Acórdão nº 1337/12.1TVPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução19 de Dezembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc.1337/12.1TVPRT.P1.S1.

R-666-B[1] Revista Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, Lda.

propôs, no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo Central Cível do Porto – Juiz 1 – acção declarativa com processo ordinário, contra: BB, advogado, sendo intervenientes principais as seguradoras CC, Lda. e Companhia DD, S.A., Pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 232.935,08 acrescida de juros legais a partir da citação até integral e efectivo pagamento.

Fundamenta a sua pretensão no alegado incumprimento ou cumprimento defeituoso do contrato de mandato celebrado entre ambos.

Devidamente citado, contestou o Réu pugnando pela improcedência da acção, mais solicitando a intervenção principal ou acessória das companhias de seguros CC, Lda. e Companhia DD, S.A..

Admitida a intervenção em via principal das seguradoras, vieram as mesmas contestar, pedindo a improcedência da acção, tendo a Ré Companhia DD excepcionado a sua ilegitimidade para a acção.

Foi proferido o despacho saneador em que se julgou improcedente a excepção da ilegitimidade invocada pela Ré DD, se fixou o objecto do litígio, se enunciaram os temas de prova e se apreciarem os requerimentos probatórios apresentados.

*** Teve lugar a audiência de julgamento que decorreu com observância do formalismo legal, tendo sido proferida decisão que julgou a acção improcedente por não provada e absolveu o Réu do pedido.

*** Inconformada, a Autora interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto, que, por Acórdão de 8.1.2018 – fls. 1730 a 1746 –, negou provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.

*** Inconformada, a Autora interpôs recurso de revista para este Supremo Tribunal de Justiça, pedindo que, se não se admitisse a revista normal, fosse admitida a revista excepcional.

Não tendo sido admitida a revista normal – decisão de fls.1902 a 1908, de 5.7.2018 – por se ter entendido existir de dupla conformidade, a Formação a que alude o art. 672º, nº3, do Código de Processo Civil, por Acórdão de 18.10.2018 – fls. 1940 a 1942 –, por considerar que a problemática que o recurso postula – perda de chance – “não é isenta de dúvidas e interrogações”, admitiu o recurso ao abrigo do art.672º, nº1, a) daquele diploma.

*** Alegando, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: 1. O Réu/Recorrido incorreu em responsabilidade civil, uma vez que cumpriu defeituosamente o mandato judicial.

  1. O Réu sabendo da existência das duas hipotecas, tinha o dever técnico de, ao abrigo do n.°4 do art. 830.° do Código Civil, requerer a condenação da promitente vendedora a entregar à Recorrente o montante necessário ao expurgo das hipotecas.

  2. Mais, tinha o dever técnico de, na sequência daquele pedido, requerer também a compensação de créditos entre o montante que a Recorrente ainda tinha que pagar a título do restante do preço de compra € 50.235,08 – e o montante em que a promitente-vendedora viesse a ser condenada a entregar para expurgo das hipotecas e que era muito superior àquele.

  3. Ao contrário do defendido no acórdão recorrido, nada na lei impedia que fosse formulado o pedido de compensação entre o montante que ainda era devido a título de preço e o montante que o Réu viesse a ser condenado a entregar para expurgo das hipotecas.

  4. Com o devido respeito, tal conclusão alcançada no acórdão recorrido decorre de uma errónea interpretação da lei, mais concretamente do art.° 847.° do Código Civil.

  5. Nada na lei impede que não se possa requerer numa acção judicial a compensação de créditos decorrentes de condenação nessa própria acção.

  6. No acórdão recorrido faz-se confusão entre exigibilidade do crédito, exigibilidade judicial do crédito e reconhecimento judicial do mesmo.

  7. Ora, no caso concreto o crédito que se pretenderia compensar é judicialmente exigível nos termos do n.°4 do art.° 830.° do Código Civil e, como tal, susceptível de compensação.

  8. Consequentemente, não se visualiza a razão pela qual a compensação não seria de admitir numa situação como essa.

  9. A actuação ilícita e culposa do Réu teve por consequência c directa a aquisição dos imóveis onerados, sem que a promitente vendedora fosse condenada a entregar o montante necessário para o expurgo das hipotecas.

  10. A Recorrente perdeu a chance de ter uma condenação da promitente vendedora a entregar-lhe o montante necessário ao expurgo das hipotecas.

  11. Teve, ainda, por consequência directa a não compensação dos créditos e o desnecessário pagamento do restante do preço no montante de € 50.235,08, com a perda dessa quantia.

  12. Perdendo-se assim a chance da compensação de créditos.

  13. No acórdão recorrido existe uma confusão entre a probabilidade do ganho de causa e a probabilidade de, ganhando a causa, a Recorrente no futuro vir a receber o montante decorrente da condenação.

  14. O dano traduzido na perda de chance goza de autonomia e é susceptível de indemnização autónoma.

  15. É irrelevante se a Recorrente depois ia ou não conseguir receber o montante decorrente da condenação.

