas obrigações.
As RR aproveitaram-se da boa-fé e lisura negocial do sócio gerente da A. e respectivos funcionários.
O valor mínimo razoável de venda da empresa em condições normais de negociação (que não aquelas em que ocorreram) seria de € 3.000.000,00, sendo esse o valor dos danos causados, a que acrescem danos não patrimoniais causados ao sócio, por ter sido posto em causa o seu bom nome e ter sido atirado para fora do sector de actividade em que estava, e indemnizações aos trabalhadores que, eventualmente, instaurem processos laborais..
Concluiu pedindo a condenação, solidária, das RR a pagarem-lhe a quantia de € 3.000.000,00, a título de indemnização pelos danos causados à A e aos respectivos sócios gerentes, por força da actuação pré-contratual ilícita que acabou por ter como consequência a destruição do estabelecimento comercial da Autora cujos lucros, nos 5 anos que precederam a actuação das RR, foram de montante não inferior à referida quantia.
Caso assim não se entenda, devem as RR ser, solidariamente, condenadas a pagar-lhe, e aos respectivos sócios-gerentes, as seguintes quantias: a) € 300.000,00, a título de indemnização pela destruição do estabelecimento comercial de que a A era titular e que as RR se propuseram adquirir pelo referido valor, proposta à qual a A deu a sua aceitação; b) € 43.000,00, a título de indemnização por despedimento aos trabalhadores que as RR consideraram dispensáveis aquando das negociações efectuadas e que não pretenderam integrar no seu universo jurídico empresarial; c) € 200.000,00, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais devidos à A. e ao respectivo sócio-gerente pelos danos reputacionais causados em consequência da destruição do estabelecimento comercial da A e da situação de incumprimento em que a mesma foi colocada e em consequência da actuação concertada de todas as RR; d) uma quantia a liquidar em execução de sentença correspondente ao valor das indemnizações que vierem a ser devidas aos trabalhadores que foram transferidos da esfera jurídica da A para a esfera jurídica do grupo empresarial constituído pelas RR e que estas arbitrariamente decidiram despedir de forma ilícita e culposa. 2.
As Rés citadas contestaram excepcionando a ilegitimidade da 1ª Ré, impugnando os factos alegados e deduzindo reconvenção, alegando: Foi a A. que deu causa ao termo das negociações e à não concretização do negócio, tendo-se alterado, ao longo do processo negocial, as condições e pressupostos essenciais que estavam na sua base, e que levaram a 2ª R. (única contratante), a apresentar duas novas propostas, que a A. não aceitou.
Os trabalhadores, carteira de clientes e meios informáticos transitaram para a 2ª R. antes da conclusão do negócio, a pedido da A., e mesmo que este não se concretizasse.
Com a transferência provisória dos trabalhadores e carteira de clientes, a 2ª R. teve diversos prejuízos, a saber: com o valor que despendeu de vencimentos desses trabalhadores; não obteve o pagamento dos serviços que prestou a diversas entidades estatais da referida carteira de clientes porque as mesmas lhe transmitiram que não a aceitavam para subcontratação, e não aceitavam as facturas; com erros cometidos pelos referidos trabalhadores, tudo por culpa da A..
Concluem pedindo a condenação da A. a pagar à 2ª R. uma indemnização no montante de € 69.905,00, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, a contar da data da citação e até integral pagamento.
3.
A A. replicou, propugnando pela improcedência das excepções invocadas, impugnou a factualidade alegada pelas RR. na reconvenção e propugnou pela sua improcedência.
As RR. treplicaram.
4.
Realizou-se, em 28.10.2013, a audiência prévia, na qual foi admitida a reconvenção, saneado o processo, julgando parte ilegítima a 3ª R., que foi absolvida da instância, foi fixado o objecto do litígio, elencada a factualidade já assente e indicados os temas da prova.
Em 1.02.2016, as RR. ampliaram o pedido reconvencional, pedindo que a A./Reconvinda seja condenada a pagar à 2ª R. uma indemnização: a) no montante de € 55.687,79, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, a contar da data de cada um dos pagamentos referidos em 21º a 27º do requerimento efectuado pela 2ª Reconvinte, ou a efectuar, a EE, FF e GG; b) nos montantes que a 2ª Reconvinte venha eventualmente a ter de pagar a HH, acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento (fls. 1122 e ss.).
Respondeu a A. a propugnar pelo indeferimento do requerido (fls. 1145 e ss.).
Foi proferido despacho que admitiu a requerida ampliação do pedido, e aditou factos assentes e temas da prova (fls. 1154 e ss.).
Em 8.06.2016, as RR. ampliaram o pedido reconvencional, pedindo que a A./Reconvinda seja condenada a pagar acrescidamente à 2ª R. uma indemnização no montante de € 38.298,02, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, a contar da data de cada um dos pagamentos referidos em a) a j) do art. 14º do requerimento, até integral pagamento (fls. 1374 e ss.).
A A. respondeu propugnando pela improcedência dos pedidos adicionais formulados no articulado superveniente, e pela sua absolvição (fls. 1407 e ss.).
Foi proferido despacho que admitiu a requerida ampliação do pedido, e aditou factos assentes e temas da prova (fls. 1419).
5.
Realizou-se julgamento, vindo, em 19.12.2016, a ser proferida sentença que julgou parcialmente procedente a acção, e, consequentemente, condenou as RR. BB, SA e CC - Viagens e Turismo, Lda., solidariamente, no pagamento à A. de uma indemnização no valor de trezentos e quarenta e três mil euros (€ 343.000,00), absolvendo-as dos demais pedidos, e julgou improcedente o pedido reconvencional, absolvendo dele a A./Reconvinda.
6. Notificadas da sentença, vieram as RR. requerer a sua rectificação, porquanto no ponto 66 da fundamentação da facto consta que “[n]os anos de 2007 a 2011 a Autora facturou cerca de € 30.000,00”, quando se queria escrever “€ 30.000.000,00”.
Foi proferido despacho a ordenar a rectificação da sentença recorrida nos termos requeridos pelas RR.
E, inconformadas, as Rés interpuseram recurso de apelação, para o Tribunal da Relação de …, que, por Acórdão de 20 de Dezembro de 2017, decidiu «julgar parcialmente procedente a apelação, alterando-se a sentença recorrida, condenando-se, solidariamente, as RR. BB, S.A. e CC - Viagens e Turismo...
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...se não tivesse iniciado as negociações para a celebração do contrato. - Cf. neste sentido o Ac. do STJ, de 22-11-2018 (Revista n.º 1156/12.5TVLSB.L1.S1) - Já no Acórdão do STJ, de 31-03-2011 (Revista n.º 3682/05.3TVLSB.L1.S1), se afirmou: “I - Incorre em responsabilidade pré-contratual por ......
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Acórdão nº 1541/11.0TVLSB.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Novembro de 2019
...de 27.4.2017, proc. 4154/15.3TBLSB.L1.S1., de 12.6.2018, proc. 12.6.2018, proc. 3407/15.5T8BRG.G1.S2, de 22.11.2018, proc. 1156/12.5TVLSB.L1.S1, de 6.12.2018, proc. 3407/15.5TBRG.G1.S2, e de 9.10.2019, proc. 462/15.1T8VFR.P1.S2, todos em Igual é a tese defendida na doutrina por Inocêncio Ga......
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