Acórdão nº 1108/12.5PCSNT.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelRAUL BORGES
Data da Resolução27 de Junho de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

No âmbito do processo comum com intervenção de tribunal colectivo n.º 1108/12. 5PCSNT, do então Juízo de Grande Instância Criminal do Tribunal da Comarca da Grande Lisboa-Noroeste, foi submetido a julgamento, para além de outro, o arguido AA, natural da ---, de nacionalidade ---, nascido a ...-1993, [...].

O recorrente esteve preso em cumprimento de pena, à ordem do processo principal, desde 12-04-2017, como consta de fls. 512, 517 e 525 e verso.

De acordo com a informação de fls. 52, desde 12-04-2018 encontra-se sujeito à medida de coacção de prisão preventiva, à ordem do processo n.º 6383/17.6T9SNT.

Realizado o julgamento, por acórdão datado de 3 de Dezembro de 2013, constante de fls. 245 a 257 do processo principal, foi o arguido condenado, pela co-autoria material de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão e na pena acessória de expulsão do território nacional com interdição de entrada por um período de 5 anos.

O arguido interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, que por acórdão de 12 de Junho de 2014, constante de fls. 341 a 357 do processo principal, negou provimento ao recurso.

Tal acórdão transitou em julgado em 5-09-2014, conforme fls. 521.

***** O arguido interpôs o presente recurso extraordinário de revisão em 28 de Fevereiro de 2018, apresentando a motivação de fls. 8 a 17 verso, que se transcreve como segue, incluídos os realces: A. Objecto do Recurso: Vem o presente recurso interposto do Douto Acórdão proferido nos autos de processo comum com intervenção do tribunal colectivo acima identificados, que condenou o arguido AA em: a) pena de 2 anos de prisão, pelo crime de roubo; No mesmo acórdão, além da condenação em custas, foi também o arguido condenado na pena acessória de expulsão do País pelo período de 5 anos, ao abrigo do disposto no art.151° nº1 da Lei n° 23/2007, de 4-7.

Entende o arguido, ora recorrente, que, face à factualidade dada como provada em juízo e ao Direito aplicável, nomeadamente quanto aos limites à expulsão, constantes do art. 135° da mesma lei, a pena aplicada revela-se pouco criteriosa e desequilibradamente injusta.

B. Da Pena Acessória 1º O Douto Acórdão recorrido impõe a expulsão do País ao arguido pelo período de 5 anos, nos termos do disposto no art. 151º nº 1 da Lei n° 23/2007 de 4-7.

2° O Tribunal a quo não fez quaisquer considerandos nem fundamentou minimamente a aplicação da pena acessória de expulsão do arguido, pena esta que poderá ser tão ou mais gravosa do que a pena limitativa da liberdade do arguido, justificando apenas que “não se concluindo pela verificação de alguma das condições impeditivas de expulsão a que alude o artº 135° da Lei 23/2007 de 4-7 (. . .) impõe-se que seja decretada a pena acessória de expulsão do Arguido, com interdição de entrada pelo período de cinco anos, medida esta que se tem por proporcional à gravidade dos factos por ele cometidos e tendo em conta o disposto no art. 144° da referida Lei nº 23/2007 ”.

3° Ora, uma vez mais o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 71 ° do Código Penal, doseando descriteriosamente a medida da pena concretamente aplicável, abstendo-se de tecer quaisquer considerações que fundamentem minimamente a sua decisão.

4° Esta pena é de aplicação meramente facultativa, apenas devendo ser aplicada quando especiais razões justifiquem a sua aplicação, devendo esta ser sempre fundamentada, cumprindo ao julgador demonstrar que aquela concreta expulsão se justifica, só assim se observando o princípio de direito criminal da individualização das penas.

5° Por imposição constitucional, “nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos” - art. 30, n.º 4 da CRP, daí que seja necessário que a decisão de expulsão - que não opera automaticamente -, seja convenientemente fundamentada.

Em conclusões do Parecer n° P000022011 da PGR pode ler-se que: I. Se, anteriormente à condenação já transitada em julgado, existia urna situação subsumível à previsão das alíneas b) ou c) do artigo 135.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, que não foi tomada em consideração pelo tribunal como limite legal à aplicação da referida pena acessória, caberá interpor recurso extraordinário de revisão da sentença respectiva, uma vez preenchidos os correspondentes pressupostos de admissibilidade (descoberta de novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre ajustiça daquela condenação); II.

Se, na situação referida na antecedente conclusão, não se mostrar admissível o recurso extraordinário de revisão de sentença, a solução adequada, em concreto, para evitar a execução da pena de expulsão, passa pela concessão de uma medida de clemência ao abrigo do disposto nos artigos 127.° e 128.°, n.º 4, do Código Penal (indulto); III.

A ocorrência, posterior à sentença condenatória, de qualquer das situações previstas nas alíneas b) e c) do artigo 135.° da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, uma vez judicialmente reconhecida, determina, também, a extinção da referida pena acessória, na medida em que ainda não tenha sido cumprida; IV.