  16. Ou seja, a Recorrente, em virtude da omissão cometida pelo Réu, consubstanciada na omissão do pedido de entrega do montante necessário para o expurgo da hipoteca, bem como no pedido de compensação, perdeu a hipótese daquela condenação favorável e da vantagem dela adveniente e a hipótese de ter sido declarada judicialmente a compensação de créditos, com a vantagem de não perder € 50.235,00.

  17. A procedência daqueles pedidos era muito provável ou mesmo certa.

  18. O Réu e as Intervenientes devem ser condenados a pagar indemnização para reparação dos danos causados, sendo que quanto à perda de chance da condenação da promitente vendedora na entrega do montante necessário ao expurgo hipoteca, a indemnização deve ser liquidada segundo juízos de equidade, nos termos do n.°3 do art. 566º do Código Civil, tendo por referência máxima o montante peticionado de € 182.700,00; 20. Já no que diz respeito ao dano causado pela omissão do pedido de compensação de créditos, entende que não existe qualquer incerteza e o dano está perfeitamente quantificado e é certo, ou seja, € 50.235,08, montante que faltava pagar do restante do preço.

    Se assim não se entender, também quanto a este dano se deveria aplicar o critério do nº 3 do art.° 566º do Código Civil.

    Termos em que este recurso deve ser julgado procedente e revogado o acórdão recorrido com a consequente condenação do Réu e das Intervenientes.

    O recorrido contra-alegou, pugnando pela inadmissibilidade do recurso de revista (normal e excepcional), e, no que respeita ao mérito do recurso, enfatizando que a figura da perde chance não é acolhida nem admissível no direito português, pugna pela improcedência do recurso, e no caso de ser revogado o Acórdão recorrido “que seja ordenada a remessa dos autos ao Tribunal da Relação do Porto, a fim de ser apreciado o pedido de ampliação do âmbito do recurso formulado pelo réu aqui recorrido, e proferida nova decisão em conformidade com a matéria de facto provada que vier a ser fixada.” *** Colhidos os vistos legais cumpre decidir, tendo em conta que a Relação considerou provados os seguintes factos: 1. Em 24 de Março de 2004 a “EE, Lda.”, sociedade comercial portadora do NIPC …, após renegociação de dois contratos-promessa anteriores, celebrou, em simultâneo, dois novos acordos, segundo os quais prometeu vender à Autora “AA, Lda.” com o NIF …, dois prédios.

  19. Pelo primeiro contrato promessa de compra e venda, a EE, Lda. prometeu vender à Autora a fracção autónoma designada pela letra “…” destinada a parque de automóveis pelo preço de € 261.868,90.

  20. Pelo segundo, e na proporção de metade, a mesma “EE, Lda.” prometeu vender à Autora as fracções autónomas designadas pelas letras “…” e “…” destinadas, segundo o contrato, a restaurante e similares, pelo preço de € 149.638,37.

  21. Estes prédios foram prometidos vender à Autora, livres de ónus ou encargos, conforme se diz expressamente na parte final do corpo da cláusula 1.ª de cada um dos respectivos contratos-promessa.

  22. Com referência aos valores entregues, a promitente-vendedora declara, na cláusula quinta de cada um dos contratos, já haver recebido da promitente compradora, a Autora, a título de sinal e princípio de pagamento de que dá quitação as quantias de: - para a fracção “…” a quantia de € 261.512,61, e; - para a metade das fracções “…” e “…” a quantia de € 99.759,58 também a título de sinal e princípio de pagamento.

  23. Da cláusula 6.ª de cada um desses acordos subscritos pela promitente vendedora e pela aqui Autora consta ainda - doc. ora juntos como 1 e 2- que a escritura “…será celebrada no dia 17/4/2004 às 14 horas no 6.º Cartório Notarial do Porto”.

  24. Estes contratos não chegaram a ser cumpridos pela promitente-vendedora, quer naquele dia, quer posteriormente.

  25. Na sequência desses incumprimentos culposos e definitivos por parte da promitente-vendedora, a sociedade A. que prometera comprar as faladas fracções decidiu agir judicialmente.

  26. Para concretizar tal intento, a Autora constituiu mandatário o advogado desta cidade, o Sr. Dr. BB, titular da cédula profissional nº …, com domicílio profissional à Rua …, …, no Porto a quem incumbiu de demandar a “EE, Lda.”, enquanto promitente vendedora que incumpriu definitivamente e com culpa aqueles contratos.

  27. O senhor advogado preparou e elaborou a competente petição inicial que ao diante se junta como doc. 3 e que deu entrada em juízo aos 23 de Setembro de 2004.

  28. E deu origem ao processo que correu termos sob o n.º 4945/04.0TVPRT da então 8.ª Vara Cível - 2ª secção (que entretanto integrou a 6.ª Vara Cível –1.ª secção) das Varas Cíveis do Porto.

  29. Nessa peça processual foi formulado o seguinte pedido: “Termos em que, na procedência da acção, não só deverá ser declarada transmitida e transferida da Ré para a Autora a dominialidade plena das fracções autónomas identificadas no artigo 47.º e a compropriedade, na proporção de metade, das descritas no artigo 57.º, integradas no mesmo edifício, de harmonia com as condições e termos estipulados nos...

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