Acórdão nº 31/13.0TBCDN-A.C2.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelABRANTES GERALDES
Data da Resolução19 de Dezembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I - AA, S.A.

, deduziu embargos de executado por apenso ao processo de execução que lhe foi movido por BB & Filhos, Lda.

A exequente veio instaurar ação executiva para pagamento da quantia de € 270.754,72 relativa a parte do preço de um contrato de subempreitada que havia celebrado com a executada.

A executada defendeu-se mediante a dedução de embargos alegando inexistência de título executivo. Alegou ainda que, enquanto empreiteira, celebrou com a exequente um contrato de subempreitada para pavimentação de uma estrada, mas esse trabalho foi defeituosamente cumprido. Notificada a exequente para efetuar a reparação dos defeitos, recusou-se a fazê-lo, de modo que, em face da urgência que se verificava, teve de contratar com terceiros a reparação, no que despendeu a quantia de € 301.333,08, pretendendo que opere a compensação.

A exequente contestou a existência do contra-crédito e defendeu a inadmissibilidade da sua invocação, dado tratar-se de um crédito indemnizatório. Alegou ainda que cumpriu o contrato de subempreitada de onde emergiu o crédito exequendo e que foi a executada que determinou que a pavimentação fosse realizada em condições atmosféricas inadequadas para o efeito.

No despacho saneador foi julgada improcedente a arguida inexistência de título executivo.

Realizado o julgamento quanto ao outro fundamento, foi proferida sentença (fls. 509 e ss.) reconhecendo a existência de defeitos na execução da subempreitada, mas considerou que não ficou demonstrado o montante do contra-crédito e que, além disso, o reconhecimento do mesmo deveria ter lugar em ação declarativa e não em sede de embargos de executado (fls. 515).

Apesar disso, julgou procedentes os embargos com o argumento de que “o valor peticionado na execução não é devido, dado que se reporta ao pagamento do contrato de subempreitada que as partes celebraram entre si e que foi cumprido defeituosamente pela exequente/subempreiteira” (fls. 515), julgando extinta a execução.

A embargada veio interpor recurso de apelação principal da sentença (fls. 652 e ss.) relativamente à decisão que declarou a extinção da execução com fundamento diverso do que fora invocado. Defendeu que a invocada compensação implicava a existência de um contra-crédito já judicialmente reconhecido, o que não ocorria no caso concreto. Sem pôr em causa a existência de defeitos na execução da subempreitada, imputou-os às deficientes condições atmosféricas que se verificavam na ocasião e ao facto de a embargante ter determinado, apesar disso, a betumagem da estrada.

A executada/embargante interpôs recurso subordinado quanto ao despacho saneador, na parte em que considerou improcedente o fundamento dos embargos sustentados na inexistência de título executivo. E apresentou ainda contra-alegações quanto à apelação principal, defendendo que a cobrança do crédito exequendo exigia a demonstração de que a exequente cumprira o contrato de subempreitada ou que o incumprimento não lhe era imputável, o que não ocorreu no caso concreto. Para o efeito invocou que a exequente foi interpelada para reparar os defeitos, o que não fez, levando a executada a resolver o contrato de subempreitada. Além disso, defendeu que a exigência do crédito exequendo nestas condições levaria a um enriquecimento da exequente à custa da executada.

A Relação julgou improcedente o recurso subordinado, confirmando a decisão que julgou improcedente os embargos de executado sustentados na inexequibilidade do título.

Já relativamente ao recurso principal interposto pela exequente/embargada, considerou que, apesar da existência de defeitos da subempreitada e da recusa da exequente em repará-los, os embargos improcediam, prosseguindo a execução, uma vez que a executada não suscitou nas contra-alegações a ampliação do recurso de apelação por forma a apreciar a existência de um crédito indemnizatório sobre a exequente em sede de compensação. Considerou ainda que não foi oportunamente exercido o direito de resolução do contrato de subempreitada, nem o direito à redução do preço da subempreitada e que nem sequer foi invocada a exceção de não cumprimento.

Ou seja, Relação considerou que a procedência dos embargos dependia da verificação do fundamento da compensação, questão que foi apreciada negativamente na sentença, sem que a executada se tivesse promovido a ampliação do objeto da apelação, e que o simples facto de a obra padecer de defeitos imputáveis à exequente não impedia o prosseguimento da execução.

A embargante interpôs recurso de revista excecional na parte em que o acórdão da Relação confirmou a decisão da 1ª instância que julgou improcedente o fundamento de embargos assente na inexistência de título executivo, mas tal recurso não foi admitido pela formação referida no nº 3 do art. 671º do CPC.

A mesma embargante interpôs ainda recurso de revista normal na parte em que a Relação julgou improcedentes os embargos de executado assentes no outro fundamento ligado ao incumprimento do contrato de subempreitada.