A Lei n." 23/2007, de 4 de Julho, na medida em que eliminou pressupostos anteriormente exigidos para impedir a aplicação da pena acessória de expulsão e em que criou pressupostos diversos dos previstos para esse efeito na lei anterior, tem natureza despenalizadora, sendo retroactivamente aplicável (artigo 29.°, n.º 1, da Constituição, e 2.°, n.º 1, do Código Penal).

6° Atento o teor do art. 30.°, n.º 4, da CRP, de harmonia com o qual «Nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos», muito se discutiu se seria admissível a imposição (automática), a um cidadão que tivesse cometido determinado tipo de infracções, da pena acessória de expulsão.

7º O Acórdão de uniformização de jurisprudência n. 14/96, de 07-11-1996 (proferido no Proc. n.º 45 706, da 3.a Secção, e publicado no DR, Série I-A, n.º 275, de 27-11-1996, e no BMJ 461.°/54), resolvendo a querela a propósito da pena acessória de expulsão de estrangeiros, então prevista no art. 34.°, n.º 2, do DL 430/83, de 13-12, fixou a seguinte jurisprudência: «A imposição a estrangeiro da pena de expulsão prevista no n.º 2 do artigo 34.° do Decreto-Lei n.º 430/83, de 13 de Dezembro, não pode ter lugar como consequência automática da sua condenação por qualquer dos crimes previstos nos seus artigos 23.º, 24.º, 25.°, 26.º, 28.º, 29.° e 30.º, devendo ser sempre avaliada em concreto a sua necessidade e justificação».

8º E, pese embora as modificações legislativas, a jurisprudência deste STJ tem vindo a acentuar a ponderação, a razoabilidade, a necessidade, a adequação e a proporcionalidade ínsitas à sua aplicação - A decisão de expulsão, que constitui uma ingerência na vida da pessoa expulsa, pressupõe, pois, sempre urna avaliação de justo equilíbrio, de razoabilidade, de proporcionalidade, de fair balance entre o interesse público, a necessidade da ingerência e a prossecução das finalidades referidas no art. 8.º, n.º 2, da Convenção Europeia, e os direitos do indivíduo contra ingerências das autoridades públicas na sua vida e nas relações familiares, que podem sofrer uma séria afectação com a expulsão, especialmente quando a intensidade da permanência no País de residência corta as raízes ou enfraquece os laços com o País de origem.

9º Em processo de fiscalização abstracta sucessiva, o TC, reunido em plenário, no âmbito do Proc. n.º 807/99, pelo Ac. n.º 232/2004, de 31-03-2004 (in DR Série I, n.? 122, de 25-05¬2004, decidiu: «(. . .) c) - Declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, por violação das disposições conjugadas dos artigos 33º nº 1, e 36º n.º 6, da Constituição, das normas do artigo 101º n.º 1, alíneas a), b) e c), e n. o 2, e do artigo 125º n. º 2, do Decreto-Lei n.º 244/98, de 8 de Agosto, na sua versão originária, da norma do artigo 68º n.º 1, alíneas a), b) e c), do Decreto-Lei n. o 59/93, de 3 de Março, e da norma do artigo 34º n.º 1, do Decreto-Lei n. º 15/93, de 22 de Janeiro, enquanto aplicáveis a cidadãos estrangeiros que tenham a seu cargo filhos menores de nacionalidade portuguesa residentes em território nacional; d) - Fixar os efeitos da inconstitucionalidade das normas referidas na alíea anterior de modo que não fiquem ressalvados os casos julgados relativamente a penas acessórias de expulsão ainda não executadas aquando da publicação desta decisão».

10° Tal entendimento baseia-se na regra da proibição da separação dos filhos dos pais ser apenas uma das manifestações da protecção constitucional dada à família e constituir não só um direito subjectivo dos pais a não serem privados dos filhos, mas também um direito destes de não serem afastados dos pais.

11º O raciocínio ali desenvolvido é o de que a expulsão de estrangeiros com filhos portugueses a seu cargo implica uma de duas consequências, ambas beliscando princípios constitucionais: ou os menores acompanham o progenitor expulso e, ipso facto, estar-se¬iam a expulsar cidadãos portugueses, infringindo-se o art. 33.° da Constituição; ou, em alternativa, os menores permanecem em território nacional, em clara afronta ao art. 36.°, n.º 6, do texto fundamental - Carlota Pizarro de Almeida, Exclusões Formais, Exclusões Materiais - O Lugar do Outro; Discriminação Contra Imigrantes, RFDUL, Volume XLV, n.ºs I e 2, Coimbra Editora, 2004, págs, 37-45, maxime pág. 43.

12º A primeira destas consequências configura a expulsão consequencial, em que a expulsão do progenitor estrangeiro, para evitar a quebra do agregado familiar, implica a expatriação do filho menor, ainda que português, não sendo mais do que uma forma indirecta de expulsão. Por isso, tenha-se presente que «(, . .) atendendo ao princípio de proibição de expulsão de nacionais, mesmo que o cidadão não tenha nacionalidade portuguesa, poderá haver...

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