Acórdão nº 4144/17.1T8LSB.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA ABREU
Data da Resolução22 de Novembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO AA intentou contra, Banco BB, S.A., Banco CC, Banco DD, S.A., EE, FF e GG, acção declarativa, com processo comum, pedindo a condenação dos Réus, como intermediários financeiros, a pagar ao Autor a quantia de €377.275,45, acrescida de juros, a título de indemnização pelos danos decorrentes da subscrição de aplicações, promovidas pelo Réu/Banco BB, S.A..

Contestaram os Réus, sustentando o Réu/Banco BB, S.A., dever ser julgada extinta a instância, quanto a si, por inutilidade da lide, e excepcionando, o 2º, 4º e 5º Réus, designadamente, a incompetência material do tribunal comum, para conhecimento do pedido.

Aquando do saneamento da demanda, foi proferida decisão, na qual se declarou extinta a instância, por inutilidade da lide, relativamente ao Réu/Banco BB, S.A., e, julgando verificada a incompetência absoluta do tribunal, se absolveram da instância, os demais Réus.

A propósito da extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, quanto ao Réu/Banco BB, S.A., o Tribunal de 1ª Instância consignou: “I. Da extinção da instância por inutilidade superveniente da lide: O “Banco BB, S.A.”, em liquidação, veio requerer que se declare a extinção da instância quanto ao mesmo, por inutilidade superveniente da lide, dada a revogação da autorização para o exercício da actividade bancária, a qual produz os efeitos da insolvência.

Notificado o A. para se pronunciar, pugna pelo indeferimento.

Cumpre decidir.

Da declaração e efeitos da insolvência - aplicação do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 8 de Maio de 2013: No caso dos autos, o Banco Central Europeu, por deliberação de 13/07/16, revogou a autorização para o exercício da actividade de instituição de crédito ao BB, S.A. a partir das 19h00 desse dia. Na sequência de tal deliberação, veio o Banco CC requerer a liquidação judicial do BB, e tal requerimento foi distribuído à 1ª secção do Comércio da Instância Central da Comarca de … - proc. n° 18.588116.2T8LSB - tendo, em 21/07/16, sido proferido despacho de prosseguimento, sobre o qual foi interposto recurso, pelo que ainda não transitou em julgado.

Todavia, a liquidação é apenas a consequência da revogação da autorização para o exercício da actividade de instituição de crédito, logo, apenas releva para se retirarem as consequências jurídicas relativas à insolvência, a decisão do BCE. Pois, nos termos do art. 8°, 2, do Dec-Lei n° 199/2006 de 25/10 a decisão de revogação da autorização produz os efeitos de insolvência, não tendo existido nos termos do art. 263º do T.J.U.E., impugnação da decisão do B.C.E. para o T.J.U.E., pelo que a decisão que determina os efeitos da insolvência é definitiva.

Nos termos do art. 81° do CIRE (Código da Insolvência e Recuperação de Empresas) a declaração de insolvência priva imediatamente o insolvente, por si, ou no caso de sociedade ou pessoa colectiva, pelos órgãos que o representem, da administração e do poder de disposição dos seus bens presentes ou futuros, os quais passam a integrar a massa insolvente, sujeita á administração e poder e disposição do liquidatário judicial. E na realização do interesse dos credores, os negócios jurídicos realizados pelo insolvente são ineficazes ou inoponíveis em relação á massa insolvente - cfr. artº 81° n° 6 do CIRE.

Sobre este entendimento (ainda que no âmbito do CPEREF, mas plenamente aplicáveis face às normas referidas) já tinha sido decidido no Ac. da RL de 8 de Outubro de 1998, relatado pelo Sr. Juiz Desembargador Salvador da Costa, proferido no proc. n° 1766/96, da 17ª Vara Cível de Lisboa (segundo cremos, não publicado) “não se trata, rigorosamente, de uma situação de incapacidade, porque os negócios jurídicos em causa, na medida em que a proibição não visa a defesa dos interesses do falido, não são afectados pelo vício da nulidade que para os menores, interditos e inabilitados resulta, em regra, do disposto nos artsº 125°, 148° a 150° e 156° do Código Civil.” Assim, é mais conforme com a situação do falido considerar que os bens que integram a massa falida ficam indisponíveis, ou na perspectiva do falido existe ilegitimidade ou ilegitimação ou pelo menos, limitação da capacidade patrimonial.

Donde, acerca desta questão e face à divergência na jurisprudência, foi proferido o Acórdão Uniformizador de jurisprudência, de 08-05-2013, publicado no DR, 1ª série, de 25.02.2014, no qual se decidiu que “Transitada em julgado a sentença que declara a insolvência, fica impossibilitada de alcançar o seu efeito útil normal a acção declarativa proposta pelo credor contra o devedor, destinada a obter o reconhecimento do crédito peticionado, pelo que cumpre decretar a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos da alínea e) do art. 287.° do C.P.C.”.

