Acórdão nº 0261/18.9BEVIS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução05 de Dezembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida em processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade acima identificada (adiante Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu julgou improcedente a reclamação por ela deduzida ao abrigo do art. 276.º e segs. do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) da decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Viseu que ordenou o levantamento da suspensão de execução fiscal, no entendimento de que o pedido de revisão oficiosa apresentado para além do termo do prazo da reclamação administrativa não consubstancia uma reclamação nos termos do art. 52.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT) e do art. 169.º do CPPT e, como tal, não pode fundamentar a suspensão do processo de execução fiscal, ainda que a dívida exequenda e o acrescido se encontrem garantidos.

1.2 Com o requerimento de interposição do recurso apresentou a respectiva motivação, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «1. Não há nenhuma distinção relevante entre o pedido de revisão apresentado dentro do prazo de reclamação graciosa e o mesmo pedido apresentado para lá desse prazo. Isto, segundo a grelha de análise que aqui importa – ou seja, tendo em consideração os princípios que formam a razão de ser do enquadramento do pedido de revisão no n.º 1 do artigo 169.º do CPPT.

  1. Se se queria evitar aquela dualidade de efeitos relativamente a meios legais com a mesma razão de ser (o pedido de revisão e a reclamação graciosa, nomeadamente), em nome dos princípios da igualdade e da tutela jurisdicional efectiva de direitos e interesses legalmente protegidos, então o pedido de revisão oficiosa também deveria ser considerado dentro do âmbito daquele dispositivo.

  2. Com efeito, a lei, devidamente explicada e densificada pela doutrina e pela jurisprudência, trata este pedido como um expediente normal, próprio, típico e principal de contestação da legalidade de actos tributários, tanto quanto o pedido de revisão dentro do prazo de reclamação administrativa.

  3. A doutrina em que nos vimos apoiando, assim como a Sentença recorrida, diz que, do ponto de vista da natureza, da função e dos efeitos, as duas versões do pedido de revisão de actos tributários são iguais, uma vez que a razão material de ser, de uma e de outra, é exactamente a mesma.

  4. É por isso que, segundo a doutrina e a jurisprudência, em ambas as versões do pedido de revisão os contribuintes podem contestar os actos com base em matéria de facto ou de direito. É por isso que em ambas as versões o erro de direito ou de facto se presume imputável aos serviços da AT. É por isso que em ambas versões o indeferimento expresso ou tácito abre a via da impugnação contenciosa.

  5. Dúvidas não restam de que, na ausência do pedido de revisão da letra do n.º 1 do artigo 169.º do CPPT, o seu conteúdo, devidamente integrado, teria de prever quer o pedido de revisão apresentado dentro prazo de “reclamação administrativa” quer o pedido deduzido para lá desse prazo, porque, à luz das razões de justiça material que recomendam a inclusão do primeiro, não é legitimamente possível deixar de fora o segundo, relativamente ao qual se aplicam as mesmas razões de justiça material.

  6. E não se diga que a inclusão do primeiro tem arrimo na letra da lei (que fala em “reclamação administrativa”) e que o princípio da interpretação segundo o qual não se pode fazer uma interpretação que não tenha um mínimo de correspondência na letra da lei recomendava a abertura da norma apenas ao pedido feito dentro do prazo de “reclamação administrativa”.

  7. É que, em primeiro lugar, o pedido de revisão também não é uma reclamação administrativa: a sua inclusão no âmbito de aplicação do n.º 1 do artigo 169.º do CPPT não decorre de uma interpretação sobre o seu respaldo literal, mas sim de um raciocínio de equiparação à natureza, função e efeitos da reclamação graciosa, com base nos princípios da igualdade no acesso ao direito, conjugado com o da tutela jurisdicional efectiva de direitos e interesses legalmente protegidos (se o pedido de revisão é a mesma coisa que a reclamação graciosa, então se for apresentado no mesmo prazo pode suspender a execução). Daí que não haja qualquer razão para afastar da previsão da norma o pedido de revisão deduzido em momento posterior ao fim do prazo de reclamação graciosa: este, quanto à sua natureza, função e efeitos, também já é equiparado à reclamação graciosa.

  8. De resto, em segundo lugar, obviamente que aquele princípio de interpretação da lei, por muito relevante que seja, não se pode sobrepor aos princípios constitucionais de primeiríssima importância que aqui em jogo.