Seguem, assim, os autos para apreciação da revista na parte que incide sobre os efeitos que decorrem da execução do contrato de subempreitada com defeitos que, atenta a urgência, foram reparados pela embargante empreiteira.

Nas alegações de recurso e mais concretamente nas respetivas conclusões são enunciados os seguintes pontos essenciais:

  1. Provado que a obra executada pela recorrida (subempreiteira) padeceu de anomalias no trabalho de aplicação do pavimento betuminoso, pondo em perigo a circulação rodoviária; que a recorrida subempreiteira, no conhecimento dessas anomalias, se recusou a efetuar os trabalhos de reparação das apontadas anomalias; e que a ora recorrente, empreiteira, dada a urgência da reparação do pavimento betuminoso, mandou efetuar as obras necessárias de reparação, por terceiro, a circunstância de a recorrente não ter requerido, em contra-alegações, a ampliação do âmbito do recurso aos fundamentos por si aduzidos em sede de oposição não é fundamento para conceder o à recorrida subempreiteira o direito a receber da recorrente o valor da quantia exequenda de € 270.754,72, pois num contrato obrigacional bilateral, como o de subempreitada, quem comprovadamente incumpre definitivamente uma obrigação não tem o direito a receber da contraparte a contraprestação ainda não efetuada por esta.

  2. Verificando-se o incumprimento definitivo da obrigação, não há necessidade de resolver o contrato de subempreitada para, em virtude desta, se libertar do pagamento da sua contraprestação, pois se a lei admite que o credor, em caso de impossibilidade de cumprimento da obrigação não imputável ao devedor, fica desobrigado da sua contraprestação (art. 795°, nº 1, do CC), por maioria de razão o terá de ficar em caso de impossibilidade de cumprimento imputável ao devedor.

  3. Admitir que, perante o incumprimento definitivo da obrigação de reparação da exequente, a recorrente tenha a obrigação de pagar o restante do preço acordado, para além de ter de custear as obras de reparação, e que a recorrida subempreiteira tenha o direito a receber o preço integral por aquilo que executou defeituosamente, não é aceite nem pelas regras da boa-fé e configura uma situação de abuso do direito, como decorre do disposto no art. 334° do CC.

  4. A mais elementar razão de sã justiça veda a solução defendida pelo Tribunal a quo de ter a recorrida subempreiteira o direito a receber da recorrente o preço, apesar de demonstrado o gravíssimo grau de incumprimento definitivo da sua obrigação.

  5. Para se considerar que não se provou que a recorrente tenha exercido extrajudicialmente o seu direito à resolução do contrato seria necessário que este facto tivesse sido considerado como não provado ou que tal facto não tivesse sido considerado na matéria de facto, neste caso a merecer a complementação ou ampliação da matéria de facto, nos termos do art. 682°, nº 3, do CPC, com a determinação constante do art. 683°, nº 1.

  6. Não obstante, após a recorrente ter exercido extrajudicialmente, perante a recorrida, o direito à eliminação dos defeitos, e perante a expressa recusa desta em proceder às obras de reparação, resolveu o contrato de subempreitada, facto provado com base no doc. de fls. 24 vº e ss. (ata de reunião de 15-3-11), cujo teor foi confirmado pelas testemunhas que nessa reunião e na respetiva ata.

  7. Uma coisa é a declaração admonitória que leva à conversão da mora em incumprimento definitivo (nos termos do art. 808º do CC) e outra a declaração resolutiva; porém, nada há que impeça que tais declarações sejam feitas em simultâneo, dizendo-se numa única missiva/comunicação que, caso não ocorra o cumprimento no prazo suplementar concedido, se resolve o contrato.

  8. A resolução do contrato de subempreitada materializou-se, ainda que tacitamente, no exato momento em que a recorrida se recusou a proceder às reparações, e sempre no momento em que a recorrente, perante tal recusa, recorreu à contratação de um terceiro para executar os trabalhos de reparação a cargo da recorrida.

  9. Ao contrário do que o Tribunal a quo parece subentender, a resolução contratual não tem de ser expressa, dado que o contrato de subempreitada não está sujeito a forma especial.

  10. Sendo a resolução negocial efetuada por simples declaração à parte contrária, não carece de ser confirmada ou ratificada por sentença judicial, tornando-se eficaz logo que chega ao poder do destinatário ou dele foi conhecida, como é característico das declarações negociais recetícias ou recipiendas (art. 224°, n° 1 do CC).

  11. Para vir a beneficiar dos efeitos da resolução do contrato de subempreitada, a recorrente não teria de "invocar" essa resolução na sua oposição à execução.

  12. Não tendo a recorrente alegado expressamente que, no seguimento da recusa da execução dos trabalhos de reparação por parte da recorrida, resolveu o contrato de subempreitada e, nesse seguimento, mandou executar os trabalhos de reparação por terceiro, na prática, foi o que relatou no processo, ao contextualizar os...

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