Com efeito, a finalidade do processo de insolvência, enquanto execução de vocação universal - art. 1.º do CIRE - postula a observância do princípio “par conditio creditorum”, que visa, como é consabido, a salvaguarda da igualdade (de oportunidade) de todos os credores perante a insuficiência do património do devedor, afastando, assim, a possibilidade de conluios ou quaisquer outros expedientes susceptíveis de prejudicar parte (algum/alguns) dos credores concorrentes.

Logo, quanto aos efeitos processuais da insolvência sobre as acções pendentes há que atender ao disposto nos art. 85 a 89 do CIRE. E dispõe o art° 85°, n° 1 que “declarada a insolvência, todas as acções em que se apreciem questões relativas a bens compreendidos na massa insolvente, intentadas contra o devedor, ou mesmo contra terceiros, mas cujo resultado possa influenciar o valor da massa, e todas as acções de natureza exclusivamente patrimonial intentadas pelo devedor são apensadas ao processo de insolvência, desde que a apensação seja requerida pelo administrador da insolvência, com fundamento na conveniência para os fins do processo”.

Resulta deste preceito que todas as acções em que se apreciem questões relativas a bens compreendidos na massa insolvente, intentadas contra o devedor, são apensadas ao processo de insolvência, bem como as acções de natureza exclusivamente patrimonial, desde que a apensação seja requerida pelo administrador de insolvência, com fundamento na conveniência para os fins do processo. E de acordo com o n° 2 do mesmo preceito são também apensados todos os processos nos quais tenha sido efectuado qualquer acto de apreensão ou detenção de bens do insolvente.

Afirma-se, assim, o regime da plenitude da instância falimentar em relação às acções em que se apreciem questões relativas a bens compreendidos na massa insolvente intentadas contra o devedor ou mesmo contra terceiro, cujo resultado possa influenciar o valor da massa.

Acresce que está manifestamente em causa um pedido de natureza patrimonial, que se repercutirá sobre o património do insolvente como um todo e não sobre um qualquer bem específico. Por isso, tais acções não serão, em princípio, susceptíveis de serem apensadas ao processo de falência. É que a motivação para a apensação dessas acções pelo administrador da insolvência tem a ver com a eventual discussão sobre a existência de bens susceptíveis de integrar a massa insolvente.

Ora, na presente acção não estão em causa bens susceptíveis de integrar a massa insolvente, razão pela qual não se justificaria a apensação dos presentes autos aos de liquidação. Com efeito, a acção declarativa em que se pede apenas o reconhecimento de um direito de crédito, não carece de ser apensada ao processo de insolvência/liquidação do devedor. Pois, importa referir que a simples apensação da acção ao processo de insolvência não implica que se considere automaticamente reclamado o correspondente crédito, embora possa permitir a presunção de que o crédito é do conhecimento do administrador da insolvência (cfr. artº 129°). Em todo o caso, “por maior prudência, os titulares dos créditos identificados nos processos apensados devem também reclamá-los” - Luís Carvalho Fernandes e João Labareda - Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, VoI. I, 2005, pág. 453.

Logo, considerando que nos presentes autos o A. pede a condenação das rés ao pagamento de determinado valor, vencem-se imediatamente todas as obrigações do insolvente, e abre-se a fase de convocação dos credores e a respectiva reclamação de créditos dentro do prazo fixado na sentença - art. 91° segs. do CIRE. Essa reclamação tem um carácter universal, abrangendo todos os créditos existentes à data da declaração de insolvência (art. 47° n° 1 e 128° n° 1 do CIRE), independentemente da natureza e fundamento do crédito e da qualidade do credor. E, quanto ao exercício dos créditos sobre a insolvência, dispõe o art. 90° do CIRE que “os credores da insolvência apenas poderão exercer os seus direitos em conformidade com os preceitos do presente código durante a pendência do processo”.

Deste modo, os credores da insolvência, quaisquer que sejam, devem reclamar a verificação dos seus créditos, nos termos do art. 128° do CIRE, e dentro do prazo assinalado na sentença declaratória da insolvência. E mesmo o credor que tenha já reconhecido o seu crédito por decisão definitiva “não está dispensado de o reclamar no processo de insolvência, se nele quiser obter pagamento”, como resulta, expressamente, do disposto no n° 3 do art. 128.°. Deste preceito resulta evidente que com a declaração de insolvência do devedor, transitada em julgado, deixa de ter interesse o prosseguimento da acção para o reconhecimento de eventuais direitos de crédito, uma vez que os mesmos sempre terão de ser objecto de reclamação no processo de insolvência.

Com efeito, de nada serve a sentença proferida na acção instaurada contra o devedor, se o credor não reclamar o crédito no processo de insolvência, porquanto jamais poderá tal decisão ser dada à execução para cumprimento coercivo, uma vez que, de acordo com o disposto no art. 88° do CIRE, a declaração de insolvência obsta à instauração ou ao...

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