  9. Nestes termos, o n.º 1 do artigo 169.º do CPPT é inconstitucional, por violação dos princípios constitucionais da igualdade, na dimensão de igualdade no acesso ao direito, consagrado no artigo 13.º da CRP, e da tutela jurisdicional efectiva de direitos e interesses legalmente protegidos, consagrado no artigo 20.º e no n.º 4 do artigo 268.º da CRP.

  10. Assim sendo, o mesmo deve aplicado neste caso como permitindo a suspensão do presente processo executivo em virtude da dedução do pedido de revisão de acto tributário apresentado.

Termos em que o presente recurso deve ser julgado procedente, por provado, com a revogação da Sentença recorrida e as demais consequências legais».

1.3 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

1.4 Não foram apresentadas contra-alegações.

1.5 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo e dada vista ao Ministério Público, o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso, com a seguinte fundamentação: «[…] 2.FUNDAMENTAÇÃO.

A cobrança da prestação tributária suspende-se no processo de execução fiscal em virtude de pagamento em prestações ou reclamação, recurso, impugnação e oposição à execução que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda, bem como durante os procedimentos de resolução de diferendos no quadro da Convenção de Arbitragem n.º 90/436/CEE, de 23 de Julho, relativa à eliminação da dupla tributação em caso de correcção de lucros entre empresas associadas de diferentes Estados membros (artigo 52.º/1 da LGT).

A execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda, bem como durante os procedimentos de resolução de diferendos no quadro da Convenção de Arbitragem n.º 90/436/CEE, de 23/07, relativa à eliminação da dupla tributação em caso de correcção de lucros entre empresas associadas de diferentes Estados membros, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestado nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido (artigo 169.º/1 do CPPT).

A suspensão da execução fiscal fora dos casos previstos na lei é fundamento de responsabilidade tributária subsidiária (artigo 85.º/ 3 CPPT).

Como expende o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa “Quanto ao pedido de revisão do acto tributário, que está previsto no n.º 1 do art. 78.º da LGT, para os casos em que é feito dentro do prazo da reclamação administrativa, trata-se de uma verdadeira reclamação, correspondendo ao respectivo conceito doutrinal, consagrado no art. 158.º, n.ºs 1 e 2, alínea a) do CPA.

Na verdade, este pedido de revisão é dirigido ao próprio autor do acto e por este decidido e, quando é deduzido no prazo de reclamação, consubstancia uma verdadeira reclamação.

Assim, por força do preceituado no referido art. 52.º, n.º 1 da LGT, que faz uma referência genérica a «reclamação» também este pedido de revisão terá efeito suspensivo, dentro do condicionalismo previsto no n.º 1 deste art. 169.º.

No entanto, o mesmo parece não se poder entender em relação aos outros casos de revisão do acto tributário, mesmo quando a denominada «revisão oficiosa» é pedida pelo sujeito passivo Com efeito, nos casos em que foi ultrapassado o prazo legal de impugnação do acto de liquidação, a revisão do acto tributário não constitui um verdadeiro meio de impugnação, pois não tem os efeitos próprios dos meios de impugnatórios, que se reconduzem à destruição retroactiva dos efeitos próprios do acto anulado, consubstanciada na «reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso» (art. 100.º da LGT), juros estes contados desde o pagamento indevido até à emissão da respectiva nota de crédito (art. 61.º, n.º 3, do CPPT). No caso de procedência de pedido de revisão oficiosa, deduzida fora do prazo legal de impugnação por meios administrativos e judiciais, não é reconhecido o direito a juros indemnizatórios com esta dimensão, própria da retroactividade dos efeitos da anulação, mas, apenas, se se verificar alguma das situações previstas nas alíneas b) e c) do n.º 3 do art. 43.º da LGT.

Nestes casos em que a revisão oficiosa não pode ser considerada como «reclamação administrativa», por ser pedida fora dos prazos de impugnação do acto de liquidação, não se está perante um meio procedimental ou processual que caiba nos conceitos de reclamação, recurso, impugnação da liquidação ou oposição à execução fiscal e só nestas situações o art. 52.º, n.º 1, da LGT prevê a possibilidade de suspensão da execução”.

E continua o mesmo autor quanto ao pedido de revisão feito para além do prazo da reclamação graciosa “…nesse caso já se fazem sentir as razões de segurança jurídica que justificam o estabelecimento de preclusão de direitos de anulação de actos tributários e, por isso, os feitos atribuídos ao pedido de revisão já não são os mesmos, como decorre da alínea c) do n.º 3 do art. 43.º da LGT, ao estabelecer que são devidos juros indemnizatórios quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de...

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