Acórdão nº 271/14.5TTMTS.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelRIBEIRO CARDOSO
Data da Resolução19 de Dezembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça ([1]) ([2]) 1 - RELATÓRIO AA intentou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra BB, LDA.

, depois designada CC, LDA., DD, LDA.

, depois designada EE, LDA.

, e FF, S.A.

, pedindo que se considerasse que entre ele e as Rés existia uma relação laboral de pluralidade de empregadores e a condenação solidária destas a pagarem-lhe a quantia de € 58.978,93, devida a título de comissões de vendas que deixaram de ser pagas a partir de 2012, acrescida do montante devido pela faturação dos negócios da GG e da HH, cujo valor deve ser apurado em liquidação da sentença, e ainda juros de mora desde a citação até trânsito em julgado da sentença.

Para tanto, em síntese, alegou que celebrou com a 1ª R. no dia 27 de abril de 2009 um contrato de trabalho para o exercício das funções de Diretor Comercial, auferindo ultimamente uma remuneração base de € 2.014,00, acrescida de uma retribuição variável de comissões no valor de 12% sobre a comissão cobrada aos clientes, e que em 2011 o sócio gerente da 1ª R. criou a 2ª R., da qual era sócia a 1ª R. e o dito sócio gerente, para intermediar os negócios em que estivessem em causa venda de quotas ou ações de sociedades detentoras de farmácias, área em que a 1ª R. antes atuava, para além da mediação em trespasses de alvarás de farmácias, passando a trabalhar indistintamente para as duas sociedades independentemente de qual faturasse a comissão do negócio de trespasse ou venda de alvará ou negócios de vendas de quotas. Aquele sócio gerente era simultaneamente administrador da 3ª R. que havia sido criada com o intuito de fazer a gestão de farmácias e prestar serviços a farmácias. Todas as RR. tinham uma estrutura organizativa comum, trabalhando ele indistintamente para as mesmas, do que se conclui que o contrato que inicialmente havia celebrado com a 1ª R. se transformou ao longo do tempo num contrato com uma tríplice entidade empregadora. A sua remuneração fixa era paga pela 1ª R. e a sua remuneração variável era assegurada pelas três RR. indistintamente. Contudo, tendo recebido as comissões até 2012 sobre todos os negócios mediados pelas três RR., por decisão unilateral do respetivo sócio gerente e administrador, tal pagamento deixou de ser efetuado sem qualquer justificação, reclamando por essa razão o seu valor, relativamente a todos os negócios concretizados em 2012 e até à cessação do seu contrato por extinção do posto de trabalho em 7.04.2013.

Frustrada a tentativa de conciliação, as RR. contestaram, admitindo que o A. trabalhava para as três, cujo capital é detido por sócios ou acionistas comuns, mas que não constituem uma única realidade económica, nem possuem uma estrutura organizativa comum. Apenas foi acordado com o A. o pagamento de um prémio anual calculado pela aplicação de 12% sobre o total das vendas angariadas pelo mesmo e na condição de aquelas vendas atingirem, anualmente, no conjunto das três sociedades, o valor mínimo de € 300.000,00, não tendo havido lugar ao pagamento de qualquer prémio a partir de 2012, porquanto o A. não atingiu aquele valor mínimo de vendas.

Respondeu o A. mantendo a sua posição inicial.

Saneado o processo, com dispensa da seleção da matéria de facto e realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida a sentença com o seguinte dispositivo: “Por todo o exposto julgo a ação parcialmente procedente e, em consequência, decido: I – condenar as rés solidariamente a pagar ao autor a quantia de € 55.056,00 (cinquenta e cinco mil e cinquenta e seis euros) a título de comissões, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento, acrescida da quantia a liquidar após a sentença relativa à comissão devida relativamente ao negócio (venda de quotas) da GG, em ..., e respectivos juros de mora, à taxa legal, desde o trânsito em julgado da decisão de liquidação até integral pagamento.

II – absolver as rés da parte restante do pedido.

Custas pelo autor e pela rés, na proporção dos decaimentos – art. 537º do Código de Processo Civil.

Valor da ação: € 58 978,93 (cinquenta e oito mil novecentos e setenta e oito euros e noventa e três cêntimos).

” Não se conformando, as RR. apelaram, impugnando, para além do mais, a decisão sobre a matéria de facto e requerendo a reapreciação parcial da prova gravada.

O A. contra-alegou.

Antes da subida da apelação foi a instância suspensa nos termos do disposto no artigo 17º-E, nº 1 do CIRE, com fundamento no facto das RR. EE, Lda. e CC, Lda. se encontrarem em processo de revitalização, estando em curso em ambos os processos a fase de negociações.

No mesmo despacho foi ainda determinado que, quanto à R. FF, Lda., oportunamente os autos fossem remetidos ao Tribunal da Relação para apreciação do recurso interposto.

Na Relação foi proferido acórdão declarando suspensa a instância também quanto à R. FF, Lda., não se conhecendo por essa razão do recurso.

Descendo os autos à 1ª Instância, e após recolha de diversas informações, foi proferido despacho a «determinar o prosseguimento dos autos e de todos os respetivos apensos contra os sócios da sociedade extinta CC, Lda, II e JJ, melhor identificados nos autos, sendo a responsabilidade destes limitada ao montante que receberem na partilha dos bens das sociedades» e a «julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide no que respeita à ré EE, Lda (…)».

Em 27.02.2017 foi determinado o prosseguimento dos autos também contra a FF, S.A., pelo facto do processo de revitalização ter terminado sem que tivesse sido homologado qualquer plano de revitalização, tendo prosseguido como insolvência, à data ainda não decidida.

Subidos os autos à Relação pelo relator foi proferida decisão sumária determinando a devolução dos autos à 1.ª Instância pelo facto de ter sido decretada a insolvência da R. FF.

Na 1ª instância foi julgada extinta a instância por inutilidade superveniente da lide relativamente a esta R. Mais se determinou a remessa dos autos à Relação para conhecimento do recurso interposto pela R. CC da sentença proferida nos autos.

Subidos os autos de novo à Relação, conhecendo-se da apelação, foi proferida a seguinte deliberação: «Acordam os juízes que integram a Secção Social do Tribunal da Relação do Porto, rejeitando-o quanto à reapreciação da matéria de facto, em declarar no mais improcedente o recurso.

Custas do recurso conhecido a cargo dos sócios liquidatários da “CC”, identificados nos autos».

Inconformados com esta deliberação, II e JJ, na qualidade de sócios da sociedade extinta CC, Lda., recorrem agora de revista para este Supremo Tribunal, impetrando a revogação do acórdão recorrido.

O recorrido contra-alegou pugnando pela manutenção do julgado.

Cumprido o disposto no art. 87º, nº 3, do CPT, a Exmª Srª Procuradora-Geral-Adjunta emitiu douto parecer no sentido da concessão da revista.

Notificadas, as partes não responderam.

Formularam os recorrentes as seguintes conclusões, as quais, como se sabe, delimitam o objeto do recurso ([3]) e, consequentemente, o âmbito do conhecimento deste tribunal: ”1. A questão que se coloca resume-se a saber se o Tribunal da Relação deveria ter conhecido da apelação no tocante à impugnação da decisão sobre a matéria de facto e, em caso negativo, ter, ao menos, convidado os Recorrentes a aperfeiçoar as suas alegações.

  1. O artigo 640º do Código de Processo Civil estabelece o ónus a cargo do apelante que impugne a decisão sobre a matéria de facto, concretamente, identificar os concretos pontos que, no seu entender, foram incorrectamente apreciados, especificar os meios probatórios que impunham decisão diversa e indicar a resposta que deveria ser dada a tais pontos de facto.

  2. É necessário que a verificação do cumprimento do ónus de alegação regulado no artigo 640º daquele Diploma seja compaginado com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, atribuindo maior relevo aos aspectos de ordem material.

  3. Este tema tem sido objecto de vários acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça que vem procurando travar uma tendência que teima em manter-se para a rejeição de recursos de apelação quando está em causa a reapreciação da decisão da matéria de facto.

  4. No caso sub iudice não se verifica um “recorrer por recorrer” no tocante à matéria de facto, mas há, outrossim, um recurso fundamentado, consciente e responsável, pelo que os Recorrentes cumpriram a exigência que sobre si impendia.

  5. De facto, volvendo as conclusões e as alegações de recurso apresentadas, temos que os Recorrentes identificaram os pontos da matéria de facto que, em concreto, impugnam, enumerando‑os e indicando o que em sua opinião deveria ser considerado provado (cfr. pontos XVII, XXXIV, XLIX das conclusões).

  6. E indicam os concretos depoimentos das testemunhas, com data, hora e minuto em que os mesmos se iniciaram e terminaram (cfr. Pontos III, VI, VII, VIII, IX, XXX, XLVIII), transcrevendo nas alegações as passagens dos referidos depoimentos e fazendo, a propósito de cada excerto transcrito, uma análise crítica do mesmo e apresenta a conclusão do que consideram, em seu entender, que deveria ter sido dado como provado tendo por base aqueles depoimentos.

  7. Por último, os recorrentes apresentaram uma alternativa decisória: em lugar de “provado”, consideraram que os factos referidos nos pontos II, IX, X, XVII, XXXIV, XLIX deveria ser considerado “não provado”.

  8. Por outro lado, conforme resulta do disposto no artigo 639º o Código de Processo Civil, as conclusões são, não apenas a súmula dos fundamentos aduzidos nas alegações stricto sensu, mas também o elemento definidor do objeto do recurso e balizador do âmbito do conhecimento do tribunal “ad quem”.

  9. Volvendo às alegações apresentadas forçoso é concluir-se que, também, no seu corpo os Recorrentes identificaram os pontos de facto que considerava[m] mal julgados por referência aos quesitos da base instrutória dados como assentes, indicaram o depoimento das testemunhas que entende[ram]...

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